terça-feira, 31 de janeiro de 2012

HABILITAÇÃO - DOCUMENTOS - FALTA JUNÇÃO

Proc. Nº 840/09.5BEVIS   TCAN                 20 de Janeiro de 2011

I. A não apresentação dos documentos de habilitação no prazo ou no modo para o efeito fixado importa a caducidade da adjudicação, sendo que se admite a possibilidade de ser concedido um prazo adicional para a apresentação de documentos de habilitação em falta no caso dessa falta resultar de facto que não seja imputável ao adjudicatário.
II. Cabe à entidade adjudicante emitir o juízo sobre se o facto impeditivo da apresentação atempada dos documentos é ou não imputável ao adjudicatário e, como tal, relevante, sendo que neste âmbito se admite como possível a invocação do justo impedimento enquanto contendo um princípio geral de direito com plena valia e aplicação neste domínio.
III. Do disposto nos arts. 81.º, n.º 1, al. b) e 86.º do CCP na sua conjugação com o demais quadro normativo em matéria de procedimentos de formação de contratos não deriva qualquer imposição à entidade adjudicante do dever de notificação ou de prolação dum novo convite ao adjudicatário quanto à junção da documentação em falta para efeitos de habilitação.
IV. Atente-se que a possibilidade de existir uma supressão de irregularidades detectadas nos documentos apresentados que possam levar à caducidade da adjudicação nos termos do art. 86.º do CCP pressupõe que se trate duma situação de mera irregularidade e quanto a documentação que foi junta ao procedimento [cfr. art. 132.º, n.º 1, al. g) do CCP na sua actual redacção] e nunca de permissão de suprimento quanto a uma total ou parcial omissão de instrução com junção de documentação para efeitos de habilitação quando estejamos perante omissão apenas imputável ao adjudicatário.
V. Não resultando apurado que em face dos avisos/esclarecimentos proferidos no procedimento hajam sido proferidos outros actos em matéria da habilitação que revelem conduta ou condutas que no confronto com a do acto impugnado importem violação dos princípios da concorrência, da transparência, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade, da boa fé e da prossecução do interesse público tem-se a infracção aos referidos princípios como insubsistente

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
“F…, LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Viseu, datada de 06.08.2010, que julgou improcedente a acção administrativa de impugnação urgente [contencioso pré-contratual] pela mesma deduzida nos termos dos arts. 100.º e segs. do CPTA contra “AGÊNCIA NACIONAL COMPRAS PÚBLICAS, EPE” e as contra-interessadas “C…, LDA.”, “C…, SA”, “F…, LDA.”, “E…, SA”, “I…, SA”, “E…, LDA.” e “O…, LDA.”, todas igualmente identificadas nos autos, na qual peticionava a declaração de nulidade dos actos proferidos pelo CA do ente público demandado no âmbito do procedimento concursal público para “selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestação de serviços de limpeza” (DR II.ª série, de 15.10.2008) em 05.03.2009 e 24.03.2009 que consideraram caduca a adjudicação à mesma relativa aos lotes 09) e 10).
Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 298 e segs. - paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem:
“...
1. A aqui Recorrente veio requerer, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, a anulação do acto administrativo da Recorrida, Agência Nacional de Compras Públicas, de 5 de Março de 2009 que considerou caducada a adjudicação que lhe fora feita do fornecimento de produtos de higiene e de prestação de serviços de limpeza, após prévio concurso a que se reportam os presentes autos, nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 86.º, do CCP, pela não apresentação, no prazo fixado no PC, das declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social, relativas ao último ano (apresentou apenas a declaração relativa ao mês 07/2008) e declarações de clientes com indicação dos valores; a falta destes documentos (ou a sua não apresentação nos termos solicitados no PC, o que equivale à sua não apresentação) impediu, ainda, a comprovação de duas das três condições técnicas constantes da alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do PC;
2. E, ainda, da deliberação do mesmo Conselho de Administração, de 24 de Março de 2009, que manteve aquela primeira deliberação de caducidade da mesma adjudicação, após a reclamação apresentada atempadamente pela Recorrente para o Conselho de Administração da Recorrida;
3. No entanto, a douta sentença, não veio a dar provimento à acção;
4. Desde logo, a douta sentença não dá como matéria de facto provada, ao contrário do que deveria ter sucedido, que a Autora dispunha dos documentos de habilitação que a Recorrida entendia deverem ser entregues, quando tal resulta dos documentos juntos aos autos pela Recorrente, mais concretamente, os documentos n.ºs 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24.
5. Pelo que, a decisão proferida sobre a matéria de facto foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada por forma a considerar como provado que a Recorrente dispunha dos documentos que a Recorrida pretendia nos termos da alínea e) do artigo 11.º do PC e ainda dos que se destinavam a comprovar duas das condições previstas na alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do PC, quando tal resulta dos documentos juntos aos autos pela Recorrente e já acima melhor identificados.
6. Acresce ainda que a douta sentença ao considerar improcedente a acção proposta pela Recorrente, violou o disposto no artigo 86.º, do CCP; e ainda os princípios da concorrência, transparência, proporcionalidade, justiça e imparcialidade, boa fé e prossecução do interesse público, consagrados no CCP e no CPA;
7. Na verdade, o MM Juiz a quo não considerou, quando, salvo melhor opinião, deveria ter considerado, que a Recorrida deveria ter dado um prazo adicional à Recorrente para esta suprir as deficiências relativamente aos documentos de habilitação pretendidos.
8. Aliás, esta interpretação do artigo 86.º, do CCP, é aquela que veio a obter consagração numa recente alteração legislativa, e que veio tornar absolutamente clara a ratio daquele normativo, mais concretamente, através do Decreto-Lei 278/2009, de 2 de Outubro,
9. Ora, a não entrega dos documentos, nos termos solicitados pela Recorrida, pelo simples facto da Recorrente não ter interpretado correctamente quais os documentos a entregar, e ter-se convencido que estaria a entregar os correctos, o que motivou que tão pouco tivesse pedido qualquer esclarecimento à Recorrida, parece-nos, sem qualquer sombra de dúvida, uma situação enquadrável na ratio desta norma - e que esta alteração legislativa simplesmente veio clarificar.
10. Sucede que corroborando a tese defendida pela Recorrente, de que o cumprimento formal daquele normativo violava a sua ratio e os princípios da concorrência e da proporcionalidade, consagrados no CCP e no CPA, veio já a ser proferido um acórdão, no âmbito de um processo de contencioso pré-contratual e em que se impugnava um acto idêntico ao impugnado nos presentes autos, e num processo concursal promovida pela ora Recorrida;
11. Assim, neste Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, datado de 04.02.2010, do CA, 2.º Juízo, proferido no processo n.º 05832/10, pode ler-se que:
«II. O art. 86.º do Código dos Contratos Públicos, mesmo na redacção anterior ao Dec.-Lei n.º 278/2009, de 2 de Outubro, deve ser interpretado no sentido do adjudicatário que tenha apresentado documentos de habilitação irregulares ser ouvido antes da decisão sobre a caducidade da adjudicação.
III. Além disso, se as irregularidades forem de reduzida gravidade e ou passíveis de sanação, a entidade adjudicante deve conceder-lhe prazo razoável para esse efeito».
12. Acresce ainda que o MM.º Juiz a quo também não considerou que os esclarecimentos prestados pela Recorrida não violaram o princípio da igualdade, uma vez que, mais não foram do que o exercício de um dever da Recorrida por forma a evitar que em futuros procedimentos tais situações se repitam,
13. Ora, sucede que, salvo melhor opinião, o exercício deste dever pela Recorrida consubstanciava-se, pelo contrário, em conceder um prazo adicional aos concorrentes que, como a Recorrente, não tivessem procedido à entrega dos documentos de habilitação, por qualquer errónea interpretação no pedido formulado e que fosse susceptível de resolução nesse prazo adicional;
14. Por outro lado, o Tribunal a quo, entendeu que, a Recorrida não violou o princípio da igualdade pelo facto de ter concedido um prazo adicional para que os concorrentes pudessem apresentar certidão de registo comercial ou lhe disponibilizassem o respectivo código de acesso, por considerar que aqui não estávamos perante a mesma situação;
15. Sucede, que tal assim não o foi, uma vez que, a certidão de registo comercial solicitada era precisamente para comprovar que os concorrentes não se encontravam nas situações previstas nas alíneas b) e i), do artigo 55.º, do CCP, cfr. artigo 81.º, n.º 1, alínea b), do CCP, e conforme é aliás referido no próprio aviso;
16. Pelo que, ao tratar de forma desigual situações iguais, quando relativamente a determinados documentos de habilitação a Recorrida entendeu que tinham ocorrido dúvidas sobre como estes eram constituídos permitindo a sua entrega num prazo adicional violou a douta sentença o artigo 81.º, n.º 1, alínea b), conjugado com as alíneas b) e i), do artigo 55.º, e o artigo 86.º todos do CCP, e assim o princípio da igualdade;
17. Pelo que, deverá anular-se a douta sentença recorrida, por esta violar claramente os artigos 86.º, 81.º, n.º 1, alínea b), conjugado com as alíneas b) e i), do artigo 55.º, e o artigo 86.º todos do CCP e ainda os princípios da concorrência, transparência, proporcionalidade, justiça e imparcialidade, boa fé e prossecução do interesse público, consagrados no CCP e no CPA …”.
Pugna pela revogação da decisão e total procedência da acção.
Dos RR., aqui recorridos, apenas a “AGÊNCIA NACIONAL COMPRAS PÚBLICAS, EPE” apresentou contra-alegações (cfr. fls. 327 e segs.), nas quais conclui nos termos seguintes:
“...
A) Por deliberações do Conselho de Administração da Recorrida, de 05.03.2009 e 24.03.2009, foi determinado, entre o mais, a caducidade da adjudicação efectuada às propostas apresentadas pela Recorrente nos Lotes 9 e 10 do «Concurso público para selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestadores de serviços de limpeza»;
B) Mais concretamente, a deliberação da Recorrida de 05.03.2009 determinou, ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do art. 86.º do Código dos Contratos Públicos - o «CCP» (na redacção originária dada pelo Decreto-Lei n.º 18/2008 de 29 de Janeiro), a caducidade da adjudicação efectuada às propostas apresentadas pela aqui Recorrente, nos Lotes 9 e 10 do Concurso, em virtude da «não apresentação, no prazo fixado no PC, das Declarações de Remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social, relativas ao último ano (apresentou apenas a Declaração relativa ao mês 07/2008) e Declarações de clientes com indicação dos valores; a falta destes documentos (ou da sua não apresentação nos termos solicitados no PC, o que equivale à sua não apresentação) impediu, ainda, a comprovação de duas das três condições técnicas constantes da alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do PC».
C) Na verdade, e ao contrário do exigido na al. d) do n.º 1 do art. 11.º do PC [Declarações de clientes, em número mínimo de 4 (quatro), relativas a fornecimentos de produtos de higiene ou a prestação de serviços de limpeza, que tenham totalizado, desde 1 de Janeiro de 2007 até à data da apresentação da proposta, 20.000 € (vinte mil euros) - cfr. art. 5.º, n.º 1, al. e), ponto (i), do PC], a Recorrente declarou expressamente que apresentou «18 declarações de clientes, e em [apenas] três delas constavam valores que totalizavam os valores referidos nos pontos (i) e (ii), da alínea d) do artigo 5.º» (cfr. art. 26.º do requerimento inicial da providência cautelar apensa ao presente processo e art. 21.º da p.i.).
D) Logo, a Recorrente confessa que incumpriu o disposto nos arts. 11.º e 5.º do PC, mesmo após o Júri do Concurso, em resposta a um pedido de esclarecimento, do Concorrente n.º 1 Borman, ter frisado bem a necessidade das declarações em causa conterem os valores dos serviços prestados.
E) No que respeita aos documentos de habilitação exigidos na al. e) do n.º 1 do art. 11.º do PC [Declarações de Remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social pelo concorrente que concorra, pelo menos, a um dos lotes 9 a 16, relativas ao último ano, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação «DR-SS_xx-yy _[designação_empresa].pdf», onde xx deve indicar o mês e yy o ano a que se referem as declarações], a Recorrente entregou apenas uma declaração, uma vez que, segundo a Recorrente, «a redacção da alínea e), daquele n.º 2, do artigo 11.º induziu a aqui Recorrente na convicção de que seria necessária a entrega de apenas uma declaração, mesmo porque aí era referido que «(...) deverá ser enviada num ficheiro com a designação “DR-SS_xx-yy _[designação_empresa].pdf».
F) Esta argumentação não colhe, porquanto, no apontado preceito, são inúmeras as referências plurais às Declarações de remunerações, relativas ao último ano, pelo que nunca se poderá interpretar a al. e) do n.º 1 do art. 11.º do PC como sendo aí exigida apenas uma declaração das remunerações dos trabalhadores ao serviço dos concorrentes e por estes apresentadas à Segurança Social.
G) Aliás, a norma em causa é perfeitamente clara quando refere o seguinte: «deverá ser enviada num ficheiro com a designação “DR-SS_xx-yy _[designação_empresa].pdf, onde xx deve indicar o mês e yy o ano a que se referem as declarações».
H) Assim, não só a entrega por parte da Recorrente de apenas uma declaração de remunerações representa o incumprimento do disposto no art. 11.º, n.º 1, al. e), do PC, como a falta desses documentos de habilitação impediu a Recorrida de aferir e de dar por verificada a exigência constante do art. 5.º, n.º 1, al. e), ponto (ii), segundo a qual os concorrentes seleccionados deveriam ter tido ao seu serviço um «Número médio de trabalhadores efectivos afectos à prestação de serviços de limpeza nos últimos 12 meses [...] igual ou superior a 100 para os lotes 9 a 15».
I) E, ao contrário do alegado pela Recorrente, a «Informação Empresarial Simplificada (IES) referente ao ano de 2007», exigida nos termos da al. b), do n.º 1, do art. 11.º, do PC, não permitia à Recorrida aferir o número médio de pessoas ao serviço da empresa, porquanto o IES de 2007 comprova apenas que a Recorrente teve 290 trabalhadores em funções no ano de 2007, mas não atesta os requisitos exigidos nos arts. 11.º, n.º 1, al. e), e 5.º, n.º 1, al. e), ponto (ii), ambos do PC, ou seja, não demonstra que, durante o ano de 2008, o número médio de trabalhadores efectivos da Recorrente afectos à prestação de serviços de limpeza foi igual ou superior a 100.
J) Porque relevante, refira-se que os demais concorrentes seleccionados apresentaram as declarações de remunerações respeitantes a todos os meses do ano de 2008.
K) Face ao que antecede, é forçoso concluir que a Recorrente não cumpriu duas das três condições exigidas na alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do PC, pelo que a caducidade da adjudicação determinada pela Recorrida, em 05.03.2009, e confirmada em 24.03.2009, é plenamente válida.
L) Assim, não é verdade que a Recorrente «dispunha dos documentos de habilitação que a Recorrida entendia deverem ser entregues», e muito menos é verdade que isso resulte «dos documentos juntos aos autos pela Recorrente, mais concretamente, os documentos n.ºs 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24», conforme se constata, aliás, pela simples leitura dos pontos 3 a 11 da matéria de facto dada como assente.
M) E ainda que, por mera hipótese, a Recorrente possuísse os documentos de habilitação exigidos no Concurso, o certo é que os mesmos não foram entregues à Recorrida no prazo legalmente fixado para o efeito.
N) Ora, o erro na interpretação das disposições do PC relativas, quer aos requisitos de selecção dos concorrentes, quer aos próprios documentos de habilitação, é única e exclusivamente imputável à Recorrente, uma vez que, conforme se disse, e, aliás, se deixou aqui bem patente, as normas em causa são perfeitamente claras e inequívocas.
O) Por conseguinte, no presente caso, nunca poderia ser concedido à Recorrente o prazo adicional previsto no art. 86.º do CCP para suprimento de irregularidades nos documentos de habilitação (não) apresentados - até porque não é fisicamente possível suprir uma falha num documento que não se conhece e, em termos concursais, nem sequer existe!
P) Acresce que a Recorrente nem sequer alegou que a falta de apresentação dos referidos documentos de habilitação se ficou a dever a factos que não lhe podiam ser imputados, o que também impossibilita a concessão do aludido prazo adicional.
Q) Atendendo à imperatividade das normas concursais (cfr. entre outros, o douto Acórdão do TCA Sul, de 25.01.2007, Proc. N.º 2205/09, in www.dgsi.pt), e, sublinhe-se, perante a não invocação de qualquer razão impeditiva por parte da Recorrente, não poderia a Recorrida ter adoptado outra decisão que não fosse a de considerar caducada a adjudicação anteriormente efectuada às propostas da Recorrente, para os Lotes 9 e 10 do Concurso.
R) Em suma: à luz do disposto no art. 86.º do CCP (na sua redacção originária) a caducidade da adjudicação só não será «inexorável» se o adjudicatário invocar desde logo, com a apresentação dos documentos de habilitação ou da sua junção em língua portuguesa ou acompanhados de tradução devidamente legalizada, os factos que justificando essa apresentação tardia, demonstrem que a mesma não lhe foi imputável - valendo aqui a lógica subjacente à do justo impedimento - por forma a habilitar o órgão competente para a decisão de contratar a aferir da imputabilidade ou não do facto invocado e, julgando válidas as razões invocadas, conceder-lhe, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta (ver, neste sentido, o douto Acórdão do TCA SUL, de 05.11.2009, Proc. N.º 05506/09, in www.dgsi.pt).
S) Na verdade, e como ficou provado em Tribunal (cfr. pontos 3 a 11 da matéria de facto dada como provada), a caducidade da adjudicação deve-se, neste caso, a falhas - e não meras irregularidades - na apresentação dos documentos de habilitação (não foram entregues todos os documentos exigidos nas peças do procedimento) por parte da Recorrente, falhas essas que, comprovadamente, só a esta podem ser imputadas.
T) Com efeito, na p.i. apresentada junto do Tribunal a quo, a Recorrente confessa várias vezes que não entregou todos os documentos de habilitação, nos termos em que estes eram exigidos no programa do procedimento, por errada interpretação das regras do Concurso, sem que, contudo, tivesse feito, em momento algum, qualquer pedido de esclarecimento ao Júri do Concurso sobre as normas em causa.
U) Aliás, a Recorrente continua a confessar que a «não entrega dos documentos, nos termos solicitados pela Recorrida» deve-se ao «simples facto da Recorrente não ter interpretado correctamente quais os documentos a entregar, e ter-se convencido que estaria a entregar os correctos (...)» - cfr. quarto parágrafo da pág. 11 das suas Alegações de recurso.
V) Perante o exposto, carece de qualquer fundamento a alegada violação dos princípios gerais que regulam a actividade administrativa, nomeadamente os aplicáveis, em especial, à actividade de contratação pública, sendo, por isso, os actos impugnados perfeitamente legais.
W) Aliás, como se refere na douta sentença recorrida (cfr. pág. 35), «os princípios invocados (...) não pode[m] significar a violação das regras legais estabelecidas, nomeadamente o disposto no CCP, nomeadamente aquele artigo 86.º, n.º 1, que a ré violaria caso concedesse qualquer prazo adicional e/ou pedisse esclarecimentos à autora sobre aquelas suas omissões.
(...) In casu prevalece o princípio da legalidade, aliado ao princípio da transparência, da imparcialidade e até o da igualdade, pois a legalidade em causa assegura precisamente a prevalência destes princípios sobre a aparente desproporcionalidade que aquela legalidade foral impôs.
(...) é no cumprimento da lei ou segundo as regras pré-estabelecidas que a justiça se concretiza».
X) Atendendo a que os actos impugnados não padecem dos vícios que lhes são assacados, não pode deixar de improceder o pedido formulado pela Recorrente, como bem decidiu o Mmo. Juiz a quo …”.
O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer/pronúncia no sentido da improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 373/374 V.), o qual submetido a contraditório não mereceu tempestivamente qualquer resposta (cfr. fls. 375 e segs.).
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que, se pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) (na redacção introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08 - cfr. arts. 11.º e 12.º daquele DL -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC) “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
As questões suscitadas e de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão judicial recorrida ao julgar improcedente a pretensão deduzida pela A., nos termos e pelos fundamentos dela constantes, incorreu em erro de julgamento de facto e de direito por desrespeito ao disposto conjugadamente nos arts. 81.º, n.º 1, al. b), 55.º, als. b) e i) e 86.º todos do CCP e ainda aos princípios da concorrência, transparência, proporcionalidade, justiça e imparcialidade, boa fé e prossecução do interesse público consagrados no CCP e no CPA [cfr. alegações e conclusões supra reproduzidas].

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade:
I) Por aviso publicado no DR n.º 200, II.ª série, de 15.10.2008, a requerida “Agência Nacional de Compras Públicas, EPE”, através do anúncio de procedimento n.º 187/2008, abriu «Concurso público para selecção e fornecedores de produtos de higiene e de prestadores de serviços de limpeza», tendo por objecto “a celebração de um acordo quadro para a selecção de fornecedores de produtos de higiene e de prestadores e serviços de limpeza (incluindo o fornecimento de produtos de higiene) em todo o território nacional, Portugal Continental e Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira”;
II) Foram opositores ao mencionado concurso a A., “F…, LDA.” e as seguintes contra-interessadas: “C…, LDA.”, com sede na Rua…, em Lisboa; “C…, SA”, com sede na Quinta…, em Castanheira do Ribatejo; “F…, LDA.”, com sede na Rua…, em Lisboa; “E…, SA”, com sede na Rua …, em Lisboa; “I…, SA”, com sede na Av.ª…, em Lisboa; “E…, LDA.”, com sede na Rua…, em Lisboa; e “O…, LDA.”, com sede na Rua…, em Lisboa.
III) Consta do artigo 05.º do Programa do Concurso, sob a rubrica de “Concorrentes”, além do mais o seguinte:
«1. Serão admitidos os concorrentes que cumpram, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) (…);
b) (…);
c) (…);
d) (…);
e) Para os lotes 9 a 16, 2 (duas) das 3 (três) seguintes condições:
i) Mínimo de 4 (quatro) experiências em prestações de serviços anteriores semelhantes ao objecto do presente concurso, com um valor unitário mínimo de 50.000 € (cinquenta mil euros) para o Lote 16 e de 20.000 € (vinte mil euros) para os lotes 9 a 15, desde 1 de Janeiro de 2007 até à data da apresentação das propostas;
ii) Número médio de trabalhadores efectivos afectos à prestação de serviços de limpeza nos últimos 12 meses igual ou superior a 400 para o lote 16 e igual ou superior a 100 para os lotes 9 a 15;
iii) Certificação de qualidade segundo as normas NP EN ISO 9001:2000 ou ISO 14001 para processos relacionados com o objecto do concurso …”.
IV) Consta do artigo 11.º do Programa do Concurso, sob a rubrica “Documentos de habilitação”, o seguinte:
«1. Cada concorrente seleccionado deve entregar no prazo de 10 (dez) dias a contar da notificação da decisão de selecção os seguintes documentos:
a) Declaração referida na alínea a), conforme Anexo VI disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt/dl18, e os documentos referidos na alínea b), ambas do n.º 1 do artigo 81.º do Código dos Contratos Públicos;
b) Informação Empresarial Simplificada (IES) referente aos anos de 2006 e 2007, entregue para efeitos fiscais e comprovativo da entrega da referida declaração, que deverão ser enviados em ficheiro com a designação ‘IES_[designação_empresa]_[ano].pdf’;
c) Declaração do concorrente na qual indique, em relação aos dois últimos anos, os valores das rubricas das peças contabilísticas fundamentais, relativas aos produtos ou serviços objecto do presente concurso, utilizando o formulário do Anexo II a este programa de concurso, disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt/dl18, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘Anexo _II_[designação_empresa].xls’;
d) Declarações de clientes, em número mínimo de 4 (quatro), relativas a fornecimentos de produtos de higiene ou a prestação de serviços de limpeza, consoante o(s) lote(s) a que concorram que tenham totalizado, desde 1 de Janeiro de 2007 até à data da apresentação da proposta, os valores referidos nos pontos (i) e (ii), da alínea d) do artigo 5.º deste programa de concurso, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘Declarações_Clientes_[designação_empresa]i.pdf’;
e) Declarações de Remunerações de trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social pelo concorrente que concorra, pelo menos, a um dos lotes 9 a 16, relativos ao último ano, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘DR-SS_xx_yy_[designação_empresa].pdf’, onde xx deve indicar o mês e yy o ano a que se referem as declarações;
f) Documento comprovativo da certificação de qualidade do concorrente para fornecimento de produtos de higiene ou prestação de serviços de limpeza, conforme o caso, em conformidade com as normas ISO 9001 e, se for o caso, ISO 14001 ou equivalente, que deverão ser enviadas em ficheiros com a designação ‘ISO_19001_[designação_empresa].Pdf’ e ‘ISO_14001_[designação_empresa].pdf’, respectivamente;
2. Para efectuar a entrega dos documentos identificados no número anterior o concorrente deve colocar os mesmos na área procedimentos respondidos - documentos de habilitação, disponível no portal https://concursos.ancp.gov.pt/dl18».
V) No relatório preliminar de análise e ordenação das propostas do qual a A. foi notificada em 06.01.2009, a mesma foi seleccionada para os lotes 9 e 10, respectivamente em 10.º e 9.º lugar e, nessa data, notificada também para efeitos de audiência prévia e, ainda, para apresentar os documentos de habilitação ao concurso, no prazo de 10 dias, nos termos exigidos pelo artigo 81.º do CCP e artigo 11.º do Programa do Concurso;
VI) E de entre outros documentos, com a notificação mencionada em V) no respeitante aos documentos a entregar no prazo de 10 dias, exigiu-lhe a R. a entrega de documentos e nos termos seguintes, aliás, notificação esta dirigida à totalidade dos concorrentes seleccionados:
- Declarações de clientes, em número mínimo de 4 (quatro) relativas a fornecimentos de produtos de higiene ou a prestação de serviços de limpeza, consoante o(s) lote(s) a que concorram, que tenham totalizado, desde 01.01.2007 até à data de apresentação da proposta, os valores referidos nos pontos (1) e (ii), da alínea d) do artigo 5.º deste Programa de Concurso, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘Declarações_Clientes_[designação_empresa]i.pdf’, e
- Declarações de Remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social pelo concorrente que concorra, pelo menos, a um dos lotes 9 a 16, relativas ao último ano, que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘DR-SS_xx_yy_[designação_empresa].pdf’.
VII) Tendo a A. entregue à R. vários documentos de habilitação em 11.02.2009, prazo este correspondente ao terminus do prazo concedido pela requerida a todos os concorrentes após esta ter prorrogado o mesmo;
VIII) Porém, de entre os documentos mencionados em VII) a A. entregou, naquele prazo, «18 declarações de clientes e em apenas três (3) delas constam valores que totalizam os valores referidos no pontos (i) da alínea e) do artigo 5.º do programa do concurso», ou seja, as declarações relativas a experiências em prestações de serviços anteriores semelhantes ao objecto do concurso, com um valor unitário mínimo de 20.000 € dado ter a mesma sido seleccionada para os lotes 9 e 10;
IX) Também de entre os documentos mencionados em VII) a A. entregou, naquele prazo, uma declaração relativa ao mês 07/2008, para cumprimento do disposto no ponto (ii) da alínea e) do artigo 5.º do Programa do Concurso e da alínea e) do n.º 1, do artigo 11.º, do mesmo Programa do Concurso, ou seja, relativas às declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social respeitantes ao último ano;
X) Com fundamento no facto de a A. ter apresentado apenas os documentos e/ou as declarações mencionadas em VIII) e IX), a R. deliberou, em 05.03.2009, que caducou a adjudicação feita à A. relativamente ao objecto do concurso em causa e relativamente aos lotes 9 e 10 a que a mesma concorreu e para os quais a havia seleccionado, deliberação esta de que a A. foi notificada em 06.03.2009;
XI) E fundamentou ainda a R. tal deliberação pelo facto de a A., nos termos do disposto no artigo 86.º, n.º 1, do CCP, não ter apresentado as declarações de remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social relativas ao último ano (pois apresentou apenas a declaração relativa ao mês 07/2008) e as declarações de clientes com indicação dos valores e, assim, a falta destes documentos (ou a sua não apresentação nos termos solicitados no «PC», o que equivale à sua não apresentação) impediu, ainda, a comprovação de duas das três condições técnicas constantes da alínea e), do n.º 1, do artigo 05.º do PC;
XII) Todavia, a A. apresentou à R., em 10.03.2009, uma exposição/reclamação com o seguinte teor:
«a) Que em relação ao solicitado na alínea e) do artigo 11.º do PC, foi enviada uma única declaração da Segurança Social por interpretação à letra da alínea “que deverá ser enviada num ficheiro com a designação ‘DR-SS_xx_yy_[designação_empresa].pdf’;
b) Em relação às Declarações de Clientes enviadas, na alínea d) do supra citado artigo não é exigido a indicação de valores.
Assim sendo, ficam devidamente provados duas das condições técnicas constantes da alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do PC, a indicar:
1 - alínea e) i) provada pela página do IES de 2007 (prestação de serviço (p));
2 - alínea e) iii) provada pelo anexo enviado a 11.02.2009 (ISSO_9001_F….pdf) …»;
XIII) Com a exposição/reclamação mencionada em XII) pretendeu a A. esclarecer a R. que apresentou os referidos documentos tal como havia entendido que os mesmos deveriam ser apresentados;
XIV) A A. havia juntado ao procedimento o IES do ano de 2007 e o anexo ‘ISO_9001_F….pdf’;
XV) Porém, a R., em apreciação daquela exposição/reclamação, deliberou, em 24.03.2009, manter a deliberação tomada em 05.03.2009, ou seja, considerando caducada a adjudicação dos lotes 9 e 10 feita à A.;
XVI) Todavia, apesar daquela deliberação mencionada em XV) a A. solicitou à R., em 30.03.2009, a concessão de um prazo adicional para apresentar os documentos em causa e que a mesma considerou em falta;
XVII) Por deliberação de 08.04.2009, o Conselho de Administração da R. decidiu nada haver a apreciar ou deliberar relativamente à solicitação da A. mencionada em XVI) por tal solicitação/impugnação mais não ser que a sua manifestação de discordância quanto aos fundamentos e ao sentido da decisão já tomada na deliberação de 05.03.2009 e mencionada em X);
XVIII) A A. juntou à sua proposta com que se apresentou ao concurso o anexo I, nos termos do artigo 57.º, do CCP e no qual consta que a A. se obriga a “… a apresentar a declaração que constitui o anexo II do referido Código, bem como os documentos comprovativos de que se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e i) do n.º 4 desta declaração”;
XIX) Em tal anexo I mais declarou a autora que “… tem pleno conhecimento de que a não apresentação dos documentos solicitados nos termos do número anterior, por motivo que lhe seja imputável, determina a caducidade da adjudicação que eventualmente recaia sobre a proposta apresentada e constitui contra-ordenação muito grave, nos termos do artigo 456.º do Código dos Contratos Públicos, a qual pode determinar a aplicação da sanção acessória de privação do direito de participar, como candidato, como concorrente ou como membro de agrupamento candidato ou concorrente, em qualquer procedimento adoptado para a formação de contratos públicos, sem prejuízo da participação à entidade competente para efeitos criminal …”;
XX) Em 12.03.2009, a R. publicou o seguinte esclarecimento: «A Agência Nacional de Compras Públicas, EPE (ANCP), preocupada com a elevada percentagem de concorrentes que não está a interpretar de forma correcta as suas obrigações no que respeita à apresentação dos documentos de habilitação no âmbito dos concursos públicos por si lançados, publicita informação sobre a matéria, esperando que a mesma possa contribuir para a redução deste tipo de deficiências em futuros procedimentos»;
XXI) E na mesma data, publicitou ainda a R.: «A Agência Nacional de Compras Públicas, EPE (ANCP), no âmbito dos procedimentos de formação de acordos quadro, tem vindo a constatar que uma elevada percentagem de concorrentes cujas propostas foram seleccionadas não está a interpretar de forma correcta as suas obrigações no que respeita à apresentação dos documentos de habilitação».
XXII) E ainda, publicitou a R. na mesma data: «Esta matéria é tanto mais sensível e merecedora de uma especial cautela por parte dos concorrentes seleccionados, posto que a falta de apresentação de qualquer dos documentos de habilitação solicitados no programa de concurso acarreta, necessariamente, a imediata caducidade da selecção, uma vez que, por falta de cobertura legal, não pode a ANCP conceder qualquer prazo adicional para a entrega de documentos em falta ou para ser completado qualquer dado omisso”;
XXIII) Entretanto, em 25.02.2009, a R. publicou um outro aviso relativo à comprovação pelos concorrentes de não se encontrarem nas situações previstas nas alíneas b) e i) do artigo 55.º, do CCP, no sentido de ser obrigatoriamente feita mediante: a) Apresentação de certidões do registo comercial de todos os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência, que se encontrem em efectividade de funções; b) Apresentação de certidão do registo comercial do adjudicatário, com todas as inscrições em vigor, ou disponibilização do código de acesso para a sua consulta «on line», nos termos previstos no n.º 2 do artigo 83.º do CCP, no n.º 5 do artigo 75.º do Código do Registo Comercial e no artigo 17.º da Portaria n.º 1416-A/2005, de 19.12, para comprovação da identidade dos titulares dos referidos órgãos e do pleno cumprimento da obrigação da alínea anterior;
XXIV) Mais esclareceu/informou a R., neste último aviso publicado, que os concorrentes deveriam apresentar a certidão do registo comercial ou a disponibilização do código de acesso, fixando-lhes o prazo até às 17 horas do dia 03.03.2009, sob pena de caducidade da adjudicação, nos termos do disposto no artigo 86.º, do CCP, que essa apresentação deveria ser feita através do canal “solicitar esclarecimentos” com o assunto: “Certidão do Registo Comercial”;
XXV) A presente acção entrou em juízo no dia 06.04.2009.
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3.2. DE DIREITO
Considerada a factualidade antecedente importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso jurisdicional “sub judice”.
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3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA
O TAF de Viseu em apreciação da pretensão anulatória deduzida pela A., aqui recorrente, concluiu, por um lado, pela procedência da excepção de inimpugnabilidade quanto à deliberação do ente público aqui recorrido tomada em 24.03.2009 e por outro lado, prosseguindo a acção quanto à aferição da legalidade da deliberação do mesmo ente tomada em 05.03.2009, pela inverificação das ilegalidades à mesma assacadas, pelo que improcedeu a acção.
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3.2.2. DA TESE DA RECORRENTE
Não pondo em causa o juízo feito quanto ao julgamento da matéria de excepção que assim se mostra transitado em julgado argumenta a A. que tal decisão judicial fez errado julgamento já que o acto deliberativo impugnado padece das ilegalidades que lhe foram imputadas nos autos pelo que assim não haver concluído o TAF de Viseu incorreu em violação do disposto conjugadamente nos arts. 81.º, n.º 1, al. b), 55.º, als. b) e i) e 86.º todos do CCP e ainda dos princípios da concorrência, transparência, proporcionalidade, justiça e imparcialidade, boa fé e prossecução do interesse público consagrados no CCP e no CPA.
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3.2.3. DO MÉRITO DO RECURSO
3.2.3.1. DO ERRO NO JULGAMENTO DE FACTO
Invoca a recorrente que a decisão judicial recorrida incorreu em erro no julgamento de facto porquanto não deu como provado que a A. dispunha dos documentos de habilitação que a R. entendia deverem ser entregues, prova essa que estaria demonstrada pela análise dos documentos n.ºs 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 juntos aos autos, termos em que a factualidade apurada deveria ser alterada de molde a considerar como assente que a mesma dispunha dos documentos que a R. pretendia nos termos da alínea e) do art. 11.º do PC e ainda dos que se destinavam a comprovar duas das condições previstas na alínea e) do n.º 1 do art. 05.º do PC.
Vejamos.
Diga-se, de logo, que este fundamento improcede já que para a economia dos autos e do interesse/relevância para a decisão a proferir nos mesmos tal realidade factual mostra-se inócua e irrelevante.
Na verdade, a questão/fundamento que alegadamente esteve na origem da prolação do acto impugnado prende-se não com o facto de se saber se a A. possuía ou não os documentos em crise mas ao invés se os havia junto ou não ao procedimento concursal em presença em conformidade com as regras e exigências nele definidos e no prazo ali fixado.
O que importa considerar e relevar nesta sede é se a A. juntou ou não ao procedimento a documentação em questão em conformidade com o «PC». Por outras palavras, à luz do que se mostra decidido no procedimento e resulta do quadro normativo a atender apenas cumpre saber se os documentos foram ou não juntos àquele e não se a A. os detém pese embora os não haja junto.
Daí que o saber e determinar se a A. possuía aquela documentação e o incluir na factualidade apurada tal realidade tem-se como irrelevante por destituído de qualquer interesse, termos em que, sem necessidade de outros desenvolvimentos, se desatende o fundamento de impugnação em análise.
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3.2.3.2. DO ERRO NO JULGAMENTO DE DIREITO
3.2.3.2.1. DA VIOLAÇÃO ARTS. 81.º, N.º 1, AL. B), 55.º, ALS. B) e I) e 86.º CCP
Deriva das alegações da recorrente que a decisão judicial objecto de impugnação efectuou incorrecta interpretação e aplicação do quadro normativo em epígrafe já que “a não entrega dos documentos” nos termos solicitados pela R. “pelo simples facto da Recorrente não ter interpretado correctamente quais os documentos a entregar, e ter-se convencido que estaria a entregar os correctos”, o que terá motivado que não “tivesse pedido qualquer esclarecimento”, deveria ter merecido por parte daquela a prolação de decisão a convidá-la a juntar os documentos em falta e não a emissão de acto com o conteúdo do impugnado.
Analisemos.
I. Resulta do art. 55.º do CCP (na redacção que à data dos factos vigorava) que não “… podem ser candidatos, concorrentes ou integrar qualquer agrupamento, as entidades que: … b) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por qualquer crime que afecte a sua honorabilidade profissional, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados por aqueles crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções; … i) Tenham sido condenadas por sentença transitada em julgado por algum dos seguintes crimes, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação, no caso de se tratar de pessoas singulares, ou, no caso de se tratar de pessoas colectivas, tenham sido condenados pelos mesmos crimes os titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência das mesmas e estes se encontrem em efectividade de funções, se entretanto não tiver ocorrido a sua reabilitação: i) Participação em actividades de uma organização criminosa, tal como definida no n.º 1 do artigo 2.º da Acção Comum n.º 98/773/JAI, do Conselho; ii) Corrupção, na acepção do artigo 3.º do Acto do Conselho, de 26 de Maio de 1997, e do n.º 1 do artigo 3.º da Acção Comum n.º 98/742/JAI, do Conselho; iii) Fraude, na acepção do artigo 1.º da Convenção relativa à Protecção dos Interesses Financeiros das Comunidades Europeias; iv) Branqueamento de capitais, na acepção do artigo 1.º da Directiva n.º 91/308/CEE, do Conselho, de 10 de Junho, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais …”.
Do n.º 1 do art. 81.º do mesmo código deriva, na parte que releva, que nos “… procedimentos de formação de quaisquer contratos, o adjudicatário deve apresentar os seguintes documentos de habilitação: … b) Documentos comprovativos de que não se encontra nas situações previstas nas alíneas b), d), e) e i) do artigo 55.º …”, sendo que nos termos do enunciado no art. 83.º o “… adjudicatário deve apresentar reprodução dos documentos de habilitação referidos no artigo 81.º através de correio electrónico ou de outro meio de transmissão escrita e electrónica de dados …” (n.º 1) na certeza de que quando “… os documentos a que se referem a alínea b) do n.º 1 e os n.ºs 2 a 4 do artigo 81.º se encontrem disponíveis na Internet, o adjudicatário pode, em substituição da apresentação da sua reprodução, indicar à entidade adjudicante o endereço do sítio onde aqueles podem ser consultados, bem como a informação necessária a essa consulta, desde que os referidos sítio e documentos dele constantes estejam redigidos em língua portuguesa …” (n.º 2) e que quando “… o adjudicatário tenha prestado consentimento, nos termos da lei, para que a entidade adjudicante consulte a informação relativa a qualquer dos documentos referidos na alínea b) do n.º 1 ou nos n.ºs 2 a 4 do artigo 81.º, é dispensada a sua apresentação nos termos do n.º 1 ou a indicação prevista no número anterior …” (n.º 3).
Por fim, decorre do art. 86.º (também na redacção vigente à data dos factos em apreciação) que a “… adjudicação caduca se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não apresentar os documentos de habilitação: a) No prazo fixado no programa do procedimento; b) No prazo fixado pelo órgão competente para a decisão de contratar, no caso previsto no n.º 8 do artigo 81.º; c) Redigidos em língua portuguesa ou, no caso previsto no n.º 2 artigo 82.º, acompanhados de tradução devidamente legalizada …” (n.º 1) e que quando “… as situações previstas no número anterior se verifiquem por facto que não seja imputável ao adjudicatário, o órgão competente para a decisão de contratar deve conceder-lhe, em função das razões invocadas, um prazo adicional para a apresentação dos documentos em falta, sob pena de caducidade da adjudicação …” (n.º 2), sendo que nos “… casos previstos nos números anteriores, o órgão competente para a decisão de contratar deve adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente …” (n.º 3).
II. Visto e presente este quadro normativo do mesmo ressuma, por um lado, a obrigatoriedade por parte do adjudicatário da apresentação dos documentos de habilitação nos prazos fixados contratualmente ou em decisão da entidade adjudicante na certeza de que para comprovar a não verificação das situações descritas nas als. b) e i) do art. 55.º do CCP o adjudicatário deve apresentar certificado do registo criminal dos titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência da pessoa colectiva em causa (cfr. no actual quadro o art. 83.º-A do CCP introduzido pelo art. 02.º do DL n.º 278/09 em claro esclarecimento do anterior regime normativo).
E, por outro, a não apresentação dos documentos de habilitação no prazo ou no modo para o efeito fixado importa, em termos de consequência, a caducidade da adjudicação, sendo que apenas se admite a possibilidade de ser concedido um prazo adicional para a apresentação de documentos de habilitação em falta no caso dessa falta resultar de facto que não seja imputável ao adjudicatário.
Ora incumbe ou cabe à entidade adjudicante emitir o juízo sobre se o facto impeditivo da apresentação atempada dos documentos é ou não imputável ao adjudicatário e, como tal, relevante, sendo que neste âmbito se admite como possível a invocação do justo impedimento enquanto contendo um princípio geral de direito com plena valia e aplicação neste domínio.
III. Munidos dos considerandos antecedentes e revertendo ao caso em presença não se descortina, desde logo, em que medida a decisão judicial recorrida se mostra proferida em infracção do art. 55.º. als. b) e i) do CCP já que nem tais normativos foram na mesma objecto de qualquer referência ou aplicação nem, por outro lado, o acto impugnado e seus pressupostos fácticos e de direito no mesmo se estriba. Com efeito, atente-se que o fundamento para o operar da caducidade da adjudicação por falta de junção de documentos por parte da A., aqui recorrente, não diz respeito a omissão de apresentação de qualquer tipo de documento que se prenda com os exigidos pelas e nas als. b) e i) do citado artigo, nem a situação em questão com a mesma possa ser equiparada quer no plano dos factos quer no do direito.
Assim, não se vislumbra qualquer erro na e de aplicação deste normativo, na sua concatenação com o previsto na al. b) do n.º 1 do art. 81.º do CCP, preceito que de igual modo assim não se tem no caso como infringido por referência àquelas alíneas.
IV. Mas de igual modo não afigura como procedente o pretenso erro de interpretação e de aplicação dos arts. 86.º e 81.º, n.º 1, al. b) ambos do CCP já que manifestamente não assiste razão à A. na tese por si propugnada a qual, diga-se, não encontra no concreto quadro factual e jurídico sustentação suficiente.
É que a A. efectivamente não juntou ao procedimento concursal em presença a totalidade da documentação exigida e imposta em termos de habilitação pelos arts. 05.º e 11.º do «PC», o que a fez posicionar sob a alçada da previsão dos arts. 81.º e 86.º do CCP e assim incorrer na consequência ali prevista, ou seja, a da caducidade da adjudicação.
Na verdade, no âmbito do procedimento e em desrespeito das regras concursais temos que a A., aqui recorrente, apesar e não obstante haver sido notificada para juntar a documentação em falta [cfr. n.º VI) da factualidade apurada] acabou por juntar apenas parte dessa mesma documentação [cfr. n.ºs VII), VIII) e IX) da factualidade apurada], já que ficaram a faltar-lhe parte das declarações exigidas pelo «PC» relativas a experiências em prestações de serviços anteriores semelhantes ao objecto do concurso com um valor unitário mínimo de 20.000,00€ e, bem assim, as declarações relativas às remunerações dos trabalhadores ao seu serviço efectuadas à Segurança Social respeitantes ao último ano [apenas foi junta a referente ao mês Julho/2008] [cfr. n.ºs X) e XI) da mesma factualidade].
Daí que do facto de a A. deter a documentação que estaria em falta e de o ter alegadamente comprovado através da junção daquela documentação a este processo judicial e não ao procedimento concursal em questão não deriva ou se pode minimamente inferir que tenha ocorrido a ilegalidade assacada ao acto administrativo impugnado e muito menos que a decisão judicial recorrida que julgou improcedente tal fundamento haja sido lavrada com erro de julgamento, mormente, do quadro legal inserto nos arts. 81.º, n.º 1, al. b) e 86.º do CCP.
No nosso entendimento destes normativos e da sua conjugação com o demais quadro normativo vigente em matéria de procedimentos de formação de contratos não deriva qualquer imposição à entidade adjudicante do dever de notificação ou de prolação dum novo convite ao adjudicatário, além daquele que já havia feito [cfr. n.º VI) dos factos provados], quanto à junção da documentação em falta para efeitos de habilitação, tese propugnada pela A. e que não encontra naquele ordenamento base legal em que se estribe, na certeza de que no caso concreto a A. não alegou ou justificou minimamente a sua omissão de instrução procedimental de molde a fazer operar pronúncia por parte da entidade adjudicante no quadro do n.º 2 do art. 86.º do CCP, sendo certo que à luz do quadro factual apurado não se vislumbra estarmos em face de situação de défice de instrução que se possa reputar como não sendo imputável ao adjudicatário.
A apresentação de documentação para efeito de habilitação para além do prazo concursal terá de se mostrar legal ou concursalmente prevista ou permitida, mormente, em situações nas quais se mostrem preenchidos os pressupostos enunciados nos arts. 81.º, n.º 8, 83.º, n.º 4 e 86.º, n.º 2 todos do CCP na redacção vigente à data a que se reportam os factos em análise e ainda, actualmente, no art. 132.º, n.º 1, al. g) do CCP [na redacção introduzida pelo DL n.º 278/09].
Permitir a junção de documentação para efeitos de habilitação fora desse quadro de exigência e de previsão normativa poderá redundar na introdução nesta sede de factores de insegurança e incerteza, postergando eventualmente alguns princípios estruturantes da contratação pública.
Atente-se que a possibilidade de existir uma supressão de irregularidades detectadas nos documentos apresentados que possam levar à caducidade da adjudicação nos termos do art. 86.º do CCP pressupõe, desde logo, que se trate duma situação de mera irregularidade e quanto a documentação que foi junta ao procedimento [cfr. art. 132.º, n.º 1, al. g) do CCP na sua actual redacção] e nunca de permissão de suprimento quanto a uma total ou parcial omissão de instrução com junção de documentação para efeitos de habilitação quando estejamos perante omissão imputável ao adjudicatário tal como ocorre no caso vertente em que o mesmo foi notificado para juntar os documentos em falta, as regras concursais que determinavam e impunham tal comportamento eram e são claras, na certeza de que para o operar da consequência da caducidade da adjudicação por falta de instrução documental não se mostra necessário que tal constasse expressamente do «PC» e/ou de cominação a apor na notificação produzida pela entidade adjudicante visto a mesma já decorrer da lei (cfr. art. 06.º do CC) e para isso também nada relevam os anúncios e avisos produzidos pelo R. referidos sob os n.ºs XX) a XXIV).
Ao invés do sustentado pela A. também não se pode aceitar como integrando a previsão do n.º 2 do art. 86.º do CCP (quer na sua redacção original como na actualmente vigente) a situação de não entrega dos documentos nos termos solicitados pela entidade adjudicante motivada pelo simples facto do adjudicatário não ter interpretado correctamente quais os documentos a entregar e alegadamente ter-se convencido que estaria a entregar os documentos certos já que daí não se pode minimamente inferir ou sequer concluir que a omissão ilegal e indevida não lhe seja imputável.
Refira-se, ainda, que na situação em presença nos autos “sub judice” nem foi invocada qualquer ilegalidade consubstanciada na preterição de direito audiência prévia nem tal ilegalidade constituiu objecto de pronúncia na decisão judicial recorrida pelo que nesse segmento se mostra como insubsistente a alusão à situação factual e jurisprudência firmada no acórdão do TCA Sul de 04.02.2010 [Proc. n.º 05832/10] [conclusões 10.ª e 11.ª das alegações].
Improcede, pois, “in totum” este fundamento impugnatório, não enfermando a decisão judicial recorrida no segmento sindicado e quanto ao concreto fundamento de ilegalidade nela conhecido de erro no julgamento de direito.
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3.2.3.2.2. DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONCORRÊNCIA, TRANSPARÊNCIA, PROPORCIONALIDADE, JUSTIÇA, IMPARCIALIDADE, BOA FÉ E PROSSECUÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO
I. Deriva desde logo do n.º 4 do art. 01.º do CCP que à “… contratação pública são especialmente aplicáveis os princípios da transparência, da igualdade e da concorrência …”.
Nas palavras de Marcelo Rebelo de Sousa e de André Salgado Matos este princípio da concorrência reclama que se mostre assegurado ou garantido “… o mais amplo acesso aos procedimentos por parte dos interessados em contratar, e que, em cada procedimento, seja consultado o maior número possível de interessados, no respeito pelo número mínimo que a lei imponha …”, sendo que o mesmo “… visa, quer a salvaguarda do normal funcionamento do mercado e a protecção subjectiva dos concorrentes [… arts. 81.º, f), e 99.º, a), c) CRP], quer a melhor prossecução do interesse público que preside à celebração do contrato, na medida em que a concorrência permite em regra que aquela se faça nas melhores condições financeiras para a administração …” (in: “Contratos Públicos - Direito Administrativo Geral”, Tomo III, pág. 75).
Também Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira sustentam a este propósito que é “… na concorrência (no apelo e defesa do mercado, ínsitos nestes procedimentos), que assenta, na verdade, o valor nuclear dos procedimentos (mais ou menos) concursais: é a ela que estes se dirigem e é no aproveitamento das respectivas potencialidades que se baseia o seu lançamento.
Com a existência de um procedimento dirigido à concorrência assegura-se, na medida do possível, que, na satisfação de interesses administrativos que lhes estão cometidos (e que implicam dispêndio de dinheiros públicos ou cedência de bens ou utilidades administrativos), os entes públicos o façam da forma publicamente mais vantajosa possível.
E, quanto mais pessoas se apresentarem perante a Administração, como eventuais futuros contratantes, quanto mais pessoas quiserem negociar com ela, no mercado administrativo, melhor: maior será o leque de ofertas contratuais - e o leque de escolha da Administração - e mais procurarão os concorrentes optimizar as suas propostas.
É esta uma das razões por que os procedimentos concursais foram legalmente erigidos no principal modus negociandi do mercado administrativo.
Chamar a concorrência, lançar um concurso, pressupõe, portanto, considerar os concorrentes como opositores uns dos outros, permitindo-se-lhes que efectivamente compitam e concorram entre si, que sejam medidos (eles ou as suas propostas) sempre e apenas pelo seu mérito relativo, em confronto com um padrão ou padrões iniciais imutáveis …” (in: “Concursos e outros Procedimentos de Adjudicação Administrativa. Das Fontes às Garantias”, 2005, págs. 100 e 101; vide ainda, no mesmo sentido, Rodrigo Esteves de Oliveira em: “Os princípios gerais da contratação pública” in: «Estudos da Contratação Pública - I», pág. 67).
Importa, todavia, ter presente que, como sustenta Cláudia Viana, a “… concorrência é em sede de contratação pública, um resultado, que se obtém através da concretização dos princípios da igualdade e das liberdades comunitárias, enquanto regras que vinculam os Estados-membros na sua relação com os particulares. Esta tem sido, …, a posição adoptada pelo Tribunal de Justiça, que tem feito assentar o regime da contratação pública na igualdade e nas liberdades de circulação, e não na concorrência, enquanto conjunto de regras dirigidas fundamentalmente às empresas …” (in: “Os princípios comunitários na Contratação Pública”, pág. 172).
II. Na sequência do quadro legal atrás explicitado sob o ponto antecedente temos, ainda, que vigora no direito concursal especiais exigências em matéria de transparência e do respectivo princípio, sendo que a transparência não se realiza apenas através do princípio da publicidade com a divulgação de tudo quanto possa contender ou relevar para os concorrentes se candidatarem e/ou formularem as respectivas propostas, mas igualmente mediante a concessão de efectivas garantias de publicidade de tudo e de todos os actos/condutas desenvolvidos ao longo de todo o procedimento e em todas as suas várias e múltiplas fases.
III. Quanto ao princípio da proporcionalidade importa reter que o mesmo se aplica a todas as espécies de actos emanados dos poderes públicos, sendo, inclusive, erigido como princípio com dignidade constitucional e com consagração ao nível do direito internacional e supranacional [v.g. cfr., arts. 05.º TUE e Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade anexo, 69.º, 296.º TFUE todos na versão decorrente do Tratado de Lisboa, sendo que o controlo da razoabilidade, da razoabilidade-adequação, proporcionalidade-necessidade é, hoje, uma imposição que recai sobre o julgador, sendo várias as decisões do «TJ» que disso fazem eco e apelo nas suas decisões - vide, entre outros, Acs. TJUE de 03.09.2009 (Procs. C-322/07, C-327/07 e C-338/07), de 02.03.2010 (Proc. C-135/08) in: «www.curia.europa.eu/jurisp/»].
Atente-se que o princípio da proporcionalidade, enquanto princípio geral de limitação do poder público, pode ancorar-se no princípio geral do Estado de Direito, impondo limites resultantes da avaliação da relação entre os fins e as medidas públicas, devendo o Estado-legislador e o Estado-administrador adequar a sua projectada acção aos fins pretendidos, e não configurar as medidas que tomam como desnecessária ou excessivamente restritivas.
Este princípio considerado em sentido lato pode, além disso, desdobrar-se analiticamente em três exigências da relação entre as medidas e os fins prosseguidos. Assim, importa considerar, enquanto sub princípios do mesmo constitutivos, a adequação das medidas aos fins (princípio da conformidade ou adequação de meios), a necessidade ou exigibilidade das medidas (princípio da exigibilidade ou da necessidade) e a proporcionalidade em sentido estrito ou «justa medida» (princípio da proporcionalidade em sentido estrito).
Socorrendo-nos da doutrina e entendimento sustentado por J.J. Gomes Canotilho temos que o princípio da adequação “… impõe que a medida adoptada para a realização do interesse público deve ser apropriada à prossecução do fim ou fins a ele subjacentes …”, sendo que a “… exigência de conformidade pressupõe a investigação e prova de que o acto do poder público é apto para e conforme os fins justificativos da sua adopção (…). Trata-se, pois, de controlar a relação de adequação medida-fim ...”, ao passo que no princípio da exigibilidade, também conhecido como o da “menor ingerência possível” “… coloca a tónica na ideia de que o cidadão tem direito à menor desvantagem possível …” reclamando-se “… sempre a prova de que, para a obtenção de determinados fins, não era possível adoptar outro meio menos oneroso para o cidadão …” e aferindo-se a exigibilidade em termos materiais, espaciais, temporais e pessoais. E quanto ao princípio da proporcionalidade em sentido restrito o mesmo configura-se pela aferição ou medida sobre se o “… meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim …” (in: “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, 7.ª edição, págs. 269/270).
Pronunciando-se sobre a concretização deste princípio refere Rodrigo Esteves de Oliveira que o mesmo tem o “… seu campo privilegiado de actuação … no seio das relações jurídicas materiais, mas ele não deixa de ter importantes projecções e consequências nas relações procedimentais da contratação pública.
O que se exige então à entidade adjudicante (e ao júri) é que, considerando a função e objectivos do procedimento em causa, não adopte medidas restritivas da concorrência sem justificação suficiente e adequada para o efeito, exigência que vale desde logo na definição do universo concorrencial que seja admitido participar no procedimento. Assim, a entidade adjudicante não deve, por exemplo, estabelecer requisitos de acesso tais … que resultem numa limitação desproporcionada do mercado habilitado a participar nesse procedimento …” (em loc. e ob. cit., pág. 104) (sublinhados nossos).
Referindo-se a este princípio Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado Matos sustentam que o mesmo “… releva para os procedimentos pré-contratuais nas suas três dimensões de adequação, necessidade e razoabilidade (…). Da dimensão da adequação decorre que, dentro dos limites legais, deve ser escolhido o procedimento pré-contratual mais adequado ao interesse público a prosseguir; da dimensão da necessidade decorre que, na tramitação dos procedimentos pré-contratuais, apenas se devem efectuar as diligências e praticar os actos que se revelem indispensáveis à prossecução dos fins que legitimamente se visam alcançar; da dimensão da razoabilidade decorre a necessidade de ponderação dos custos e dos benefícios decorrentes da utilização de cada um dos procedimentos pré-contratuais para efeitos da sua escolha …” (in: ob. cit., pág. 76).
IV. Já o princípio da justiça, nas palavras de J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, "... aponta para a necessidade de a Administração pautar a sua actividade por certos critérios materiais ou de valor, constitucionalmente plasmados, como, por exemplo, o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da efectividade dos direitos fundamentais ..." (in: "Constituição da República Portuguesa Anotada", 3.ª edição, pág. 925).
Não é, por conseguinte, por critérios de justiça abstracta que deve ser regulada a conduta da Administração mas sim por critérios objectivos e universais (cfr. Freitas do Amaral, in: “Direito Administrativo”, vol. II, Lisboa 1988, pág. 201; M. Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim in: “Código de Procedimento Administrativo” 2.ª edição actualizada, revista e aumentada, pág. 106, nota I).
O princípio em questão significa ou implica que a Administração pública deve, na sua actuação, harmonizar o interesse público específico que lhe cabe prosseguir com os direitos e interesses legítimos dos particulares eventualmente afectados, comportando no seu seio, pelo menos três corolários, que se podem elencar em outros tantos princípios e que consistem:
a) No princípio da justiça "stricto sensu", segundo o qual todo o acto administrativo praticado com base em "manifesta injustiça" é contrário à Constituição e à lei ordinária e como tal é ilegal;
b) No princípio da igualdade;
c) E no principio da proporcionalidade (cfr. Freitas do Amaral, in: ob. cit., vol. II, Lisboa 1988, págs. 201 a 203).
Aliás como defende Marcelo Rebelo de Sousa no princípio da justiça conjuga-se a consecução da igualdade com a salvaguarda dos direitos fundamentais, pelo que o aludido princípio "... não apresentará, senão em casos-limite, autonomia jurídica em relação a outros princípios em que ele se desdobra (ou lhe são instrumentais), como os da igualdade, da necessidade e da proporcionalidade, da imparcialidade e da protecção de direitos e interesses legalmente protegidos.
Ele constitui (...) uma última 'ratio' da subordinação da Administração ao Direito, permitindo invalidar aqueles actos que, não cabendo em nenhuma das condicionantes jurídicas expressas da actividade administrativa, constituem, no entanto, uma afronta intolerável aos valores elementares da Ordem Jurídica, sobretudo aos plasmados em normas respeitantes à integridade e dignidade das pessoas, à sua boa-fé e confiança no Direito ..." (in: "O concurso público na formação do contrato administrativo", págs. 24/25; cfr. M. Esteves de Oliveira e outros, in: ob. cit. pág. 106, nota I).
V. No que diz respeito ao princípio da imparcialidade, consagrado no art. 06.º do CPA, o mesmo constitui uma emanação do comando constitucional vertido no art. 266.º da CRP e visa não só proteger o particular contra a Administração, mas, igualmente, a própria Administração em relação aos seus funcionários e agentes, revestindo em sede de procedimento concursal de papel fundacional e fomentador, sendo reputado como princípio de valor reforçado. É nele, conjuntamente com o princípio da igualdade, que assenta o próprio sistema de aquisição de meios e de serviços por parte da Administração, a ponto de incumpri-los é, nas palavras de M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira, “… pôr em causa a confiança e o crédito do público, do mercado em geral, no mercado administrativo, factores imprescindíveis da existência e eficiência deste …” (in: ob. cit., pág. 87).
O princípio da imparcialidade ora objecto também de apreciação envolve dois aspectos diferentes já que:
a) Por um lado, traduz-se numa emanação ou corolário igualmente do princípio da justiça, enquanto encarado como dever da Administração Pública de actuar de forma isenta em relação aos particulares/concorrentes através de um comportamento recto que não favoreça os amigos nem prejudique os inimigos, exigindo do órgão decisor que a apreciação duma candidatura ou proposta seja feita sem atender a quaisquer interesses alheios àqueles que devem nortear a escolha da melhor proposta ou do melhor concorrente, mormente não podem ser atendidos afinidades políticas ou outras similares, simpatias ou preferência regionais ou locais, conhecimentos pessoais ou antigos, etc;
b) E por outro lado, consiste num meio de protecção da confiança do público nos órgãos da Administração, mercê de se traduzir na proibição imposta aos órgãos da Administração de intervierem em quaisquer procedimentos, actos ou contratos que digam respeito a questões do seu interesse pessoal ou familiar, ou de pessoas com quem tenham relações de especial proximidade, a fim de que não possa suspeitar-se da isenção ou rectidão da sua conduta (cfr. Freitas do Amaral in: ob. cit., págs. 204 e segs.; Freitas do Amaral e outros in: “Código de Procedimento Administrativo Anotado”, págs. 44 e 45; Marcelo Rebelo de Sousa in: “Lições de Direito Administrativo”, págs. 151 a 155; Esteves de Oliveira e outros in: ob. cit., pág. 107; M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira in: ob. cit., pág. 121; Santos Botelho, Pires Esteves e Cândido Pinho in: “Código de Procedimento Administrativo Anotado”, 5.ª edição, págs. 95/96).
Tal como defendem J. Gomes Canotilho e Vital Moreira o princípio da imparcialidade consagrado no n.º 2 do art. 266.º da CRP constitui, tal como o princípio da igualdade, um limite material interno da actividade administrativa, sendo que "... a imparcialidade respeita essencialmente às relações entre a Administração Pública e os particulares, podendo circunscrever-se a dois aspectos fundamentais: a) o primeiro, relacionado com os princípios constitucionais consagrados no n.º 1, consiste, em que, no conflito entre o interesse público e os interesses particulares, a Administração deve proceder com isenção na determinação da prevalência do interesse público de modo a não sacrificar desnecessária e desproporcionalmente os interesses particulares (imparcialidade na aplicação do princípio da proporcionalidade); b) o segundo, refere-se à actuação da Administração em face dos vários cidadãos, exigindo-se igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos através de um critério uniforme de prossecução do interesse público ..." (in: "Constituição da República Portuguesa Anotada", 2.ª edição revista e ampliada, vol. II, pág. 420).
O princípio da imparcialidade constitui claramente um limite interno à discricionariedade, impondo que a Administração não tome partido ou se incline ou beneficie uma parte em prejuízo de outra, antes tendo de se nortear na sua actuação segundo o ordenamento jurídico e com a finalidade da prossecução do interesse público que a motiva.
Como refere a este propósito Marcelo Rebelo de Sousa "... a função administrativa se caracteriza pela sua parcialidade ou vinculação ao princípio da prossecução do interesse público, e, ao mesmo tempo, pela sua imparcialidade ou dever de isenção dos titulares dos seus órgãos e agentes ..." (in: ob. cit., pág. 152).
V. Quanto ao princípio da boa fé temos que o mesmo tem actualmente assento expresso da lei ordinária (cfr. art. 06.º-A do CPA), constituindo também o mesmo um dos limites da actividade discricionária da Administração e bem assim dever pelo qual se devem reger as relações entre a Administração e os administrados.
Segundo tal princípio o órgão ou agente que actue no exercício de um poder público está impedido de agir de má fé, utilizando artifícios ou qualquer outro meio, por acção ou omissão, tendo em vista enganar o administrado, tal como este deve actuar e agir perante aquela segundo as regras da boa fé.
Tem-se o conceito de boa-fé, enquanto princípio geral de direito, como difícil de encerrar numa noção precisa e completa, constituindo o mesmo, antes, uma linha geral de orientação jurídica, um padrão ético-jurídico de avaliação das condutas humanas, como honestas, correctas, leais, no seu relacionamento entre si.
Como referem Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim “… conseguir dizer numa cláusula jurídica geral, quando é que isso ocorre, não só é impossível, como frustraria exactamente a função que estes princípios assumem, de «escape» ou de «travão» da ordem jurídica, que hão-de estar sempre abertos a novas aplicações.
Apesar de o princípio da boa-fé ser dotado de inúmeras potencialidades jurídicas, é possível, com Rui de Alarcão, resumi-las a dois vectores básicos: um, de sentido negativo, em que se visa impedir a ocorrência de comportamentos desleais e incorrectos (obrigação de lealdade), e um de sentido positivo, mais exigente, em que se intenta promover a cooperação entre os sujeitos (obrigação de cooperação).
Naquele primeiro sentido, podem subsumir-se certas exigências típicas da boa-fé, tais como a inadmissibilidade, em certas condições, da invocação de vícios formais, a proibição de venire contra factum proprium (ou proibição de comportamento contraditório) - de acordo com a qual se veda (ou impõe) o exercício de uma competência ou de um direito, quando tal exercício (ou não exercício) entra em flagrante e injustificada contradição com o comportamento anterior do titular, por este ter suscitado na outra parte uma fundada e legítima expectativa de que já não seriam (ou o seriam irreversivelmente) exercidas …” (in: ob. cit., págs. 109 e 110).
E mais à frente sustentam os mesmos Autores que “… a actuação de boa fé de um dos intervenientes no procedimento não convalidará, não fará desaparecer o vício invalidante de que sofre o acto administrativo: um deferimento a que falta um requisito legalmente exigido, por a Administração ter sugerido ao particular, e este ter confiado nela, que não o consideraria na sua avaliação, é anulável ….
A conduta administrativa, nesses casos, é certamente fonte de responsabilidade civil, mas não da convalidação jurídica do acto ilegal; este não deixa de ser anulável mesmo que represente o culminar de um comportamento procedimental correcto e leal da Administração ou que o seu destinatário tenha mantido ao longo do procedimento uma postura irrepreensível, ignorando violar qualquer disposição legal …” (in: ob. cit., págs. 113 e 114).
VI. Por fim e quanto ao princípio da prossecução do interesse público temos que importa ainda considerar que no n.º 1 do art. 266.º da CRP se preceitua que a “… Administração Pública visa a prossecução do interesse público …”, sendo que em concretização daquele comando constitucional o legislador ordinário veio dispor também no art. 04.º do CPA, sob a epígrafe de “princípio da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos”, que compete “… aos órgãos administrativos prosseguir o interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos …”.
Como impressivamente refere a este propósito Marcelo Rebelo de Sousa a “… administração pública e o direito administrativo só podem compreender-se com recurso à ideia de interesse público …”, este “… é o norte da administração pública …” (in: ob. cit., Tomo I, pág. 201).
A definição do que constitui o “interesse público” comporta quer uma perspectiva mais ampla sendo entendido como o “interesse colectivo”, o “interesse geral duma determinada comunidade”, o “bem comum”, quer uma perspectiva mais restrita correspondendo, então, à “esfera das necessidades a que a iniciativa privada não pode responder e que são vitais para a comunidade na sua totalidade e para cada um dos seus membros”.
Note-se que é na lei (Constituição e lei ordinária) que se mostram definidos os interesses públicos que devem ser prosseguidos obrigatoriamente pela Administração Pública não sendo esta a fazê-lo e estando-lhe vedada, sob pena de ilegalidade e de sujeição dos prevaricadores a outras sanções, a possibilidade de prossecução de interesses particulares, para além de que sobre a mesma impende também o dever de boa administração (cfr. art. 10.º do CPA - princípio da eficiência) e está limitada na sua actuação pelo princípio do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos.
Nas palavras de M. Esteves de Oliveira e outros “… a «prossecução dos interesses públicos» seria … o «volante» (ou o «acelerador») da Administração Pública: os «direitos e interesses protegidos» são as barreiras da estrada em que ela circula, levando-a a fazer, aqui e ali, «curvas» e desvios mais pronunciados, a optar por medidas menos radicalmente viradas para a satisfação do interesse público do que aquelas que se tomariam, se este fosse o único critério da sua determinação …” (in: ob. cit., pág. 98).
Atente-se, todavia, que a noção e definição do que seja o “interesse público” se revela como sendo de conteúdo variável já que a sua concretização está dependente da evolução dos tempos ou do permanente devir, pelo que o que ontem constituía interesse público hoje poderá não sê-lo e o de hoje não o será possivelmente amanhã.
Refere ainda nesta sede Marcelo Rebelo de Sousa que “… a administração goza de uma ampla margem de livre decisão quanto ao «modus faciendi» da sua prossecução: um tribunal pode anular um acto da administração por ele prosseguir um interesse privado ou um interesse público diferente do definido por lei para o exercício da competência em causa, mas não pode anulá-lo, com fundamento no mesmo princípio, por considerar que ele não prossegue da melhor maneira o interesse público legalmente definido …” (in: ob. cit., Tomo I, pág. 202).
VII. Munidos dos considerandos antecedentes e presente o que supra já se foi entendendo em matéria da pretensa infracção aos arts. 55.º. als. b) e i) e 81.º, n.º 1, al. b) do CCP temos que, revertendo ao caso em presença e à alegada infracção ou erro de julgamento quanto aos princípios em epígrafe, também este fundamento impugnatório improcede.
Desde logo e tal como supra se concluiu a situação conducente à caducidade da adjudicação feita à A. em nada se compara ou encontra paralelismo com a actuação havida por parte do R. com a apresentação/publicação de esclarecimentos gerais e avisos, os quais mais não são do que isso.
Atente-se que nada se revela como demonstrado e provado nos autos que no procedimento de formação de contrato em presença hajam sido utilizados ou produzidos neste particular actos ou condutas que revelem da parte da entidade adjudicante actuação com preterição dos princípios da concorrência, da transparência, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade, da boa fé e da prossecução do interesse público.
Nada resulta apurado que, em face dos avisos/esclarecimentos referidos em XX) a XXIV) dos factos provados, hajam sido proferidos outros actos no procedimento em matéria da habilitação dos adjudicatários que revelem conduta ou condutas que no confronto com a do acto aqui impugnado revele a violação tais princípios, na certeza de que os pressupostos factuais e de direito que estão não base da decisão de caducidade da adjudicação objecto de impugnação nos autos não são, como aludimos supra, compatíveis e enquadráveis nas previsões dos arts. 81.º, n.º 8, 83.º, n.º 4 e 86.º, n.º 2 todos do CCP [na redacção vigente à data a que se reportam os factos em análise] ou mesmo da do actual art. 132.º, n.º 1, al. g) do mesmo código [na redacção introduzida pelo DL n.º 278/09].
Aquilo que se infere, aliás, do procedimento em presença é uma mesma conduta ou linha de orientação para cada uma das mesmas situações em que incorreram os vários concorrentes e consequentes decisões de caducidade das decisões de adjudicação.
Atente-se que o definido no aviso datado de 25.02.2009 [n.ºs XXIII) e XXIV) da matéria de facto apurada] e proferido no uso dos poderes decorrentes dos arts. 81.º e 83.º do CCP não envolve qualquer tratamento que se implique infracção aqueles princípios já que a solicitação da apresentação do certidão do registo comercial prendia-se com a forma de comprovar a identidade dos titulares dos órgãos sociais de administração, direcção ou gerência que se encontravam em efectividade de funções e, assim, controlar da observância do ónus de instrução no que tange aos documentos referentes às als. b) e i) do art. 55.º do CCP, exigência essa feita de modo não discriminatório e sem que envolvesse um alargamento do prazo para a junção dos documentos a que se reportavam aquelas als. b) e i) [certidões do registo criminal].
Com aquele aviso não se alargou, pois, o prazo de apresentação dos documentos exigidos naquelas alíneas para efeitos de habilitação já o que se determinou que fosse junto eram não as certidões de registo criminal que necessariamente teriam de ter sido juntas anteriormente e no tempo fixado no «PC» mas, ao invés, certidões do registo comercial enquanto documento novo e que foi reputado como necessário para aferir e controlar do efectivo cumprimento por parte das concorrentes da instrução quanto aos documentos referentes às als. b) e i) do citado normativo do CCP.
Daí que para além de o acto impugnado não se haver estribado na omissão de cumprimento da instrução documental do procedimento quanto aos documentos previstos nas referidas alíneas temos, também, que em termos procedimentais não se descortina que da exigência feita em termos gerais quanto à necessidade de junção de novo documento [no caso das certidões de registo comercial - n.ºs XXIII e XXIV dos factos provados] derive ou implique actuação/conduta que envolva infracção aos princípios da concorrência, da transparência, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade, da boa fé e da prossecução do interesse público, e muito menos que aquela infracção ocorra por referência e contraposição à caducidade da adjudicação por falta da junção dos documentos [legal e contratualmente exigidos para efeitos de habilitação] nos termos em que se estribou a decisão administrativa impugnada.
Importa referir, por fim, que a afirmação e a valia dos princípios concursais e procedimentais em presença não significa que hajam ou tenham de ser postergados regras elementares de procedimento (legais/concursais) prevalecendo de forma irrestrita e absoluta.
É que não raras vezes tais regras mais não são do que concretização e emanação de muitos daqueles princípios, princípios esses que importa serem em concreto harmonizados e compatibilizados entre si, potenciando os valores e objectivos que presidem à sua enunciação.
*
Sumariando, nos termos do n.º 7 do art. 713.º do CPC, concluiu-se da seguinte forma:
I. A não apresentação dos documentos de habilitação no prazo ou no modo para o efeito fixado importa a caducidade da adjudicação, sendo que se admite a possibilidade de ser concedido um prazo adicional para a apresentação de documentos de habilitação em falta no caso dessa falta resultar de facto que não seja imputável ao adjudicatário.
II. Cabe à entidade adjudicante emitir o juízo sobre se o facto impeditivo da apresentação atempada dos documentos é ou não imputável ao adjudicatário e, como tal, relevante, sendo que neste âmbito se admite como possível a invocação do justo impedimento enquanto contendo um princípio geral de direito com plena valia e aplicação neste domínio.
III. Do disposto nos arts. 81.º, n.º 1, al. b) e 86.º do CCP na sua conjugação com o demais quadro normativo em matéria de procedimentos de formação de contratos não deriva qualquer imposição à entidade adjudicante do dever de notificação ou de prolação dum novo convite ao adjudicatário quanto à junção da documentação em falta para efeitos de habilitação.
IV. Atente-se que a possibilidade de existir uma supressão de irregularidades detectadas nos documentos apresentados que possam levar à caducidade da adjudicação nos termos do art. 86.º do CCP pressupõe que se trate duma situação de mera irregularidade e quanto a documentação que foi junta ao procedimento [cfr. art. 132.º, n.º 1, al. g) do CCP na sua actual redacção] e nunca de permissão de suprimento quanto a uma total ou parcial omissão de instrução com junção de documentação para efeitos de habilitação quando estejamos perante omissão apenas imputável ao adjudicatário.
V. Não resultando apurado que em face dos avisos/esclarecimentos proferidos no procedimento hajam sido proferidos outros actos em matéria da habilitação que revelem conduta ou condutas que no confronto com a do acto impugnado importem violação dos princípios da concorrência, da transparência, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade, da boa fé e da prossecução do interesse público tem-se a infracção aos referidos princípios como insubsistente.*


4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional “sub judice” e, em consequência, manter a decisão judicial recorrida.
Custas nesta instância a cargo da A., aqui recorrente, sendo que na mesma a taxa de justiça, não revelando os autos especial complexidade, se atenderá ao valor resultante da secção B) da tabela I anexa ao Regulamento Custas Processuais (doravante RCP) [cfr. arts. 446.º, 447.º, 447.º-A, 447.º-D, do CPC, 04.º “a contrario”, 06.º, 12.º, n.º 2, 25.º e 26.º todos do referido Regulamento, e 189.º do CPTA].
Valor para efeitos tributários: 30.000,01€ [cfr. art. 12.º, n.º 2 do RCP].
Notifique-se. D.N..

Restituam-se, oportunamente, os suportes informáticos que hajam sido gentilmente disponibilizados.

Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator (cfr. art. 138.º, n.º 5 do CPC “ex vi” art. 01.º do CPTA).

Porto, 20 de Janeiro de 2011
Ass. Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Ass. Antero Pires Salvador
Ass. Rogério Paulo da Costa Martins

EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS - EXECUÇÃO - PROJECTO DE VARIANTE - OMISSÃO DE PRONÚNCIA

Processo nº 964/2009   -  STA     2010-03-17

I - Não existe falta de especificação dos fundamentos que justificam a sentença que reconhece a vantagem económica resultante da execução de projecto variante em empreitada de obra pública se ela indica todos os fundamentos de facto e de direito suficientes para a sua completa compreensão;
II - A discordância quanto à concreta aplicação do direito aos factos não é questão de omissão de pronúncia mas problema de erro de julgamento.



Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
 1.
1.1. A…, com sede no … em …, ..., e B…, com sede na …, freguesia de …, ..., intentaram acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra o Instituto para a ... — I... — actualmente EP — ..., SA (cfr. despacho de fls. 2182), com sede na ..., ..., peticionando a condenação da R. a:
a) reconhecer que a vantagem económica emergente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... integrado na empreitada dos autos ascende a 1.236.303.646$00;
b) reconhecer que a execução do referido projecto variante permitiu evitar a ocupação parcial do recinto desportivo do Clube de Futebol “…”, localizado no lado Norte da zona I, Emboquilhamento Nascente, dos Túneis do ..., que inevitavelmente ocorreria com a execução do projecto concursado e, por conseguinte, desonerou o dono da obra do pagamento de todos os custos e indemnizações daí emergentes, que ascenderiam a, pelo menos, a 206.500.000$00, importância esta que constitui um acréscimo à vantagem económica resultante da execução do projecto variante;
c) reconhecer que o valor das expropriações adicionais dos terrenos localizados na zona II, área Central dos Túneis do ..., que ingressaram no património do dono da obra e cuja execução se revelou necessária mercê da ampliação da área de intervenção resultante da implementação do projecto variante, ascendeu a 88.930.000$00, a suportar integralmente pela J.../I...;
d) reconhecer que o custo das indemnizações emergentes das expropriações de edifícios, benfeitorias e perda de rendimentos agrícolas e dos realojamentos de agregados familiares localizados nas 12 parcelas adicionais de terrenos incorporados na zona II, área central dos Túneis do ..., resultante da ampliação da respectiva área de intervenção determinada pela execução do invocado projecto variante ascendeu a 263.367.000$00, a ingressar como sobrecusto decorrente da execução do mesmo projecto variante e a abater à vantagem económica do mesmo resultante;
e) reconhecer que o custo de 94.060.000$00 emergente das indemnizações pagas pela demolição e desocupação de edifícios, estabelecimentos comerciais e realojamento de agregados familiares residentes no aglomerado populacional denominado de “…” localizado na parte Norte da zona III, Emboquilhamento Poente dos Túneis do ..., é um sobrecusto à execução do projecto concursado, na medida em que, e independentemente do método construtivo utilizado, sempre constituiria uma situação inevitável, atenta a diminuta resistência estrutural dos respectivos edifícios, capazes de absorver apenas assentamentos de 1,2mm, valor esse incompatível com o mínimo de 1,5cm de assentamento determinado pelos correspondentes terrenos de fundação constituídos por aterros heterogéneos com uma espessura de cerca de 15m, o que não constitui, de modo algum, qualquer sobrecusto decorrente da execução do projecto variante, nem é consequência de qualquer vício ou omissão, aliás inexistentes, deste último;
f) reconhecer que o saldo líquido final da vantagem económica decorrente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... ascende a 1.179.436.646$00, do qual às AA. como adjudicatárias da empreitada dos autos é atribuível, nos termos do disposto no art. 31º n.° 3, do DL 235/86, de 18 de Agosto, metade do correspondente valor, no montante de 586.718.323$00;
g) reconhecer que, abatidas as importâncias entretanto pagas a esse mesmo título no montante de 290.000.000$00, ainda deve às AA. a quantia remanescente, e,
h) ser condenado a pagar às AA. a quantia de 299.718.323$00, com acréscimo de juros de mora vencidos à taxa estabelecida no art. 190° n.° 1, do DL 235/86, de 18 de Agosto, desde a data de conclusão dos trabalhos de execução dos Túneis do ..., ou seja, pelo menos desde 20/05/98, actualmente num valor líquido de 45.939.017$00 e vincendos à mesma referida taxa até efectivo e integral pagamento.
1.2. Por despacho saneador/sentença (fls. 1550 e segts), foi julgada improcedente excepção de ilegitimidade activa, suscitada pela ré com base em as autoras terem aceitado tacitamente a decisão do dono da obra quanto à aprovação da variante, e foi julgada procedente a excepção de caducidade do direito de acção, por ter decorrido mais de 132 dias desde a notificação ao empreiteiro (as autoras) da decisão do dono da obra. Por isso, a ré foi absolvida dos pedidos.
1.3. Interposto recurso para este Supremo Tribunal, foi revogado aquele despacho, por acórdão de fls. 1722 e segts, pois entendeu-se que nenhum órgão competente havia praticado acto denegatório de pretensão formulada pelo empreiteiro, não tendo começado a correr o prazo para proposição de acção.
1.4. Por sentença de 3 de Março de 2009, o TAF de ... julgou a acção parcialmente procedente, e, em consequência, condenou a ré a:
«a) reconhecer que a vantagem económica — sem se atender aos custos das expropriações adicionais para a sua execução – emergente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... integrado na empreitada dos autos ascende a € 6.166.656,59;
b) reconhecer que o valor das expropriações adicionais dos terrenos localizados na zona II, área Central dos Túneis do ..., que ingressaram no património da dona da obra e cuja execução se revelou necessária mercê da ampliação da área de intervenção resultante da implementação do projecto variante ascendeu a € 373.449,99;
c) reconhecer que o custo de € 469.169,30 emergente das indemnizações pagas pela desocupação de edifícios, estabelecimentos comerciais e realojamento de agregados familiares residentes no aglomerado populacional denominado de “…”, localizado na parte Norte da zona III, Emboquilhamento Poente dos Túneis do ..., é um sobrecusto à execução do projecto concursado, na medida em que, e independentemente do método construtivo utilizado, sempre constituiria uma situação inevitável, atenta a diminuta resistência estrutural dos respectivos edifícios, capazes de absorver apenas assentamentos de 1,2mm, valor esse incompatível com o mínimo de 1,5cm de assentamento determinado pelos correspondentes terrenos de fundação constituídos por aterros heterogéneos com uma espessura de cerca de 8 a l0m, o que não constitui, de modo algum, qualquer sobrecusto decorrente da execução do projecto variante, nem é consequência de qualquer vício ou omissão deste último.
d) reconhecer que o saldo líquido final da vantagem económica decorrente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... ascende a € 3.877 495,96, do qual às autoras, como adjudicatárias da empreitada dos autos, é atribuível, nos termos do disposto no art. 31° n.° 3, do DL 235/86, de 18 de Agosto, metade do correspondente valor, no montante de € 1 938 747,98.
e) reconhecer que, abatidas as importâncias entretanto pagas a esse mesmo título no montante de € 1.446.513,90, ainda deve às AA. a quantia remanescente.
f) pagar às autoras a quantia de € 510.288,28, acrescida dos juros de mora vencidos, desde 10.01.2001, e vincendos, calculados sobre a quantia de € 492.234,08, até integral pagamento, à taxa de 4,25%, a partir de 1.11.2001 à taxa de 4,75%, a partir de 14.11.2001 à taxa de 4,25%, a partir de 11.12.2002 à taxa de 3,75%, a partir de 18.2.2003 à taxa de 12%, a partir de 1.10.2004 à taxa de 9,01%, a partir de 1.1.2005 à taxa de 9,09%, a partir de 1.7.2005 à taxa de 9,05%, a partir de 1.1.2006 à taxa de 9,25%, a partir de 1.7.2006 à taxa de 9,83%, a partir de 1.1.2007 à taxa de 10,58%, a partir de 1.7.2007 à taxa de 11,07%, a partir de 1.1.2008 à taxa de 11,2%, a partir de 1.7.2008 à taxa de 11,07%, e a partir de 1.1.2009 à taxa de 9,50%, e correspondentes taxas legais subsequentemente em vigor, do demais se absolvendo a ré».
1.5. Dessa sentença, a ré interpôs recurso principal e as autoras recurso subordinado.
1.6. A ré, EP ..., conclui nas alegações do seu recurso:
«1. Efectivamente, logrou o Tribunal a quo desmontar a imensa complexidade que rodeou a presente demanda, tentando-se cingir a algo que, de facto, era essencial — aferir a vantagem económica que derivou para a recorrente, em virtude do projecto variante apresentado e implementado pelas
AA/ RECORRIDAS.
II. Salvo melhor opinião, antes da aferição da mencionada vantagem económica, importaria que o Tribunal a quo se debruçasse sobre a forma de cálculo dessa mesma vantagem — nomeadamente, analisando criticamente a conduta das partes em todo o processo negocial que conduziu à aceitação das propostas formuladas.
III. Importaria também que o Tribunal a quo ponderasse devidamente o regime legal aplicável à situação sub judice, analisando-o, interpretando-o convenientemente e, dessa forma, definindo as regras do jogo.
IV. As RECORRIDAS entenderam elaborar um projecto variante à execução dos dois túneis do “...”.
V. A solução preconizada pelo projecto variante conduzia a uma vantagem económica considerável e assegurava o cumprimento do prazo de execução contratualmente previsto.
VI. Além disso, a variante em causa transformava toda essa zona, delimitada pelos dois emboquilhamentos, numa empreitada em regime de preço global. - como se encontra fixado na alínea p) da lista de factos assentes.
VII. Após um aturado e longo processo de análise, que se estendeu por 11 meses, a RECORRENTE, em 05/07/96, comunicou às AA a aprovação do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., impondo, para tanto, várias condições e pressupostos.
VIII. Em 21/08/96, ou seja, mais de um mês e meio depois da definição das «regras do jogo», vieram as RECORRIDAS comunicar a sua posição (sob a forma de “comentários”!!!) relativamente às aludidas condicionantes.
IX. Após algumas trocas de correspondência, a RECORRENTE informou as AA./RECORRIDAS que mantinha tudo quanto era afirmado no ponto 1 do oficio n.° 7...., de 96/07/05, pelo que não aceitava as pretensão destas, designadamente a manifestada na alínea a) da carta A...... de 96/08/21.
X. Na sequência da entrega à J..., em 97/02/10, da versão final do “Projecto de escavação e aterros entre os Km 1+270 (emb. poente) e 1+660 alteração” – após análise do teor da parte escrita do mesmo, nomeadamente das suas páginas 16, 17 e 18
- verificou-se a necessidade de proceder a realojamentos e indemnizações autónomas adicionais.
XI. Neste sentido, entendeu a RECORRENTE que: a) os encargos resultantes das expropriações e indemnizações do aglomerado habitacional denominado “…”; b) a indemnização paga ao Sr. C… e; c) a verba a pagar pela J... devido ao realojamento de 3 famílias que habitavam na mesma zona; deveriam constar a título de dedução à verba devida ao Consórcio adjudicatário.
XII. Deste modo, o apuramento da verba a pagar ao Consórcio, resultante da vantagem económica associada à aprovação do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., seria feito da seguinte forma: a) Redução de custos associada à Variante – 1.236.303.646$00; b) Expropriações a deduzir – 394.090.500$00; c) Indemnizações autónomas a deduzir – 64.500.000$00; Sub-Total – 777.713.146$00 (o valor dos terrenos a suportar pela J..., não incluídos nestas 3 alíneas, é de 70.215.000$00); d) Parcela a reverter para o Consórcio (50% do total) – 388.856.573$00; e) Indemnizações autónomas da “…” (a deduzir) – 70.000.000$00; f) Indemnização autónoma paga ao Sr. C… (a deduzir) – 5.000.000$00; g) Custo dos 3 realojamentos (a deduzir) – 16.500.000$00; Total Final da parcela a reverter para o consórcio:
297.356.573$00 — cfr. alíneas V), X), Z), AA), AB) e AC) da Lista de Factos Assentes.
XIII. Só a partir desta data as AA./RECORRIDAS começaram a levantar dúvidas sobre a forma de apuramento da vantagem económica discutida nos autos, em total contraste com o acontecido anteriormente, já que nunca, até então, haviam posto em causa a metodologia e pressupostos usados no seu cálculo.
XIV. Assim sendo, resulta de forma manifesta que, ao contrário do que as RECORRIDAS pretendem agora fazer crer, A METODOLOGIA DE APURAMENTO DA VANTAGEM ECONÓMICA RESULTANTE DA ADOPÇÃO DO PROJECTO VARIANTE NUNCA FOI OBJECTO DE DISCUSSÃO, ultrapassada que foi a divergência sobres os terrenos expropriados que iriam integrar o património da J....
XV. Aliás, na sequência dos esclarecimentos prestados pela J..., constatou-se que a verba a reverter para o Consórcio Adjudicatório era, afinal, de 292.296.573$00 e não de 297.356.573$00, como havia sido inicialmente indicado (no ofício 7/8/043/98 de 98.02.06).
XVI. As AA./RECORRIDAS aceitaram as condições/pressupostos de que a RECORRENTE fez depender a aprovação do projecto variante, para depois, muito mais tarde, a dois meses da conclusão da obra, tentarem, de forma ilegítima, o empolamento do verdadeiro benefício económico que derivou da solução construtiva que apresentaram.
XVII. Através da carta A... de 31/03/99 (ou seja, cerca de 10 meses após a finalização das obras) as RECORRIDAS vieram defender ex novo que: (i) o método variante à construção dos Túneis do ... permitiu à J... economizar o valor de 206.500.000$00, pelo facto de ter sido possível evitar a interferência com o recinto desportivo do Clube …, poupança que deveria ser considerada pela J... no cômputo geral da economia a apurar com o projecto variante; (ii) o custo a abater à vantagem económica emergente do projecto variante, resultante da expropriação das 12 novas parcelas de terreno referidas em AJ), ascende a 263.367.000$00; (iii) a verba despendida pela J..., no valor global de 94.060.000$00, referida no ofício da J... ref. G....., de 4/11/98, alíneas 4, 5, 6, 7, não deverá ser considerada como custo da variante, já que os desalojamentos em causa eram indissociáveis da execução dos túneis na versão concursada, devendo tal valor ser retirado na sua totalidade do apuramento global da economia da variante.
XVIII. As AA./RECORRIDAS NUNCA discordaram da «metodologia» de cálculo do valor da economia emergente do projecto variante, assim como nunca apresentaram razões minimamente plausíveis para pôr em causa os valores apurados.
XIX. Também não lograram provar na presente demanda qualquer factualidade que permitisse chegar a tal conclusão!!!
XX. No caso dos autos pelo que o regime jurídico aplicável encontra-se plasmado no DL 235/86, de 18 de Agosto (aplicável ex vi 241° DL 405/93, de 10 de Dezembro e 278° DL 59/99, de 2 de Março).
XXI. Foi tido por assente que a empreitada em apreço era “por preço global” (alínea P) dos Factos Assentes e art. 20° do DL 235/86, de 18 de Agosto), o que significa que a remuneração desta empreitada é fixada adiantadamente numa soma certa, correspondente à realização de todos os trabalhos necessários para a execução da obra ou parte da obra objecto do contrato — art. 7° do DL 235/86, de 18 de Agosto.
XXII. De acordo com o disposto no art. 9º do DL 235/86, de 18 de Agosto, sob a epígrafe “objecto da empreitada”, o dono da obra, no caso da empreitada ser por preço global, definirá, com a maior precisão, nos elementos escritos e desenhados do projecto e no caderno de encargos, as características da obra e as condições técnicas da sua execução.
XXIII. Pela análise do regime jurídico em causa, verifica-se que o empreiteiro tem, salvo estipulação em contrário, a especial obrigação de executar todos os trabalhos necessários para garantir a segurança das pessoas empregadas na obra e do público em geral e para evitar danos nos prédios vizinhos — cfr. art. 25°, n.° 2, alínea b) do DL 235/86, de 18 de Agosto.
XIV. No mesmo sentido, será da conta do empreiteiro, salvo estipulação em contrário, o pagamento das indemnizações devidas pela constituição de servidões ou pela ocupação temporária de prédios particulares, necessárias à execução dos trabalhos adjudicados – cfr. art 26° do DL 235/86, de 18 de Agosto.
XXV. Nos termos do art. 31° do referido diploma legal, “em qualquer momento da realização dos trabalhos, poderá o empreiteiro propor ao dono da obra variantes ou alterações ao projecto relativamente a parte ou partes dele ainda não executadas”, sendo que “tais variantes ou alterações obedecerão ao que ficou disposto sobre os projectos ou variantes apresentadas pelo empreiteiro, mas o dono da obra poderá ordenar a sua execução desde que aceite o preço global ou os preços unitários propostas pelo empreiteiro ou com este chegue a acordo sobre os mesmos”.
XXVI. Nos termos do art. 256° do DL 59/99, de 2 de Março: “o cumprimento ou acatamento pelo empreiteiro de qualquer decisão tomada pelo dono da obra ou pelos seus representantes não se considera aceitação tácita da decisão acatada”, acrescentando o n.° 2 daquela mesma norma que se “dentro do prazo de oito dias a contar do conhecimento da decisão, o empreiteiro não reclamar ou não formular reserva dos seus direitos, a decisão é aceite”.
XXVII. As AA./RECORRIDAS não põem em causa as condições de que o dono da obra fez depender a aprovação do projecto variante – NEM SEQUER O PODERIAM FAZER, UMA VEZ QUE, DE ACORDO COM O TAMBÉM JÁ CITADO ART. 256° DO DL 59/99, DE 2 DE MARÇO, O EMPREITEIRO DISPÕE DE OITO DIAS PARA “RECLAMAR” OU “FORMULAR RESERVA DOS SEUS DIREITOS”, SOB PENA DE A DECISÃO SE CONSIDERAR ACEITE.
XXVIII. É manifesto que as RECORRIDAS nunca o fizeram no prazo de que dispunham para o efeito (aliás, nem no prazo, nem fora dele), tendo, ao invés, executado a obra em questão, não obstante o firme reiterar das condições/pressupostos ressalvados pela RECORRENTE.
XXIX. SOBRE TAL FACTUALIDADE, O TRIBUNAL A QUO NADA DISSE, SENDO CERTO QUE O QUE, SALVO MELHOR ENTENDIMENTO, CONFIGURA UMA NULIDADE PREVISTA NAS ALÍNEAS B) E D) DO N° 1 DO ARTIGO 668° DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, O QUE DESDE JÁ SE INVOCA PARA TODOS OS DEVIDOS E LEGAIS EFEITOS.
XXX. Acresce que, o art. 12° do DL 235/86, de 18 de Agosto, impõe que “as variantes da autoria do empreiteiro deverão conter todos os elementos necessários para a sua perfeita apreciação e para a justificação do método de cálculo utilizado”.
XXXI. A ponderação de custo/benefício apenas poderá ser correctamente realizada se o dono da obra conhecer – sem margem para avanços e recuos do proponente — os pressupostos de economia, utilidade, duração e solidez que caracterizam a variante.
XXXII. Ao aceitar um projecto variante que lhe seja proposto, o dono da obra não passa um «cheque em branco» ao empreiteiro, aceitando, num primeiro momento, a construção da mesma e os respectivos métodos construtivos, para só mais tarde, já num segundo momento, ir discutir com o empreiteiro qual montante que resulta como poupança.
XXXIII. O que o dono, da obra não pode fazer, mesmo por força de imposição legal – o que, de todo, se compreende — é aceitar uma variante, com base numa promessa de diminuição de custos, deixando essa aferição de valores para um momento posterior, no qual pudesse vir a pagar muito mais do que o previsto para o projecto concursado.
XXXIV. Assim sendo, não estando em causa a violação das condições acordadas entre RECORRIDAS e RECORRENTE para a determinação da vantagem económica do projecto variante, que, recorde-se, foram, como continuam a ser, integralmente aceites pelas RECORRIDAS, deverá a presente acção improceder, com todas as devidas e legais consequências.
XXXV. Ainda que assim não se entendesse, o que não se concede, quanto à “…”, o Tribunal a quo entendeu dar razão às RECORRIDAS, reconhecendo que o custo de 94.060.000$00, emergente das indemnizações pagas pela demolição e desocupação de edifícios, estabelecimentos comerciais e realojamento de agregados familiares, nessa mesma área geográfica, é um sobrecusto ao projecto concursado.
XXXVI. Verifica-se, uma vez mais, que esta questão em particular, entretanto surgida, mais não é do que um tardio «acrescento» à metodologia de cálculo da vantagem económica que deriva do Projecto Variante – realça-se o facto de as AA./RECORRIDAS terem suscitado esta questão – de forma muito «ténue», em 10/03/1998, dois meses antes do final da obra — e apenas em relação ao campo de futebol “…”.
XXXVII. Quanto à “…”, e como se disse, a questão é totalmente nova, nunca tendo merecido o interesse das AA./RECORRIDAS antes do final da obra – nesta conformidade, será aplicável, mutatis mutandi, o raciocínio anteriormente explanado acerca da definição prévia das «regras do jogo».
XXXVIII. Acontece que, continua a não se alcançar qual o concreto fundamento jurídico de que as RECORRIDAS se socorrem para alicerçar o seu pedido – por outras palavras: qual a concreta norma, da lei ou do contrato, que habilita as AA./RECORRIDAS a pôr em causa tudo aquilo que haviam combinado com a recorrente a este propósito?
XXXIX. A resposta é evidente: nenhuma!!!
XL. UMA VEZ MAIS, SUSCITADA A QUESTÃO PELA RECORRENTE, O TRIBUNAL A QUO NADA DISSE A ESTE PROPÓSITO, O QUE CONFIGURA UMA NULIDADE PREVISTA NAS ALÍNEAS.B) E D) DO N° 1 DO ARTIGO 668° DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, O QUE SE INVOCA PARA TODOS OS DEVIDOS E LEGAIS EFEITOS.
XLI. Aliás, quando analisadas as Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos verificamos que
i. “1.5.2 — No caso em que a adjudicação tenha recaído sobre a proposta com variante ao projecto ou a parte dele entende-se que a referida variante contém todos os elementos necessários para a sua perfeita apreciação e que se encontra completada com os esclarecimentos, pormenores, planos e desenhos explicativos, com o grau de desenvolvimento a que se refere o n.° 1 do art. 11.” do Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto.
ii. 1.5.3 — Na fase de preparação e planeamento a que se refere a cláusula 4 no caso referido na cláusula 1.5.2, o empreiteiro completará os elementos de projecto por ele apresentados a concurso por forma que seja atingida uma pormenorização e especificação pelo menos idênticas às do projecto patenteado ou da parte a que dizem respeito. O projecto variante deverá conter particularmente nos casos em que inclua inovações tecnológicas relativamente ao projecto patenteado, a necessária justificação e obedecer no que for aplicável às disposições legais para a elaboração de projectos e obras públicas”.
XLII. Por sua vez, “O empreiteiro, sempre que, nos termos do art. 21° do Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto, propuser qualquer alteração ao projecto, deverá apresentar, conjuntamente com ela e além do que se estabelece na referida disposição legal, todos os elementos necessários à sua perfeita apreciação” — cfr. cláusula 7.4 do Caderno de Encargos, sob a epígrafe — Alterações ao projecto propostas pelo empreiteiro.
XLIII. Já o Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto, é absolutamente inequívoco quando dispõe que “As propostas relativas a variante ao projecto posto a concurso deverão ser elaboradas obedecendo a sistematização idêntica à da proposta base e em termos que permitam a sua fácil comparação com esta, nomeadamente no que respeita à natureza e volume dos trabalhos previstos, ao programa, meios e processos de execução adoptados, aos preços unitários e totais oferecidos e às condições que divirjam das do caderno de encargos ou de outros documentos do processo de concurso” cfr. art. 77°, n.°2.
XLIV. A verdade é que, na presente demanda, as RECORRIDAS se limitam a tentar «enxertar» novos factores de avaliação, alegando, para o efeito, que, afinal, o Projecto Concursado estava mal elaborado e que, se isso não acontecesse, a vantagem económica teria sido muito maior.
XLV. As AA./RECORRIDAS não põem em causa eventuais erros do Projecto Variante, nem a boa execução do mesmo, nem o acordado com a RECORRENTE quanto à metodologia a seguir para o cálculo do benefício económico.
XLVI. O que as AA./RECORRIDAS acabam por pôr em causa é precisamente o Projecto Concursado, afirmando que o mesmo estava errado e que deveria ter sido feito de outra maneira!!!
XLVII. IMPUNHA-SE, POIS, QUE O TRIBUNAL A QUO SE PRONUNCIASSE SOBRE ESTA MATÉRIA, TOMANDO POSIÇÃO SOBRE A MESMA – NÃO O TENDO FEITO, ASSISTIMOS, NOVAMENTE, A UMA OMISSÃO DE PRONÚNCIA A QUAL O SUPREMO TRIBUNAL TERA QUE PÔR COBRO.
XLVIII. No que concerne a reclamações quanto a erros e omissões do projecto, dispõe o art. 13° do Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto, que o empreiteiro poderá reclamar dos mesmos, no prazo de 90 dias ou no que, para o efeito, for estabelecido no caderno de encargos, contados da consignação da obra.
XLIX. O empreiteiro poderá reclamar “a) Contra erros ou omissões do projecto relativos à natureza ou volume dos trabalhos, por se verificarem diferenças entre as condições locais existentes e as previstas ou entre os dados em que o projecto se baseia na realidade; b) Contra erros de cálculo, erros materiais e outros erros ou omissões do mapa de medições, por se verificarem divergências entre este e o que resulta das restantes peças do projecto” (vide, também a este propósito, art. 135° do Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto).
L. Também de acordo com o ponto 1.4 das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos da obra em apreço, “as dúvidas que o empreiteiro tenha na interpretação dos documentos por que se rege a empreitada devem ser submetidas à fiscalização da obra antes de se iniciar a execução do trabalho sobre o qual elas recaiam. No caso de as dúvidas ocorrerem somente após o início da execução dos trabalhos a que dizem respeito, deverá o empreiteiro submete-las imediatamente à fiscalização, juntamente com os motivos justificativos da sua não apresentação antes do início daquela execução. (...) 1.4.2 — A falta de cumprimento do disposto na cláusula 1.4.1 torna o empreiteiro responsável por todas as consequências da errada interpretação que porventura haja feito, incluindo a demolição e reconstrução das partes da obra em que o erro se tenha reflectido”.
LI. Por sua vez, nos termos do ponto 7.3.1 das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos: “O empreiteiro deverá comunicar à fiscalização, logo que deles se aperceba, quaisquer erros ou omissões que julgue existirem no projecto e nos demais documentos por que se rege a execução dos trabalhos, bem como as ordens nos avisos e nas notificações da fiscalização. A falta de cumprimento da obrigação estabelecida da cláusula 7.3.1 torna o empreiteiro responsável pelas consequências do erro ou da omissão...” – Vide também sobre reclamações, o disposto no ponto 13.01.6.1.1 das Cláusulas Especiais do Caderno de Encargos.
LII. As RECORRIDAS nunca fizeram qualquer reclamação relativa ao projecto concursado, razão pela qual carecem de qualquer legitimidade para invocar erros ou omissões do mesmo — erros e omissões esses que, naturalmente, não existiam!!!
LIII. As RECORRIDAS acabaram por tentar imputar erros técnicos e omissões graves nos estudos que serviram de base ao Projecto Concursado, carecendo, nesta matéria, de qualquer razão que dê respaldo às suas pretensões.
LIV. Sucede que, ainda que assim não fosse, o art. 40º, n.° 2 do Decreto-Lei n.° 235/86, de 18 de Agosto dispõe que “Quando o projecto ou variante for da autoria do empreiteiro, mas estiver baseado em dados de campo, estudos ou previsões fornecidos, sem reservas, pelo Dono da Obra, será este responsável pelas deficiências e erros do projecto ou variante que derivem da inexactidão dos referidos dados, estudos ou previsões”.
LV. A questão está em que a RECORRENTE sempre consignou reservas em relação aos estudos técnicos apresentados, mormente na Memória Descritiva e Justificativa dos Túneis do ... – a título de exemplo, veja-se o doc. N.° 7 a fls. 350 (ponto 1.2.2) e fls. 354 (ponto 1.6. 2° parágrafo): “Sobre as propriedades geomecânicas, as grandes condicionantes das soluções do anteprojecto, há uma grande lacuna de informação. (...) Deste modo, se após a realização da campanha de sondagens adicional prevista e dos ensaios em curso, se verificar que os solos possuem características diferentes, bem como se o zonamento que resultar desta nova campanha for diferente daquele utilizado neste estudo, as secções de galeria deverão ser reajustadas às novas características dos solos e ao novo zonamento geológico”.
LVI. Ou seja, as AA./RECORRIDAS estavam prevenidas (e conscientes) de que era necessário proceder ao aprofundamento dos dados disponíveis por altura do concurso, não podendo, desta forma, invocar que foram apanhadas de surpresa.
LVII. UMA VEZ MAIS, O TRIBUNAL A QUO, NÃO SE PRONUNCIOU SOBRE ESTAS CONCRETAS QUESTÕES, O QUE VICIA A SENTENÇA RECORRIDA NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ARTIGO 668°, N.° 1 ALÍNEA D) DO CPC.
LVIII. Face a todo o exposto, será forçoso concluir que a presente acção não dispunha de qualquer fundamento de facto ou de direito que pudesse conduzir à condenação da recorrente, devendo a mesma ser considerada totalmente improcedente e, em consequência, ser, a recorrente absolvida do pedido formulado nos autos.
LIX. Com a decisão recorrida, o Tribunal a quo violou, entre outras, as normas previstas nos artigos 7º, 9°, 12°, 13°, 20°, 25°, n.° 2, alínea b), 26°, 31°, n.° 3 e 223° do DL 235/86, de 18 de Agosto e art. 256° do DL 59/99, de 2 de Março.
NESTES TERMOS, e nos melhores de Direito, deve o presente recurso merecer provimento, e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida nos exactos termos exarados na presente peça processual».
1.7. A recorrida A… contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A — Na medida em que as alegações do recurso do Réu são praticamente iguais às alegações que o mesmo apresentou em 1ª instância sobre o aspecto jurídico da causa, não versando sobre os vícios da sentença, impõem-se que o meio de impugnação jurisdicional em apreço seja objecto de decisão sumária, aderindo-se à decisão da 1ª instância, rejeitando-se, por conseguinte, o recurso
B — Da análise da matéria de facto provada que não foi pelo Réu impugnada, conclui-se, sem margem para dúvidas, que no período temporal que decorreu de 05/07/1996 a 15/05/2000 as partes mantiveram diversos contactos, por via dos quais se constata que as AA. nunca aceitaram, no que ao caso interessa, que a vantagem económica da variante fossem subtraídas as indemnizações respeitantes ao aglomerado populacional da “…” e contestaram-no logo que o mesmo assunto foi equacionado pelo dono de obra.
C — O referido assunto surge, precisamente e pela primeira vez, no ofício do Réu de 06/02/98 — alínea AB e AC da sentença — e foi determinado única e exclusivamente pelas razões que constam das pags. 16, 17 e 18 da versão final do “Projecto de Escavação e Aterros entre os Km 1+27
D — Estas razões e fundamentos prendem-se com o (Emb. Poente) e 1 + 660 — alterações” a fls. 1234 a 1263. a deficiente qualidade e resistência geológica dos solos existentes na zona do aglomerado da “…”, o que se encontra em linha com a matéria factual dada como provada e não impugnada nas alíneas CO) a DA) da sentença, o que era já inerente ao projecto concursado.
E — Demonstra-se, assim, que as AA. não só desde sempre se opuseram à subtracção das indemnizações do aglomerado populacional da “…” à vantagem económica do projecto variante, como também que tinham razão nessa sua oposição, porque aqueles eram custos inerentes ao projecto concursado.
F — Na medida em que o art. 25° do Dec. Lei n° 235/86 de 18 de Agosto se reporta a trabalhos necessários a assegurar a segurança de operários empregues em obra e do público em geral, assim como a evitar que os prédios vizinhos sejam danificados e o artº 26° do mesmo diploma legal respeita às indemnizações a atribuir por servidões de passagem e por ocupações temporárias de imóveis enquanto durarem os trabalhos da empreitada, em nada se relacionam e, por conseguinte, não se aplicam, ao caso dos autos, designadamente ao aglomerado populacional da “…” cujas indemnizações respeitam a alojamentos e a desocupações definitivas de imóveis que não são revertíveis após a conclusão da empreitada.
G ― acresce que na sentença recorrida esta problemática é abordada e decidida exactamente no mesmo sentido, pelo que a mesma não peca por omissão de pronúncia e, por conseguinte, não se encontra ferida de nulidade.
H — Mesmo que os invocados preceitos legais fossem aplicáveis no caso dos autos, as situações que aí se visam prevenir têm um custo que necessariamente está incluído no preço da empreitada, de tal sorte, que a aprovação de um projecto variante que os evite representará uma redução de custos a levar em consideração no cálculo da respectiva economia, de cuja metade do valor o empreiteiro terá direito a apropriar-se.
I ― Conforme já foi decidido por esse Supremo Tribunal por acórdão proferido em 08/10/2003 a fls._ já transitado e que faz caso julgado formal e material, as decisões do dono da obra que constam dos diversos ofícios dos autos não foram proferidas pelos respectivos órgãos sociais para o efeito competentes.
J ― Na medida e à semelhança do que foi decidido a propósito do decurso do prazo para a propositura da acção, o prazo de 10 dias para que o empreiteiro se oponha ou reserve os seus direitos nunca começou no caso dos autos a correr, pelo que a omissão da reacção atempada nunca poderia significar a aceitação de uma decisão não definitiva nos termos do preceituado no artº 256° n°2 do Dec. Lei n° 59/99 de 2 de Março.
K — Como se tratava de caso julgado, não carecia a Sra. Juiz “a quo” de apreciar semelhante questão na sentença recorrida, pelo que a mesma não peca por omissão de pronúncia, nem tão pouco está, por esse motivo, inquinada de nulidade.
L — A demanda “sub-judice” não se centra sobre erros ou omissões do projecto concursado, mas única exclusivamente sobre a discordância das AA. sobre o cálculo e o conjunto da vantagem económica do projecto variante que foi aprovado e executado em obra, mais concretamente na oposição à subtracção do valor das indemnizações pagas pelo dono da obra no âmbito da desocupação e realojamento do aglomerado populacional da “…”.
M ― Os factos não impugnados e apurados nestes autos demonstram, sem sombra de dúvidas, que aqueles sobrecustos já eram inerentes ao projecto concursado, pelo que não eram subtraíveis à vantagem económica decorrente da execução do projecto variante.
N — O direito das AA. recorridas a receberem metade da referida vantagem económica advém-lhes do disposto no artº 31° n°3 do Dec. Lei n° 235/86 de 18 de Agosto e é com base exactamente nessa pretensão que é movida a acção judicial aqui em causa.
O — A sentença recorrida aborda e pronuncia-se sobre esta temática nos parágrafos 2° e 3° da respectiva pag. 31, pelo que não omitiu pronúncia sobre esta problemática e, por conseguinte, não se encontra ferida de nulidade
P — Improcedem, assim e em toda a linha, as conclusões do recurso do Réu, ao qual, deve, deste modo, negar-se provimento, mantendo-se e confirmando-se, na parte colocada em crise, a sentença recorrida».
1.8. No seu recurso subordinado, concluíram as autoras:
«A – O projecto concursado na zona de escavação adjacente ao, campo de futebol do clube “…” apenas contemplava a execução de escavação a céu aberto com contenção de terras através do recurso à construção de sucessivos taludes em terra com 10m, intervalados por banquetas
B – Nessa zona, o projecto concursado não previa, a nível de contenção de terras, a execução de qualquer cortina ancorada ou de paredes com escoras, tanto que nem existia qualquer rubrica orçamental para o efeito, pelo que a sua eventual instalação constituiria uma alteração ao projecto.
C – O projecto concursado, ao invés, na zona de escavação adjacente ao referido campo de futebol contemplava uma solução mista de execução de taludes em terra e cortina ancorada de sustentação de terras e da estrutura daquele equipamento desportivo.
D – Estas conclusões são as que resultam dos art. 139º a 143° da contestação da Ré, que produz, como confissão, prova plena em juízo, do n°3.1, 3.4, e 3.5 do documento nº3 junto como essa peça forense e do depoimento testemunhal do Sr. Prof. … no qual o Tribunal “a quo” se ancorou decisivamente para proferir as respostas à matéria de facto versada dos quesitos 12 e 20.
E – Foi com base nas versões originais do projecto concursado e do projecto variante, respectivamente sem e com cortina ancorada, que foi aprovada a mais valia resultante de um e de outro.
F – Deste modo, as alíneas CB) e CM) devem ser alteradas, no sentido de delas ser eliminado o segmento “excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora”.
G – Essa alteração da matéria de facto é possível de concretizar por via do disposto no art. 712º nº1 do Cód. Proc. Civil e do art. 20º nºl do ETAF (Dec. Lei nº l29/84 de 27 de Abril).
H – Por via do despacho proferido em 03/07/1997 pelo Presidente da J... e transmitido através do oficio nº 7... de 06/02/1998 foi decidido que seria pago aos empreiteiros o remanescente da correspondente da quota parte na mais valia decorrente do projecto variante na data da conclusão definitiva dos correspondentes trabalhos, o que se encontra provado na alínea AC) da matéria de facto assente.
I – Resulta da alínea AF) da matéria de facto assente que os trabalhos de construção dos Túneis do ... se concluíram em 20/05/1998.
J – Era, pois, até esta última data que deveria ter sido pago o diferencial da mais valia atribuída aos empreiteiros, pelo que o seu não pagamento por mais de 60 dias úteis, fez constituir o demandado em mora e, por conseguinte na obrigação de pagar os correspondentes juros às taxas supletivas legais às Recorrentes.
K – Deste modo, é a partir de 16/08/2008 que se deve contar o vencimento dos juros moratórios, cuja taxa supletiva oscilou entre 5%, 4,25% e 3,25%, até Março de 2000, revogando-se nessa parte a sentença recorrida».
1.9. A essas alegações, respondeu EP ..., formulando as seguintes conclusões:
«A) As recorrentes não dispõem de qualquer fundamento que permita viabilizar a peticionada «ampliação» da vantagem económica que entendem ter resultado do Projecto Variante.
B) No que respeita à ocupação do Campo de Futebol “…”, o Tribunal a quo andou com total acerto pelo que nada há a rectificar.
C) Ao contrário do que os AA./recorrentes pretendem fazer crer com os artigos 13° e seguintes do seu articulado, a verdade é que da análise das alíneas — CI) e CJ) — é impossível retirar a conclusão de que o Projecto Variante comportava a execução de uma cortina ancorada.
D) O Projecto Variante não comportava a execução de uma cortina ancorada de contenção de terras, pelo que, e como é obvio, facilmente se retira que a execução do Projecto Variante, por si só, não era suficiente para evitar a ocupação do Campo de Futebol “…”!!!
E) Por outras palavras, os moldes da ocupação do campo de futebol “…” não derivaram, directa e necessariamente, da solução construtiva preconizada pelo projecto variante, mas sim da posterior introdução de uma cortina ancorada!!!
F) Nesta medida, o Projecto Variante não trouxe qualquer mais valia à empreitada, pelo que inexiste razão bastante para alterar a matéria de facto dada como provada — em concreto, as alíneas CB) e CM) — visto que a mesma repercute com exactidão o contexto subjacente à presente demanda.
G) Desconhece-se, aliás, qual a concreta norma, da lei ou do contrato, que habilita as AA. a pôr em causa tudo aquilo que haviam combinado com a R. a este propósito?
H) As AA. limitaram-se a tentar «enxertar» novos factores de avaliação, alegando, para o efeito, que, afinal, o Projecto Concursado estava mal elaborado e que, se isso não acontecesse, a vantagem económica teria sido muito maior.
I) As AA. não põem em causa eventuais erros do Projecto Variante, nem a boa execução do mesmo, nem o acordado com a R. quanto à metodologia a seguir para o cálculo do beneficio económico.
J) As AA. nunca fizeram qualquer reclamação relativa ao projecto concursado, razão pela qual carecem de qualquer legitimidade para invocar erros ou omissões do mesmo -erros e omissões esses que, naturalmente, não existiam!!!
K) Acresce que, como resulta do ponto 1.10.1 das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos que “correrão por conta do empreiteiro, que se considerará, para o efeito, o único responsável: (...) b) as indemnizações devidas a terceiros pela constituição de servidões provisórias ou pela ocupação temporária de prédios particulares necessários à execução da empreitada”
L) No mesmo sentido, será da conta do empreiteiro, salvo estipulação em contrário, o pagamento das indemnizações devidas pela constituição de servidões, pela ocupação temporária de prédios particulares, necessárias à execução dos trabalhos adjudicados – cfr. artº 26° do DL 235/86, de 18 de Agosto.
M) De tudo isto resulta, inequivocamente, que a ocupação do Campo de Futebol “…” se refere a um encargo que sempre teria de ser suportado pelo empreiteiro, fosse no âmbito do Projecto Concursado, fosse na execução do Projecto Variante.
N) Pelo que não faz qualquer sentido vir invocar a existência de economias quando a responsabilidade no pagamento dos encargos relativos à ocupação do Campo de Futebol “…” cabia, unicamente, ao empreiteiro.
O) Face a todo o exposto, deverá improceder a pretensão aduzida pelos AA./recorrentes quanto à alteração da matéria de facto dada como provada, mormente as alíneas CB) e CM).
P) Quanto aos juros peticionados, atente-se que aquando da conclusão da obra, os montantes em causa estavam ainda a ser discutidos quer pelas AA. quer pela R.
Q) A contagem do pagamento dos juros, a ocorrer, o que não se concede, dever-se-ia iniciar 60 dias úteis após a data do acerto definitivo ou seja, a partir de dia 01 de Março de 2000, e não 60 dias após a data de conclusão da Obra — dia 20 de Maio de 1998, como as AA. pretendem fazer crer.
R) Nestes termos, e também no que a esta questão diz respeito, o recurso ora interposto pelos AA. terá necessariamente de improceder».
1.10. O juiz proferiu o seguinte despacho de sustentação:
«A ré veio invocar na sua alegação de recurso a nulidade da sentença de fls. 2170 e ss., nos termos do art. 668° n.º 1, als. b) e d), do CPC, com base nos seguintes fundamentos:
1) O tribunal nada disse sobre a sua alegação de que as autoras nunca puseram em causa, no prazo de que dispunham para o efeito (art. 256°, do DL 59/99, de 2/3), as condições de que o dono da obra fez depender a aprovação do projecto variante (conclusão XXIX);
2) O tribunal nada disse sobre a concreta norma, da lei ou do contrato, que habilita as autoras a pôr em causa tudo aquilo que haviam combinado com a ré (conclusão XL);
3) O que as autoras acabam por pôr em causa é o projecto concursado, afirmando que o mesmo estava errado e que deveria ter sido feito de outra maneira, não tendo o tribunal emitido pronúncia sobre esta matéria (conclusão XLVII);
4) O tribunal não se pronunciou sobre as questões de que as autoras carecem de legitimidade para invocar erros e omissões do projecto concursado, já que nunca fizeram qualquer reclamação ao mesmo (art. 13°, do DL 235/86, de 18/8), e de que a ré sempre apresentou reservas em relação aos estudos técnicos apresentados - art. 40° n.º 2, do DL 235/86, de 18/8, do DL (conclusão LVII).
As autoras pronunciaram-se no sentido da improcedência das referidas nulidades. A EMMP nada disse.
Apreciando.
Dispõe o art. 668°, do CPC, que: "1. É nula a sentença:
( ... )
b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
(…)" .
d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (...);".
A nulidade prevista na 1ª parte da al. d) do n.º 1 deste art. 668° relaciona-se directamente com estatuído no art. 660° n.º 2, do CPC, nos termos do qual "O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dadas a outras. (...).".
A sentença de fls. 2170 e ss. não padece das apontadas nulidades, pelas razões a seguir enunciadas.
No que respeita aos fundamentos supra enunciados sob os n.ºs 1) a 4) [com excepção da parte final], improcedem os mesmos, pelas razões a seguir enunciadas.
Está em causa matéria de excepção que não é de conhecimento oficioso. Assim sendo, a mesma apenas poderia ser arguida na contestação (art. 489° n.º 2, do CPC), o que veio a ocorrer quanto à excepção referida em 1) e 2), a qual foi decidida no despacho saneador, o qual já transitou em julgado, ou seja, inexiste, neste parte, qualquer omissão de pronúncia.
Quanto à excepção a que se alude em 3) e 4), 1ª parte, não foi a mesma alegada na contestação, pelo que, estando vedada a sua arguição em articulado posterior (art. 489° n.º 2, do CPC), não incorreu a sentença em nulidade ao não conhecer da mesma, já que tal conhecimento estava-lhe vedado.
Acresce que a decisão recorrida se encontra fundamentada, conforme decorre de fls. 2174 e ss., assentando a condenação da ré no disposto no art. 31° n.° 1, do DL 235/86, de 18 de Agosto (cfr. fls. 2200 - último parágrafo do ponto 6).
Igualmente improcede a alegação de que a sentença é nula já que não se pronunciou sobre a questão de que ré sempre apresentou reservas em relação aos estudos técnicos apresentados, pois - para além da ré, nas respectivas alegações de direito, nos termos do art. 657°, do CPC (cfr. ponto 146), referir que se trata de matéria que nem sequer releva para a decisão da causa - está em causa apenas um argumento jurídico expendido pela ré, sendo certo que a omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas, entendendo-se por questões os problemas concretos a decidir (in casu a questão em causa é a imputação das indemnizações pagas no aglomerado populacional denominado de "…") e não simples argumentos expendidos pela parte em defesa da sua posição, por o juiz ser livre na interpretação e aplicação da lei.
Mesmo que assim não se entenda, sempre improcederia nesta parte a alegação de que a sentença proferida nos autos é nula, já que nesta afastou-se este argumento jurídico, pois aí se escreveu que:
"Quanto a esta questão, cumpre ainda salientar que não se aplicam os arts. 13º, 25º n.º 2, al. b), 26º ou 40º, do D L 235/86, de 18/8, já que estes tratam de realidades distintas - erros ou omissões de trabalhos e do mapa de medições, trabalhos para evitar danos nos prédios vizinhos, ocupações provisórias e erros de concepção da obra -, pois a quantia de 94 060 000$00 visa possibilitar uma ocupação definitiva de prédios vizinhos." (sublinhado ora efectuado) (cfr. fls. 2200).
Pelo exposto, e uma vez que não assiste razão à ré, mantém-se na integra a sentença recorrida (art. 744º n.º 1, ex vi art. 668, n.º 4, ambos do CPC)».
1.11. O EMMP emitiu o seguinte parecer:
«1. Quanto ao recurso da Ré – E.P. ..., SA (fls. 2273 a 2329) importa referir que para além de uma quase repetição das alegações de direito antes apresentadas na 1ª instância a fls. 2576/2613 apenas se acrescenta que a sentença recorrida será nula por não se ter pronunciado sobre determinadas questões e não especificando os fundamentos de facto e de direito que levaram à decisão de outras havendo, assim, que tirar as consequências previstas no art. 668° do C.P.C..
1.1. No despacho de fls. 2431 a 2433 a Exmª. Juíza respondeu, ponto por ponto, às questões levantadas sendo que concordamos integralmente com tudo o ali expendido Na verdade, basta ler o douto Ac. deste STA de fls. 1722 a 1760 (XII volume) e a sentença recorrida para se chegar à conclusão de que o recurso não tem qualquer fundamento tanto mais que não vem questionada a matéria de facto dada como provada em concreto e que levou ao apuramento do montante da indemnização (vide conclusões do recurso de fls. 2313 a 2330).
2. Quanto ao recurso subordinado interposto pelas AA e que incide sobre a ocupação/não ocupação do Campo de Futebol “…” e data da contagem do pagamento de juros, concordamos com as contra-alegações da R. E.P – ..., SA as quais se encontram juntas de fls. 2334/51 (XV volume). Com efeito, mesmo que fosse executado o projecto concursado era possível não ocupar o referido “Campo de Futebol” e aqui o projecto variante nada acrescentou em termos de economia de custos, sendo que não se vislumbram razões válidas para que este STA altere a matéria de facto dada como provada.
3. Como assim, somos de parecer que os recursos não merecem provimento devendo manter-se, na íntegra, a sentença recorrida».
1.12. Notificadas as partes do parecer do MP, só a recorrente subordinada se pronunciou, manifestando-se a favor do mesmo, na parte em que é contrário ao recurso principal, e em seu desfavor, na parte em que é contrário ao seu próprio recurso.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
2.
2.1. A matéria de facto assente na sentença foi a seguinte:
«A) Por anúncio datado de 8 de Março de 1994 e publicado na III Série do Diário da República n° 66, de 19 de Março de 1994, a “Junta .... — J....” lançou a concurso público a empreitada de construção do “IC ....-Circular ...., Lanço ... — ... e a Ligação de ... ao ...”.
B) A empreitada foi por série de preços, conforme decorre do n° 13.01.1 das Cláusulas Especiais do correspondente Caderno de Encargos.
C) O objecto da empreitada consistiu, basicamente, na construção do IC ... — C..... entre o Nó de ... inclusive e o Nó de ... exclusive numa extensão de 3.952m, com inclusão de uma ligação a ... com cerca de 1.400m através dos Nós do ... e de ... do IC ..., incluindo-se neste último lanço 5 nós desnivelados designados de, respectivamente, Nó de ..., Nó de ..., Nó de ..., Nó com a Futura Via Norte-Sul e Nó de ..., conforme resulta do n° 13.05.01 do Caderno de Encargos, cujo programa e projecto foram aprovados pela Lei n° 39-B/94 de 27 de Dezembro (Orçamento de Estado de 1995).
D) O respectivo prazo inicial foi fixado em 700 dias a contar da data da consignação dos trabalhos – n.° 13.01.03.1 do Caderno de Encargos.
E) De acordo com o n.° 13.01.21, do Caderno de Encargos, o prazo de garantia foi fixado em 2 anos, e, no caso específico de serem implementadas técnicas inovadoras sob proposta do adjudicatário, determinava que ter-se-ia em consideração o disposto no artigo 13.02.10.
F) As AA. apresentaram oportuna e atempadamente a sua proposta, devidamente documentada e instruída de harmonia com o programa de Concurso, na qual propuseram um valor de Esc.: 12.596.000.000$00 com acréscimo de IVA.
G) O acto do Concurso público foi realizado em 15/06/94.
H) A empreitada foi adjudicada às AA. por despacho de 07/03/1995 pelo valor de Esc.: 12.594.650.301$00 com acréscimo de IVA, o qual lhes foi notificado por via do oficio 793 de 30/03/1995 da J....
I) A minuta do contrato de empreitada de obras públicas foi aprovada por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas proferido em 07/03/95 e visado previamente pelo Tribunal de Contas em 02/05/95 sob o registo n°3.... de 26/04/95.
J) O contrato de empreitada foi celebrado em 09/05/95 entre a J..., como dona da obra, e as firmas adjudicatárias, ora autoras, entretanto associadas em Consórcio externo, tendo-lhe sido atribuído o n° 7/95 da D.S.C. da J....., em cuja cláusula 1ª se estipulou que as firmas adjudicatárias se obrigavam a cumprir o Caderno de Encargos, que era parte integrante do referido Contrato.
L) No projecto concursado encontrava-se prevista a execução, como parte integrante da empreitada, dos dois “Túneis do ...”, afastados entre hasteais ou vãos de 19m e com uma extensão de 520m de comprimento.
M) As AA. entenderam elaborar um projecto variante à execução dos dois túneis do “...”.
N) Assim, o projecto variante ao processo de execução, embora respeitando a geometria inicial dos dois túneis, concebeu-os de uma forma nivelada e geminada, dotada de um hasteal central comum com um afastamento de apenas 2m, prevendo que o método construtivo fosse executado em toda a extensão dos túneis em “cut and cover” ou a céu aberto (método que consiste na abertura de uma escavação provisória, construção do túnel a céu aberto e posterior aterro do túnel), eliminando-se a perfuração horizontal prevista no projecto concursado.
O) A solução preconizada pelo projecto variante conduzia a uma vantagem económica considerável e assegurava o cumprimento do prazo de execução contratualmente previsto.
P) E transformava toda essa zona, delimitada pelos dois emboquilhamentos, numa empreitada em regime de preço global.
Q) Nesta sequência, em 14/06/95, as AA. através da sua carta A.... e tendo em consideração que à data decorriam as expropriações e desalojamento de um conjunto de edificações no Bairro do ... correspondente à zona de implantação dos túneis, propuseram à J..... o referido projecto variante.
R) Através do ofício n° 7/08/003, de 14/07/95, a J..... informou as AA. que, por via de despacho proferido pelo Director dos Serviços de Construção, o projecto variante não havia sido tomado em consideração, em virtude de em 14/06/95 a obra ainda não ter sido consignada.
S) De novo, as AA., por via da respectiva carta de 21/07/95, n° A...., propuseram à J... o invocado projecto variante à execução dos túneis do “...”.
T) Ao longo de 11 meses e através das cartas de 26/07/95, 30/11/95 e de 04/06/96, as AA. apresentaram à J... diversos elementos documentais adicionais de esclarecimento e pormenorização do seu projecto variante.
U) Através do ofício n° 7/8/092/96, de 05/07/96, o Dono da Obra comunicou às AA. a aprovação do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., nos seguintes termos (pressupostos e condições):
“ (...) por despacho da Presidência da J... de 96/07/04, foi aprovado o Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., apresentado pela vossa carta A... de 96/06/04.
Recordamos que o Projecto Variante aprovado substituiu o anteriormente proposto através das cartas A... de 95/07/21, A... de 95/07/26 e A... DE 95/11/30.
De acordo com o despacho atrás citado, deverão ser tomados em consideração os seguintes pressupostos:
1- Em caso de necessidade de ocupação de terrenos fora do limite inicial de expropriação, o Consórcio deveria comprometer-se a executar obras de contenção não previstas ou obter autorização escrita dos proprietários para a utilização dos terrenos, devendo estar sempre salvaguardada a necessidade de, por razões de segurança, proceder a realojamentos, definitivos ou provisórios, das habitações cuja estabilidade possa estar em risco devido à escavação para a construção dos túneis.
2 - Não foi aceite a proposta de alteração da fórmula de revisão de preços prevista no Caderno de Encargos para o cap. 9 — Túneis, feita ao abrigo do art° 2 — ponto 2 do Decreto – Lei 348-A/86 de 16 de Outubro, tendo em consideração o art°.1° – ponto 1 do mesmo decreto, uma vez que o referido artigo permite a alteração da fórmula de revisão de preços se solicitado em Variantes apresentadas a concurso, o que não é o caso.
3 — Deverá se tida em consideração a drenagem de águas acumuladas na frente nascente - poente em sentido descendente, dado que o escoamento se fará no sentido da frente de trabalho.
4 — O texto da rubrica 9.2.29, integrante da Proposta Variante, deverá ser idêntico ao da rubrica 9.2.29 concursado, isto é:
9.2.29 - “Moldes curvos aplicados no desenvolvimento das galerias a céu aberto, incluindo cimbre e escoramentos necessários e todos os transportes, desmoldagem, limpeza e operações acessórias e complementares, ficando as superfícies após a desmoldagem em condições de receberem os acabamentos”.
5 - À medida que os trabalhos de escavação foram progredindo, o Consórcio deverá ir executando atempadamente as obras de construção/estabilização dos taludes que forem julgadas convenientes, que deverão ser previamente submetidas à aprovação da fiscalização.
O faseamento das escavações deverá garantir que nenhum talude seja escavado sem que o talude superior seja examinado e, eventualmente, tratado, por forma a garantir convenientemente a sua estabilidade.
6 - No que respeita à concepção das galerias, tal como no projecto base entregue em 1995, continua a não ser apresentada qualquer justificação para a geometria encontrada para as abóboras, aspecto este particularmente importante em obras desta natureza.
Verifica-se igualmente que foi efectuada a eliminação da laje de fundo, considerando-se a admissibilidade de elevadas tensões nas sapatas de fundação, que chegam a atingir 14 Kglcm2.
Para as presentes alterações não são dadas quaisquer justificações, nem apresentados dados claros que justifiquem a segurança das novas concepções adoptadas.
No que respeita aos princípios de cálculo, apesar de na reunião efectuada a quando da entrega da reformulação do “Projecto Base”, o projectista ter referido que se tinha tido em conta o critério de dimensionamento das acções dos solos de aterro (situados portanto sobre a abóbada) como cargas totalmente verticais, da análise do processo entregue tal não resulta minimamente claro.
Deverá o Consórcio proceder ao devido esclarecimento destas questões.
7 - A redução de custos permitida pela variante ascende a 1.236.303.646$00 (após correcção). No entanto, e tendo em conta o método construtivo proposto (“Cut and Cover’), toma-se necessário proceder à expropriação adicional de 2 faixas de terreno ao longo de toda a extensão dos túneis para possibilitar a execução da escavação provisória.
O custo dessas expropriações acrescidas é de 535.325.500$00.
Em sequência, a redução de custos associada à Variante aprovada é de 1.236.303.646$00-535.325.500$00, o que perfaz 700.978.146$00, revertendo 50% desta verba para o Estado e 50% para o consórcio adjudicatário, no montante de 350.489.073$00, de acordo com a legislação em vigor.
Na sequência da aprovação da Revisão do Projecto Base Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., atrás citada, deverá o Consórcio entregar o respectivo Projecto de Execução”.
V) Por via da carta A..., de 21/08/96, as AA. comunicaram à J... a sua posição no que se refere às aludidas condicionantes, nos seguintes termos:
“Acusamos a recepção da vossa carta 7/8/092/96 de 96.07.05 na qual nos era comunicada a aprovação pela Presidência da J... do projecto em epígrafe.
Tal aprovação é no entanto acompanhada de alguns pressupostos dos quais dois nos merecem alguns comentários. Assim:
a) Parece-nos desejável que seja mantido o principio definido no ponto 1 da mesma, isto é, caso seja necessário ocupar terrenos fora do limite de expropriação, as despesas resultantes de realojamentos definitivos ou provisórios das habitações cuja estabilidade possa estar em risco devido à escavação para construção dos túneis, bem como a execução de obras de contenção não previstas, deverão ser consideradas como custos acrescidos da variante e portanto subtraídas ao valor global da redução de custos permitida pela mesma.
b) Relativamente ao ponto 7, é nosso entendimento que os custos das expropriações dos terrenos deverão ser considerados como custo da variante e portanto deduzidos à redução de custos dela decorrentes, uma vez que os referidos terrenos ficarão a pertencer ao património da J.... Julgamos pois haver necessidade de subdividir o custo de 535.325.500$00 de forma a separar claramente expropriações de terrenos das expropriações de habitações e indemnizações para realojamentos.
Parece-nos assim que o valor a deduzir à redução de custos da variante deverá ser apenas o referente a expropriações de habitações e indemnizações para realojamentos.
Por outro lado e dado que no projecto inicial dos Túneis já eram previstas expropriações de habitações e indemnizações para realojamentos, o valor agora a considerar deverá ser apenas o resultante dessa diferença”.
X) Perante o silêncio da J..., as AA., por via da carta A..., de 21/11/96, solicitaram ao dono da obra a entrega de uma planta de onde constassem claramente identificados os terrenos a expropriar na versão do projecto concursado e os terrenos a expropriar no projecto variante, a fim de que ficassem esclarecidas as verbas indemnizatórias invocadas no of. N° 7.... de 05/07/96.
Z) Através do ofício n° 7...., de 27/02/97, a J... enviou às AA. a requisitada planta, tendo-as informado que apenas a partir do P.K. 1 + 675 os limites de expropriação coincidiam em ambas as versões, a concursada e a variante, porquanto no emboquilhamento nascente já se encontrava prevista desde o início a escavação a céu aberto.
AA) Por via desse mesmo ofício, mais informou a J... que o valor entretanto apurado para fazer face às referidas expropriações adicionais se havia reduzido para Esc.: 528.805 500$00.
AB) Através do oficio n° 7/8...., de 06/02/98, a J..., reportando-se à carta das AA. datada de 21/08/96, comunicou-lhes que, por via do despacho de 03/07/97 da Presidência daquela Junta, foi decidido que o custo de Esc.: 70.215.000$00 proveniente das expropriações dos terrenos que constituíram o acréscimo de área necessária à implementação do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ... não seria deduzido à vantagem económica desta última resultante, porquanto os terrenos em causa integrar-se-iam no património do dono da obra.
AC) Por via desse mesmo oficio a J... informou as AA. que:
“Também através do mesmo despacho foi decidido manter o ponto 1 do n/ oficio nº 7/8... de 96.07.05 não tendo sido aceite, por conseguinte, a pretensão de V. Exas. manifestada na alínea a) da v/ carta A.... de 96.08.21.
Neste sentido, e na sequência da entrega à J..., em 97.02.10, da versão final do “Projecto de escavação e aterros entre os km 1+270 (emb. poente) e 1+660 — alteração”, e após análise do teor da parte escrita do mesmo, nomeadamente das suas páginas 16, 17 e 18, verificou-se a necessidade de proceder a realojamentos e indemnizações autónomas adicionais. Assim, foi decidido, através de despachos da Presidência da J... de 97.07.16 e 97.12.16, deduzir à verba devida ao Consórcio adjudicatário os encargos resultantes das expropriações e indemnizações do aglomerado habitacional denominado “…”, da indemnização paga ao Sr. C… e da verba a pagar pela J... devido ao realojamento de 3 famílias que habitavam na mesma zona.
Assim sendo, o apuramento da verba a pagar ao Consórcio, resultante da vantagem económica associada à aprovação do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., é constituído da seguinte forma:
a) Redução de custos associada à Variante 1.236.303.646$00
b) Expropriações a deduzir 394.090.500$00
c) Indemnizações autónomas a deduzir 64.500.000$00
TOTAL. 777.713.146$00
(O valor dos terrenos a suportar pela J..., não incluídos nestas 3 alíneas, é de 70.215.000$00)
d) Parcela a reverter para o Consórcio (50% do total) 388.856.573$00
e) indemnizações autónomas da “… (a deduzir) 70.000.000$00
f) Indemnização autónoma paga ao Sr. C… (a deduzir) 5.000.000$00
g) Custo dos 3 realojamentos (a deduzir) 16.500.000$00
TOTAL final da parcela a reverter para o Consórcio 297.356.573$00

Face aos processamentos já efectuados (3 prestações no total de 250.000.000$00), e na sequência do despacho da Presidência da J... de 97.12.16, a verba remanescente 47.356.573$00 será paga com a conclusão definitiva dos trabalhos relativos ao Projecto Variante aprovada.”.
AD) Perante tal posição expressa pela J..., as AA. solicitaram àquele ente público, através da carta A...., de 10/03/98, que:
“Em sequência de conversa havida entre V. Exa. e o nosso Administrador Dr. …, vimos com a presente solicitar que nos sejam facultados os seguintes elementos, para podermos dar continuidade ao estudo que estamos a elaborar, relativo ao processo da economia dos Túneis do ...:
1) Planta com as áreas bem definidas das parcelas que foram expropriadas e/ou indemnizadas;
2) Cópias dos contratos e escrituras havidas, a que correspondem os valores indicados no oficio de V. Exas, ref. 7/8.... de 98/02/06;
nomeadamente:
a) Expropriações a deduzir 394.090.500$00
b) Indemnizações autónomas a deduzir 64.500.000$00
e) Indemnizações autónomas da “…” 70.000.000$00
d) Indemnização autónoma paga ao Sr. C… 5.000.000$00
e) Custo de 3 realojamentos 16.500.000$00
3) Dos elementos que dispomos, o valor total das indemnizações atingiu 550.090.500$00, contra 70.215.000$00 das expropriações concretas dos terrenos.
A diferença de valores é muito significativa e distorcida, já que a primeira verba, segundo o critério unilateral de VExas, será suportada numa parte significativa pelo Consórcio e a segunda verba, de reduzido valor, será suportada totalmente pela J..., que ficará em contrapartida na posse dos terrenos;
4) Solicitamos esclarecimentos quanto ao critério adoptado pela J... no que respeita às verbas referidas nas alíneas e), f), g) do vosso ofício 7/S..., diferente do que foi seguido nas expropriações anteriores;
5) Não podemos deixar de estranhar que, nas negociações com as expropriações/indemnizações que envolveram centenas de milhar de contos, não terem estado presentes ou terem previamente sido consultados representantes do Consórcio e os seus valores nos terem sido apresentados como facto consumado, o que não poderemos aceitar.
6) Não entendemos a diferença entre o valor dos terrenos a suportar pela J... e o das restantes expropriações e/ou indemnizações, pelo que nos sentimos fortemente lesados, situação em que, naturalmente, não poderemos concordar;
7) Estamos a analisar e avaliar as economias verificadas no Campo de Futebol “…”, com a execução da Variante, as quais deverão ser consideradas no conjunto global como economia trazido pela referida Variante;
8) Em princípio não estamos dispostos a concordar com os números indicados por V. Exas., já que foram obtidos de uma forma unilateral, sem conhecimento do Consórcio. Para uma tomada de posição, iremos analisar todos os elementos solicitados nos pontos 1), 2) 3) e 4) desta carta, recorrendo eventualmente ao apoio de um consultor especializado nestes assuntos”.
AE) Perante o silêncio da J..., as AA., por via da sua carta A...., de 05/08/98, insistiram pela satisfação do solicitado na sua carta de 10/03/98, o mesmo sucedendo por via da carta A.... de 12/10/98.
AF) Os trabalhos de construção e execução dos Túneis do ... concluíram-se em 20 de Maio de 1998.
AG) Por via do oficio no G.... de 04/11/98, a J... respondeu à carta das AA. referida em AD), nos seguintes termos:
“Na sequência da recepção da carta A... de 98.03.10 foi elaborada a informação G...., de 98.07.20 que mereceu despacho favorável, pelo que, conforme solicitado por V. Exas., junto enviamos cópia da Planta de Expropriações onde foram definidas as áreas das parcelas que foram expropriadas e/ou indemnizadas, assim como cópia dos contratos e escrituras havidas a que correspondem os valores indicados. Para dar resposta ao solicitado pelo Consórcio, foi criado o seguinte quadro onde se descriminam todas as verbas envolvidas:
Verba   
Valores conforme
informação
7/8/23/97 de 97.12.05    Verba final agora apurada

Redução custos
associada à Variante    1.236.303.646$00    1.236.303.646$00
1    Expropriação a deduzir    394.090.500$00    394.090.500$00
2    Indemnizações
autónomas a deduzir    64.500.000$00    69.500.000$00

Total    777.713.146$00    772.713.146$00
3    Valor dos terrenos a
suportar pela J..., não
incluídos nas alíneas
supra referidas    70.215.000$00    70.215.000$00

Parcela a reverter para o
Consórcio (50% total)    388.856.573$00    386.356.573$00
4    Indemnização autónoma
“…”    70.000.000$00    70.000.000$00
5    Indemnização autónoma
Sr. C…    5.000.000$00    5.000.000$00
6    Custo 3 realojamentos a pagar a C.M. ....
conforme protocolo    16.500.000$00    16.000.000$00
7    Indemnização autónoma
(armazém e garagem)    -    3.060.000$00

Total final da parcela a
reverter para o Consócio    297.356.573$00    292.296.573$00

Como se pode verificar pela consulta do já referido quadro, a verba a reverter para o Consórcio Adjudicatório é de 292.296.573$00 e não de 297.356 573$00 como havia sido indicado no nosso ofício 7/8/043/98 de 98.02.06.
Face ao processamento já efectuado (Esc. 250.000.000$00 pagos em 3 prestações), foi decidido superiormente que com a conclusão definitiva dos trabalhos da Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ... seja paga a verba final de Esc. 42.296.573$00 ao Consórcio.”.
AH) Conjuntamente com esse oficio, a J... anexou a base do cálculo justificativo do valor da expropriação dos terrenos a suportar por si (verba n.° 3), tendo atribuído o valor de 5.000$00/m2 para as referidas expropriações e considerada uma área de 14.541 m2, correspondente às faixas suplementares de terreno sombreadas na correspondente planta, apresentado o resultado final de 72.705.000$00, de acordo com esse anexo.
AI) O valor de Esc.: 394.090.500$00 constante do oficio mencionado em AG) – verba n.° 1 -, segundo a J..., apresenta as seguintes origens e imputações:
Parcela de Terreno Nº     Valor da Expropriação de Edifícios, benfeitorias, Culturas Agrícolas e de Terrenos    
Beneficiário    Data
de
Pagamento
a) 2066     3.000.000$00     …    Segunda e última prestação paga em 01/10/96
b) 2067     1.500.000$00     …    Segunda e última prestação paga em 14/12/95
c) 2097     3.500.000$00     …    03/10/96
d) 2050     70.000.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 13/12/95
e) 2093     36.000.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 18/10/95
f) 2094     40.000.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 27/10/95
g) 2098     28.000.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 27/10/95
h) 2099     40.000.000$00     …    Segunda e última prestação paga em 28/10/95
i) 2100     61.148.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 18/10/95
j) 2101     47.032.500$00     …    Segunda e última prestação paga em 18/10/95
k) 2102     51.460.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 18/10/95
1) 2059.1     12.450.000$00     …     Segunda e última prestação paga em 13/10/95

AJ) A alteração do método construtivo referida em N) – eliminação da perfuração horizontal prevista no projecto concursado – determinou que, por mero efeito da escavação, a área inicialmente delimitada pela J... para efeitos de expropriação fosse ampliada, tendo abarcado as 12 parcelas de terreno mencionadas em AI), anteriormente não previstas.
AL) As parcelas n.°s 2066, 2067, 2097, 2050, 2093, 2094, 2098, 2099, 2100, 2101, 2102 e 2.059.1, citadas em AI), têm a área de 122m2, 219m2, 207m2, 505m2, 300m2, 300m2, 240m2, 250m2, 290m2, 305m2, 300m2 e 126m2, respectivamente.
AM) A J... acordou e arbitrou as indemnizações referidas em AI) sem a presença, o acordo e o conhecimento das AA..
AN) A J..., ainda por via do invocado oficio n° GE 4/1/119, de 04/11/98, informou as AA. que à redução do custo emergente da Variante ainda haveria que abater a importância de Esc.: 69.500.000$00 a título de indemnizações por realojamentos de agregados familiares que residiam nas parcelas de terreno onde seriam construídos os Túneis do ..., cujos autos de indemnização por essa via disponibilizou e que correspondem aos seguintes valores:
Parcela de terreno nº     Interessado realojado     Valor da indemnização     Data de pagamento
a) 2.050     …    5.500.000$00     03/10/95
b) 2.094     …    5.000.000$00     04/10/95
c) 2.099     …    5.000.000$00     04/10/95
d) 2.100     …    5.000.000$00     04/10/95
e) 2.101     …    5.500.000$00     04/10/95
f) 2.101     …    6.000.000$00     04/10/95
g) 2.101     …    5.000.000$00     04/10/95
h) 2.102     …    5.500.000$00     04/10/95
i) 2.102     …     5.000.000$00     04/10/95
j) 2.102     …    5.000.000$00     04/10/95
k) 2.102     …    5.500.000$00     04/10/95
1) 2.102     …    5.500.000$00     04/10/95
m) 2.102     …    6.000.000$00     04/10/95

AO) A J..., no oficio referido em AG), invocou que a importância de Esc.: 94.060.000$00 (verbas 4 a 7), de harmonia com os correspondentes autos de indemnização, respeitava a compensações atribuídas a particulares lesados que ocupavam um conjunto de edificações – que se agrupavam à volta do estabelecimento comercial conhecido como “…” – localizadas na zona do emboquilhamento Poente, dos Túneis do ..., nos seguintes termos:
Parcela de terreno nº     Interessado indemnizado     Proveniência da indemnização     Valor da indemnização    Data de pagamento
a) 2.025.2     …    Desocupação do complexo comercial e habitacional denominado “…”    60.000.000$00     28/05/97
b) 2.025.2     …    Desocupação de estabelecimento de pronto a vestir     5.000.000$00     28/05/97
c) 2.025.2     …     Desocupação de estabelecimento de cafetaria     5.000.000$00     28/05/97
d) 2.015.2     C…    Desocupação de barraca de habitação     5.000.000$00     28/07/97
e) 2.025.2     …, … e …     Realojamento de 3 agregados familiares     16.000.000$00     09/05/97
f) 2.025.2     …    Desocupação de garagem     400.000$00     10/07/97
g) 2.025.2     …    Desocupação de edifício destinado a depósito de produtos hortícolas para venda em feiras     2.560.000$00     10/07/97

AP) Em 20/11/98 as autoras enviaram ao dono da obra duas cartas: uma com a referência A...., do seguinte teor:
“Reportamo-nos ao ofício de V. Exas. G.... de 98.11.04 que mereceu a nossa melhor atenção.
Estamos a analisar os elementos que nos foram enviados em anexo ao referido oficio e oportunamente voltaremos ao contacto com V. Exas. para pedir mais esclarecimentos dentro do âmbito global da avaliação da economia objectiva”.
AQ) E outra com a referência A..., do seguinte teor:
“ (...) A determinação da economia efectiva verificada está a ser avaliada pelo Consórcio, de forma a se atingir um valor equilibrado e justo.
O processo é complexo, mas estamos certos que chegaremos a uma solução equilibrada e justa.
A J... apresentou em 98.11.04 o último valor do benefício que reverteria para o Consórcio, correspondente a uma verba de 292.296.573$00, da qual já foi liquidada 250.000.000$00.
A verba remanescente de 42.296.573$00 seria liquidada com a conclusão definitiva dos trabalhos relativos ao Projecto Variante, que se encontram concluídos. Independentemente do valor final a atingir entre as partes, vimos solicitar que seja liquidada a verba de 42.296.573$00 relativa ao remanescente do valor global indicado unilateralmente por V Exas.
O recebimento daquela importância não implica a aceitação por parte do Consórcio do valor indicado, sendo este obtido numa tentativa de análise conjunta entre as partes.” (...)”.
AR) Em 08/02/99 o dono da obra dirigiu às autoras o oficio com a referência 462/99, do seguinte teor:
“Em resposta à v/ carta A.... de 98/11/20, informamos que registámos a discordância de V. Exas. quanto à verba apurada como economia decorrente do projecto variante citado em epígrafe.
No entanto, e como até ao momento não foram recebidos quaisquer elementos concretos que suportem fundamentalmente essa discordância, comunicamos a V. Exas. que damos o assunto por encerrado, mantendo o valor apurado que consideramos justo e equilibrado.
Tendo esta realidade em consideração e atendendo a que a metodologia adoptada foi aprovada por despacho do Sr. Presidente da J... de 97/12/16, não se vê inconveniente em se proceder ao pagamento da verba remanescente da economia, no valor de 42.296.573$00.”.
AS) Em 18/02/99 as autoras enviaram ao dono da obra a carta com a referência O...., do seguinte teor:
“Reportamo-nos ao ofício de V. Exas. ref. 462/99 de 99/02/08 que mereceu a nossa melhor atenção.
Vimos informar que estamos a preparar um processo de apuramento da economia verificada, que oportunamente enviaremos a V. Exas., atenta a complexidade do mesmo.
Embora a metodologia tenha sido aprovada por despacho do Sr. Presidente da J..., ficamos surpreendidos porque, sendo o Consórcio parte integrante e interessada no processo, não tenha sido consultado para opinar sobre a referida metodologia e esta tenha sido determinada e aprovada sem o seu conhecimento.
Não podemos concordar com o encerramento deste assunto, feito de uma maneira unilateral por V. Exas., por não considerarmos que os valores que indicaram sejam justos e equilibrados. A razão de demora da nossa parte é resultante da pouca clareza e transparência dos valores apresentados por V. Exas., que nos tem obrigado a aprofundar o assunto para tentar encontrar uma solução correcta.
Lamentamos verificar que V. Exas. consideram neste momento atraso na nossa resposta, quando só decorreu um pequeno prazo de tempo e esquecem que os nossos pedidos de esclarecimento às respostas de V. Exas. só vieram passados dezoito meses no primeiro pedido e oito meses no último pedido.
É oportuno indicar que a própria J... informou ao Consórcio diferentes valores da economia o que mostra confusa a situação e torna indispensável o aprofundamento a que estamos a proceder.
Contamos entregar o processo durante o próximo mês de Março, com todos os elementos concretos, os quais ainda não foi possível apresentar pelos motivos acima referidos, que não nos são imputáveis.
AT) Em 22/02/99, o dono da obra dirigiu às autoras o ofício com a referência 604/99, dessa data, do seguinte teor:
“Reportamo-nos à carta O.... de 99/02/18, que mereceu a n/ melhor atenção e que, perante o seu teor, nos merece desde já alguma réplica.
Para além de outras afirmações que só ao consórcio responsabilizam, importa desde já esclarecer que os valores da economia aprovados não evoluíram ao longo do tempo; antes foram sendo calculados (de acordo com uma metodologia inalterada) de forma mais rigorosa à medida que se conhecem os valores exactos das várias parcelas que concorrem para o apuramento desta verba.
A título de mero comentário devo referir que não tencionámos acusar V. Exas. de atraso em qualquer resposta. Simplesmente constatámos a ausência de fundamentação da discordância repetidamente anunciada por V. Exas. no que respeita ao apuramento da verba relativa à economia decorrente do Projecto Variante ao método construtivo dos Túneis do ....”.
AU) Por via da carta A.... de 01/03/99, as AA. comunicaram à J... que durante o mês de Março, então decorrente, lhe entregariam o dossier referente à análise e cálculo da economia verificada no Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ....
AV) Através da carta A.... de 31/03/99, as AA., em cumprimento do prometido, entregaram à J..., em triplicado, o dossier de apuramento da economia verificada no Projecto Variante de execução dos Túneis do ..., que encerra no seu teor o confronto comparativo entre o Projecto Variante e o Projecto Oficial concursado, e no qual defendiam que:
- O método variante à construção dos Túneis do ... permitiu à J... economizar o valor de 206.500.000$00 pelo facto de ter sido possível evitar a interferência com o recinto desportivo do Clube …, economia que deveria ser considerada pela J... no cômputo geral da economia a apurar com o projecto variante;
- O custo a abater à vantagem económica emergente do projecto variante, resultante da expropriação das 12 novas parcelas de terreno referidas em AJ), ascende a 263.367.000$00;
- A verba despendida pela J..., no valor global de 94.060.000$00, constante do oficio da J... ref. G...., de 4/11/98, alíneas 4, 5, 6, 7, não deverá ser considerada como custo da variante, já que os desalojamentos em causa já eram indissociáveis da execução dos túneis na versão concursada, devendo tal valor ser retirado na sua totalidade do apuramento global da economia da variante.
AX) Dado que o Dono da Obra não manifestou qualquer posição sobre a pretensão das A.A., estas últimas, através da carta A...., de 09/07/99, endereçada ao I..., renovaram a sua anterior pretensão.
AZ) Mantendo-se a situação de inércia do I..., as AA. renovaram, uma vez mais, a sua pretensão através da carta O..., de 27/10/99.
BA) O dono da obra, agora já o I..., respondeu pelo ofício com a refª l..., de 11.11.99, nos seguintes termos:
“Com a carta acima referida apresentaram V. Exas., uma avaliação da economia decorrente da variante ao método construtivo dos Túneis do ... para o qual solicitaram a nossa apreciação.
Após essa apreciação, informamos V. Exa. que a referida avaliação não merece a nossa concordância pelo que mantemos integralmente a nossa posição sobre este assunto que oportunamente vos foi comunicada.
Assim, reafirmamos que a economia global decorrente da variante ao método construtivo dos Túneis do ... foi avaliada em ESC: 777.713.146$00, sendo de ESC: 292.356.573$00 o valor a atribuir ao Consórcio na sua qualidade de autor da variante. Uma vez que até à data já foi paga a quantia de ESC; 290.000.000$00, o remanescente, no valor de ESC: 2.356.573$00, encontra-se à vossa disposição, aguardando apenas que V. Exas. nos manifestem a intenção de o receber (...).”.
BB) Através do oficio n° 2....)), de 07/12/99, o I... reiterou a metodologia e as condicionantes subjacentes para o apuramento da vantagem económica emergente do Projecto Variante estabelecida pela J... no respectivo oficio n° 7/8/092 de 05/07/96, o que afirmou ter apoio legal nos art°s. 40° e 41° do D.L. n°235/86 de 18 de Agosto.
BC) Quanto ao processo expropriativo, o I..., no referido ofício, informou que as A.A. não só nele não participaram porque o não requereram, como não também teriam de participar, porquanto se não enquadravam no conceito de parte interessada definido no art°. 9° do D.L. no 438/91 de 9 de Novembro que aprovou, o então em vigor, Código das Expropriações.
BD) No que às indemnizações e expropriações ocorridas na Zona do Emboquilhamento Poente dos Túneis do ... concerne, o I... entendeu que o correspondente valor de Esc.: 94.060.000$00 deveria constituir um encargo adicional do Projecto Variante e a abater na íntegra à parcela da economia a reverter a favor das A.A., já que essa situação era enquadrável no preceituado no n°2 do art°. 40° do D.L. 235/86 de 18 de Agosto.
BE) Nesse oficio o I... formulou as seguintes conclusões:
“1. O dono da obra associou à aprovação da variante apresentada pelo Consórcio um conjunto de pressupostos ou condições referentes às obrigações e responsabilidades do Consórcio bem como a metodologia de cálculo do valor da economia dela emergente;
2. O dono da obra, com base nessa metodologia que foi aprovada, da qual nunca se afastou, foi sempre comunicando ao Consórcio os valores, sempre estimados, a que ia chegando, à medida em que o processo das expropriações avançava ou eram conhecidos novos dados (v.g. indemnizações autónomas);
3. Com base nesse método aprovado, o dono da obra apurou, a final, como valor total final da parcela da economia a reverter para o Consórcio, o montante de Esc.: 292.296.573$00”.
BF) Perante semelhante tomada de posição, as AA., por via da carta A...., de 30/12/99 endereçada ao I..., comunicaram-lhe que discordavam da correspondente interpretação, relativamente à qual, a breve trecho, teceriam os adequados comentários, tendo simultaneamente formulado a reserva dos correspondentes direitos.
BG) Por carta A...., de 15/05/2000, as AA., historiando cronológica e tecnicamente todos os antecedentes da presente temática, discordaram frontalmente, pelos motivos constantes do documento de fls. 1272 e ss., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da posição expressa pelo I... e mantiveram a sua pretensão inicial, tendo reivindicado a atribuição da quantia de Esc.: 589.718.323$00 a título da parcela da vantagem económica emergente do Projecto Variante, da qual ainda têm a haver a importância de Esc.: 299.718.323$00.
BH) O Projecto Concursado previa que as galerias dos túneis distassem entre si 19m em planta e a galeria Norte teria uma cota de soleira de cerca de 4m abaixo do túnel Sul na Zona do Emboquilhamento Poente.
BI) Já o Projecto Variante diminuiu a distância entre túneis para apenas 2m e nivelou-os a ambos.
BJ) O Projecto Variante assenta em dados objectivos e concretos, designadamente em novas campanhas de sondagens geotécnicas.
BL) A redução de custos permitida pela variante ascendia (sem atender aos custos das expropriações adicionais para a sua execução) a 1.236.303.646$00.
BM) A desocupação do aglomerado habitacional designado por “…” não estava prevista no projecto concursado nem no projecto variante base.
BN) O réu já pagou às autoras, a título de vantagem económica decorrente da execução do Projecto Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., 290.000.000$00.
BO) A execução da parte da empreitada referida em L), segundo o projecto concursado, envolvia uma solução mista em que o emboquilhamento do lado de ..., zona III, com uma extensão de 120m, seria executado pelo recurso ao método “cut and cover” ou a céu aberto.
BP) A execução da parte da empreitada referida em L), segundo o projecto concursado, envolvia uma solução em que:
a) o emboquilhamento do lado do “...”, zona I, com uma extensão de 55m de comprimento seria executado pelo recurso ao método “cut and cover” ou a céu aberto;
b) o trecho central, zona II, com uma extensão de 345m seria executado em perfuração horizontal.
BQ) A zona II a executar em perfuração horizontal apenas contemplava uma cota de recobrimento máxima de 25m.
BR) A solução preconizada pelo projecto variante conferia maior segurança na execução dos trabalhos.
BS) Na área referida em AH) não foram incluídas as parcelas de terreno numeradas sob os n°s 2057A, 2059A, 2098A, 2099A, 2100A e 2102A na invocada planta e cuja propriedade também reverteu a favor da J....
BT) Relativamente às parcelas n°s 2097 e 2050, mencionadas em AI), não foi autonomizado o valor referente à expropriação dos correspondentes terrenos, o qual está incluído no montante global indicado em AI).
BU) E aos terrenos respeitantes às parcelas n.°s 2066, 2093, 2094, 2098, 2099, 2100, 2101 e 2102, também aí referidos, foram pelo dono de obra expropriados à razão de Esc.: 2.500$00/m2.
BV) E da indemnização de 1.500.000$00 conferida à parcela n.° 2.067, 1.095.000$00 destinou-se exclusivamente a compensar a expropriação do terreno.
BX) Os valores padrão e unitários aferidos pelos valores normais de mercado praticados em 1995 são os que se passam a indicar:
Natureza do bem a indemnizar     Preço Unitário
c) Custo de metro linear de muros de alvenaria de tijolo     5.000$00/m.l.
d) Custo do metro linear de muros de betão armado     10.000$00/m.l

BZ) Os valores indemnizatórios para cada uma das seguintes parcelas, referidas em AI), é o seguinte:
Parcela N°     Valor da indemnização por Realojamento
a) 2.050     5.500.000$00
f) 2.094     5.000.000$00
i) 2.099     5.000.000$00
j) 2.100     5.000.000$00
l) 2.102     32.500.000$00.

CA) Os interessados referidos em AO) ocupavam edifícios de génese clandestina.
CB) Por força do Projecto Concursado, a respectiva execução conduziria, inevitavelmente — excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora –, a que a escavação para a construção dos túneis no troço do Emboquilhamento Nascente, localizado entre P.K. 1 + 800 e P.K. 1 + 675, ocupasse no talude esquerdo uma faixa do Campo de Futebol do Clube Desportivo “…”, o que inviabilizaria totalmente a sua utilização pelo período correspondente ao período temporal da construção dos túneis nessa zona.
CC) Acresce que, após a execução da obra e caso tivesse ocorrido a ocupação de uma faixa do Campo de Futebol do Clube Desportivo “…”, conforme referido em CB), necessário era proceder-se ao aterro e reconstrução do recinto desportivo em causa para reposição das suas anteriores e normais condições de utilização.
CD) Caso tivesse ocorrido a ocupação de uma faixa do Campo de Futebol do Clube Desportivo “…”, conforme referido em CB), bem como o aterro e reconstrução do recinto desportivo, nos termos mencionados em CC), o recinto desportivo ficaria imobilizado por um período temporal nunca inferior a 18 meses.
CE) Os custos resultantes de se proporcionar ao Clube “…” um recinto alternativo, designadamente através de arrendamento, de molde a não inviabilizar os respectivos treinos e a realização dos jogos oficiais em que o mesmo se encontrava envolvido, ascenderia a 1.000.000$00, por mês.
CF) A compensação financeira emergente das deslocações diárias dos jogadores, equipa técnica e dirigentes de e para o recinto desportivo alternativo ascenderia a 750.000$00, por mês.
CG) Caso se tivesse de proporcionar ao Clube “…” um recinto alternativo, a compensação financeira resultante de diminuição de receitas de bilheteira, da perda da renda de exploração do bar, da perda das receitas de cartazes publicitários e outras situações conexas e inerentes à normal actividade de um clube de futebol, ascenderia a cerca de 810.000$00, por mês, para além do importantíssimo factor psicológico e as inconveniências emergentes do facto de aquele clube passar, então, a jogar sistematicamente fora do seu próprio recinto.
CH) O aterro e reconstrução do recinto desportivo em causa, referidos em CC), implicariam os seguintes custos:
Natureza do custo     Valor
a) Reposição de muros e portão     1.744.357$92
b) Reconstrução/reparação do terreno do recinto desportivo     18.000.000$00
c) Renovação de bancadas, cabine de som, sanitários e depósito existente     23.863.931$80
d) Reconstrução dos balneários e áreas de apoio incluindo redes de água, electricidade, aquecimento e esgotos     8.000.000$00
e) Recuperação do sistema de iluminação do campo     4.960.000$00
f) Rede de drenagem envolvente ao campo e arranjos diversos     2.766.500$00.

CI) O projecto da solução variante ao método dos túneis, ao prever nomeadamente a redução para a distância de apenas 2 metros do hasteal da separação dos túneis e o nivelamento das suas duas galerias, foi suficiente para que os limites da escavação se aproximassem do seu eixo.
CJ) Essa alteração fundamental do método construtivo, conjugada com a aplicação de uma cortina ancorada executada pelo exterior do muro de vedação do Campo de Futebol, foi o bastante para que, na zona confinante com o referido recinto, se evitasse a sua ocupação parcial, o que permitiu, com excepção de dois períodos de cerca de três meses no total, a manutenção da sua normal actividade sem qualquer turbação ou impedimento.
CL) A proposta financeira da Variante considerava o valor de Esc.: 30.000.000$00 correspondente à montagem alternativa temporária, no lado oposto ao actual, da bancada e reparação do muro confinante com o talude por questões de segurança, o que nunca chegou a ser executado.
CM) De acordo com o projecto concursado a escavação para a construção do emboquilhamento nascente ocupava – excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora – parte do campo de jogos dos “…”, nomeadamente bancada sul e parte do campo propriamente dito.
CN) A ocupação provisória do campo de jogos decorrente da execução do projecto concursado não foi considerada pelas autoras na análise das vantagens da solução variante, nem então propuseram que entrasse no cálculo da economia dela emergente.
CO) O referido em BH) e BI) significa que o Projecto Concursado faria deslocar para Norte 8,5m o limite da escavação, enquanto que o Projecto Variante reduziu substancialmente esse limite.
CP) Acresce que a conjugação dos factores de distância acentuada entre os túneis e o desnivelamento da cota de soleira entre ambos constantes do Projecto Concursado eram já por si suficientes para agravar substancialmente o risco de ruína das edificações existentes do lado Norte dos Túneis na Zona III (Emboquilhamento Poente) e mencionadas em AO).
CQ) Com efeito, essas edificações configuravam um aglomerado “sui generis” não dotado de estrutura bem definida onde fosse possível identificar pilares e vigas formando uma unidade estável, sendo mesmo difícil identificar edifícios formando unidades perfeitas e completamente autónomas.
CR) As edificações em apreço foram erigidas de forma e modo a que umas suportassem as outras, formando no seu todo um conjunto errático.
CS) Os terrenos de fundação dos referidos edifícios eram compostos na sua camada superior por aterros heterogéneos com uma espessura da ordem dos 8 a 10m sobrejacente a formações oligocénicas descomprimidas próximo da superfície.
CT) Este tipo de terreno é extremamente frágil e deformável, sendo permeável a assentamentos consideráveis.
CU) Num cenário geotécnico mais optimista e independentemente do método construtivo utilizado, previu-se em ensaios e estudos que o assentamento na área de localização dos edifícios em causa ascenderia a 1,5cm.
CV) Tendo em consideração a natureza específica e a fragilidade estrutural dos edifícios em apreço, os mesmos apenas tinham capacidade para absorver assentamentos até ao limite máximo de 1,2mm.
CX) Pelo que os edifícios em apreço correriam, em qualquer circunstância, grave risco de aberturas de fendas que fariam perigar a estabilidade do seu conjunto, criando condições para que ocorresse uma ruptura total por efeito “dominó”.
CZ) Nestes termos a sua desocupação era inevitável em quaisquer circunstâncias, não obstante a situação ter melhorado consideravelmente com a execução do Projecto Variante, já que a solução no mesmo contida permitiu posicionar as cristas dos taludes de escavação a cerca de 10m da “…”.
DA) Daí que a opção pela sua desocupação já era em si inerente ao Projecto Concursado, só não tendo sido prevista dada a insuficiente informação geotécnica disponível à data em que o Projecto da J... foi elaborado.
DB) Por força do Projecto Variante de execução de Maio de 1997, a zona onde as edificações referidas em AO) se encontravam era, parcialmente, afectada pelo desvio e restabelecimento da conduta adutora da EPAL DN 800mm.
DC) O desvio da conduta adutora da EPAL DN 800mm foi proposto por exclusiva iniciativa das autoras e resultou da necessidade de reformular o planeamento da obra.
DD) As autoras, até à conclusão do processo expropriativo, nunca manifestaram qualquer interesse em nele participar ou de acompanhar as negociações.»
2.2. A sentença sob recurso debruçou-se sobre pedido de reconhecimento de vantagem económica ─ e consequente condenação da ré ─ emergente da execução de projecto variante no quadro de contrato de empreitada de obras públicas celebrado entre as partes para a construção do “IC ....-Circular ... ..., Lanço ... — ... e a Ligação de ... ao ...”.
A sentença debruçou-se sobre todos os segmentos em que se cindia o pedido e veio a julgar a acção parcialmente procedente nos termos decisórios que se deixaram transcritos em 1.4. supra.
Dessa sentença, a ré interpôs recurso principal e as autoras recurso subordinado.
2.2.1. Do recurso principal
Procede a recorrente a uma alegação assente na invocação de sucessivas faltas de especificação dos fundamentos que justificam a decisão e de omissões de pronúncia da sentença, invocação que culmina nas conclusões XXIX, XL, XLVII e LVII.
As alegadas omissões de pronúncia vêm sustentadas na ideia de que o tribunal não cuidou de fazer o enquadramento jurídico adequado à situação que se lhe apresentava. Na verdade, sustenta, “II. Salvo melhor opinião, antes da aferição da mencionada vantagem económica, importaria que o Tribunal a quo se debruçasse sobre a forma de cálculo dessa mesma vantagem — nomeadamente, analisando criticamente a conduta das partes em todo o processo negocial que conduziu à aceitação das propostas formuladas.
III. Importaria também que o Tribunal a quo ponderasse devidamente o regime legal aplicável à situação sub judice, analisando-o, interpretando-o convenientemente e, dessa forma, definindo as regras do jogo”.
Sem prejuízo do que adiante se dirá quanto a cada uma das específicas alegadas omissões, deve começar por notar-se que a sentença fundamentou expressamente a sua decisão de direito, com a indicação:
─ primeiro, do regime jurídico aplicável, o que logo fez na abertura da apreciação jurídica, no primeiro parágrafo (“[...] o qual é regulado pelo disposto no DL 235/86, de 18.8., já que a empreitada em causa foi posta a concurso em Março de 1994 [...] – cfr. art. 241º, do DL 405/93, de 10/12, art. 278º, do DL 59/99, de 2/3, e art. 16 nº 1, do DL 18/2008, de 29/1”);
─ depois, com a indicação precisa, no terceiro parágrafo dessa abertura, do artigo 31.º, n.º 3, do DL 235/86, como sustentador da sua apreciação (“A presente acção visa o apuramento da vantagem económica emergente da execução desse projecto variante, dado que as partes não estão de acordo quanto ao montante a que ascende tal economia e uma vez que, de acordo com o disposto no art. 31º n.º 3, do DL 235/86, as autoras têm direito a metade desse montante”);
─ ainda, pontualmente, em 6. e 8. dessa apreciação jurídica com indicação expressa dos preceitos aplicáveis e também dos não aplicáveis sempre que necessitou de explicar a recusa de aplicação ([...] cumpre ainda salientar que não se aplicam os arts. 13°, 25° n.o 2, al. b), 26° ou 40°, do DL 235/86, de 18/8, já que estes tratam de realidades distintas - erros ou omissões de trabalhos e do mapa de medições, trabalhos para evitar danos nos prédios vizinhos, ocupações provisórias e erros de concepção da obra -, pois a quantia de 94 060 000$00 visa possibilitar uma ocupação definitiva de prédios vizinhos”);
─ finalmente, no segmento decisório, como se vê do supra (1.4.) transcrito.
Passa-se é que o tribunal não retirou as consequências pretendidas pela recorrente; esse é, porém, outro problema, é um problema de hipotético erro de julgamento, não de omissão.
Não existiu, assim, desde já se pode afirmar, qualquer falta de especificação dos fundamentos que justificaram a decisão. A sentença indica, com detalhe, aliás, todos os fundamentos de facto e de direito necessários à sua completa compreensão, pelo que não está preenchida a previsão do artigo 668.º, n.º1, b), do CPC.
O mesmo se julga quanto às alegadas omissões de pronúncia. Mas estas impõem que se verifique onde radicam, especificamente.
2.2.1.1. Por facilidade de explanação, comecemos pelo que respeita às conclusões XLVII e LVII.
Entende a recorrente:
─ que as autoras, afinal, punham em causa o projecto concursado, afirmando que o mesmo estava errado e que deveria ter sido feito de outra maneira, não tendo o tribunal emitido pronúncia sobre esta matéria (é ao que se refere a conclusão XLVII);
─ que a sentença não se pronunciou sobre o facto de que as autoras careciam de legitimidade para invocar erros e omissões do projecto concursado, já que nunca fizeram qualquer reclamação do mesmo (art. 13° do DL 235/86, de 18/8), e também não se pronunciou sobre o facto de que ela sempre apresentara reservas em relação aos estudos técnicos apresentados pelas autoras - art. 40°, n.º 2, do DL 235/86, de 18/8 (é ao que se refere a conclusão LVII).
Ocorre que a fundamentação da sentença não assenta, em nenhum momento, em apreciação negativa do projecto concursado; de nenhum ponto resulta que tenha acolhido qualquer alegação de erro ou omissão desse projecto.
A sentença debruçou-se sobre a determinação da vantagem económica resultante do projecto variante, que apreciou no confronto, quando foi necessário, com o projecto concursado, mas não se baseou em qualquer erro ou omissão desse projecto.
Ora, só poderia ter havido omissão de pronúncia, no quadro alegado, se a sentença se tivesse fundamentado em erros ou omissões do projecto concursado. Só nessa circunstância deveria ter havido, se tivesse sido suscitada (e no despacho de sustentação diz-se que não foi), a apreciação da possibilidade de discussão da correcção desse projecto.
Assim, no quadro do decidido, os problemas alegados não constituíram matéria sobre que tivesse que existir pronúncia da sentença (artigo 668.º, n.º 1, d), do CPC).
2.2.1.2. Passemos ao que respeita às conclusões XXIX e XL.
Entende a recorrente, no essencial, que o tribunal a quo não cuidou de verificar que as autoras tinham aceitado a posição que lhes fora transmitida pelo dono da obra quanto à proposta de variante. E tinham aceitado, defende, por aplicação do artigo 256.º do DL n.º 59/99. E, novamente, sustenta que não operou a melhor aplicação do direito aplicável aos factos.
Vejamos.
2.2.1.2.1. O problema da aceitação havia sido colocado pela ora recorrente na sua contestação, para sustentar a ilegitimidade activa dos autores.
Essa excepção foi tratada no despacho saneador, que a desatendeu.
Esse problema foi também suscitado coligado à excepção de caducidade do direito de acção.
E essa excepção foi acolhida por aquele despacho saneador.
Todavia, em recurso jurisdicional, este Supremo Tribunal, pelo Acórdão de fls. 1722 e segts (já referenciado supra, 1.3.) julgou que nunca a ré havia praticado, por órgão competente, acto denegatório de pretensão ou direito dos autores.
Julgou-se nesse acórdão:
“Ora, da matéria de facto provada, não resulta que as comunicações que dos autos constam, designadamente as referidas na sentença recorrida, nos pontos 47º, 30 a 33 e 57 da matéria de facto, em que foram denegadas as pretensões formuladas pelo empreiteiro, ora recorrente, tivessem a suportá-las, uma decisão ou deliberação dos órgãos competentes para o efeito, tal como atrás ficou definido. Tais comunicações foram subscritas por coordenadores ou gestores do dono da obra sem que seja referida qualquer deliberação do órgão competente em que assentem. E, como vimos, os actos respeitantes à execução do contrato, designadamente os que deneguem direitos ao empreiteiro eram da competência do Conselho Directivo ou do Conselho de Administração e não do Presidente ou de algum administrador.
Argumenta a entidade recorrida que as recorrentes aceitaram as comunicações que lhes eram favoráveis, apenas questionando agora, aquelas que negaram as suas pretensões.
É evidente que sendo satisfeitas as suas pretensões, as recorrentes não tinham interesse nem estavam obrigadas a questionar a legalidade das correspondentes decisões do dono da obra, sendo este que, na defesa dos seus direitos ou interesses, poderia e deveria actuar na defesa da legalidade, v.g. anulando ou revogando eventuais actos ilegais.
Em suma: não resultando dos autos que haja sido comunicada às recorrentes qualquer decisão definitiva tomada pelos órgãos competentes dos diversos donos da obra, não se pode considerar decorrido o prazo de propositura da acção em causa, nos termos do artº 255º do citado DL nº 59/99”.
Assim, como defende o tribunal a quo no seu despacho de sustentação, a questão foi tratada, com trânsito em julgado.
2.2.1.2.2. Pode ver-se na alegação da recorrente a ideia de que, ainda assim, restava o problema da comunicação identificada em U) da matéria de facto, ainda na vertente de excepção peremptória inominada.
É que, apesar de ter sido tratada expressamente em sede de excepção de ilegitimidade activa e, depois, ter sido considerada em sede de caducidade, a verdade é que não foi expressamente incluída no elenco das comunicações a que se referiu o citado Acórdão intercalar deste Supremo Tribunal.
E, por isso, ainda haveria de ser tratada enquanto excepção peremptória.
2.2.1.2.3. Quanto a essa comunicação, deve-se começar por observar que, para o efeito pretendido, o artigo 256.º do DL n.º 59/99, de 2 de Março, não é aplicável.
Na verdade, sendo a comunicação de 05.07.96, ainda aquele diploma não tinha visto a luz do dia; assim, a previsão do artigo 278.º do mesmo sobre a “aplicação às empreitadas em curso das disposições do título IX sobre contencioso dos contratos”, não abrange a questão de saber se tinha havido aceitação, pois esta só poderia ser regida pelo diploma em vigor à data em que alegadamente se operou.
De qualquer modo, não há diferença de substância, para o que aqui interessa, entre o regime do artigo 256.º do DL n.º 59/99 e o do artigo 227.º do DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro, e ainda o do artigo 223.º do DL n.º 235/86, de 18 de Agosto. A diferença é que neste diploma de 1986 o prazo não era de 8 dias, como naqueles, mas, sim, de 10 dias.
2.2.1.2.4. Mas à parte essa observação, deve dizer-se que não se encontra assente em sede de matéria de facto a data em que aquela comunicação foi recebida. A alínea U) fixa a comunicação e a alínea V) a resposta a essa comunicação. Porém, a data da recepção da comunicação não consta na matéria fixada, nem vem solicitado nas conclusões que se proceda a algum alteração ou aditamento dessa matéria de facto.
Ora, sendo a aceitação contada do conhecimento pelo empreiteiro da decisão tomada pelo dono da obra ou pelos seus agentes e não estando assente essa data, não poderia julgar-se ter havido aceitação.
2.2.1.2.5. De todo o modo, a alegada questão encontra-se ultrapassada pela solução dada pela sentença ao caso.
Com efeito, o ponto central da comunicação fixada em U), em termos de nela existir uma definição precisa do que a ré, ora recorrente, considerava quanto à vantagem económica adveniente do projecto variante, e que, por isso, não sendo reclamado nem sobre ele formulada reserva, se poderia considerar aceite pelo empreiteiro, é o ponto 7, que reza:
«7 - A redução de custos permitida pela variante ascende a 1.236.303.646$00 (após correcção). No entanto, e tendo em conta o método construtivo proposto (“Cut and Cover’), torna-se necessário proceder à expropriação adicional de 2 faixas de terreno ao longo de toda a extensão dos túneis para possibilitar a execução da escavação provisória.
O custo dessas expropriações acrescidas é de 535.325.500$00.
Em sequência, a redução de custos associada à Variante aprovada é de 1.236.303.646$00-535.325.500$00, o que perfaz 700.978.146$00, revertendo 50% desta verba para o Estado e 50% para o consórcio adjudicatário, no montante de 350.489.073$00, de acordo com a legislação em vigor.
Na sequência da aprovação da Revisão do Projecto Base Variante ao Método Construtivo dos Túneis do ..., atrás citada, deverá o Consórcio entregar o respectivo Projecto de Execução»
Ora, a sentença deu como assente esse ponto sobre a vantagem económica, e considerou-o totalmente.
Basta ver que a sentença julgou improcedentes todos os pedidos dos autores que contrariavam directamente aquela definição.
Assim, julgou a sentença:
“1. O primeiro pedido formulado pelas autoras é o de condenação da ré a reconhecer que a vantagem económica emergente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... integrado na empreitada dos autos ascende a 1 236 303 646$00 (€ 6 166 656,59).
Tendo em conta a matéria dada como assentes sob as alíneas U), AG), BB), e, em especial, BL), deverá o presente pedido proceder, com a precisão de que nesse valor não se têm em conta os custos das expropriações adicionais para a sua execução”.
Há, portanto, uma decisão de procedência, mas no quadro limitativo que figurava no ponto 7 da comunicação da ora recorrente; a vantagem económica ascendia ao valor indicado, mas sem ter ainda em conta os custos das expropriações adicionais.
Depois:
“2. As autoras também peticionam a condenação da ré a reconhecer que a execução do referido projecto variante permitiu evitar a ocupação parcial do recinto desportivo do Clube de Futebol "…", localizado no lado Norte da zona I, Emboquilhamento Nascente, dos Túneis do ..., que inevitavelmente ocorreria com a execução do projecto concursado e, por conseguinte, desonerou o dono da obra do pagamento de todos os custos e indemnizações daí emergentes, que ascenderiam a, pelo menos, 206 500 000$00, importância esta que constitui um acréscimo à vantagem económica resultante da execução do projecto
Improcede este pedido, pois, conforme resulta da factualidade assente (cfr. als. CI) e CJ), em especial esta última), a execução do projecto variante não foi suficiente para evitar a ocupação parcial do recinto desportivo do Campo de Futebol do clube Desportivo "…", já que tal ocupação só foi evitada conjugando tal método construtivo com a aplicação de uma cortina ancorada, tal como se evitaria tal ocupação parcial, caso fosse executado o projecto concursado, com a aplicação de uma cortina ancorada mais profunda ou de paredes com uma escora (cfr. als. CB) e CM))”
Ou seja, ainda absolutamente nos limites do ponto 7 da sempre referida comunicação, o tribunal não julgou procedente o pedido de reconhecimento de vantagem económica superior à ali considerada, por integração de elemento que não fora tido em conta.
Ainda:
“4. As autoras pedem também a condenação da ré a reconhecer que o custo das indemnizações emergentes das expropriações de edifícios, benfeitorias e perda de rendimentos agrícolas e dos realojamentos de agregados familiares localizados nas 12 parcelas adicionais de terrenos incorporados na zona II, área central dos Túneis do ..., resultante da ampliação da respectiva área de intervenção determinada pela execução do invocado projecto variante ascendeu a 263 367 000$00, a ingressar como sobrecusto decorrente da execução do mesmo projecto variante e a abater à vantagem económica do mesmo resultante.
Este pedido tem de improceder, já que dos factos provados nada resultou provado no sentido de que o valor indicado pela ré - cfr. verbas n.os 1 e 2 indicadas no ofício descrito na al. AG), dos factos provados - é incorrecto/desproporcionado [cfr. resposta - total ou parcialmente - negativa aos quesitos 8) a 11) e 42)], conforme é reconhecido pelas autoras na respectiva alegação”.
Ou seja, também aqui se manteve a sentença no quadro definido.
Assim, se bem que não voltando a discutir o problema da aceitação a que se reportam os artigos 223.º do DL n.º 235/86, de 18 de Agosto, 227.º do DL n.º 405/93, de 10 de Dezembro e 256.º do DL n.º 59/99, de 2 de Março, o certo é que nada do que por essa alegada aceitação se pudesse considerar adquirido foi posto em causa.
Poderia o tribunal ter proferido uma consideração expressa, sobre a falta de reserva ou reclamação atempadas à comunicação de 05.07.96.
Mas, do ponto de vista da recorrente, nenhum prejuízo resultou dessa falta de expressão, pois que os pontos que alegadamente poderiam ser considerados aceites não eram mais do que aqueles a que chegou o tribunal na apreciação, sem aquela consideração expressa.
Tudo o resto que a sentença vem a considerar não podia, ao contrário do que pretende a recorrente, ser considerado abrangido por aquela comunicação, em termos de serem excluídos de apreciação.
Na verdade, tudo o mais que a sentença reconheceu não está em oposição àquela comunicação.
Trata-se ou de matéria exterior àquela comunicação ou de matéria que foi sendo discutida entre as autoras e a ré ou de matéria nova.
Assim, podia e devia o tribunal tê-las analisado, como fez.
2.2.1.2.6. Foi o que ocorreu quanto ao que é particularmente levado como problema de omissão à conclusão XL
Está principalmente em causa o que foi apreciado no ponto 5 da sentença.
Julgou a sentença:
“5. As autoras peticionam igualmente a condenação da ré a reconhecer que o custo de 94 060 000$00 emergente das indemnizações pagas pela demolição e desocupação de edifícios, estabelecimentos comerciais e realojamento de agregados familiares residentes no aglomerado populacional denominado de "…", localizado na parte Norte da zona III, Emboquilhamento Poente dos Túneis do ..., é um sobre custo à execução do projecto concursado, na medida em que, e independentemente do método construtivo utilizado, sempre constituiria uma situação inevitável, atenta a diminuta resistência estrutural dos respectivos edifícios, capazes de absorver apenas assentamentos de 1,2 mm, valor esse incompatível com o mínimo de 1,5 em de assentamento determinado pelos correspondentes terrenos de fundação constituídos por aterros heterogéneos com uma espessura de cerca de 15m, o que não constitui, de modo algum, qualquer sobrecusto decorrente da execução do projecto variante, nem é consequência de qualquer vício ou omissão, aliás inexistentes, deste último.
Este pedido deverá proceder atenta a factualidade provada, apenas com a correcção de que a indemnização é devida pela desocupação e que os aterros heterogéneos têm uma espessura de cerca de 8 a 10m (cfr. als. AO) e CO) a DA), dos factos assentes).
Com efeito, dessa factualidade decorre que a verba em questão - 94 060 000$00 (€ 469 169,30) - não deve ser considerada como um custo exclusivo da variante, já que os desalojamentos em causa já eram indissociáveis da execução dos túneis na versão concursada”.
Como se vê, também esta matéria − não se pondo em causa, como não vem posta, a matéria de facto − não poderia estar englobada no custo adicional de expropriações que vinha referenciado no ponto 7 da comunicação. E tratando-se, ainda e sempre, de analisar as vantagens económicas do projecto variante, o tribunal não poderia ter deixado de decidir como fez.
2.2.1.2.7. Ademais, quanto ao dito custo das expropriações acrescidas em razão do projecto variante, o tribunal efectuou pronúncia que não vem controvertida pela recorrente.
Fê-lo, de modo pormenorizado:
“6. As autoras peticionam também que a ré seja condenada a reconhecer que o saldo líquido final da vantagem económica decorrente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... ascende a 1 179 436 646$00, do qual às autoras, como adjudicatárias da empreitada dos autos, é atribuível, nos termos do disposto no art. 31º n.º 3, do DL 235/86, de 18 de Agosto, metade do correspondente valor, no montante de 586 718 323$00.
Este pedido apenas procede parcialmente, como se passa a demonstrar.
Ao valor de 1 236 303 646$00, correspondente à vantagem económica emergente da execução do projecto variante ao método construtivo dos Túneis do ... - a que se alude no ponto 1 desta sentença -, tem de se abater a quantia de 458 935 500$00, correspondente aos custos acrescidos do projecto variante emergente de expropriações de edifícios, benfeitorias e culturas agrícolas e indemnizações por realojamentos ocorridos e indemnizações autónomas.
Para apuramento deste valor de 458 935 500$00 tem de se ter em conta que, no valor indicado pela ré - 463 590 500$00 (cfr. als. AG) - verbas 1 e 2 (394 090 500$00 + 69 500 000$00) -, AI), AJ), AN) e BZ), dos factos provados) -, há que abater 4 655 000$00, o qual corresponde, conforme se apurou no ponto 3 desta sentença, ao valor para compensar a expropriação dos terrenos das parcelas n.ºs 2097, 2050 e 2067, montante que está incluído na quantia de 463 590500$00, já que a ré aceitou que os valores dos terrenos necessários à implementação do projecto variante não seriam deduzidos à vantagem económica desta última, porquanto os terrenos em causa integrar-se-iam no seu património (cfr. al. AB), dos factos assentes).
De todo o modo, este valor de 4655 000$00, bem como a quantia de 70 215 000$00, também referida no ponto 3 desta sentença, não acrescem à economia resultante da execução do projecto variante - como pretendido pelas autoras a fls. 27, da sua alegação (cfr. fls. 2571, dos autos) -, pois trata-se de um custo acrescido do projecto variante, embora a suportar pela dona da obra [desonerando o custo da variante, pois, conforme referido no parágrafo anterior, a ré assumiu tal custo].
O referido valor de 70 215 000$00, de todo o modo, não é de abater à quantia de 458 935 500$00, já que a ré não incluiu aquele valor neste último, conforme decorre da al. AG), dos factos provados, em que o valor de 70 215 000$00 surge autonomamente, como verba n.º 3.
Relativamente à quantia de 94.060.000$00, relativo a compensações atribuídas pelos desalojamentos de edificações que se agrupavam à volta do estabelecimento comercial conhecido como "…", deve a mesma ser retirada na sua totalidade do apuramento da economia da variante.
De facto, apenas são de abater ao supra referido valor de 1 236 303 646$00 as indemnizações decorrentes exclusivamente do projecto variante, isto é, os custos acrescidos do projecto variante e não também aqueles custos que são comuns ao projecto concursado e ao projecto variante, como decorre do conceito de economia do art. 31 ° n.º 3, do DL 235/86.
Com efeito, este conceito pressupõe que se contabilizem todos os custos do projecto concursado, aos quais se subtraem todos os custos do projecto variante, ou seja, se um custo é comum ao projecto concursado e ao projecto variante não pode ser imputado apenas neste último, carecendo de razão de ser a alegação da ré de que, entendimento contrário, podia dar lugar ao pagamento, pelo projecto variante, de quantia mais elevada do que a prevista para o projecto concursado, já que a indemnização ora em causa é também um custo inerente a este último.
Quanto a esta questão, cumpre ainda salientar que não se aplicam os arts. 13°, 25° n.º 2, al. b), 26° ou 40°, do DL 235/86, de 18/8, já que estes tratam de realidades distintas - erros ou omissões de trabalhos e do mapa de medições, trabalhos para evitar danos nos prédios vizinhos, ocupações provisórias e erros de concepção da obra -, pois a quantia de 94 060 000$00 visa possibilitar uma ocupação definitiva de prédios vizinhos.
Ora, deduzindo 458 935 500$00 a 1 236 303 646$00, obtém-se o valor de 777 368 146$00 (€ 3 877 495,96), ao qual às autoras, como adjudicatárias da empreitada dos autos, é atribuível, nos termos do disposto no art. 31° n.o 3, do DL n.º 235/86 de 18 de Agosto, metade do correspondente valor, no montante de 388684073$00 (€ 1 938747,98)”.
A sentença teve, pois, em conta os valores que, entretanto, foram sendo considerados pelas partes no contrato e que, depois, deu por assente, sem que haja controvérsia a propósito.
Em síntese, apesar das alegadas falta de especificação e omissão de pronúncia, a recorrente não põe em causa a total adequação das soluções a que foi chegando a sentença ao quadro factual apurado, culminando com a decisão final. Ora, estando fundamentada a decisão e não se detectando erro na apreciação de facto e de direito realizada sobre tudo o que havia que apreciar, não pode proceder o recurso.
2.2.2. Do recurso subordinado
Pretendem as recorrentes modificação da decisão em matéria de facto e em matéria de fixação de juros.
2.2.2.1. Da modificação da matéria de facto
Pretendem as recorrentes a modificação da decisão em matéria de facto quanto às respectivas alíneas CB) e CM).
Recordem-se aquelas alíneas:
«CB) Por força do Projecto Concursado, a respectiva execução conduziria, inevitavelmente — excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora –, a que a escavação para a construção dos túneis no troço do Emboquilhamento Nascente, localizado entre P.K. 1 + 800 e P.K. 1 + 675, ocupasse no talude esquerdo uma faixa do Campo de Futebol do Clube Desportivo “…”, o que inviabilizaria totalmente a sua utilização pelo período correspondente ao período temporal da construção dos túneis nessa zona.»
«CM) De acordo com o projecto concursado a escavação para a construção do emboquilhamento nascente ocupava – excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora – parte do campo de jogos dos “…”, nomeadamente bancada sul e parte do campo propriamente dito.»
Defendem as recorrentes que «as alíneas CB) e CM) devem ser alteradas, no sentido de delas ser eliminado o segmento “excepto se, se optasse pela aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora”» (conclusão F).
As recorrentes sustentam a modificação da matéria de facto em factualidade e prova que, alegadamente, contraria os segmentos em causa.
E essa factualidade e prova são a que sintetizam nas conclusões A, B, C e D da alegação, todas respeitantes ao projecto concursado.
Ocorre que não surge explicitado por que é que os segmentos em crise das alíneas CB) e CM) estão contrariados pelo que consta da matéria enunciada naquelas conclusões A a D.
Com efeito, só haveria que verificar da exigência de eliminação dos segmentos referidos se as recorrentes alegassem que eles se opõem logicamente a outra matéria provada, que não são verdadeiros, que não resultam da matéria apurada.
Porém, as alíneas CB) e CM) não contrariam o que vem alegado quanto ao projecto concursado. A excepção (“excepto se”) consignada nas duas alíneas compagina-se, totalmente, com o alegado.
É que, em nenhum momento dessas alíneas se considera assente que o projecto concursado previa a “aplicação de uma cortina ancorada mais profunda que a referida em CJ) ou pela execução de paredes com uma escora”.
Depois, não aduzem qualquer elemento de prova que permita concluir não ser verdadeira a matéria constante, exactamente, dos segmentos que pretendem eliminar.
Afinal, o que as recorrentes pretendem eliminar não é a possibilidade da opção ali assente em matéria de facto, o que elas pretendem eliminar é a possibilidade dessa opção se coligar, ainda, de algum modo, à matriz do projecto concursado.
Mas há-de notar-se que, aí, a compreensão plena só se obtém na verificação da apreciação jurídica que foi feita dos factos.
Ora, no que aqui releva, o problema foi respondido pela sentença, quando apreciou o pedido feito pelas autoras com base na vantagem económica decorrente da não ocupação do recinto desportivo do Clube de Futebol “…”.
Disse a sentença:
«2. As autoras também peticionam a condenação da ré a reconhecer que a execução do referido projecto variante permitiu evitar a ocupação parcial do recinto desportivo do Clube de Futebol "…", localizado no lado Norte da zona I, Emboquilhamento Nascente, dos Túneis do ..., que inevitavelmente ocorreria com a execução do projecto concursado e, por conseguinte, desonerou o dono da obra do pagamento de todos os custos e indemnizações daí emergentes, que ascenderiam a, pelo menos, 206 500 000$00, importância esta que constitui um acréscimo à vantagem económica resultante da execução do projecto
Improcede este pedido, pois, conforme resulta da factualidade assente (cfr. als. CI) e CJ), em especial esta última), a execução do projecto variante não foi suficiente para evitar a ocupação parcial do recinto desportivo do Campo de Futebol do Clube Desportivo "…", já que tal ocupação só foi evitada conjugando tal método construtivo com a aplicação de uma cortina ancorada, tal como se evitaria tal ocupação parcial, caso fosse executado o projecto concursado, com a aplicação de uma cortina ancorada mais profunda ou de paredes com uma escora (cfr. als. CB) e CM))»
Resulta dessa fundamentação que o entendimento que a sentença operou quanto à discutida matéria de facto foi o de que a aplicação de uma cortina ancorada foi exterior ao projecto variante, como seria ao projecto concursado, se tivesse sido este o prosseguido. Mas, em qualquer deles seria possível efectivar, como acabou por ser no projecto variante, pois foi este que foi o executado.
Não sendo, portanto, a aplicação de cortina ancorada elemento de distinção, demonstrando-se que seria possível realizar, sem desvirtuamento, no quadro de um e outro projecto, o benefício alegado não tinha razão de ser, pois não resultava do projecto variante.
Assim, a recorrente só poderia obter algum ganho de causa nesta parte se também tivesse impugnado a sentença nesse seu segmento fundamentador e aí lhe fosse reconhecida razão.
A recorrente em 13 e 14 do corpo das suas alegações chega a afirmar que o tribunal a quo esqueceu que o projecto variante já comportava a execução de uma cortina ancorada de construção de contenção de terras, o que resultaria de CI) e CJ).
Mas não resulta de CI) e CJ), como bem ponderou a sentença, com saliência para CJ), que se recorda: “CJ) - Essa alteração fundamental do método construtivo, conjugada com a aplicação de uma cortina ancorada executada pelo exterior […]”.
É essa exigência suplementar de conjugação, com a aplicação de uma cortina ancorada, assente em CJ), que contraria o que a recorrente pretende, e foi ela decisiva para a sentença não considerar o projecto variante suficiente para evitar a ocupação do recinto desportivo do Clube ….
Para obter algum ganho nesta parte haveria que questionar, pelo menos, a matéria assente em CJ), o que não vem feito.
Não há, assim, lugar à modificação requerida.
2.2.2.2. Dos juros
Concluem as recorrentes:
«H – Por via do despacho proferido em 03/07/1997 pelo Presidente da J... e transmitido através do oficio nº 7/8/043/98 de 06/02/1998 foi decidido que seria pago aos empreiteiros o remanescente da correspondente da quota parte na mais valia decorrente do projecto variante na data da conclusão definitiva dos correspondentes trabalhos, o que se encontra provado na alínea AC) da matéria de facto assente.
I – Resulta da alínea AF) da matéria de facto assente que os trabalhos de construção dos Túneis do ... se concluíram em 20/05/1998.
J – Era, pois, até esta última data que deveria ter sido pago o diferencial da mais valia atribuída aos empreiteiros, pelo que o seu não pagamento por mais de 60 dias úteis, fez constituir o demandado em mora e, por conseguinte na obrigação de pagar os correspondentes juros às taxas supletivas legais às Recorrentes.
K – Deste modo, é a partir de 16/08/2008 que se deve contar o vencimento dos juros moratórios, cuja taxa supletiva oscilou entre 5%, 4,25% e 3,25%, até Março de 2000, revogando-se nessa parte a sentença recorrida»
Como se vê, as recorrentes pretendem a alteração do termo inicial sustentadas num compromisso da dona da obra. Ocorre que os valores declarados na comunicação provada em AC) da matéria de facto foram controvertidos pelas autoras, como logo revela a sua comunicação provada em AD), em que concluíam, “em princípio não estamos dispostos a concordar com o números indicados”.
Ora, não tendo aceitado os valores assumidos pela dona da obra, e estando os montantes em causa ainda a ser discutidos aquando da conclusão da obra, como contra alega a ..., e não sendo já aqueles valores que estão em causa nos autos, com certeza que não pode retirar-se da comunicação de 6.2.1998 um efeito que ultrapassa os seus termos.
3. Pelo exposto, nega-se provimento a ambos os recursos, o recurso principal e o recurso subordinado, mantendo-se a sentença.
Custas pelos recorrentes.
 Lisboa, 17 de Março de 2010

Alberto Augusto Andrade de Oliveira (relator)
António Políbio Ferreira Henriques
Rosendo Dias José