sexta-feira, 1 de novembro de 2013

CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL - JUIZ SINGULAR – RECURSO - ARTIGOS 76º E 79º DO CCP - DECISÃO DE NÃO ADJUDICAÇÃO



 Proc. Nº 10318/13   TCAS               10 Out 2013

I – Uma acção de contencioso pré contratual, em regra, deve ser julgada, de facto e de direito, por juiz singular, designadamente pelo juiz titular do processo, tal como haja resultado da distribuição, nos termos do artigo 40º, n.º 1, do ETAF, não sendo imediatamente aplicável a esta acção de contencioso pré-contratual, a regra especial de competência, estabelecida no n.º 3 daquele artigo 40º, dirigida às acções administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal, norma para a qual o artigo 102º, n.º 1, do CPTA, não remete, nem expressa, nem implicitamente.
II – Da decisão proferida pelo juiz singular, titular do processo, numa acção de contencioso pré contratual, há recurso directo para este TCAS e não reclamação para a conferência;
III – O 79º do CCP não é taxativo, mas meramente exemplificativo
IV – É lícito à entidade contratante decidir pela não adjudicação por razões de interesse público, devidamente fundamentado, relativo à circunstância de se ter aberto um concurso através da central de compras, com vista a obter uma economia de escala e poupanças, mas face às propostas que foram apresentadas, todas consideradas com um preço anormalmente baixo, acabou por se manter no concurso uma única concorrente, cuja proposta apresenta um preço muito superior aquele que resulta da análise comparativa para o mesmo tipo de serviço, face aos dois anos anteriores, e ainda, porque tal contratação poderia conduzir a uma situação de monopólio no fornecimento do serviço a favor dessa empresa.
V – A circunstância de se verificar, após a abertura do concurso, que todos os concorrentes têm de ser excluídos, menos um, porque apresentavam uma proposta com um preço anormalmente baixo, é algo superveniente à abertura do próprio concurso, à vontade de contratar.
VI- Para a verificação de um interesse público relevante e superveniente, justificativo da decisão de não adjudicação ao abrigo do artigo 79º do CCP, não há que afastar uma situação de erro na forma como se configurou o concurso, ou na forma como se pretendia contratar, pressuposto da decisão revogada


Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul
Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa, que julgou improcedente a presente acção de contencioso pré-contratual, na qual se requeria a nulidade ou a anulação do acto do Conselho Directivo (em diante, CD) da Entidade de Serviços Partilhados da Administração Publica (em diante, ESPAP), notificado em 06.02.2013, de não adjudicação da proposta apresentada pela Autora no âmbito do concurso público para a celebração de acordo quadro de plataformas electrónicas de contratação pública e consequentemente a revogação da decisão de contratar proferida no referido procedimento.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: «A) A Entidade Demandada proferiu uma deliberação de acordo com a qual:
i. Aderiu aos fundamentos e conclusões do parecer em anexo à deliberação;
ii. Decidiu não adjudicar o Concurso Público em tutela do interesse público, revogando a decisão de contratar;
iii. Concedeu prazo de audiência prévia aos concorrentes por cinco dias.
B) No dia 6 de Fevereiro de 2013, e depois de ter exercido o direito de audiência prévia, a ora Recorrente foi notificada da decisão pela qual o conselho directivo da Entidade Demandada deliberou considerar improcedente a pronúncia apresentada pela Recorrente e, consequentemente, deliberar a não adjudicação do Concurso Público em tutela do interesse público e que consubstancia o acto impugnado.
C) A Sentença proferida pelo douto Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa determina a improcedência do pedido formulado pela Recorrente invocando-se os seguintes fundamentos:
b. A Entidade Demandada não estava impedida de não adjudicar, com base em, devidamente fundamentada, causa diversa daquelas que se encontram legalmente enunciadas (designadamente por motivos de interesse público);
c. O cancelamento do concurso não implica a violação do princípio da boa-fé;
d. A decisão de não adjudicação encontra-se devidamente fundamentada;
e. O preço da proposta da Recorrente era “anormalmente elevado” pelo que a não adjudicação se encontra justificada.
D) Dessa forma, o acto impugnado viola o 76.º e o 79.º, quando interpretados conjugadamente, na medida em que decide a não adjudicação e a revogação da decisão de contratar sem ter por fundamento uma das causas de não adjudicação que, excecionalmente, estão consagradas no artigo 79.º do CCP, nem nenhuma das demais que, estando compreendidas no espírito das normas consagradas neste artigo 79.º e que são obtidas através de um processo de extensão teleológica das mesmas, vêm a sua existência reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência.
E) Por seu lado, e em consequência, a Sentença recorrida, ao decidir da forma descrita, interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 76.º e 79.º, n.º 1, ambos do CCP, e padece de omissão de fundamentação.
Senão vejamos:
F) O CCP consagra um dever de adjudicação que vincula a Administração a essa espécie de “oferta ao público” que, em nome do princípio da boa fé e da protecção das legítimas expectativas criadas, não pode desrespeitar.
G) Assim, o acto de adjudicação é um acto devido (ver, por todos, o ac. do TCA Sul de 26/04/2012 proferido no processo n.º 08634/12), sendo o elenco de causas de não adjudicação previstas no artigo 79.º, do CCP taxativo.
H) Isso mesmo decorre do CCP (independentemente dos elementos interpretativos que se considerem prevalecentes, literal, histórico ou sistemático), jurisprudência e da doutrina que se debruçou sobre a matéria.
I) Ao entender de forma distinta, isto é, ao considerar que o elenco de causas de não adjudicação previstas no artigo 79.º, do CCP é exemplificativo, o douto Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 76.º e 79.º, ambos do CCP, devendo os mesmos ser interpretados e aplicados no sentido de se considerar que o elenco de causas de não adjudicação previstas no artigo 79.º, do CCP é taxativo, o que se alega nos termos e para os efeitos do artigo 685.º-A, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
J) Ainda que se entenda que o elenco de causas de não adjudicação previstas no artigo 79.º, do CCP, não é taxativo, aquela só pode ocorrer se estiverem em causa motivos de interesse público de carácter superveniente.
K) Ao entender de forma distinta, isto é, ao considerar que a não adjudicação pode ser decretada sem a existência de um facto SUPERVENIENTE e de interesse público, o douto Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa interpretou e aplicou incorrectamente os artigos 76.º e 79.º, ambos do CCP, devendo os mesmos ser interpretados e aplicados no sentido de se considerar que a não adjudicação apenas pode ter lugar caso exista um motivo de interesse público e superveniente, que o justifique, o que se alega nos termos e para os efeitos do artigo 685.º-A, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
L) Ora, não presente caso, não existem motivos de interesse público de carácter superveniente que justifiquem uma decisão de não adjudicação e aqueles que são invocados como motivos de interesse público não são nem supervenientes, nem de interesse público.
M) Acresce que a decisão de não adjudicação não pode ser proferida apenas porque a administração não gostou do resultado final do procedimento, da entidade escolhida a final.
N) Ainda que se admita que a Entidade Demandada pode ter em conta, como fundamento para proferir uma decisão de não adjudicação, uma nova ponderação das razões de interesse público que estiveram na base da decisão de contratar, o que se admite, sem conceder, por mera cautela de patrocínio, certo é que a ponderação feita no Parecer não pode merecer acolhimento.
O) De facto, o júri do procedimento analisou a fundamentação do preço apresentado pela ora Recorrente tendo concluído que o mesmo era conforme com as normas legais, regulamentares e concursais em vigor.
P) Não tendo concluído que o preço era excessivamente alto (como agora a Entidade Demandada parece pretender sustentar) sendo que, se o fosse, o júri sempre poderia ter excluído a proposta.
Q) Acresce que a Sentença recorrida é totalmente omissa quanto aos fundamentos que a levaram a concluir que o preço é anormalmente alto.
R) Assim, a Sentença recorrida é nula por não especificar os fundamentos de facto que a levam a considerar que o preço proposto pela Recorrente é “anormalmente alto” (artigo 668.º, n.º 1, al. b), do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA) e por os fundamentos estarem em oposição com a decisão na medida em que nada na matéria de facto considerada provada permite a conclusão de que o preço proposto pela Recorrente é “anormalmente alto” (artigo 668.º, n.º 1, al. c), do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA).»
O Recorrido nas contra alegações formulou as seguintes conclusões: «a) O artigo 79.º, n º 1 do CCP, não contém um elenco exaustivo das causas que determinam a não adjudicação da proposta ou propostas, pelo que a decisão de adjudicação não representa "um dever jurídíco" inelutável para o órgão competente para a decisão de contratar.
b) Por conseguinte, o ato de adjudicação é um "ato tendencialmente devido", que pode mudar de sentido - "decisão de não adjudicação" - perante a verificação de determinadas circunstâncias excecionais tipificadas na lei, ou em função de outros relevantes motivos de interesse público subjacentes à decisão de contratar.
e) Nesta conformidade, a Recorrida não estava impedida (antes tinha o dever) de tomar uma decisão de não adjudicação, baseada numa "diversa apreciação da situação pré­ existente" e em função das ocorrências verificadas durante o procedimento pré­ contratual, como única forma de tutelar os interesses públicos em presença.
d) Acresce que se afigura indiscutível que a Administração não pode ficar obrigada à celebração de um contrato público quando a tal se oponham relevantes motivos de interesse público.
e) Por conseguinte, reconhecendo-se à Administração o poder de resolver um contrato por motivos de interesse público, esses mesmos motivos podem ser suficientes para sustentar unia decisão de não adjudicação.
f) No caso vertente, verificam-se ponderosos motivos de interesse público para a adoção de uma decisão de não adjudicação, sintetizados da seguinte forma:
- o preço proposto pela Recorrente constitui um preço "anormalmente" alto, quando comparado ao preço médio de mercado, e
- um acordo quadro celebrado unicamente com a Recorrente significa que esta será prestadora em regime de monopólio de toda a Administração Direta do Estado e a todos os institutos públicos
g) Na verdade, a adjudicação da proposta da Recorrente compromete os objetivos de obtenção de economias na despesa pública, traçados pelo legislador à ANCP (agora a ESPAP, 1.P.) no âmbito do SNCP - tal como vertidos no citado Decreto-Lei n.º 37/2007, de 19 de fevereiro.
h) Mais ao adjudicar - em cal1-offs dentro de um acordo quadro para elas vinculante - propostas de "valor consideravelmente elevado", as entidades públicas contratantes estarão a não acolher também recomendações do Tribunal de Contas (dirigidas, embora, a ANCP, agora ESPAP, l.P.), que visam a tutela do interesse público através de uma correta racionalização dos dinheiros públicos objetivo que a ora Recorrida não pode deixar de antecipar e de prosseguir
i) O ato impugnado é absolutamente válido, respeitando todas as normas legais e regulamentares aplicáveis a procedimentos concursais, maxime o disposto no CCP.
j) Face a tudo o que antecede, e atendendo a que o ato impugnado não padece dos vícios que lhe são assacados não podem deixar de improceder os pedidos formulados pela Recorrente.»
A DMMP apresentou a pronúncia de fls. 1228 a 1230, no sentido de não ser admissível o presente recurso, por no caso haver lugar a reclamação para a conferência.
O Recorrente apresentou a resposta de fls.1233 a 1234 verso, acerca da questão suscitada pelo DMMP.
Os Factos
Na 1º instância foram dados por assentes, por provados, os seguintes factos que ora não vêm impugnados:
1) No dia 04.01.2012 foi publicado no Diário da República o anúncio de abertura do procedimento de “concurso público para a celebração de acordo quadro de plataformas electrónicas de contratação pública” (“Concurso Público”), com o n.º 35/2012, (Cfr. Doc. 1 PI), no âmbito do qual a Entidade Pública Contratante é a Agência Nacional de Compras Públicas, E.P.E.
2) A data definida para apresentação das propostas foi o dia 21 de Fevereiro de 2012, sendo que em matéria de critérios de adjudicação, ficou definido que seriam “adjudicadas as 4 melhores propostas de acordo com o critério do mais baixo preço” (cfr. artigo 14.º, n.º 1, do Programa de Procedimento - artigo 12.º, n.º 1, do Programa de Procedimento Doc 2 PI),
3) A proposta do aqui Autor foi apresentada em 21/02/2012, tendo sido apresentadas outras 6 propostas (cfr. acta nº 3 do Júri do Concurso Público – Doc. 4 PI);
4) No dia 01/03/2013, o Júri do Concurso Público procedeu à análise das propostas, tendo concluído pela “existência de uma disparidade de preços propostos não negligenciável, a qual podia consubstanciar a prática de actos com intuito de impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência” (cfr. acta n.º 4 do Júri do Concurso Público – Doc. 5 PI);
5) O Júri do Concurso Público decidiu solicitar a todos os concorrentes esclarecimentos sobre os preços propostos, tendo alguns concorrentes, designadamente a Autora, requerido a classificação das respostas aos pedidos de esclarecimento nos termos e para os efeitos do artigo 66.º, do CCP, o que veio a ser aceite pelo júri do Concurso, em reunião realizada no dia 08/03/2012 (Cfr. acta n.º 5 – Doc. 6 PI);
6) Depois da referida classificação, e com excepção do concorrente ... , S.A., os concorrentes entregaram os esclarecimentos solicitados, tendo a Autora feito tal entrega em 12 de Março de 2012 (cfr. Doc. 7 PI);
7) Nos dias 20/03/2012, 22/05/2012, 04/06/2012 e 12/06/2012, o Júri do Concurso Público reuniu tendo em vista analisar as propostas apresentadas (incluindo os esclarecimentos prestados).
8) Da análise dos referidos elementos, o Júri do Concurso Público deliberou o seguinte (cfr. acta n.º 6 – Doc. 8 PI);
a) Propor a exclusão das propostas apresentadas pela ... Services, S.A. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... Serviços, Lda. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... , S.A. (por não ter as qualificações necessárias para prestar o serviço objecto do Concurso Público), Academia Informática Brava, Engenharia de Sistemas, Lda. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... , S.A. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente) e ... , S.A. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente);
b) Propor a adjudicação da proposta apresentada pela aqui Autora;
c) Conceder prazo para exercício do direito de audiência prévia.
9) 5 dos 7 concorrentes apresentaram pronúncia de exercício do direito de audiência prévia (Cfr. acta n.º 7 - Doc. 9 PI) tendo o júri do Concurso Público mantido a decisão que constava do relatório preliminar constante da acta n.º 6, do Júri do Concurso, tendo ainda concedido novo prazo para os concorrentes exercerem o seu direito de audiência prévia.
10) Nos dias 19/07/2012, 02/08/2012 e 10/08/2012, o Júri do Concurso Público reuniu tendo em vista apreciar as pronúncias proferidas pelos concorrentes, tendo, a final (Cfr. acta n.º 8 - Doc. 10 PI) concluído o seguinte:
a) Proposta de exclusão das propostas apresentadas pela ... Services, S.A. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... Serviços, Lda (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... , S.A. (por não ter as qualificações necessárias para prestar o serviço objecto do Concurso Público), Academia Informática Brava, Engenharia de Sistemas, Lda. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente), ... , S.A (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente) e ... , S.A. (por o preço apresentado ser anormalmente baixo e a justificação para o mesmo não ter sido considerada procedente);
b) Proposta de adjudicação à aqui Autora; e,
c) Proposta de enviar o relatório ao órgão competente para proferir a decisão de contratar.
11) O Conselho directivo da Entidade Demandada, em função da extinção da ANCP por fusão na Demandada, através do Decreto-Lei n.º 117-A/2012, de 14 de Junho), proferiu uma deliberação (Doc. 11 PI) de acordo com a qual:
a) Aderiu aos fundamentos e conclusões do parecer em anexo à deliberação;
b) Decidiu não adjudicar o Concurso Público em tutela do interesse público, revogando a decisão de contratar;
c) Concedeu prazo de audiência prévia aos concorrentes por cinco dias.
12) A aqui Autora apresentou requerimento de exercício do direito de audiência prévia (Cfr. Doc. 12 PI);
13) No dia 6 de Fevereiro de 2013 a aqui Autora foi notificada da decisão pela qual o conselho directivo da Demandada deliberou considerar improcedente a pronúncia apresentada pela Autora e, consequentemente, deliberou a não adjudicação do Concurso Público em tutela do interesse público (Cfr. Doc. 13 PI);
14) O presente Processo de Contencioso Pré-Contratual deu entrada nos Tribunais Administrativos, em 5 de Março de 2013 (Cfr. fls. 2 e sg SITAF).

Nos termos dos artigos 662º, n.º1 e 665º, n.ºs 1 e 2, do (novo) CPC, acrescentam-se os seguintes factos assentes, por provados:
15) O Acórdão de fls. 1027 a 1047 foi proferido por juiz singular.
16) O citado acórdão foi comunicado às partes por ofícios datados de 28.06.2013, de fls. 1049 e 1050.
17) Com data de registo no SITAF em 09.07.2013, foi apresentada pelo ora Recorrente a reclamação para a conferência de fls. 1053 a1091 (cf. também fls. 1052).
18) Em 11.07.2013 foi proferido o despacho de fls. 1102 e 1103, que aqui se dá por reproduzido, que convolou a indicada reclamação em recurso e convidou o Reclamante a apresentar alegações de recurso.
19) Com data de registo no SITAF em 30.07.2013, foram apresentadas pelo ora Recorrente as alegações de recurso de fls. 1111 a 1167 (cf. também fls. 1109).
20) A deliberação do CD da ESPAP referida em 11) é datada de 02.01.2013, teve o teor constante de fls. 807 e 808 e nomeadamente o seguinte teor: «Da análise das dúvidas levantadas pelo próprio júri e respetivas conclusões em sede de relatório final bem como da sua proposta de adjudicação, entendeu este Conselho Diretivo existirem fundadas dúvidas acerca da prossecução do interesse público que fundamenta a decisão de celebrar o acordo quadro de plataformas eletrónicas de contratação pública, nomeadamente acerca do cumprimento dos objetivos do Sistema Nacional de Compras Públicas,
Neste sentido, considerando imprescindível recorrer a uma análise e parecer especializado no âmbito do Sistema Nacional de Compras Públicas, a sociedade de advogados ... & Associados foi convidada a realizar tal tarefa tendo-a conctuído com a entrega do parecer em anexo à presente deliberação. ».
21) Está anexo à indicada deliberação o documento de fls. 809 a 824, que aqui se dá por reproduzido e que refere o seguinte: « Omissis.».
22) Comunicada a deliberação do CA do ESPAP à Central E, esta apresentou a pronúncia constante de fls. 826 a 842, que aqui se dá por reproduzida.
23) O CA do ESPAP na reunião de 31.01.2013 apreciou a supra indicada pronúncia e decidiu conforme documento de fls. 846 a 851, que aqui se dá por reproduzido, no qual se refere nomeadamente o seguinte: «
“Omissis”

» (cf. também documento de fls. 844 e 845).
O Direito
Da questão prévia da admissibilidade do recurso
Vem o DMMP suscitar a questão da inadmissibilidade do recurso por a decisão recorrida não ter sido proferida em invocação do artigo 27º, n.º1, alínea i), do CPTA e haver lugar a prévia reclamação para a conferência.
Conforme deriva dos factos provados, ora acrescentados, na situação em análise o Recorrente apresentou no prazo de 10 dias após a notificação da decisão, uma reclamação para a conferência.
Essa reclamação, por despacho de fls. 1102 e 1103, foi convolada em recurso, por se entender que no caso em apreço, uma acção de contencioso pré-contratual, a competência para proferir a decisão cabia ao juiz singular e não a um relator ou a uma formação de três juízes. Logo, da decisão proferida havia imediatamente recurso para o TCAS.
Nada há a apontar ao indicado despacho, pelo que se confirma a admissão do recurso.
Sobre o assunto já nos pronunciamos no Ac. n.º 09605/13, de 07.03.2013 (in www.dgsi.pt), ali considerando o seguinte: «os presentes autos referem-se a uma acção de contencioso pré-contratual, que vem prevista no CPTA, nos artigos 100º a 103º, e não a uma acção administrativa especial (prevista nos artigos 46º e ss. do mesmo código).
Trata-se aqui de um processo urgente, com uma tramitação própria, que se pretende simples e célere, que obedece «à tramitação estabelecida no capítulo III do título III, salvo o preceituado» no artigo 102º, n.ºs 2 a 5 (cf. artigo 102º, n.º 1, do CPTA). Ou seja, este contencioso pré-contratual obedece à tramitação estabelecida nos artigos 78º a 96º do CPTA, mas não é confundível com a forma processual correspondente à acção administrativa especial. E da tramitação referida nos artigos 78º a 96º do CPTA, não resulta a exigência da acção ser julgada em tribunal de formação de três juízes. Diferentemente, o artigo 92º do CPTA prevê que o julgamento possa ocorrer em juiz singular. O que acontece no caso vertente, pois por aplicação da regra geral do artigo 40º, n.º 1, do ETAF, os tribunais administrativos de círculo «funcionam com juiz singular, a cada juiz competindo o julgamento de facto e de direito, dos processos que lhe forem distribuídos» (cf. em sentido idêntico o artigo 46º, n.º1, do ETAF, para os processos tributários).
Tal regra do julgamento por juiz singular só não ocorre, nos termos do artigo 40º, n.º 2, do ETAF, nas acções administrativas comuns, que sigam o processo ordinário, quando as partes requeiram o tribunal colectivo (cf. artigo 646º, n.º 1, do CPC), mas desde que não haja gravação de prova, e nos termos do artigo 40º, n.º 3, do ETAF, nas acções administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal, em que o julgamento é feito, não em tribunal colectivo, mas em formação de três juízes.
Aparentemente, o CPTA, no artigo 40º do ETAF, para além do funcionamento do tribunal com juiz singular e em colectivo, figuras que tem paralelo na jurisdição cível, criou uma figura apenas para o contencioso administrativo, e unicamente para as acções administrativas especiais, no n.º 3 daquele artigo 40º, relativa a uma formação de três juízes.
Nas palavras de Carlos Alberto Fernandes Cadilha, «Esta formação corresponde a um órgão colegial, que decide em conferência, quer a fixação dos factos materiais da causa quer a solução jurídica aplicável, funcionando como juiz relator aquele a quem o processo tenha sido distribuído. (…) A formação de três juízes não se confunde com o tribunal colectivo, que apenas intervém na acção administrativa comum que siga a forma de processo ordinário, para o julgamento da matéria de facto, quando qualquer das partes o requeira e não haja lugar a gravação da prova, e com os poderes que lhe são fixados para o processo civil (artigos 40º, n.º2, do ETAF e 42º, n.º2, do CPTA e 105º e segs. Da LOFTJ» (in, do Autor, Dicionário de Contencioso Administrativo, Livraria Almedina, Coimbra, 2006, págs. 274 a 276; cf. também págs. 672 a 674).
Na realidade, da conjugação dos artigos 40º, n.º 2, do ETAF, 35º, 42º, do CPTA e 646º, n.º 1, do CPC, o tribunal colectivo que está previsto para a acção administrativa comum, visa o julgamento da matéria de facto, mas é inadmissível para todos os casos previstos no artigo 646º, n.º 2, do CPC, designadamente nas «acções em que todas as provas, produzidas antes do inicio da audiência final, hajam sido registadas ou reduzidas a escrito» (cf. alínea b) do n.º2, do artigo 646º do CPC). Ou seja, nas acções administrativas comuns é inadmissível a intervenção do colectivo quando a prova da matéria de facto se faça apenas com base em prova documental, não havendo, nessa medida, lugar à audiência de julgamento, por não haver mais prova, nomeadamente por não haver prova testemunhal a produzir. Acresce, que conforme o n.º 3 do artigo 42º do CPTA, «mesmo quando intervenha o tribunal colectivo», «a sentença é proferida pelo juiz do processo» e não pelo tribunal colectivo, que apenas tem de proceder ao julgamento da matéria de facto (nos termos do artigo 40º, n.º2, do ETAF; cf. a este propósito Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, Coimbra, 2005, pág. 216, anotação 2 ao artigo 42º do CPTA).
Ora, de forma completamente diversa, o ETAF e o CPTA, parecem ter criado aquela formação de três juízes, apenas para as acções administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal, que de forma diferente do tribunal colectivo previsto no CPC, julgará da matéria de facto e de direito. De forma totalmente diversa da prevista para o tribunal colectivo em processo civil, a indicada formação de três juízes, intervém no julgamento da matéria de facto mesmo quando «todas as provas, produzidas antes do início da audiência final, hajam sido registadas ou reduzidas a escrito» (cf. alínea b) do n.º 2, do artigo 646º do CPC). Igualmente, essa formação pode ser convocada para intervir numa audiência pública, prevista nos termos artigo 91º do CPTA, visando-se a discussão oral da matéria de facto, que pode ser toda ela documental, audiência essa que não tem paralelo no processo civil, que como acima assinalamos, não admite que se realize uma audiência de julgamento com a intervenção do tribunal colectivo, para produzir apenas prova documental. Por último, é também diferente o papel da formação de três juízes, já que procede ao julgamento de direito, enquanto no processo civil, o tribunal colectivo apenas tem de proceder ao julgamento da matéria de facto e já não ao de direito (cf. artigos 40º, ns.º 2 e 3, do ETAF, 35º, n.º2, 42º, n.º3, 91º, 92º, do CPTA e 646º do CPC).
Por conseguinte, quer àquela formação de três juízes, quer ao julgamento de facto e de direito que à mesma incumbe, nas acções administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal, não são aplicáveis as regras previstas no processo civil para a intervenção do tribunal colectivo e para a discussão e julgamento da matéria de facto em audiência de julgamento, salvo na estrita medida em que não estejam reguladas no ETAF e CPTA e possam ser subsidiariamente aplicáveis (cf. artigo 35º, n.º2, do CPTA). Consequentemente, não lhes pode ser aplicável subsidiariamente o estipulado no artigo 646º do CPA, para a formação do tribunal colectivo e para o julgamento da matéria de facto, pois tais determinações contendem directamente com o determinado no ETAF e CPTA. Nestes, prevê-se, para as acções administrativas especiais, a constituição de um tribunal formado três juízes, que não se confunde com o tribunal colectivo referido no CPC e que apenas opera nas acções administrativas comuns. No CPTA, prevê-se uma audiência pública, que inexiste e nunca poderia ocorrer num processo civil e que o julgamento pela formação de três juízes se faça de forma totalmente diferente daquela que incumbe ao tribunal colectivo, já que a indicada formação de três juízes julga de facto e de direito. E o julgamento de facto da formação de três juízes, intervém mesmo quando a prova seja apenas documental e não se realize qualquer audiência pública, nem qualquer audiência de discussão e com a apreciação da prova testemunhal.
Em termos práticos, a formação de três juízes e a audiência a realizar com a intervenção dessa formação só se assemelha à prevista no CPC, quando na acção administrativa especial se produza prova testemunhal. E só nesses casos há que fazer a aplicação subsidiária do CPC, com relação à tramitação processual a seguir, relativamente à qual o CPTA é omisso, porquanto, no que se refere à natureza do tribunal colectivo e às regras de competência para a sua formação e julgamento, as disposições do CPC são inaplicáveis, já que totalmente diversas das previstas no ETAF e CPTA para a acção administrativa especial.
Pelo exposto, as regras que o ETAF e o CPTA criaram para a acção administrativa especial e para a competência da indicada formação de três juízes, são regras únicas, apenas aplicáveis a este tipo de acção, que não se alargam aos demais meios processuais e designadamente aos urgentes, mesmo que na sua tramitação sigam o rito estabelecido para aquelas. A regra da competência do julgamento nos tribunais administrativos, tal como nos tributários, é a do juiz singular (cf. artigo 40º, n.º 1 e 46º, n.º1do ETAF). Essa competência apenas é afastada em duas formas de processo, na acção administrativa comum, nos casos em que se lhe apliquem as regras do processo civil relativas ao tribunal colectivo e na acção administrativa especial, quando deva ser julgada pela formação de três juízes.
Em suma, estando-se aqui frente a uma acção de contencioso pré-contratual, acção urgente que se distingue do outro meio processual previsto nos artigos 46º e ss. do CPTA – a acção administrativa especial – e que apenas segue «a tramitação prevista nos artigos 78º a 96º do CPTA, salvo o preceituado» no artigo 102º, n.ºs 2 a 5 do mesmo Código, aplicar-se-á a esta acção de contencioso pré-contratual a regra geral constante do artigo 40º, n.º 1, do ETAF e não a regra especial indicada no artigo 40º, n.º 3, do ETAF (cf. também neste sentido os Acs. do TCAS n.º 7802/11, de 06.10.2011 e n.º 7072/10, de 09.06.2011, in http:\\www.dgsi.pt).
Assim, não se desconhecendo a jurisprudência do Pleno do STA, que no Ac. n.º 420/12, de 05.06.2012, precisamente num processo relativo a um contencioso pré-contratual, fixou como jurisprudência que da decisão de um juiz singular em invocação dos poderes conferidos pelo artigo 27º, n.º1, alínea i), do CPTA, cabe reclamação para a conferência e não recurso directo para este TCAS, não se seguirá tal jurisprudência no caso dos autos.
Isto porque, como acima se referiu, se considera que ao contencioso pré-contratual aplica-se a regra geral do artigo 40º, n.º 1, do ETAF e não a regra especial contida no n.º 3 daquele preceito. Consequentemente, não há que invocar neste contencioso pré-contratual, os poderes que são conferidos ao relator, nos termos do artigo 27º do CPTA, e nomeadamente o conferido na alínea i) do n.º 1, daquele artigo.
Aliás, esses poderes não foram também invocados na sentença recorrida. Dos autos resulta que o presente processo, após distribuição ao juiz titular, foi tramitado também por juiz singular e assim foi decidido, sem que se determinasse em momento algum que os autos seriam julgados de facto e de direito em formação de três juízes, ou sem que se invocasse que o julgamento ocorreria pelo relator do processo ao abrigo dos poderes indicados no artigo 27º do CPTA (cf. despachos de fls. 112, 127 a 129, 148, 130 e decisão de fls. 171 a 187).
Consequentemente, a decisão ora em apreciação não terá contornos fácticos totalmente semelhantes aos referidos no Ac. do Pleno do STA, n.º 420/12, de 05.06.2012, na qual se discutia uma decisão tomada em sede de contencioso pré-contratual, mas em que era invocado o artigo 27º, n.º 1, alínea i) do CPTA.
Depois, porque de forma diversa relativamente ao decidido em tal acórdão do STA, se entende que ao contencioso pré-contratual se aplica o preceituado no artigo 40º, n.º 1, do ETAF e não o n.º 3 desse artigo, unicamente pensado para as acções administrativas especiais e não para o restante contencioso urgente, que se exige com um rito muito simples e célere, como é o caso de uma acção de contencioso pré-contratual (cf. artigo 36º, n.º1, alínea b), do CPTA).
No contencioso pré-contratual, à dissemelhança do que acontece nas acções administrativas especiais, o processo quer-se «simplificado e abreviado do modus procedendi», concedendo-se ao juiz, em ordem a alcançar aquele fito, «poderes especiais de conformação do procedimento, assumindo-se como um gestor do processo, como «Master of the Rolls» - discricionariedade in procedendo» (in Isabel Celeste M. Fonseca, Processo Temporalmente Justo e Urgência, Contributo para a Autonomização da Categoria da Tutela Jurisdicional de Urgência na Justiça administrativa, Coimbra Editora, 2009, Coimbra, págs. 944 e 945; cf. ainda págs. 946 a 950).
Assim, entende-se, a remissão da parte final da alínea b) do n.º 3 do artigo 102º do CPTA, relativa à submissão do «processo a julgamento» pelo relator, não como a indicação de que a regra a aplicar quanto à competência para decidir da acção de contencioso pré-contratual, é do tribunal colectivo ou da formação de três juízes (cf. artigo 40º, n.ºs 2 e 3 do ETAF), mas antes como a atribuição da plasticidade que é conferida a todos os processos urgentes do CPTA, que permitem que o juiz titular do processo conforme a respectiva tramitação, nos termos em que achar mais adequados ao respectivo litígio.
Neste sentido, veja-se o determinado no artigo 99º, n.º3, alínea b), do CPTA, para o contencioso eleitoral, ou o artigo 110º, n.º 3, do mesmo Código, para a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, ou o determinado nos artigos 119º, n.ºs 1 a 3 e 27º, n.º1, alínea h) do CPTA, para os processos cautelares. Em todos estes casos, mantém-se a referida plasticidade ou a «discricionariedade in procedendo» afirmada por Isabel Celeste M. Fonseca, que permitem que mesmo em processos que se querem urgentes e pensados pelo legislador para serem decididos por um juiz singular, ao abrigo da regra geral do artigo 40º, n.º1, do ETAF, se possa optar pela decisão em tribunal plural, nos termos do n.º 3 daquele artigo 40º, caso a «complexidade da matéria o justifique» (cf. artigo 119º, n.º 3, do CPTA).
Considera-se, por isso, que para todos os processos urgentes o legislador do CPTA previu como regra o julgamento por juiz singular – conforme o artigo 40º, n.º1, do ETAF -, mas não pensou a indicada regra de competência em termos imperativos, abrindo uma válvula de segurança face à novidade do Código e aos novos juízes, permitindo que mesmo nestes processos urgentes, em situações de especial complexidade, à semelhança do que se consignou para as acções administrativas especiais, o julgamento se pudesse fazer em tribunal plural.
Face ao exposto, a tramitação a seguir numa acção de contencioso pré-contratual, será o rito indicado no artigo 102º, n.º1, do CPTA, com a remissão para a «a tramitação prevista nos artigos 78º a 96º do CPTA, salvo o preceituado» no artigo 102º, n.ºs 2 a 5, com a consequente aplicação da regra geral constante do artigo 40º, n.º 1, do ETAF, ou seja, o julgamento da causa por juiz singular. Mas, caso o juiz titular do processo assim o equacione, mormente face a uma muito especial complexidade do processo, fazendo uso dos seus poderes de adequação formal, sempre poderia – pois o código não o veda e na indicada parte final da alínea b) do n.º3 do artigo 102º do CPTA, até o parece consentir – determinar o julgamento na formação alargada de três juízes, prevista no artigo 40º, n.º 3, do ETAF, para a acção administrativa especial.
No artigo 103º, n.º 2, alínea b), do CPTA, o legislador determinou, porém, que o prazo para a decisão do juiz ou para o relator submeter o processo a julgamento, é apenas de 10 dias (metade do prazo que é conferido às partes para apresentarem a contestação ou as alegações, quando as houver), assim se garantindo, mesmo que se complexifique o processo com a intervenção de um tribunal de formação plural, que a marcha processual mantém a celeridade.
Em conclusão, a presente acção de contencioso pré-contratual, em regra, deve ser julgada, de facto e de direito, por juiz singular, designadamente pelo juiz titular do processo, tal como haja resultado da distribuição, nos termos do artigo 40º, n.º 1, do ETAF, não sendo imediatamente aplicável a esta acção de contencioso pré-contratual, a regra especial de competência, estabelecida no n.º 3 daquele artigo 40º, dirigida às acções administrativas especiais de valor superior à alçada do tribunal, norma para a qual o artigo 102º, n.º 1, do CPTA, não remete, nem expressa, nem implicitamente.
Portanto, da decisão proferida, porque o não foi no âmbito dos poderes do relator, conforme artigo 27º do CPTA, mas sim no âmbito dos poderes próprios de um juiz singular, há recurso directo para este TCAS e não reclamação para a conferência».
O julgado no acórdão acima transcrito é aqui plenamente aplicável.
Porque, no caso, a decisão foi proferida no âmbito dos poderes próprios de um juiz singular, há recurso directo para este TCAS.
Assim, improcede a questão prévia da inadmissibilidade do recurso suscitada pela DMMP.
Do mérito do recurso
Vem o Recorrente imputar à decisão sindicada uma nulidade decisória, alegando que padece de omissão de fundamentação, por ser totalmente omissa quanto aos fundamentos de facto que levaram a concluir que o preço é anormalmente alto, assim como, porque padece de fundamentos contraditórios, pois nada na matéria de facto permite a conclusão de que o preço apresentado pelo ora Recorrente é anormalmente alto.
Mais vem o Recorrente arguir erro de julgamento, alegando que a sentença recorrida interpretou mal os artigos 76º e 79º do Código de Contratos Públicos (CCP), pois defendeu que o elenco das causas de não adjudicação previstas no artigo 79º do CCP é exemplificativo. Considera o Recorrente, que contrariamente ao decidido, deve julgar-se que a decisão de não adjudicação viola os artigos 76º e 79º do CCP, pois o fundamento para aquela não adjudicação não é um dos previstos no artigo 79º do CCP. Diz o Recorrente, que as causas de não adjudicação apenas podem ser as excepcionalmente previstas naquele artigo 79º do CCP, ou aquelas que se compreendam no espírito deste artigo, obtidas através de um processo de extensão teleológica dos mesmos e que vêm reconhecidas pela doutrina e pela jurisprudência.
Aduz o Recorrente, que mesmo que se entenda que o elenco do artigo 79º do CCP é exemplificativo, a não adjudicação por motivos de interesse público exige que esse interesse seja superveniente. Diz também o Recorrente, que no caso em análise não existe uma causa de interesse público, nem esse interesse é superveniente, pois o júri do procedimento quando analisou a fundamentação do preço não conclui que o mesmo fosse excessivamente alto, o que permitiria então a exclusão da proposta.
Vejamos.
É jurisprudência pacífica que só ocorre a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, nos termos do artigo do CPC, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cf. artigos 660º, nº 2, 668º, n.º 1, alínea d), do antigo CPC, 607º e 615º, n.º 1, alíneas b) a d) do novo CPC).
Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Mas só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão.
Também a nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e decisão, terá de ser grave, patente, implicando uma incongruência absoluta.
Ora, no caso em apreço, o tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as.
Para tanto, indicou o tribunal as razões de facto e de direito que levavam à sua decisão.
Na decisão recorrida explicou o tribunal de forma compreensível o seu raciocínio.
O Recorrente apesar de arguir uma omissão da fundamentação de facto, por da factualidade indicada na decisão recorrida não constarem elementos que conduzam à conclusão de que o preço apresentado é anormalmente alto, não impugna tal matéria de facto fixada na decisão, com a qual concordou.
Ali remeteu-se as afirmações de que o preço apresentado na proposta do ora Recorrente era o de valor mais elevado de entre todas as propostas, que era superior à média dos preços indicados nas outras propostas, ou que era uma proposta «anormalmente elevada» relativamente aos «preços praticados no mercado», acolhendo-se os argumentos indicados pela Entidade demandada e remetendo-se para o teor da proposta de decisão de não adjudicação.
Nota-se, ainda, que apreciada a PI, nela não são indicados como factos o valor concreto do preço apresentado pela proposta do ora Recorrente, nem o valor do preço apresentado pelas restantes propostas, nem o teor concreto do parecer do júri do concurso que apreciou as propostas que terão sido apresentadas, ou o teor concreto do acto sindicado e respectiva fundamentação. Toda essa concreta factualidade não foi alegada na PI de forma especificada.
Igualmente, na contestação apresentada pela ESPAP, a fls. 877 a 903, não se se alegou especificadamente nenhum dos factos acima referidos.
Ou seja, porque no processo administrativo ainda vigora o ónus do dispositivo, para que se considerasse que eram factos essenciais para o dirimir deste litígio a aferição do preço indicado na proposta do Recorrente, ou dos preços das restantes propostas, teriam esses concretos factos que serem alegados especificamente pelas partes.
Não foi isso que ocorreu nestes autos. Nenhuma das partes alegou os concretos preços apresentados nas propostas, ou acerca dos elementos ali constantes, factos com base nos quais depois se pudesse apreciar a fundamentação do acto impugnado relativa ao preço elevado da proposta do Recorrente, ou relativamente a um valor de mercado, que também não vem indicado como um facto concreto.
Diferentemente, as partes não quiseram trazer esses factos para o litígio. Quiseram antes, apenas, aqui discutir as decisões da entidade contratante tal como resultavam dos teores da fundamentação da proposta de decisão de não adjudicação e dessa decisão.
Assim, porque o A. e ora Recorrente nada alegou relativamente ao concreto valor da sua proposta, ou aos concretos valores das restantes propostas, ou à existência de outros concretos preços que se reconduzissem a «preços de mercado», isso não poderia ser a matéria em litígio.
Essas alegações também não foram feitas pelo R. e Recorrido.
Em suma, as partes nesta acção apenas quiseram discutir a fundamentação adoptada pelo acto impugnado, desprovida da análise concreta dos valores que foram apresentados nas várias propostas.
Por isso, na decisão sindicada se apreciou apenas a fundamentação adoptada na proposta da decisão de não adjudicação e por essa via da decisão de não adjudicação.
Somente aquela factualidade foi trazida ao litígio pelo A. e Recorrente.
Nenhuma das partes indicou factos concretos relativos ao preço apresentado por cada uma das propostas dos concorrentes, aos elementos que constituíam esse preço ou aos concretos valores do mercado.
Quer isto dizer, a factualidade que há que ser discutida pelo tribunal é apenas aquela que as partes tem o ónus de alegar nos seus factos essenciais. Não os alegando, não podia o tribunal oficiosamente trazê-los para o litígio.
Assim, não se pode entender que a decisão recorrida padeça de qualquer nulidade quando apenas apreciou os fundamentos constantes do acto de não adjudicação, desprovidos de mais análises factuais.
A apreciação do preço “anormalmente” elevado, que foi feita na decisão sindicada ateve-se ao termos do litígio tal como foi trazido a juízo e delimitado pelas partes – uma mera discussão jurídica e um tanto abstracta acerca da possibilidade de não se proceder à adjudicação face à fundamentação adoptada no acto de não adjudicação.
Não há pois aqui uma nulidade decisória, havendo que se entender que o A. apenas quis que se discutisse em tribunal acerca da fundamentação da decisão sindicada, sem que se trouxesse a juízo os factos relativos aos concretos preços apresentados nas várias propostas.
Portanto, não quis o A. e Recorrente que o tribunal se pronunciasse acerca dos concretos preços das propostas, sua comparação, média ou valores do mercado.
Pretendeu antes o A. e Recorrente a discussão meramente jurídica das questões acerca da legalidade do acto sindicado, com base apenas no teor da sua fundamentação. Na PI não diz o A., acompanhando essa alegação de factos concretos e especificados, que a fundamentação adoptada pela decisão de não adjudicação não correspondia à realidade, porque o preço da sua proposta era o adequado face aos que se praticava no mercado, qual era esse preço ou qual era o das propostas dos outros concorrentes.
E foi isso que foi conhecido pela decisão sindicada, nela apenas se apreciou e concordou com os fundamentos da proposta e da decisão de não adjudicação.
Falece assim a indicada nulidade.
Aponta o Recorrente um erro de julgamento à decisão recorrida e a violação dos artigos 76º e 79º do CCP, porque considera que o elenco das causas de não adjudicação do artigo 79º do CCP é taxativo, ou que para além daquelas causas só podem ser admitidas as que ainda se compreendam no espírito deste artigo, obtidas através de um processo de extensão teleológica do mesmo e que vêm reconhecidas pela doutrina e pela jurisprudência.
Considera também o Recorrente, que para se admitir como causa de não adjudicação o interesse público, tal interesse também teria de ser superveniente, o que não acontece no caso, pois o júri do procedimento quando analisou a fundamentação do preço não conclui que o mesmo fosse excessivamente alto, o que permitiria então a exclusão da proposta.
Neste recurso mantém-se a discussão trazida a litígio num plano meramente de direito.
Porém, mesmo para a apreciação do litígio restringido aos seus aspectos jurídicos, é ainda necessário indicar-se a toda a factualidade que justifica aquela discussão.
Por isso, foi agora ampliada oficiosamente a matéria de facto, incluindo-se nessa matéria o teor da deliberação referida em 11., o teor do parecer para o qual se remete, a indicação da existência de uma pronúncia do ora Recorrente em sede de audiência prévia e a existência e teor da deliberação do CA do ESPAP, de 31.01.2013, que após a audiência prévia manteve os termos da deliberação de 02.01.2013.
Ora, conforme deriva dos factos provados, ora acrescentados, a deliberação de não adjudicação fundamenta-se no seu próprio texto, mas também remetendo para a anterior proposta de deliberação e para o parecer anexo a esta. Ali não se remete a fundamentação para nenhum relatório do júri.
Tal como resulta provado, na deliberação de não adjudicação analisa-se e rebate-se os argumentos aduzidos pela Central E em sede de audiência prévia e remete-se essencialmente para o já antes indicado no citado parecer jurídico.
Mas acrescenta-se relativamente ao que é aduzido no parecer, como fundamento para o interesse público que suporta a decisão de não adjudicação, o seguinte: «E, note-se, pretendia-se no Concurso em causa a seleção de quatro cocontratantes particulares (artigo 14.º, n.º 1, do Programa do Concurso), por se considerar um resultado concorrencialmente aceitável, num "mercado" em que se encontram certificadas oito plataformas eletrónicas de contratação pública: http://www.base.gov.pt/base 2/html/plataformas/plataformascertificadas.html.
A eventual celebração de um acordo quadro com apenas um desses oito operadores representaria a compressão máxima - inaceitável sob a ótica do adquirente público - da concorrência de fornecedores nesta atividade económica. Representaria a instituição, por via contratual, de uma posição de monopólio perfeito para prestar serviços de plataforma eletrónica de contratação a todas as entidades compradoras vinculadas do SNCP (n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 37/2007, de 19 de fevereiro). Mais, representaria a instituição de tal monopólio via presente quadro conjuntural do País, de ainda acrescida exigência no controlo da despesa pública, retirando, por essa via, à Administração Pública qualquer margem de controlo por via concorrencial dos preços a pagar, através do lançamento de procedimentos de call off competitivos, cujos destinatários seriam os múltiplos cocontratantes de um acordo quadro com uma pluralidade destes.
A hipotética conjugação da celebração de um acordo quadro com um único cocontratante com a imposição legal da aquisição, pelas entidades compradoras vinculadas do SNCP, da disponibilidade de uma plataforma eletrónica de contratação no seio desse mesmo acordo quadro deixaria integralmente na esfera de decisão da Concorrente, assim convertida em prestadora exclusiva às referidas entidades, a determinação do preço e portanto da onerosidade do serviço».
Quanto ao parecer que faz parte da fundamentação do acto por remissão (cf. artigos 124º e 125º do CPA), refere uma abordagem jurídica relativa às possibilidades de não adjudicação, mas no seu ponto «4. Decisão final a adoptar no Procedimento», acrescenta as razões concretas porque a entidade contratante pode aqui invocar um interesse público de relevo.
Ali é afirmado, designadamente que a proposta da Central E indicava um preço de 435.000 «valor mais elevado de entre todas as propostas» e que se apresentava «manifestamente superior à média dos preços indicados nas outras propostas, como também aos preços praticados de mercado», o qual foi “criado” com o CCP e legislação conexa, que passou a obrigar todas as entidades públicas, desde 30.07.2009, a efectuar compras por aqueles meios electrónicos.
Depois, indica-se as razões porque se considera a proposta da Central-E superior à do «mercado», dizendo nomeadamente o seguinte: «Relativamente aos serviços objecto do Procedimento, e após análise das aquisições de plataformas electrónicas de contratação pública efectuadas ao abrigo do Acordo Quadro vigente (AQ-PEC), a Direcção de Compras Públicas da ANCP apurou que, nos dois anos 2010 e 2011, 7 a valor total facturado em cal-offs ao abrigo da AQPECP, agregando todos os co-contratantes, foi de € 536.245, o qual é apenas marginalmente superior ao valor unitário proposto pela Central-e, de € 435,000 por uma utilização anual da plataforma.»
E acrescenta-se o seguinte quadro comparativo:

De seguida, continua-se a justificar aquela diferença de preço, para mais, da proposta da Central E: «Os dados relativos ao primeiro semestre de 2012 - com um valor total facturado pelos co-contratantes de € 129.808 - mantêm a tendência de valores dos anos anteriores considerados. Ou seja, incluindo os dados deste primeiro semestre e anualizando (desconsiderando variações sazonais entre semestres, pouco relevantes), temos um valor médio de facturação total anual. agregando todos os co-contratantes. de € 266.421.
Acresce que, através de consulta ao Portal Base.gov, a mesma Direcção pode determinar que o valor máximo de contratação aí registado foi de € 205.000, relativo a uma plataforma electrónica por um período de 3 anos, logo com um custo anual de cerca de € 68.333, sendo que o preço contratual médio foi de € 18.748.

Ora, se for celebrado o presente Acordo Quadro com a Central-e como única cocontratante, basta extrapolar para uma hipotética aquisição - em cal-off - por todas as (onze) Unidades Ministeriais de Compras actualmente existentes, desconsiderando as demais entidades compradoras vinculadas, designadamente os institutos públicos, para chegarmos a um valor total de facturação. por ano, que poderia atingir € 4.785.000. ».
Posteriormente, nesse parecer, com base naqueles elementos que se transcreveram diz-se: «Perante o preço proposto pela Central-E e considerando os dados acima, demonstrativos de forte deseconomia para a Administração Pública, por comparação com os dados do "mercado", pode o órgão competente para a decisão de contratar deliberar não adjudicar a prestação deste serviço à única proposta não excluída?
Afigura-se-nos que pode (e que, enquanto única agente de tutela do interesse público nesta fase), por vários motivos:
- A criação da ANCP e do Sistema Nacional de Compras Públicas (SNCP) teve como desiderato último a redução da despesa pública, mediante uma organização centralizada das compras públicas, com vista a obter economias de escala e poupanças, racionalização das aquisições e melhoria da competitividade entre os fornecedores do Estado.
- A agregação das necessidades aquisitivas é uma das grandes ferramentas de criação de economias de escala na aquisição e de obtenção de poupanças, conforme dispõem os artigos 4.° e 5.° do Decreto-Lei n.º 37/2007, de 19 de Fevereiro.
- O SNCP tem por objectivo promover a aquisição, de forma centralizada, de bens móveis e de serviços pelas entidades compradoras, mediante a intervenção da ANCP - como entidade gestora do SNCP - e das Unidades Ministeriais de Compras (UMC), sendo a figura do acordo quadro aquela que é seguida para efeitos de seleccionar as entidades que, durante o período de tempo em que ele é vigente, ficam habilitadas a fornecer ao Estado determinadas categorias de bens e serviços de que este necessita.
- O SNCP, além da ANCP e das UMC, integra entidades compradoras vinculadas e entidades compradoras voluntárias (artigo 3.°, n.º 1, do Decreto-lei nº 37/2007).
- De acordo com o n.º 2 do referido artigo, integram o SNCP na qualidade de entidades compradoras vinculadas, os serviços da administração directa do Estado e os institutos públicos, num total de cerca de 1800 entidades. Dispõe ainda o n.º 3 do artigo 3.° do mesmo diploma que podem integrar o SNCP, na qualidade de entidades compradoras voluntárias, entidades da administração autónoma, local e regional, e do sector empresarial público, mediante a celebração de contrato de adesão com a ANCP.
- Perante a abrangência do SNCP e a obrigatoriedade que recai sobre as entidades compradoras vinculadas de contratar ao abrigo do Acordo Quadro, fácil é antever que a contratação dos serviços à Central-e - com um preço consideravelmente superior ao do "mercado" - representaria um acréscimo exorbitante da despesa pública neste tipo de serviços, o que - sobretudo, no actual contexto de défice excessivo, e em face dos compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português - impõe uma ponderação, exigente e acrescida, quanto à necessidade de ser adoptada uma decisão de não adjudicação no caso vertente.
- Afigura-se-nos que a adjudicação proposta pelo Júri - vinculado, por lei, a esse resultado - compromete os objectivos de obtenção de economias na despesa pública, traçados pelo legislador à ANCP (agora à ESPAP) no âmbito do SNCP - tal como vertidos no Decreto-Lei n.º 37/2007.
Na verdade, a eventual adjudicação de uma proposta com um valor muito superior ao praticado no "mercado·pode, inclusive, afectar a legalidade da decisão de adjudicação se esta implicar a violação das atribuições, e da "fatia" de interesse público, que cabe prosseguir à entidade adjudicante na qual se insere o órgão competente para a decisão de contratar.
Por conseguinte, a celebração do acordo quadro com um só prestador de serviços, pelo preço anual proposto de €435.000, representa um custo desproporcionado, que não pode ser aceite pela ANCP (agora, ESPAP), custo esse que pode configurar um lucro abusivo por parte do cocontratante privado, a obter de entidades compradoras vinculadas, ex lege, a contratar no âmbito dos acordos quadro celebrados pela ANCP (agora, pela ESPAP). »
Portanto, face aos factos provados, ora acrescentados, há que concluir que a decisão de não adjudicação foi fundada no interesse público que a entidade contratante considerou de relevo, relativo à circunstância de ter aberto um concurso através da central de compras, com vista a obter uma economia de escala e poupanças, mas face às propostas que foram apresentadas, todas consideradas com um preço anormalmente baixo, acabou por se manter no concurso uma única concorrente, a Central –E, cuja proposta apresenta um preço muito superior aquele que resulta da análise comparativa para o mesmo tipo de serviço, face aos anos de 2010 e 2011.
Estimou a entidade contratante, que se 11 unidades de compras adquirissem em call-off, se chegaria a «um valor total de facturação por ano que poderia atingir €4.785.000».
Feita esta indicação dos fundamentos aduzidos pela Administração para não adjudicar a única proposta que se manteve em concurso, a da Central E, ora Recorrente, há que concluir que no caso se considerou que no contexto da redução da despesa pública e do défice público, face aos compromissos internacionais assumidos pelo Estado português e à obrigação da Entidade contratante, uma central de compras, contratar com um fito de economia de gastos, a presente adjudicação corresponderia a uma violação das suas atribuições, a um custo desproporcionado face ao fim do contrato a celebrar e a um lucro abusivo pela Central E.
Ou seja, aqui o interesse público que foi invocado foi essencialmente económico.
A entidade contratante, uma central de compras, abriu o presente concurso com vista a obter uma contratação economicamente favorável, mas atendendo aos termos como definiu o concurso, sem a fixação de um preço base e face às propostas que foram apresentadas, acabou por ver manter-se no concurso uma única concorrente, cuja proposta, se adjudicada, não só não lhe permitiria esses ganhos face à escala de compras, mas significaria uma adjudicação por um preço substancialmente mais elevado do que aquele que nos anos de 2010 e 2011 tinha sido pago a outras empresas por serviços similares.
Mas foram ainda invocados como fundamento para a decisão de não adjudicar outros interesses relativos a uma sã concorrência. É afirmado que «num "mercado" em que se encontram certificadas oito plataformas eletrónicas de contratação pública (…) a eventual celebração de um acordo quadro com apenas um desses oito operadores representaria a compressão máxima - inaceitável sob a ótica do adquirente público - da concorrência de fornecedores nesta atividade económica. Representaria a instituição, por via contratual, de uma posição de monopólio perfeito para prestar serviços de plataforma eletrónica de contratação a todas as entidades compradoras vinculadas do SNCP».
Quanto a este fundamento, de uma sã concorrência, vai para além de uma mera razão económica e constitui ele mesmo um dos princípios fundamentais exigidos à contratação pública.
Considerando que o “mercado” aqui em causa é, tal como aduzido pela entidade contratante, um mercado “criado” por força de uma opção legislativa e que se restringe ao universo da própria Administração em sentido lato, operando pelo menos 8 empresas no mercado, tendo participado no concurso 7 delas, ficando todas excluídas, salvo a Central E, sem dúvida que por acção de um contrato público, para o tempo de vigência do acordo-quadro, de 2 anos, automaticamente renovável (para contratos celebrados ao seu abrigo com uma duração mínima de 1 ano e máxima de 3), criar-se-ia, na prática, por um tempo economicamente relevante, uma situação de monopólio no fornecimento deste serviço a favor da Central E (cf. artigos 1º, 14º do Programa de Concurso, 3º, 19º e 20º do Caderno de Encargos).
Nota-se, ainda, que num “mercado” como Portugal, com uma economia pequena, em que a actividade económica privada “vive” em grande medida “à custa” da contratação pública, ou pelo menos, num país em que a contratação do Estado constitui uma contratação de relevo, a escolha por via do acordo-quadro em apreço de uma única empresa a operar, quando se pretendia escolher 4 empresas, será, sem dúvida, uma contratação que pode distorcer ou prejudicar a concorrência.
Acresce, que a contratação através de uma única empresa em resultado do acordo-quadro, claramente não era a intenção querida pela Administração, que esperava adjudicar as 4 melhores propostas, tal como definira nos critérios de adjudicação (cf. artigo 14º do Programa de Concurso).
A circunstância de se verificar, após a abertura do concurso, que todos os concorrentes têm de ser excluídos, menos um, porque apresentavam uma proposta com um preço anormalmente baixo, é algo superveniente à abertura do próprio concurso, à vontade de contratar.
Pergunta-se, assim, verificado supervenientemente à decisão de abertura de um concurso, que a única proposta que se manteve como admissível implica uma adjudicação por um preço consideravelmente mais elevado do que o preço de mercado, a uma única empresa, quando se pretendia adjudicar a 4 empresas, está a entidade contratante obrigada a adjudicar aquela proposta àquela empresa, ou pode desistir da decisão de contratar, não adjudicando, por as causas indicadas no artigo 79º do CCP não serem taxativas, mas exemplificativas?
Julgamos que num caso como o dos autos é legal a entidade contratante decidir pela não adjudicação.
Neste caso, os pressupostos da decisão de contratar alteraram-se supervenientemente ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas (cf. artigo 79º, n.º 1, alínea d), do CCP).
Na realidade, a entidade contratante lançou o concurso com vista a adjudicar as «4 melhores propostas de acordo com o critério do mais baixo preço», sendo que «as propostas de mais baixo preço são as que apresentam menor valor no somatório do preço total anual de utilização da plataforma com o preço unitário dos serviços opcionais de parametrização» - cf. artigos 8º, n.º 1 e 14º, n.ºs 1 e 2 do Programa de Concurso.
Não fixou a entidade contratante um preço base.
Assim, apresentaram-se a concurso 7 concorrentes, considerando o júri do concurso que os preços apresentados foram muito díspares. Pedidos esclarecimentos aos concorrentes, acabaram por 6 das propostas serem excluídas por apresentarem preços anormalmente baixos. Restou a proposta da ora Recorrente, a Central E, que como resulta do acima expendido, apresentou um preço muito superior ao do mercado, entendido como aquele que resultava da comparação das contratações feitas para os anos anteriores.
Consequentemente, há que concluir que a Entidade contratante falhou nos propósitos que tinha quando abriu o concurso: para obter uma proposta que trouxesse vantagens económicas face à economia de escala que se esperava, pois tratava-se de um concurso aberto por uma central de compras, para um acordo quadro, onde se seleccionassem as «4 melhores propostas de acordo com o critério do mais baixo preço».
Verificada essa falha supervenientemente à decisão de contratar, decidiu revogou a anterior decisão, pois o concurso tornou-se imprestável ao fim pelo qual o iniciou (cf. artigos 261º, n.º 1, alínea c) e 263º do CCP).
Para tanto, invocou a Entidade contratante o interesse público inerente àquela não adjudicação e fundamentou suficientemente aquele interesse.
Da fundamentação adoptada constam dados concretos acerca das estimativas da Administração, antecedentes acerca de contratações similares, as razões de economia que justificam a alteração da decisão e a frustração da sua intenção de abrir um concurso com vista a seleccionar pelo menos 4 empresas e não só uma.
Portanto, haverá aqui uma situação paralela àquelas que estão previstas no artigo 79º, nomeadamente à da alínea d) do n.º 1 deste artigo 79º do CCP.
Tal artigo não é taxativo, mas meramente exemplificativo.
Contudo, considerar exemplificativo o artigo 79º não significa que em regra a entidade contratante, uma vez aberto o procedimento de concurso e fazendo-o prosseguir, não fique obrigada a terminá-lo adjudicando a proposta vencedora (cf. artigo 76º do CCP). Essa é a regra, tal adjudicação é um acto tendencialmente devido, corolário dos princípios da boa fé e da confiança.
Admite-se, contudo, que em situações excepcionais, que serão as previstas no artigo 79º do CCP, ou outras similares, a entidade contratante possa revogar a decisão de contratar e não prosseguir o concurso com a correspondente adjudicação (cf. neste sentido, Acs. do TCAS n.º 8222/11, de 19.01.2012; na doutrina, vide, Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação, Livraria Almedina, Coimbra, 2001, págs. 1053 a 1055; Jorge Andrade da Silva, Código dos Contratos Públicos, Comentado e Anotado, Almedina, Coimbra, 2008, págs. 307 e 308 - anotações ao artigo 76º, 3 e 6 - págs. 318, 319 e 320 - anotações ao artigo 79º, 2 a 5 e 8 - pág.321, anotações ao artigo 80º; Maria João Estorninho, Curso de Direito dos Contratos Públicos, Livraria Almedina, Coimbra, 2012, págs. 408 a 413, 460 a 465 e 461; Tiago Duarte, «A Decisão de Contratar no Código dos Contratos Públicos: Da Idade do Armário à Idade dos Porquês», em Estudos de Contratação Pública I, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pág. 177; Bernardo Azevedo, «Adjudicação e Celebração do Contrato no Código dos Contratos Públicos», em Estudos de Contratação Pública II, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, págs. 227 a 252; João Amaral e Almeida e Pedro Fernández Sánchez, «Abertura de Procedimento Pré-contratual e Dever de Adjudicação», em Temas de Contratação Pública, I, Coimbra Editora, 2011, págs. 275 a 289. Aparentemente em sentido diferente ao defendido neste acórdão, mas referindo-se à não admissão de um «poder discricionário de livre apreciação das propostas», vide Sérvulo Correra, Lino Torgal e Pedro Fernández Sánchez, «Alteração de Circunstâncias e Modificação de Propostas em Procedimentos de Contratação Pública», em Estudos de Contratação Pública III, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, págs. 179 a 200. Notamos que estes Autores não se pronunciam nesta análise a uma situação totalmente similar à dos autos. Acabam, porém, por defender a possibilidade dos contraentes, público e privado, se “desvincularem” das suas obrigações, que conduzem a um “negócio ruinoso”, assim como a preponderância do interesse público. Consequentemente, nessa medida, o sentido do seu estudo não é completamente diverso ao propugnado neste acórdão).
Em todos os casos de não adjudicação, ficará a Administração com a obrigação e indemnizar os concorrentes cujas propostas não tenham sido excluídas nos termos do n.º 4 daquele artigo 79º do CCP (cf. ainda o artigo 334º relativo à resolução do contrato por razões de interesse público).
Esta indemnização é o reverso da frustração das expectativas legítimas e juridicamente tuteladas dos concorrentes que viram as suas propostas manterem-se no concurso e em posição de serem as adjudicadas. Ou visto de outra forma, é o corolário do sacrifício dos princípios da boa fé e da tutela da confiança e dos direitos que decorriam para os concorrentes por imposição desses princípios.
Porque estes princípios da boa fé e da tutela da confiança não são absolutos e têm de conviver com os demais princípios e regras, aqui se avultando os princípios da prossecução do interesse público, da economia, da boa gestão da coisa pública e da sã concorrência, são admissíveis excepções à regra do artigo 76º do CCP. Daí a previsão do artigo 79º do mesmo código. E pela mesma razão, a defesa do carácter meramente exemplificativo deste último artigo.
Em suma, no caso em apreço não só existe uma situação de interesse público devidamente fundamentado que justifica aquela alteração da decisão de contratar, como a desistência de contratar se deveu a uma causa superveniente àquela decisão.
Isto porque, queria a entidade pública lançar um concurso para alcançar uma aquisição economicamente adequada ou vantajosa, seleccionando as 4 melhores propostas, e acabou por ver subsistir no concurso a proposta de uma única concorrente, que apresentava um preço muito superior àquele que seria o preço que a entidade contratante estimou como o de mercado.
Poderá dizer-se que era possível à entidade contratante evitar a situação com que se deparou, nomeadamente se tivesse configurado o concurso com vista a seleccionar obrigatoriamente 4 propostas apresentadas e tivesse fixado um preço base (cf. artigos 47º, 70º, n.º 2, alínea d), 251º, 252º, 253º, n.º 4, do CCP, 14º do Programa do Concurso e 19º do Caderno de Encargos; cf. a este propósito João Amaral e Almeida e Pedro Fernández Sánchez, «Definição do Preço Base como Critério de Exclusão de Propostas Contratualmente Inaceitáveis», em Temas de Contratação Pública, I, Coimbra Editora, 2011, págs. 353 a 369; Claúdia Viana, «O Acordo Quadro», Revista de Direito Público e Regulação, Cedipre, Setembro de 2009, edição e-book em www.fd.uc.pt/cedipre, págs. 16 e 17).
Acontece, que bem ou mal, a entidade contratante configurou assim o concurso. Terá a entidade contratante errado no seu juízo de prognose relativamente ao valor das propostas que seriam apresentadas. Esse erro, mesmo que pudesse ter sido evitado se a entidade contratante “imaginasse” que a contratação poderia prosseguir e terminar como acabou, ocorreu efectivamente e só foi constatado após a decisão de contratar e a definição dos termos do concurso. E para a verificação de um interesse público relevante e superveniente, justificativo da decisão de não adjudicação ao abrigo do artigo 79º do CCP, não há que afastar uma situação de erro na forma como se configurou o concurso, ou na forma como se pretendia contratar, pressuposto da decisão revogada.
Aqui não houve uma decisão arbitrária de revogar a decisão de contratar, não se adjudicando a proposta da Central E. Diversamente, a Administração invocou um interesse público relevante, superveniente e fundamentou com dados concretos a razão pela qual a adjudicação à Central E lesava o interesse público e conduzia a uma contratação por um preço desproporcional relativamente ao fim do contrato. Igualmente, foi invocada a violação de um princípio de concorrência sã, por num mercado com pelo menos 8 empresas a operar, querendo-se seleccionar um grupo de 4, acabar-se por criar uma situação de monopólio a favor da Central E.
Depois, face à actual situação financeira de Portugal, que exigiu uma intervenção externa, facto que é público e notório, a boa gestão da coisa pública e o princípio da economia ganharam um relevo preponderante na aferição do interesse público.
Assim, os fundamentos aduzidos pela entidade contratante relativos aos custos desproporcionais e não queridos para o erário público e aos ganhos também desproporcionais para a empresa que manteve a proposta não excluída, têm de ser atendidos para efeitos de aceitar-se como lícita a não adjudicação numa situação como a dos autos, que será paralela à prevista na alínea d) do n.º1 do artigo 79º do CCP (cf. a propósito da obrigação de a contratação pública respeitar os princípios da boa gestão pública e da economia, sob pena de se poder efectivar pelo Tribunal de Contas a correspondente responsabilidade financeira, José F. D. Tavares, «Os Contratos Públicos e a sua Fiscalização pelo Tribunal de Contas», em Estudos de Contratação Pública I, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, págs. 972 a 974, 984 e 990; sobre os objectivos de economia de escala da celebração de acordos-quadro, vide Claúdia Viana, «O Acordo Quadro», Revista de Direito Público e Regulação, Cedipre, Setembro de 2009, edição e-book em www.fd.uc.pt/cedipre, págs. 11 a 13 e 20 a 22).
Aliás, permitindo o artigo 334º do CCP a resolução do contrato por razões de interesse público devidamente fundamentado, nenhum sentido faria considerar-se o artigo 79º do CCP como taxativo e totalmente vinculada a obrigação de adjudicar (cf. artigo 76º). Isto porque, face ao estipulado naquele artigo 334º do CCP, a entidade contratante sempre poderia logo de imediato à adjudicação e à celebração do contrato, resolvê-lo (cf. também artigo 330º do CCP).
Se o interesse público é preponderante para que de forma unilateral – mas fundamentada – a Administração possa resolver um contrato já celebrado, então também o será para a tomada da decisão de não adjudicação, que está a jusante daquele na tramitação procedimental correspondente. Esta decisão de não adjudicação, em termos procedimentais, encontra-se inserida num momento em que os direitos e expectativas do concorrente vencedor são menores, quando comparadas com o momento seguinte ao da celebração do contrato. Quem pode o mais pode o menos. Se a entidade contratante pode unilateralmente resolver o contrato por imperativos de interesse público, terá também que poder decidir pela não adjudicação, quando em causa estejam tais imperativos e fundamente suficientemente a sua decisão (cf. a este propósito, Carla Amado Gomes, «A Conformação da Relação Contratual no Código dos Contratos Públicos», em Estudos de Contratação Pública I, Coimbra Editora, Coimbra, 208, págs. 534 a 549, 551 e 554 a 557).
Em conclusão, o presente recurso tem de improceder e há que manter a decisão sindicada, pelos fundamentos antes indicados.
Dispositivo
Pelo exposto, acordam em:
- em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente.
Lisboa, 10/10/2013
(Sofia David)

(Carlos Araújo)

(Teresa de Sousa) – Com a ressalva
de que entendo de que deveria haver reclamação para a conferência

CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL - INALTERABILIDADE OU DA ESTABILIDADE DAS REGRAS DO PROCEDIMENTO - DECISÃO JUDICIAL - PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO - AUDIÊNCIA PRÉVIA



 10299/13    TCAS     10 Out 2013


I- Determinada por decisão judicial a suspensão da eficácia de normas consideradas ilegais e insertas num Programa de concurso, não viola as regras da inalterabilidade ou da estabilidade das regras do procedimento, a conduta do júri que faz irrelevar na sua apreciação posterior os documentos apresentados por exigência das normas consideradas ilegais.
II- Não viola o princípio do inquisitório a conduta do júri do concurso que não prossegue com averiguações acerca de uma invocada falsidade ou acerca de falsas declarações relativas a manuais de voo entregues por um concorrente em cumprimento da norma do concurso cuja eficácia foi entretanto suspensa por decisão judicial e que mais tarde veio a ser declarada ilegal por decisão transitada em julgado e havida em sede de uma acção de contencioso pré-contratual.
III- Num concurso público, a decisão do júri de acatamento de uma decisão judicial não dá lugar a uma nova fase de audiência prévia

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul
Vêm interposto recurso da decisão do TAF de Sintra, que julgou improcedente a presente acção de contencioso pré-contratual, onde se impugna a decisão de adjudicação do lote 3, de 13.02.2013, tomada no âmbito do Concurso n.º 04/EMA-2012, lançado pelos Ministérios da Administração Interna (MAI) e da Saúde (MS), através do Conselho de Administração da EMA, Entidade de Meios Aéreos, SA, e do Conselho Directivo do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), para aquisição de serviços de manutenção e operação de meios aéreos próprios e locação de meios aéreos complementares para missões do MAI e do INEM.
Em alegações são formuladas pelos Recorrentes as seguintes conclusões:«
I. É objecto do presente recurso a aliás douta sentença pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual onde as Autoras, ora Recorrentes, atacaram o acto administrativo impugnado – a deliberação de adjudicação datada de 13.02.2013, tomada pelas RR EMA e INEM relativa ao Lote 3 do Concurso n.º 04/EMA-2012, para locação de 25 (vinte e cinco) helicópteros ligeiros e correspectivos serviços de manutenção e operação por um período de 5 (cinco) anos, a decorrer durante os anos de 2013 a 2017 - e o procedimento concursal relativo ao referido Lote 3.
II. A sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento em matéria de facto, porquanto a matéria de facto dada como assente na sentença recorrida é manifestamente insuficiente para a boa decisão da causa e correcta determinação do direito aplicável, sendo que, perante os elementos instrutórios constantes dos autos, existem factos que ficaram de fora do leque dos dados como provados, embora fossem e sejam determinantes para a boa decisão da causa.
III. O Tribunal Central Administrativo pode alterar e ampliar a matéria de facto dada como assente, nos termos permitidos pelo artigo 149.º do CPTA e artigos 685.ºB e 712º nº 1 do CPC, alteração dos factos constantes das alíneas V, W e X e ampliação e aditamento que se requerem relativamente aos factos supra alegados nas alíneas RR a KKK constantes do título II das alegações supra, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
IV. Acresce ainda que a sentença recorrida padece, salvo o devido respeito, de vários erros de julgamento de direito que importa a este Venerando Tribunal corrigir.
V. Desde logo, a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por não ter feito uma correcta interpretação e aplicação do princípio do inquisitório e do dever de decisão constantes dos arts. 56º, 9º e 87º, nºs 1 e 2 do CPA.
VI. O princípio do inquisitório, inscrito no art. 56º CPA, como corolário do princípio da prossecução do interesse público, assinala o papel preponderante dos órgãos administrativo da decisão administrativa e, em estreita combinação com o principio da verdade material impunha ao júri do concurso em apreciação nos presentes autos, não apenas a realização das diligências necessárias ao apuramento da verdade, mas a tomada de posição e decisão perante as pertinentes questões que lhe haviam sido colocadas e que consistiam na imputação à concorrente, contra interessada nos presentes, da prática de factualidade que, sem prejuízo de participação às autoridades competentes, determinaria a exclusão da sua proposta.
VII. Ao decidir como decidiram, o Júri do concurso e as Entidades Adjudicantes, ora Recorridas, demitiram-se, ilegalmente, do seu dever de decidir com base numa interpretação errada dos efeitos da sentença de 21.01.2013, proferida no processo cautelar n.º 1370/12.3BEBRG-A, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, sentença essa que suspendeu, entre outras, o art. 9º, nº 3, al. d) do Programa do Concurso em causa nos autos, nos termos da qual ”A proposta apresentada para o lote 3 deve ser constituída pelos seguintes documentos: (…) d) Manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (HELICÓPTEROS LIGEIROS A) propostas, indexado ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens.” FACTO constante da alínea G).
VIII. Ao demitirem-se de um dever a que se encontravam vinculados por força de lei, o Júri do concurso e as Entidades Adjudicantes violaram os princípios do inquisitório e da verdade material e de decisão, o que inquinou o acto impugnado.
IX. As diligências de prova que o Júri do concurso deveria ter concluído incidiam sobre a apresentação de documentos falsos ou falsificados na proposta da Contra-Interessada ... , denunciadas e demonstradas pelas Recorrentes.
X. A sentença recorrida erra, assim, quando julga que, pelo facto de ter sido suspensa a norma que exigia a apresentação dos referidos documentos, objecto das falsificações, o Júri do concurso ficou dispensado de concluir as suas averiguações. Mais, ficou até impedido de o fazer.
XI. O erro de julgamento está em concluir que, por força da decisão cautelar proferida a 21.01.2013, a actuação do Júri do concurso há-de ter por cenário a inexistência da norma, como se nunca ela tivesse existido.
XII. Sucede que, ao invés, a norma em causa existiu e foi eficaz durante o tempo suficiente para que as concorrentes, ora litigantes, apresentassem propostas orientadas pela exigência ínsita na mesma, pelo que à data em que as propostas foram apresentadas por ambas as concorrentes – 25 de Outubro de 2012 - a norma que mais tarde, por sentença proferida a 21.01.2013, viria a ser suspensa, estava em vigor.
XIII. Assim a sentença recorrida erra ao decidir que o júri se viu impedido de apreciar a prática de falsificações de documentos que lhe haviam sido apresentados com a proposta da ... , por tal questão ter ficado fora do âmbito dos poderes de apreciação do júri, como tal, considerando válida do ponto de vista legal a decisão do júri de não se pronunciar sobre aquelas e de não tomar uma posição para efeitos do disposto no art. 146.º, n.º 2 do CCP.
XIV. A relevância da apresentação de documentos falsos ou falsificados, no âmbito dos concursos públicos, não depende da instauração de processo-crime e de punição do infractor, bastando que perante os documentos apresentados se possa concluir, do ponto de vista administrativo, da desconformidade do documento apresentado com o seu original, o que está bem evidenciado, pelo menos relativamente a 3 dos 25 manuais de voo apresentados pela ... , na declaração feita por um membro do grupo técnico que assessorou o júri do concurso, o Comandante Martinho Martins, junta ao processo.
XV. O art. 9º, nº 3, al. d) do Programa de Concurso, que exigia a apresentação dos referidos documentos, objecto das falsificações, só foi suspenso em 21/01/2013 e a sua suspensão tem eficácia ex nunc.
XVI. Como tal, a apresentação pela Concorrente ... em 25/10/2012 de documentos falsos ou falsificados exigia necessariamente a sua apreciação administrativa e concursal e que fossem– e sejam - retiradas as devidas e legais consequências, quer no âmbito do Concurso, em particular para efeitos da exclusão da proposta apresentada pela ... nos termos do disposto nos arts. 146º nº 2, em particular na al. m) e 148º, nº 1 do CCP, quer fora do Concurso para efeitos criminais.
XVII. O Júri no seu relatório final ignorou totalmente as consequências previstas na lei que advêm para os concorrentes com a apresentação de documentos falsos ou falsificados e da prestação culposa de falsas declarações, sendo indiferente, para o efeito, saber quem foi o autor da falsificação (o que se investiga no inquérito criminal em curso), uma vez que a simples apresentação de documentos falsos ou falsificados e da prestação culposa de falsas declarações é causa de exclusão da proposta nos termos do arts. 146.º, n.º 2, m) e 148º, nº 1 do CCP.
XVIII. Nesta medida, em face das normas procedimentais e legais aplicáveis ao Concurso, e bem assim em face dos princípios gerais de direito e dos princípios específicos da contratação pública, deveria ter sido proposto pelo Júri do Concurso e decidido pelas Entidades Adjudicantes a exclusão da proposta apresentada pela Concorrente B ... e a adjudicação do Lote 3 às AA., ora Recorrentes, Concorrente A.
XIX. De onde decorre que a decisão de adjudicação impugnada violou e viola o disposto nos artigos 9º, 56º, 87º nºs 1 e 3, 124.º nº 1 als. a), c) e) e 125.º nºs 1 e 2 do CPA, e artigo 268 nº 3 da CRP, e nos arts. 70º, nº 2, al. g), 146º, nº 2, als. d), m) e o) e 148º, nº 1 do Código dos Contratos Públicos, violando, dessa forma, os princípios da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da transparência, da proporcionalidade, da concorrência, da boa fé, da decisão e do inquisitório, pelo que deveria ter sido declarada nula ou, caso assim não se entendesse, anulada pelo Tribunal a quo, sob pena de, ao não o ter feito, a sentença recorrida ter violado as referidas disposições legais e os mencionados princípios de direito.
XX. Ao decidir pela improcedência dos vícios de violação do principio do inquisitório e do dever de decidir a sentença incorreu em erro de julgamento em matéria de direito, violando, em consequência, o disposto nos artigos 9º, 56º, 87º nºs 1 e 3, 124.º nº 1 als. a), c) e) e 125.º nºs 1 e 2 do CPA, e artigo 268 nº 3 da CRP, e nos arts. 70º, nº 2, al. g), 146º, nº 2, als. d), m) e o) e 148º, nº 1 do Código dos Contratos Públicos, e, bem assim, os princípios da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da transparência, da proporcionalidade, da concorrência, da boa fé, do inquisitório e da decisão.
XXI. Sem prescindir, acresce ainda que a sentença recorrida erra, ainda, no seu julgamento de direito quando conclui pela improcedência do vício de forma de preterição de audiência prévia assacado ao acto impugnado e assim decidiu que “para além de não se verificarem os pressupostos de nova audiência prévia previstos no n.º 2 do art. 148.º do CCP, também não existiam quaisquer conclusões para dar a conhecer às Autoras sobre as diligências realizadas”.
XXII. O instituto do direito de audiência de interessados, concretizado nos artigos 100º e seguintes do CPA, enquanto manifestação do princípio da participação dos interessados no procedimento administrativo, consagrado no artigo 267.º, n.º5 da CRP, é transversal a todos os procedimentos, salvo nos casos excepcionais de inexistência ou dispensa expressamente indicados no artigo 103º do referido diploma.
XXIII. As Recorrentes tinham o direito de, e o interesse em, serem ouvidas quanto à interpretação, efeitos e conclusões que o júri do concurso retirou da sentença cautelar de 21.01.2013 do TAF de Braga, e quanto às suas implicações a nível de procedimento concursal.
XXIV. A sentença recorrida ignora a arguição das Recorrentes do seu direito a serem ouvidas quanto à alteração das regras do concurso, votando-se ao silêncio, o que poderá ser qualificado como verdadeira omissão de pronúncia, acarretando a nulidade da sentença recorrida nos termos previstos no art. 668º, nº 1, al. d) do CPC, o que se invoca, para os devidos efeitos legais.
XXV. O direito de audiência dos interessados, regulado nos artigos 100º a 104º, é aplicável aos procedimentos especiais, por força do n.º 5 do art. 2º do CPA, incluindo o procedimento pré- contratual.
XXVI. A interpretação dada pela sentença recorrida ao disposto no artigo 100.º do CPA e artigo 148.º do CCP, na medida em que restringe a satisfação do princípio constitucionalmente consagrado, no artigo 267º, n.º 5 da CRP, da participação dos interessados na formação das decisões ou deliberações que lhes digam respeito, é inconstitucional.
XXVII. Pois o Código dos Contratos Públicos não pode limitar o âmbito de aplicação do previsto no 100.º do CPA, sob pena de estar ferido de inconstitucionalidade se assim se o entender.
XXVIII. Ao não julgar violado o direito à audiência prévia das Recorrentes, a sentença recorrida incorreu, assim, em erro de julgamento em matéria de direito por errada interpretação e aplicação do disposto nos art. 267.º, n.º 5 da CRP e 100° do CPA.
XXIX. A sentença recorrida erra, ainda, no seu julgamento de direito quando conclui pela improcedência do vício de violação de lei por violação do princípio da transparência e do disposto no art. 146º, nº 2, al. m) do CCP.
XXX. As Recorrentes denunciaram a existência de graves imprecisões e desconformidades nos manuais de voo das supostas 25 aeronaves com que a Concorrente ... se apresentou ao concurso.
XXXI. As desconformidades denunciadas relativamente a, pelo menos, 3 das aeronaves foram confirmadas por um membro do grupo técnico que assessorou o Júri do Concurso.
XXXII. Com efeito, os 25 manuais de voo das aeronaves AS 350 B3 apresentados pela Concorrente ... são composições de outros manuais de duas aeronaves que nem sequer não foram apresentadas a concurso.
XXXIII. A apresentação de documentos falsos ou falsificados, bem como a prestação de falsas declarações por parte de um concorrente, deve determinar a sua exclusão independentemente da apresentação dos documentos falsos ter sido determinada por norma que, em data posterior, viria a ser desaplicada.
XXXIV. Acrescendo ao caso sub judice que as desconformidades entre os documentos apresentados pelo concorrente e os originais foram confirmadas, pelo menos parcialmente, por membro do grupo técnico de apoio ao júri e a este dada a conhecer.
XXXV. A sentença cautelar que ordenou a não aplicação da norma que obrigava à junção de manuais de voo produziu efeitos a partir da data da sua notificação às partes, tendo efeitos ex nunc.
XXXVI. Aliás, se tivesse tido eficácia ex tunc, nunca poderiam ter sido aproveitados os actos que foram praticados no Concurso relativamente ao Lote 3, em particular, não poderiam ter sido mantidas as propostas apresentadas pelos dois concorrentes que se apresentaram a concurso!
XXXVII. O júri do procedimento pré-contratual, sem prejuízo de participação à entidade competente, tem competência material, restrita ao âmbito administrativo, para apreciar a falsificação de qualquer documento de habilitação ou a prestação culposa de falsas declarações por concorrente.
XXXVIII. Se assim não fosse, ficariam esvaziados de aplicação prática e de relevância procedimental administrativa e concursal os artigos 87.º, 456.º do CCP, entre outros.
XXXIX. O júri de um procedimento concursal tem, nos termos da lei aplicável, quer o CCP, quer o CPA, não só competência administrativa material, como o dever de fiscalizar o cumprimento da legalidade por parte das entidades que se propõem contratar com ele, sob pena de, não o fazendo, violar o princípio da legalidade, ínsito nos artigos 266.º, n.º 2 da CRP, e artigo 3.º do CPA.
XL. A decisão de adjudicação, na medida em que aceitou que não tinham de ser concluídas as investigações em curso e não tinham de retiradas as necessárias consequências legais - que no caso seriam a exclusão da proposta apresentada pela Concorrente B ... e a adjudicação à proposta apresentada pelas ora Recorrentes classificada em segundo lugar - em virtude da sentença cautelar mencionada no FACTO constante da alínea I), violou o artigo 146º n.º 2 al. m) do CCP.
XLI. Nestes termos, e porque a matéria em apreço respeita a procedimento administrativo concursal, que era da competência do Júri do concurso e das Entidades Adjudicantes, o Tribunal a quo errou no seu julgamento quando não julgou verificada a violação do disposto no art. 1.º, nº 4 (princípio da transparência), 57.º, n.º 1 al. c), 146.º nº 2, al. m) e 148º, nº 1 do CCP, normas que se devem ter por violadas pela sentença recorrida.
XLII. A sentença recorrida erra, ainda, no seu julgamento de direito quando conclui pela improcedência do vício de violação de lei por violação do disposto no art. 79º, nº 1, al. c) do CCP e dos princípios da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da transparência, da concorrência, da boa fé e dos princípios da estabilidade das regras do concurso e da inalterabilidade ou intangibilidade das propostas.
XLIII. As Recorrentes defenderam nos autos recorridos que, caso não fosse declarada nula ou anulada pelo Tribunal a quo a decisão de adjudicação com os fundamentos supra referidos e ordenada a sua substituição por outra que adjudicasse o Lote 3 à proposta das AA., então, por força do disposto no art. 79º, nº 1, al. c) do CCP, sempre a referida decisão de adjudicação do Lote 3 teria de ser declarada nula ou anulada pelo Tribunal por ter ocorrido uma alteração das condições essenciais do Concurso relativamente ao Lote 3 e por, em consequência de não ter sido tomada a decisão de não adjudicação, terem sido violados vários princípios de direito aplicáveis à contratação pública, em particular os princípios da estabilidade das regras do concurso e da inalterabilidade das propostas.
XLIV. Com efeito, entendem as Recorrentes que a decisão judicial proferida pelo TAF de Braga que determinou a suspensão da eficácia do art. 9º, nº 3, al. d) do Programa do Concurso acarretou uma alteração das condições determinantes de um elemento essencial do concurso para o Lote 3.
XLV. Por um lado, a norma que o Júri do concurso desaplicou, no âmbito do Lote 3 do Concurso, é de carácter essencial, conforme vem provado pelas decisões proferidas no TAF de Braga, no âmbito dos processos 1370/12.3BEBRG-A e 1370/12. 3BEBRG.
XLVI. Acresce que o TCA Norte confirmou, por acórdão transitado em julgado a 21 de Junho de 2013, o que tinha sido decidido pelo TAF de Braga na acção principal quanto à ilegalidade da referida norma concursal, atenta a sua essencialidade.
XLVII. Ora, decorre da aplicação conjugada dos artigos 50º, n.º 3 e 79º, n.º 1, alínea c), 2, 130º, 132º, n.º 1, alínea f), do CCP, que as peças do concurso, nos seus aspectos fundamentais, para além das rectificações a efectuar até ao termo do segundo terço do prazo para a apresentação das propostas, hão-de manter-se estáveis.
XLVIII. Por essa razão, no art. 79.º, nº 1 do CCP, referente às “Causas de não adjudicação”, prevê-se que “1 - Não há lugar a adjudicação quando: (…) c) Por circunstâncias imprevistas, seja necessário alterar aspectos fundamentais das peças do procedimento após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas; "
XLIX. No caso em apreciação nos presentes autos, a alteração das normas concursais ocorreu por força de uma decisão judicial que determinou a suspensão de aplicação de norma concursal. Ora, essa suspensão alterou as condições determinantes de um elemento essencial do concurso.
L. Ao publicitar o Programa do Concurso, e depois, ao prestar os esclarecimentos, as Entidades Adjudicantes informaram o mercado que pretendiam que as empresas concorrentes apresentassem os manuais de voo das 25 aeronaves complementares (helicópteros ligeiros a) propostas, indexado ao número de série, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragem de cada uma das aeronaves.
LI. Ora, a detenção e possível apresentação desses documentos implicam a sua propriedade ou a sua detenção a título de locação ou por meio de contrato promessa, com inerentes encargos.
LII. Com efeito, a aplicação da norma em causa exigia que o concorrente fosse proprietário ou locatário das aeronaves ou tenha celebrado promessa de comprar ou locar essas mesmas aeronaves a quem seja o proprietário delas.
LIII. Foi, pois, foi no pressuposto dessa exigência que as várias empresas a actuar no mercado terão optado por participar ou não participar no concurso, nomeadamente por não serem titulares daqueles manuais de voo.
LIV. As Recorrentes apresentaram-se sob a forma de consórcio porquanto compreenderam as razões de fundo da exigência em causa, pelo que, ao aceitarem as condições impostas pelo Concurso, sentiram necessidade de se agrupar com vista ao dar cumprimento ao requisito imposto no art. 9º, nº 3, al. d) do Programa do Concurso, que mais tarde viria a ser suspenso e declarado ilegal.
LV. Caso não houvesse necessidade de apresentação os referidos manuais de voo das aeronaves, as Recorrentes estariam em condições de apresentar propostas em condições diferentes daquelas em que o fizeram. Poderiam ter-se apresentado em nome individual, poderiam estabelecer preços inferiores, porquanto não seriam penalizadas com os actos preparatórios que, necessariamente, encetaram.
LVI. Caso o Programa do Concurso não exigisse a entrega dos referidos manuais de voo, as Recorrentes poderiam, quer individualmente quer em agrupamento, ter feito uma proposta baseada numa pesquisa de mercado meramente indiciária, que serviria para tomar o peso aos preços praticados e às disponibilidades médias futuras e tipos de aeronave, sem ter a necessidade de as garantir, de prometer contratar, sem pagar sinal ou reserva. Uma maior facilidade de acesso ao concurso teria tido directas repercussões no preço.
LVII. O preço constante da sua proposta, ainda que em agrupamento, seria inferior, caso não se tivessem sujeitado ab initio às normas cuja aplicação foi posteriormente suspensa e declarada ilegal.
LVIII. Ora, o preço é uma condição essencial do contrato e era, no caso do concurso dos autos, o único elemento ou atributo das propostas submetido à concorrência.
LIX. Assim sendo, a desaplicação da norma que impôs a apresentação dos referidos manuais de voo, uma vez já estes apresentados, com o prosseguimento do Concurso relativo ao Lote 3, acarretou não só a violação do disposto no art. 79º, nº 1, al. c) do CCP, como a violação de vários princípios gerais de direito aplicáveis à contratação pública, muito em particular os princípios da estabilidade das peças do procedimento - de acordo com o qual as peças do procedimento devem manter-se inalteradas durante a pendência dos respectivos procedimentos, sendo proibida a sua alteração (eliminação, aditamento, modificação) ou desconsideração - e da inalterabilidade das propostas.
LX. A admitir-se a necessidade de alterar, de corrigir, o Programa do Concurso, não se retirando as consequências legais que se impunham – que era e é a exclusão da proposta apresentada pela Concorrente ... e a adjudicação à proposta apresentada pelas Recorrentes - então, o procedimento pré-contratual não podia prosseguir.
LXI. Com efeito, a supressão de uma exigência, ao nível de documentos constitutivos da proposta, com repercussões directas a nível do preço, constitui uma alteração – e ainda por cima fundamental – das regras do Concurso.
LXII. Ora, nos termos previstos no artigo 79°, n.º 1, alínea c), do Código dos Contratos Públicos, não há lugar à adjudicação quando por circunstâncias imprevistas seja necessário alterar aspectos fundamentais das peças do procedimento após o termo fixado para a apresentação das propostas.
LXIII. A decisão final, ao desaplicar as normas suspensas e ao decidir não decidir sobre a falsidade dos documentos apresentados, fazendo seguir, sem mais, o procedimento violou o princípio da intangibilidade das propostas apresentadas pelos concorrentes.
LXIV. O legislador em momento algum pretendeu atribuir qualquer discricionariedade ao júri no sentido de solucionar a irregularidade das propostas considerando-as como “não escritas” ou melhor, no caso em concreto, como não apresentados os documentos anteriormente tidos como documentos constitutivos das propostas.
LXV. Acresce que a decisão final do LOTE 3, em detrimento da não anulação do procedimento pré- contratual referente ao mesmo lote em clara violação do art. 79º, nº 1, al. c) do CCP, incorporou ainda uma violação directa dos Princípios da Igualdade, da Imparcialidade, da Transparência, da Proporcionalidade, da Concorrência e da Boa Fé.
LXVI. É que, ao comparar o preço das propostas apresentadas pelas duas concorrentes, uma que, mercê de compromissos e investimentos preparatórios, apresentou efectivamente 25 aeronaves a concurso, e outra que apresentou um único manual de voo, a decisão de adjudicação trata de modo igual o que não é igual, violando os princípios da igualdade, da imparcialidade, da proporcionalidade e da boa fé.
LXVII. Pelo que supra foi dito, resulta ainda que a decisão de adjudicação viola o princípio da concorrência e consequentemente da comparabilidade das propostas.
LXVIII. Não só as Recorrentes poderiam ter apresentado melhor preço, como eventualmente podiam ter-se apresentado a concurso outros concorrentes, que por carência dos documentos inicialmente exigidos se viram na contingência de não apresentar proposta neste procedimento pré-contratual para o Lote 3.
LXIX. Assim sendo, atenta a essencialidade da norma, o Júri do concurso não podia decidir desaplicar uma norma e fazer seguir o concurso, aproveitando todos os actos de concurso já praticados.
LXX. A desaplicação do artº 9º, n.º 3, alínea d) do Programa do Concurso traduziu-se, assim, numa alteração das regras do concurso, numa matéria que traduzindo-se num documento que devesse ser apresentado por todos os concorrentes, teve a aptidão de impedir que quem não se encontrasse em condições de o apresentar, tenha optado por não apresentar proposta ao concurso ou então, tenha apresentado em condições menos favoráveis do que a Contra- interessada que apenas teve de contratar as aeronaves após a adjudicação da sua proposta.
LXXI. E mais, não se diga que apenas se verifica uma alteração substancial das regras do concurso quando a decisão que declarar a ilegalidade da norma desaplicada transitar em julgado, porquanto, como tem vindo a ser defendido na jurisprudência, e com o que se concorda, tal alteração ocorre com a mera desaplicação, acompanhada ou não de decisão judicial que declare a sua ilegalidade.
LXXII. Assim, a sentença recorrida, na parte em que considerou não verificada a violação da alínea c) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP, violou o referido preceito e, bem assim, os princípios da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da transparência, da concorrência, da boa fé e muito em particular os princípios da estabilidade das regras do concurso e da inalterabilidade e intangibilidade das propostas.
LXXIII. Mas ainda que assim não se entendesse, o que não se concede e só por cautela de patrocínio se equaciona, ainda assim à data da apresentação das presentes alegações de recurso, já tendo transitado em julgado o Acórdão do TCA Norte que confirmou a decisão do TAF de Braga que declarou a ilegalidade da norma concursal em causa, verifica-se uma alteração formal nas normas do Concurso relativamente ao Lote 3, pelo que se encontra preenchida a exigência formal a que se refere a sentença recorrida.
LXXIV. No sentido propugnado pelas Recorrentes nas presentes alegações de recurso pronunciaram- se os Mui Ilustres Jurisconsultos Dr. Mário Esteves de Oliveira e Dr. Rodrigo Esteves de Oliveira, no parecer que se junta.»
O Recorrido ... , Aviação Executiva, SA (em diante ... ), apresentou as contra alegações onde formula as seguintes conclusões: «
A. A matéria de facto dada como provada pela Sentença recorrida encontra-se bem fixada, não sendo necessária qualquer alteração, tanto que as alterações que vêm peticionadas dizem respeito a factos irrelevantes, sendo que muitos deles foram expressamente impugnados e não resultam provados por qualquer das formas processualmente admissíveis.
B. O Recurso apresentado, tal como o Parecer que lhe vem junto, partem do sofisma de que terá ocorrido uma falsificação de documentos, facto que é falso e que nunca foi provado, em qualquer das instâncias administrativas e judiciais onde a questão se colocou.
C. A única declaração no sentido da existência de irregularidades nos manuais apresentados com a proposta da ... ao concurso sub iudice, não tem valor probatório, desconhecendo-se a sua valia técnica, autoria e a isenção (ou falta dela) com que foi prestada.
D. A providência cautelar de suspensão de eficácia de normas concursais decretada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga determinava a desconsideração de tais normas na decisão do concurso, assim como a continuação do procedimento, tal como reafirmou - e bem - a Sentença recorrida.
E. A decisão cautelar de suspensão de normas significava que a exigência documental contida na norma privada de eficácia deixou de ser relevante para a tramitação subsequente do procedimento, incluindo a decisão (cf. Parecer jurídico junto).
F. A tese segundo a qual as entidades adjudicantes deveriam, apesar da Sentença cautelar, considerar as normas cautelarmente suspensas desrespeitaria, em absoluto, os efeitos decorrentes das decisões jurisdicionais, como bem decidiu o Tribunal a quo.
G. A Sentença recorrida andou bem ao desconsiderar o alegado vício de preterição de uma (suposta) segunda audiência dos interessados, porque, nos termos da lei, não há lugar a essa fase procedimental em casos como o presente.
H. O sofisma quanto à alegada falsificação de documentos é retomado pelas Recorrentes para sustentar a violação da alínea m) do artigo 146.º/2 do CCP, o que não constitui um facto provado, improcedendo, por isso, o vício apontado à Sentença recorrida quanto à interpretação do Direito aplicável (cf. Parecer jurídico junto).
I- Os documentos tornados irrelevantes por Sentença judicial obrigatória não podem ser considerados para qualquer efeito, nomeadamente para aplicação da causa de exclusão prevista na alínea m) do artigo 146.º/2 do CCP, tal como foi decidido pela Sentença recorrida (cf. Parecer jurídico junto).
J. A situação do concurso sub iudice, depois de decretada a providência cautelar, não implicava qualquer alteração às condições essências do procedimento , havendo apenas que desaplicar, dali em diante, as normas cuja eficácia foi suspensa.
K. Tal como foi decidido pela Sentença recorrida, não estavam reunidas as condições legais de que depende a existência da causa de não adjudicação prevista na alínea e) do artigo 79./1 do CCP.
L. A alteração que tal providência cautelar imprimiu no procedimento não atingiu o núcleo duro da sua estabilidade, um qualquer aspecto fundamental do procedimento (cf. Parecer jurídico junto).
M. A alteração também não era fundamental porque dela não resultaria a inversão do resultado do concurso, seja porque a proposta da aqui Recorrida não continha qualquer razão de exclusão, seja porque - e bem ao contrário - a proposta das Recorrentes padecia de (pelo menos) 4 vícios bem evidentes, todos tendentes à sua imediata exclusão do procedimento.
N. A proposta das Recorrentes ao concurso sub iudice (i) integrava sete manuais de voo escritos em língua não admitida pelo programa de concurso, (ii) integrava outros manuais de voo que não eram constituídos por todos os elementos exigidos pelo programa de concurso,
(iii) integrava outros manuais que violavam normas regulamentares, e (iv) uma das empresas Recorrentes apresentou a proposta quando não tinha, de acordo com prova documental junta , a sua situação perante a Segurança Social regularizada - tudo motivos que, sem necessidade de ulteriores indagações, condenariam à exclusão a proposta das Recorrentes.
K. A jurisprudência do STA citada pelas Recorrentes não invalida o decidido pela Sentença recorrida porque se reporta a situação oposta à dos presentes autos, uma vez que a norma em causa não era essencial e havia evidentes razões, atendendo ao objecto do concurso, para imprimir celeridade ao procedimento sub iudice (cf. Parecer jurídico junto).
L. Andou bem a Sentença recorrida a não considerar violado o princípio da igualdade, uma vez que, em resultado da providência cautelar decretada, ambas as concorrentes ao procedimento ficaram em perfeita igualdade de circunstâncias, não tendo as Recorridas suportado maiores custos com a apresentação da sua proposta, como o demonstra, à saciedade, a prova documental junta.»
Os Recorridos EMA e INEM nas suas contra alegações formularam as seguintes conclusões: «
1. As pretendidas alterações e ampliações da matéria de facto são irrelevantes para a decisão da causa;
2. Concretamente no que respeita à pretendida nova alínea KKK) essa ampliação é juridicamente impossível, porque diz respeito a um facto que nunca foi alegado nos autos pela simples razão de que é posterior à prolação da sentença recorrida;
3. A forma como conclusões da alegação das Recorrentes se encontram organizadas viola inequivocamente o n.º 1 do artigo 685.º-A do CPC, pelo que devem as Recorrentes ser convidadas a esclarecê-las ou, no mínimo, a sintetizá-las, corno impõe o n.º 3 do mesmo artigo 685.º-A;
4. A sentença recorrida não viola o disposto no artigo 56.0 do CPA (principio do inquisitório), uma vez que essa norma contém uma permissão e não um dever de proceder a diligências;
5. A sentença recorrida também não violou o disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 87.º do CPA pois decidiu muito bem quando decidiu que o júri do concurso averiguou todos os factos cujo conhecimento era relevante;
6. O cumprimento da sentença, de 21 de janeiro de 2013, do TAF de Braga (proferida no processo cautelar n.º 1370/12.3BEBRG-A) impôs ao júri do concurso e às entidades adjudicantes qualquer averiguação sobre factos relativos aos manuais de voo que foram apresentados ao abrigo da alínea d) do n. 3 do artigo 9. do programa do concurso;
7. Decidiu também bem a sentença recorrida quando considerou que não foi violado o artigo 9. do CPA, uma vez que foi decidido o «assunto» da competência das entidades adjudicantes: a análise e a avaliação das propostas;
8. Decidiu bem a sentença recorrida quando decidiu que não ocorreu o vício de forma por preterição da audiência prévia dos interessados, uma vez que sobre a questão da desaplicação da alínea d) do n.º 3 do artigo 9.º do Programa do Concurso não tinham as Recorrentes qualquer direito a ser ouvidas em audiência prévia;
9. Sobre essa questão as Recorrentes só tinham direito de recorrer para tribunal superior, o que aliás fizeram;
10. Decidiu bem a sentença recorrida quando conclui pela improcedência do vício de violação do princípio da transparência, uma vez que as Autoras não concretizaram, minimamente que fosse, em que consistiria essa violação;
11. A sentença recorrida não comete qualquer erro de julgamento por ter concluído não se verificar o vício de violação da alínea m) do n.º 2 do artigo 146º do CCP;
12. Não podem as Recorrentes, em sede de recurso jurisdicional, continuar a sustentar que a contrainteressada ... apresentou documentos falsos ou falsificados;
13. O júri do concurso nunca chegou a formar qualquer conclusão ou sequer qualquer juízo preliminar sobre essa matéria;
14. É falso - rotundamento falso - que o júri tenha alguma vez concluído pela falsidade ou falsificação de documentos, ao contrário do que, ao longo das suas alegações, as Recorrentes insistem;
15. Por outro lado, a sentença ora recorrida, em nenhuma das alíneas relativas aos factos dados como assentes, deu como provado a existência de documentos falsos ou falsificados;
16. A imputação de um erro de julgamento à sentença ora recorrida com fundamento na violação da alínea m) do n.0 2 do artigo 146.º do CCP implicaria que a sentença tivesse dado como provado a existência de documentos falsos ou falsificados, o que não sucedeu;
17. Em alternativa, a imputação de um erro de julgamento à sentença ora recorrida com fundamento na violação da alínea m) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP implicaria que, em sede do presente recurso recurso jurisdicional, as Recorrentes tivessem impugnado a decisão da matéria de facto assente com fundamento na respetiva insuficiência por não inclusão da matéria relativa às alegadas falsidades e falsificações de documentos e, simultaneamente, tivessem impugnado a sentença na parte em que a mesma considerou desnecessária a realização de prova pericial sobre essa matéria, o que também não sucedeu;
18. É pois quanto basta para que, em sede do presente recurso jurisdicional, a matéria da alegada existência de documentos falsos ou falsificados ou de falsas declarações, e a consequente violação da alínea m) do n.º 2 do artigo 146.0 do CCP, esteja totalmente prejudicada;
19. O mui douto parecer junto pelas Recorrentes afigura-se totalmente imprestável para a decisão do presente recurso jurisdicional, uma vez que esse parecer foi elaborado num pressuposto que não é verdadeiro: o de que estaria provado (ou ainda poderia ser) que os documentos juntos pela concorrente ... , ora contrainteressada, são falsos ou incorporam falsas declarações;
20. A razão pela qual o júri não prosseguiu a análise dos manuais de voo apresentados por ambos os concorrentes ficou a dever-se ao facto de ter sido confrontado com a sentença, de 21 de janeiro de 2013, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (proc. n.0 1370/12.3BEBRG-A), a qual determinou a suspensão da eficácia da norma da alínea d) do n.º 3 do artigo 9.º do Programa do Concurso;
21. Cumprir essa sentença passava necessariamente por desaplicar a referida norma, isto é, analisar as propostas apresentadas ao concurso sem ter em conta a exigência da apresentação dos manuais de voo das aeronaves;
22. Não existe qualquer relevância autónoma da causa de exclusão de propostas prevista na alínea m) do n.º 2 do artigo 146. do CCP na hipótese em que os documentos alegadamente falsos ou falsificados apresentados foram ilegalmente exigidos no programa do concurso;
23. A não ser assim, qualquer documento que um concorrente faça constituir como parte da sua proposta - mesmo que não tenha qualquer relevância no contexto do concurso - passa a ter de ser analisado quanto à sua falsidade, bem como - no caso de se tratar de uma declaração - se essa declaração é ou não falsa;
24. Perante uma sentença judicial que determina a suspensão da eficácia da norma do Programa do Concurso que impõe aos concorrentes a apresentação de um certo documento (seja ele uma barra de ouro de 24 quilates, seja ele um manual de voo de uma aeronave), não podem o júri nem as entidades adjudicantes analisar o documento para dele extraírem a consequência da eventual exclusão do concorrente, qualquer que seja o motivo dessa exclusão, por exemplo, se a barra é mesmo de ouro ou se é sofisticado pechisbeque ou se os manuais de voo são mesmo verdadeiros ou se são refinadas falsidades;
25. A alínea c) do n.º 1do artigo 79.º do CCP não foi violado nem pelo então impugnado ato de adjudicação, nem, consequentemente, pela sentença ora recorrida;
26. Mesmo que tenha havido alteração de uma norma (essencial ou não) do programa do concurso, a adjudicação nunca é ilegal por violação da alínea e) do n.º 1 do artigo 79. do CCP;
27. A norma da alínea e) do n.0 1 do artigo 79.0 do CCP dispõe sobre as condições de não adjudicação, nada tendo a ver com as condições (de legalidade) da adjudicação;
28. A alínea e) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP só pode ser violada na situação - que não é o caso sub judíce - em que a entidade adjudicante profere um ato de não adjudicação não se verificando, in casu, os pressupostos contidos na referida alínea;
29. O n.º 1do artigo 79.º do CCP estabelece uma faculdade e não um dever de não adjudicação;
30. Por outras palavras: não é a alteração que impõe, subsequentemente, a não adjudicação; é a intencionada alteração que permite a não adjudicação;
31. A ser ilegal o ato de adjudicação praticado na sequência da desaplicação de uma norma do programa do concurso, essa ilegalidade só pode residir na violação da própria norma (ilegalmente) desaplicada;
32. Mas no caso sub judice, a alteração (por desaplicação da alínea d) do n.0 3 do artigo 9.0 do programa do concurso) da norma sobre as exigências instrutórias­ documentais das propostas não foi urna alteração/ desaplicação ilegal;
33. Essa desaplicação deveu-se apenas ao necessário cumprimento de urna sentença: a sentença do TAF de Braga, de 21 de janeiro de 2013;
34. Essa sentença decretou a suspensão da eficácia da norma da alínea d) do n.º 3 do artigo 9.º do Programa do Concurso e, além disso, ao não ter dado provimento ao pedido que também lhe fora formulado de suspensão da eficácia do próprio procedimento concursal, determinou que o concurso prosseguisse sem a referida norma;
35. Sustentar que o ato de adjudicação, de 13 de fevereiro de 2013, praticado na sequência de tal decisão jurisdicional é ilegal porque tal adjudicação viola a alínea e) do n.0 1do artigo 79.0 do CCP significaria que cumprir aquela sentença representou afinal uma ilegalidade ...;
36. Mas sustentar que o ato de adjudicação, de 13 de fevereiro de 2013, praticado na sequência de tal decisão jurisdicional é ilegal porque tal adjudicação viola a norma que resulta da aplicação da alínea d) do n.º 3 do artigo 9. programa do concurso conjugada com a alínea m) do n.º 1do artigo 146.º do CCP significaria que cumprir aquela sentença é ignorar a desaplicação por ela ordena-la ...;
37. O cumprimento da sentença do TAF de Braga, de 21 de janeiro de 2013, nunca podia conduzir à prática de um ato de adjudicação que não desaplicasse (alterasse, portanto) aquela norma do programa do concurso;
38. Se as entidades adjudicantes tivessem iniciado um novo procedimento, não só estavam a incumprir a referida sentença, como arriscavam estar a tomar uma decisão precipitada (e ilegal, no final) já que se mantinha aberta a possibilidade de, no processo principal em que se impugnava a norma em causa, se verificar um desfecho no sentido da perfeita legalidade dessa norma;
39. Com efeito, no momento da prática do ato de adjudicação (13 de fevereiro de 2013), os dados de facto e de direito - os únicos que tem relevância para aferir da sua legalidade - eram estes: a sentença do TAF de Braga, de 15 de janeiro de 2013, que declarara a ilegalidade da norma da alínea d) do n.0 3 do artigo 9.0 do programa do concurso estava a ser reapreciada num recurso jurisdicional, com efeito suspensivo, para o Tribunal Central Administrativo Norte;
40. A pretensa violação, pela sentença ora recorrida, de oito princípios jurídicos... (ponto VI das alegações das Recorrentes) não tem qualquer fundamento, pois tal alegação é destituída de concretização, nomeadamente do próprio sentido deôntico (que não existe) nos referidos princípios;
41. Finalmente, o presente recurso jurisdicional tem por objeto a sentença proferida pelo TAF de Sintra em 6 de junho de 2013; a qual, por seu turno, decidiu um processo contencioso em que se afere da (i)legalidade de um ato administrativo praticado em 13 de fevereiro de 2013;
42. Esta (i)legalidade só pode ser aferida pela lei e pelos factos vigentes/ existentes nessa data;
43. Por isso, as implicações que possam resultar do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 31 de maio de 2013, e transitado em julgado em 21 de junho de 2013, só podem pois ser analisadas, discutidas e aferidas no âmbito do processo de execução da sentença que esse acórdão confirmou (a sentença do TAF de Braga, de 15 de janeiro de 2013, proferida no processo n.0 1370/12.3BEBRG).»
A DMMP não se pronunciou.
Sem vistos, vem o processo à conferência.
Os Factos
Na decisão de 1º instância foram dados por assentes, por provados, os seguintes factos, que se mantém:
A) Pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2012, publicada no Diário da República, 1.ª Série, n.º 128, de 4 de julho de 2012, determinou-se que o INEM, I.P., procedesse, sob a forma de agrupamento de entidades adjudicantes, com a EMA, ao lançamento do procedimento concursal necessário à aquisição dos serviços de manutenção e operação dos meios aéreos próprios e dos serviços de disponibilização e locação de meios aéreos para a prossecução das missões públicas atribuídas ao Ministério da Administração Interna e ao INEM, I.P., durante os anos de 2013 a 2017 – cfr. processo instrutor apenso.
B) No Diário da República, II.ª Série, Parte L, n.º 136, de 16.07.2012, foi publicado o Anúncio de Procedimento n.º 2854/2012, com o seguinte teor:
MODELO DE ANÚNCIO DO CONCURSO PÚBLICO
1 - IDENTIFICAÇÃO E CONTACTOS DA ENTIDADE ADJUDICANTE
NIF e designação da entidade adjudicante: 508053307 - EMA - Empresa de Meios Aéreos, SA.
501356126 - Instituto Nacional de Emergência Médica, IP Endereço: Av. Casal Ribeiro n.º 14 - 3º
Código postal: 1000 092 Localidade: Lisboa Telefone: 00351 213118540
Fax: 00351 213153134
Endereço Eletrónico: geral@ema-sa.pt 2 - OBJETO DO CONTRATO
Designação do contrato: Concurso Público n.º 04/EMA-2012
Descrição sucinta do objeto do contrato: Aquisição dos serviços de manutenção e operação dos meios aéreos próprios e locação de meios aéreos complementares para missões do Ministério da Administração Interna e do Instituto Nacional de Emergência Médica.
Tipo de Contrato: Aquisição de Serviços
Valor do preço base do procedimento 189291000.00 EUR […]
5 - DIVISÃO EM LOTES, SE FOR O CASO
Lote n.º 1
Designação do lote: Aquisição dos serviços de manutenção e operação das aeronaves médias próprias e do respetivo material de apoio operacional complementar, bem como dos serviços de atualização de manuais e publicações e de assistência técnica.
Preço base do lote: 64000000.00 EUR […]
Lote n.º 2
Designação do lote: Aquisição dos serviço de manutenção e operação das aeronaves ligeiras próprias e do respetivo material de apoio operacional complementar, bem como dos serviços de atualização de manuais e publicações e de assistência técnica.
Preço base do lote: 16500000.00 EUR […]
Lote n.º 3
Designação do lote: Locação de 25 aeronaves complementares (helicópteros ligeiros A), bem como aquisição dos correspetivos serviços de manutenção e operação.
Preço base do lote: 41323000.00 EUR […]
Lote n.º 4
Designação do lote: Locação de 8 aeronaves complementares (helicópteros médios), bem como a aquisição dos correspetivos serviços de manutenção e de operação.
Preço base do lote: 21288000.00 EUR […]
Lote n.º 5
Designação do lote: Locação de 4 aeronaves complementares (aviões anfíbios médios), bem como a aquisição dos correspetivos serviços de manutenção e operação.
Preço base do lote: 13680000.00 EUR […]
Lote n.º 6
Designação do lote: Locação de 4 aeronaves complementares (helicópteros ligeiros B), bem como a aquisição dos correspetivos serviços de manutenção e operação.
Preço base do lote: 32500000.00 EUR Lote n.º 7
Designação do lote: Aquisição dos serviços manutenção e operação das aeronaves médias próprias, das aeronaves ligeiras próprias e do respetivo material de apoio operacional complementar, bem como dos serviços de atualização de manuais e publicações e de assistência técnica.
Preço base do lote: 80500000.00 EUR […]
Lote n.º 8
Designação do lote: Locação de 25 aeronaves complementares (helicópteros ligeiros A), de 8 aeronaves complementares (helicópteros médios), de 4 aeronaves complementares (aviões anfíbios médios) e de 4 aeronaves complementares (helicópteros ligeiros B), bem como a aquisição dos correspetivos serviços e de manutenção e operação.
Preço base do lote: 108791000.00 EUR […]
7 - PRAZO DE EXECUÇÃO DO CONTRATO
Restantes contratos
Prazo contratual de 60 meses a contar da celebração do contrato […]
12 - CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO
Mais baixo preço […]
Regime de contratação: DL nº 18/2008, de 29.01
[….]” – cfr. o processo instrutor apenso e doc. 7 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, cujo teor se dá por reproduzido.
C) Constituem peças do procedimento do concurso o Programa do Concurso (PC), o Caderno de Encargos (CE) e respetivos anexos – cfr. o processo instrutor apenso e docs. 8 e 9 juntos com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, cujo teor se dá por reproduzido.
D) As aeronaves complementares, cuja locação constitui objeto do lote 3 destinam- se à execução de missões de combate a incêndios florestais e missões de emergência médica – cfr. cláusula 4.ª da Parte B do CE, constante do processo instrutor apenso.
E) Relativamente ao lote 3, pretendem as Entidades Adjudicantes celebrar contrato de locação de 25 aeronaves existentes no mercado ou que se encontrem em processo de fabrico, que cumpram determinadas especificações técnicas e operacionais, bem como adquirir os correspondentes serviços de manutenção e operação – cfr. cláusula 1.ª da Parte B do CE constante do processo instrutor apenso.
F) Os períodos de operação, no que tange ao lote 3, iniciam-se, em 01.06.2013 – cfr. cláusula 5.ª, n.º 2, al. a) 1. do CE constante do processo instrutor apenso.
G) O artigo 9.º do Programa de Concurso dispõe o seguinte:
«[…] ARTIGO 9.º
Documentos que constituem as propostas
1. A proposta apresentada para o lote 1 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]2. A proposta apresentada para o lote 2 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]
3. A proposta apresentada para o lote 3 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]d) Manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (HELICÓPTEROS LIGEIROS A) propostas, indexado ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens;
[…] 4. A proposta apresentada para o lote 4 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]d) Manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (HELICÓPTEROS MÉDIOS)
propostas, indexado ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens;
[…]5. A proposta apresentada para o lote 5 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]d) Manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (AVIÕES ANFÍBIOS MÉDIOS) propostas, indexado ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens;
[…]6. A proposta apresentada para o lote 6 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]d) Manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (HELICÓPTEROS LIGEIROS B) propostas, indexado ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens;
8. A proposta apresentada para o lote 8 deve ser constituída pelos seguintes documentos: […]
c) Os documentos referidos nas alíneas c), d) e e) do n.º 3;
d) Os documentos referidos nas alíneas c), d) e e) do n.º 4;
e) Os documentos referidos nas alíneas c), d) e e) do n.º 5;
f) Os documentos referidos nas alíneas c), d), e) e f) do n.º 6 […]» – cfr. o PC constante do processo instrutor apenso.
I) Na mesma data que antecede a EVEJETS apresentou providência cautelar da suspensão do procedimento que correu em apenso aos autos referidos na alínea que antecede sob processo n.º 1370/12.3BEBRG-A, no qual foi proferida Sentença em 21.01.2013, que julgou parcialmente procedente a providência e decretou «a suspensão de eficácia do artigo 9.º, n.º 3, al. d), n.º 5, al. d), n.º 6, al. d), n.º 8, al. c), d), e) e f) do Programa do Concurso» e «[n]o que tange ao pedido de suspensão de eficácia do procedimento concursal, julgou que o mesmo não merece provimento porquanto, decretando-se a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais (…) a Requerente fica em condições de apresentar proposta, ficando acautelada a sua posição jurídica, bem como a utilidade prática do processo principal que a providência cautelar visa acautelar» – cfr. docs. 11 e 17 juntos com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, que aqui se dão por reproduzidos.
J) O prazo de apresentação das propostas, inicialmente previsto até ao dia 04.09.2012, foi prorrogado até ao dia 25.10.2012 – cfr. PC constante do processo instrutor apenso, e por acordo.
K) As Autoras agruparam-se em consórcio para se apresentarem ao concurso – por acordo.
L) Foram pedidos esclarecimentos sobre o artigo 9.º, n.º 3, al. d) do Programa do Concurso, designadamente, «se bastaria um manual de voo genérico do tipo das aeronaves apresentadas a concurso» ao que as Entidades Adjudicantes responderam: «Não, as Entidades Adjudicantes estão a exigir a apresentação de manuais de voo indexados ao número de série das Aeronaves com o propósito de se assegurarem de que as unidades de Aeronaves que o concorrente se propõe locar existem efetivamente no mercado e que este tem um qualquer vínculo contratual com o respetivo fabricante ou proprietário (ainda que um mero contrato-promessa), que lhe permita assegurar a disponibilidade das aeronaves.» – cfr. processo instrutor junto aos autos.
M) No concurso de fornecimento de meios aéreos 02/EMA-2011, a adjudicação não se veio a concretizar por falta de apresentação das aeronaves, tendo as Autoras sido chamadas, na posição de segunda classificada, a assumir o contrato – por acordo.
N) Até à data indicada em J) as concorrentes estavam obrigadas a apresentar, entre vários outros documentos, manuais de voo das 25 aeronaves que se proporiam locar aos Estado Português e ambas fizeram acompanhar as suas propostas desses documentos – por acordo.
O) Ao Lote 3 foram apresentadas duas propostas:
Concorrente A, Agrupamento ... – ... – ... – HTA: € 41.303.500 […],em 25.10.2012, às 20h03m;
Concorrente B, ... : € 39.923.000 […],em 25.10.2012, às 22h52m;
– cfr. doc. 12 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso.
P) As ora Autoras ao terem conhecimento da proposta apresentada pela Concorrente B, previamente à elaboração do relatório preliminar, alertaram o Júri do Concurso para o incumprimento da concorrente ... do estabelecido no artigo 9.º n.º 3, d) do Programa do Concurso e para a falsidade de documentos e prestação de falsas declarações da referida concorrente quanto à documentação apresentada, nomeadamente os manuais de voo das aeronaves com que se apresentou ao concurso – por acordo.
Q) A 15.11.2012 o júri do concurso procedeu à análise das candidaturas apresentadas e, no relatório preliminar, propôs a lista de ordenação das propostas apresentadas para o Lote 3, do seguinte modo:
1.ª Classificada: proposta do concorrente B, ... , com o preço global de € 39.923.000 […]
2.ª Classificada: proposta do concorrente A, Agrupamento ...
– ... – ... – HTA, com o preço global de € 41.303.500 […]
Em conclusão, […] a adjudicação referente ao lote 3 deve recair sobre a proposta apresentada pelo concorrente B, ... . […]
– cfr. cópia do relatório preliminar junto como doc. 12 com o requerimento inicial do processo cautelar apenso.
R) As Autoras, notificadas do relatório preliminar, exerceram o direito de audiência prévia, reiterando a exposição a que se refere a alínea P), nos termos que, em síntese, se extraem:
«[…]4. Manuais de Voo das aeronaves apresentadas a concurso pela concorrente ...
4.1. Conforme determinado pelo art. 9 nº 3 d) do Programa do Concurso, os concorrentes estavam obrigados a apresentar o Manual de Voo específico de cada uma das aeronaves, o que ficou bem explícito na resposta da Entidade Adjudicante em 10/09/2012 aos esclarecimentos solicitados pela ... na sua pergunta nº 351, pag. 180.
4.2. Para as 25 aeronaves AS 350 B3, a concorrente ... apresentou tão só 25 ficheiros que correspondem a apenas dois manuais de voo, um de suporte para as aeronaves B3 (tipo 2B) e outro de suporte para as aeronaves B3 (tipo 2B1).», concluindo que:
«1ª – Nos onze manuais de voo das aeronaves B3 (tipo 2B) na pág. 461 do PDF do complemento do manual de voo está indicada a aeronave S/N 3437 I-ONVI que nada tem a ver com os manuais de voo das aeronaves apresentadas a concurso.
2ª – Os números de série e matrículas que constam nas folhas de rosto dos onze manuais de voo das aeronaves B3 tipo 2B, estão em contradição e não correspondem ao manual de voo que lhes serve de suporte que pertence à aeronave I-ONVI S/N 3437. 3ª – A concorrente ... para que o manual específico da aeronave I-ONVI S/N 3437 servisse de suporte às onze aeronaves, apresenta documentos que ocultam através da colocação de caixa de texto, por dez vezes a matrícula I-ONVI e por duas vezes as datas e assinaturas que constavam deste manual específico, que contém 635 folhas indexadas ao PDF.
4ª – Os números de série e matrículas que constavam nas folhas de rosto dos manuais apresentados para as aeronaves B3 (tipo 2B1) não correspondem ao número de série e matricula do manual específico que contém 584 folhas.
5ª – As folhas de rosto dos manuais das aeronaves I-DION, I-FRAT, I-LUMT, I-TALT, ITORG, I-CMCM, HB-ZKG, HB-ZIS, HB-ZIG e HB-ZHY não correspondem ao formulário da Eurocopter, não contém data de emissão nem os respetivos carimbos de certificação emitidos pelo fabricante ou pela Autoridade Aeronáutica do País, nem a revisão assinalada no rodapé do documento.
6ª – As folhas de rosto dos manuais das aeronaves apresentadas I-CAVA, I-FRAT, IDION, I-CMCM, I-HBLU, I-LUMT e I-MCMC indiciam a falsificação do respetivo documento.
7ª - As folhas de rosto dos manuais das aeronaves apresentadas I-ELIW, I-RUFA, IGUSA e HB-ZIS e o certificado de peso e centragem da aeronave HB-ZHJ foram falsificadas.
8ª – Os certificados de peso e centragem das aeronaves I-FEAL, I-TALT e HB-ZKG não estão assinados ou carimbados pelo responsável da manutenção.
9ª – A concorrente ... não obteve das empresas proprietárias das aeronaves qualquer contratualização da sua locação por forma a assegurar a sua disponibilidade em Portugal para o período de 2013 a 2017.
10ª – A ... não cumpriu o determinado pelo art. 9 nº 3 d) do Programa do Concurso uma vez que não apresentou o manual específico de cada uma das aeronaves, tendo tão só apresentado um manual para 11 aeronaves (tipo 2B) e um outro manual para as aeronaves (tipo 2B1).
11ª – A ... apresenta manual que terá sido falsificado e para as onze aeronaves tipo 2B nas folhas que correspondem às páginas do PDF 462, 463, 464, 465, 466, 467, 486, 489 e 495, ocultando as matrículas da aeronave I-ONVI do manual específico dessa aeronave, e as folhas do manual correspondentes às pags. do PDF 418 e 426, ocultam datas e assinaturas.
12ª – A ... prestou falsas declarações quando apresentou as aeronaves a concurso, sem ter qualquer compromisso ou pré-contratualização de locação por parte das empresas proprietárias, com o propósito de enganar a Entidade Adjudicante e lhe fazer crer que tinha a disponibilidade das aeronaves para assegurar o cumprimento do contrato.
13ª - A ... prestou falsas declarações ao pretender fazer crer perante a Entidade Adjudicante que estava a apresentar um manual específico para cada aeronave, quando apenas utilizou dois manuais para as 25 aeronaves.»
Terminou a sua pronuncia invocando que a concorrente B:
a) Não cumpriu o determinado pelo art. 9 nº 3 d) do Programa do Concurso;
b) Apresenta documentação falsificada, o que para além dos efeitos previstos no art. 146 nº 2 m) do CCP constitui crime previsto no art. 265 do C. Penal desconhecendo-se o autor.
c) Prestou falsas declarações ao pretender fazer crer à Entidade Adjudicante que tinha ao seu dispor as aeronaves para concorrer, quando bem sabia que não tinha qualquer compromisso ou pré-contratualização de locação com as proprietárias;
Tendo como fundamento o que vem alegado, deverá no relatório final ser alterado o projeto de decisão e excluída a candidatura da proponente ... , nos termos do disposto nos arts. 1.º (princípio da transparência), 57.º, n.º 1 alínea c), 146.º nº 2 alíneas m) e n) e artigo 87.º do CCP.
– cfr. doc. 13 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, que aqui se dá por reproduzido.
S) Em 03.12.2012 a ... (concorrente B) também exerceu o direito de audiência prévia, onde concluiu que: «A. A proposta do Concorrente A apresenta seis manuais de voo redigidos em língua francesa e um parcialmente redigido em língua espanhola idiomas não admitidos pelo Programa de Procedimento (art. 9.º/13 do Programa), o que determina a exclusão da proposta, nos termos alínea e) do art. 146.º/2 do CCP (cf., também, Acórdão do TCA Sul, de 28.04.2011, p.07261/11).
B. A proposta do Concorrente A apresenta três manuais de voo incompletos (1 deles apenas com a primeira página), o que determina a exclusão da proposta por falta de documentos exigidos pelo Programa do Concurso, nos termos da alínea d) do art. 146.º/2 do CCP (cf., também, Acórdãos do TCA Sul de 01.06.2011, p. 07643/11 e de 21.10.2010, p.6658/10).
C. As desconformidades relativas ao estado das revisões dos manuais de voo de 5 das aeronaves propostas e às tabelas de peso e centragem de 2 aeronaves implicam que elas não estejam em condições de respeitar as vinculações legais e regulamentares inerentes à prestação dos serviços objecto do presente Concurso, o que determina a exclusão da proposta do Concorrente A, nos termos da alínea f) do art. 70.º/2 do CCP.
D. A situação de incumprimento das obrigações para com a Segurança Social por parte da consorciada ... Trabalhos e Transporte Aéreo, Representações, Importação e Exportação, S.A. constitui um impedimento para a apresentação dessa empresa ao presente Concurso [cf. art. 55.º, alínea e) do CCP], o que determina, nesta fase do procedimento, exclusão da proposta nos termos da alínea c) do art. 146.º/2 do CCP.
E. A solicitação ao mercado da ... para o fornecimento de 11 helicópteros, já depois de o Concorrente A ter apresentado a sua proposta ao mercado, reforça a conclusão contida em C. supra, demonstrando que o Consórcio não tem disponíveis (e em condições de executar os serviços concursados) os 25 helicópteros exigidos, pelo que a sua proposta deve ser excluída nos termos da alínea f) do art. 70.º/2 do CCP.
F. Os indícios de práticas restritivas da concorrência adoptadas pelo administrador de uma das consorciadas do Concorrente A e melhor descritas na exposição de 28.11.2012 constituem motivo para a exclusão da proposta nos termos da alínea g) do art. 70.º/2 do CCP.
Nestes termos e pelos motivos acima expostos, deve:- manter-se a adjudicação do concurso à Concorrente B, nos termos do Relatório Preliminar, e
- ser a proposta do Concorrente A excluída do presente Concurso.» cfr. doc. 14 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, que aqui se dá por reproduzido.
T) Em virtude dos motivos invocados pelos concorrentes, o júri do concurso iniciou um processo de reanálise das propostas assessorado pelo Grupo Técnico e pelo Grupo Jurídico, encetando um conjunto de diligências com vista a confirmar ou desmentir a veracidade das alegações dos concorrentes – por acordo.
U) Os resultados dessas diligências foram sendo reportados ao júri e discutidos com e pelos seus membros – por acordo.
Y) Em 13.02.2013 foi elaborado pelo Júri do Concurso o Relatório Final, que ordenou as propostas apresentadas para o lote 3, classificando em primeiro lugar o concorrente B (... ), com o preço global de € 39.923.000, e em segundo lugar o concorrente A, Agrupamento ... – ... – ... – HTA, com o preço global de € 41.303.500, propondo que a adjudicação referente ao lote 3 recaia sobre a proposta apresentada pelo concorrente B, ... – cfr. doc. 1 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Z) Relativamente aos argumentos utilizados pelas concorrentes A e B em sede de audiência prévia, mencionados supra em R) e S), o Júri do concurso fez constar do Relatório Final, designadamente, o seguinte:
«[…] a) Os efeitos da suspensão de eficácia da norma da alínea d) do n.º 3 do artigo 9.º do programa do Concurso judicialmente decretada
5.1.2. Perante a pronúncia do concorrente B, o Júri do Concurso iniciou o processo de reanálise da proposta apresentada pelo concorrente A, solicitou e recolheu os contributos do Grupo Técnico que assessora o Júri do Concurso e, bem assim, encetou outras diligências, com vista a confirmar ou desmentir a veracidade das alegações produzidas pelo concorrente ... .
Sucede que, durante o desenvolvimento destas diligências instrutórias, mais concretamente em 25 de janeiro de 2013, as Entidades Adjudicantes informaram este Júri de que haviam sido notificadas da sentença proferida em 21 de janeiro de 2013 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga no âmbito do processo cautelar intentado pelo concorrente ... (processo n.º 1370/12.3BEBRG-A). Na referida sentença é «julg[ada] parcialmente procedente a presente providência cautelar e, em consequência, decret[ada]a suspensão de eficácia do artigo 9.º, n.º 3, al. d), n.º 5, al. d), n.º 6, al. d), n.º 8, al. c), d), e) e f) do Programa do Concurso», decidindo paralelamente o Tribunal […] que, «no que tange ao pedido de suspensão de eficácia do procedimento concursal, julgamos que o mesmo não merece provimento», pois «decretando-se a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais (…) a Requerente fica em condições de apresentar proposta, ficando acautelada a sua posição jurídica, bem como a utilidade prática do processo principal que a providência cautelar visa acautelar».
5.1.3. […] os recursos interpostos de decisões respeitantes à adoção de providências cautelares têm efeito meramente devolutivo, o que significa que, ainda que seja intentado recurso jurisdicional da sentença […] a decisão […] é imediatamente aplicável, sem viabilidade de suspensão dos referidos efeitos.
Desta forma, e no que ao Lote 3 respeita, cabe às Entidades Adjudicantes […] prosseguir com a tramitação do procedimento pré-contratual até final, procedendo, porém, à desaplicação da norma concursal cuja eficácia de encontra suspensa […], nos termos da qual «a proposta apresentada para o lote 3 deve ser constituída pelo manual de voo das AERONAVES COMPLEMENTARES (HELICÓPETEROS LIGEIROS A) propostas, indexando ao número de série da aeronave, incluindo obrigatoriamente as tabelas de pesos e centragens.»
[…] 5.2. Proposta apresentada pelo concorrente B (... )
[…] 5.2.1. […] veio o concorrente A no âmbito da pronúncia apresentada em sede de audiência prévia, alegar (i) o «incumprimento pela concorrente ... do estabelecido no artigo 9.º, n.º 3 d) do Programa do Concurso» e (ii) a «falsidade e prestação de falsas declarações da referida concorrente quanto à documentação apresentada, nomeadamente os manuais de voo das aeronaves que apresentou ao concurso» […].
[…] 5.2.2. Como resulta dos parágrafos 5.1.2.e 5.1.3. supra, as Entidades Adjudicantes (e o Júri do Concurso) estão judicialmente obrigadas a prosseguir com a tramitação do procedimento pré-contratual até final, procedendo, porém, à desaplicação da norma concursal cuja eficácia de encontra suspensa […]
Estando suspensa a aplicação da norma concursal que exigia a apresentação dos manuais de voo das aeronaves que o concorrente se propõe locar, é juridicamente irrelevante, para efeitos concursais, saber (i) se as cópias dos manuais de voo apresentadas pelo concorrente ... , e designadamente as respetivas folhas de rosto e certificados de pesos e centragens, correspondem ou não aos originais desses mesmos manuais de voo, (ii) se essas cópias resultam (ou não) da reprodução copiada de um único manual de voo «deliberadamente alterado (…) ocultando matriculas e, bem assim, datas e assinaturas apostas no manual», bem como, (iii) se o concorrente B contactou (ou não) as empresas proprietárias das aeronaves que se propõe locar e com elas acordou ou encetou quaisquer negociações pré-contratuais com vista à locação ou à aquisição de aeronaves ligeiras que cumpram as especificações técnicas do Caderno de Encargos e seus anexos.
Assim sendo, não cabe ao Júri ao concurso pronunciar-se sobre a verificação destas causas de exclusão de propostas invocadas pelo concorrente A na pronúncia em sede de audiência prévia apresentada pelo concorrente B, sumariadas nas alíneas a),
b) e c) do parágrafo 5.2.1. acima.
[…] 5.2.3. Em qualquer caso, importa tecer algumas considerações em relação à alegação prestação de falsas declarações por parte do concorrente B […]
5.2.4. Em primeiro lugar importa referir que o agrupamento concorrente A não comprova a veracidade dos factos alegados, não constituindo prova bastante a cópia das comunicações e declarações alegadamente subscritas por algumas dessas empresas, juntas como Docs. 22 a 25 e 27 da pronúncia […].
[…] ainda que fossem verdadeiros os factos alegados pelo concorrente A, […], dessa matéria não decorre que o concorrente B tenha prestado falsas declarações juridicamente relevantes no âmbito do presente concurso para os efeitos previstos na alínea m) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP.
Desde logo, pelas razões expostas no segmento final do parágrafo 5.1.6. acima. De acordo com a sentença cautelar proferida em 21 de janeiro de 2013, a apresentação de uma proposta no Concurso […] não deve depender do prévio estabelecimento de acordos ou compromissos contratuais com os seus futuros fornecedores do concorrente. Por esta razão, o Júri do Concurso não está autorizado a valorizar juridicamente quaisquer factos – ainda que estes fossem considerados provados – dos quais alegadamente resulte que, afinal, o concorrente B não contactou, nem estabeleceu quaisquer acordos firmes com os proprietários das aeronaves que indicou na sua proposta.
[…] Pelas razões expostas, o Júri entende que não está comprovada a prestação de falsas declarações pelo concorrente B que se afigurem juridicamente relevantes, razão pela qual a proposta por ele apresentada não deve ser excluída com fundamento no disposto na alínea m) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP.
– cfr. doc. 1 junto com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
AA) Ato impugnado: Em 13.02.2013 foi tomada Deliberação Conjunta pelo Conselho de Administração da EMA e Conselho Diretivo do INEM com o seguinte teor:
«Concorda-se com a ordenação das propostas constante do Relatório Final e a consequente adjudicação do fornecimento do serviço de locação proposto, ao concorrente “... – Aviação Executiva, S.A.”
Comunique-se a decisão de adjudicação ao concorrente.» – cfr. doc. junto com a oposição do processo cautelar apenso.
BB) A Deliberação que antecede mostra-se acompanhada da Informação n.º 01/02/DAR-GGCCP, também datada de 13.02.2013, elaborada pelo Diretor de Administração e Recursos da EMA e pelo Gabinete Gestão Compras e Contratação Pública, que faz uma súmula dos atos praticados no procedimento do Concurso Público identificado em B) – cfr. doc. junto com a oposição do processo cautelar apenso, e que aqui se dá por integralmente reproduzida.
CC) As Autoras foram notificadas da deliberação que antecede em 15.02.2013– por acordo.
DD) As Autoras dirigiram recurso aos Ministros da Administração Interna e da Saúde, onde pediram, com urgência, a revogação da decisão de adjudicação do Lote 3 do Concurso e a exclusão da proposta apresentada a concurso pela Concorrente B ... e, em consequência dessa revogação e exclusão, a adjudicação do Lote 3 à proposta apresentada pelas ora Autoras; ou caso assim não se entenda, a revogação da decisão de adjudicação do Lote 3 e anulação do procedimento de concurso no que respeita ao Lote 3 – cfr. doc. 8 junto com a p.i., e por acordo.
EE) A Sentença proferida no processo cautelar n.º 1370/12.3BEBRG-A, mencionada em I), foi objeto de recurso, o qual foi acolhido por de 18.02.2013, com efeito devolutivo – cfr. doc. 16 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso.
FF) Relativamente aos documentos de habilitação o documento a que se refere o art. 16.º, n.º 2, al. c.1) do Programa do Concurso (Certificado de Operador de Trabalho Aéreo), que foi apresentado pela concorrente ... , é da sua titularidade e foi emitido pelo INAC – cfr. doc. 13 junto com a PI, que aqui se dá por reproduzido.
GG) Os documentos a que se referem as als. c.2) e c.3) do n.º 2 do art. 16.º, bem como aqueles a que se referem as als. a) e b) do n.º 2 do art. 16.º do Programa do Concurso, que foram apresentados pela concorrente ... , são da titularidade da empresa italiana EUROTECH SRL – cfr. doc. 14 junto com a PI, que aqui se dá por reproduzido.
HH) Conjuntamente com os documentos mencionados em FF) e GG) foi apresentada uma declaração da empresa EUROTECH SRL, a que se refere a al. a) do n.º 2 do art. 16.º do Programa do Concurso, datada de 21.02.2013, e bem assim a sua tradução para nos termos do art. 16.º, n.º 6 do Programa do Concurso, da qual consta que a EUROTECH SRL compromete-se: «incondicionalmente a prestar serviços de Aeronavegabilidade Permanente de acordo com a PARTE M da EASA e os serviços de manutenção de acordo com a PARTE 145 da EASA, relativamente a cinco helicópteros Eurocopter AS350 operados pela ... , AVIAÇÃO EXECUTIVA, S.A. (…), sempre de acordo com as especificações do contrato estabelecido na Oferta Pública n.º 04/EMA-2012, lote 3» – cfr. processo instrutor apenso e por acordo.
II) A ... , entre os documentos de habilitação, apresentou uma declaração de aceitação da prevalência das traduções, em conformidade com o art. 16.º, n.º 6 do Programa do Concurso – cfr. doc. 15 junto com a PI, que aqui se dá por reproduzido.
JJ) Em 20.03.2013, com base nos factos descritos em FF), GG), HH) e II), as Autoras apresentaram requerimento de declaração de caducidade da adjudicação relativa ao lote 3 – cfr. processo instrutor apenso.
KK) Em 22.03.2013 a ... apresentou participação criminal contra as sociedades comerciais que compõem o consórcio constituído pelas ora Autoras, e seus responsáveis, pelos crimes p.p. nos arts. 256.º e 359.º do Código Penal – cfr. doc junto pela Contrainteressada no processo cautelar apenso em 05.04.2013.
LL) Em 12.04.2013 a ... e o respetivo Presidente do Conselho de Administração apresentaram participação criminal contra a ... , Pedro Manuel Martins Pinheiro Silveira, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração, e incertos, pelos crimes p.p. nos arts. 153.º, 180.º, n.º 1, 182.º, 183.º e 187.º, todos do Código Penal – cfr. doc junto pela Contrainteressada no processo cautelar apenso em 18.04.2013.
MM) Em 25.03.2013 a concorrente adjudicatária (... ) apresentou um requerimento onde informa ter identificado a existência de «lapsos de escrita contidos na tradução exigida pelo n.º 6 do artigo 16.º do Programa do Concurso» e veio «requerer a junção de tradução expurgada dos referidos lapsos», dizendo ainda que «a requerida junção do documento retificado justifica-se pela manifesta simplicidade da correção de lapso realizada» – cfr. processo instrutor apenso.
NN) Resulta do requerimento que antecede designadamente, que a correção de lapsos incidiu: «1. Sobre a tradução quanto ao número de aeronaves incluídas no compromisso estabelecido com a Eurotech, ou seja, 25 aeronaves – tal como referido no documento em língua inglesa – e que havia sido erradamente traduzido com referência a cinco aeronaves, o que constitui um manifesto lapso de escrita da tradução realizada;
2. Sobre a referência aos termos em que a Eurotech se obrigava a realizar o compromisso estabelecido com a ... : estando referido que esse compromisso seria executado de acordo, com as especificações do contrato
, a expressão mais correta seria „de acordo com o Caderno de Encargos, lapso que é corrigido no documento retificado que agora se junta.» – cfr. processo instrutor apenso.
OO) No documento junto com o requerimento mencionado em MM), que corresponde à nova tradução da declaração subscrita pela Eurotech em 21.02.2013, lê-se que: «…a Eurotech se compromete incondicionalmente a prestar os serviços de Aeronavegabilidade Permanente de acordo com a PARTE M da EASA e os serviços de manutenção de acordo com a PARTE 145 da EASA, relativamente a vinte e cinco helicópteros Eurocopter AS350 operados pela ... – AVIAÇÃO EXECUTIVA, S.A. (…),de acordo com o caderno de encargos do concurso público n.º 04/EMA-2012, lote 3» – cfr. processo instrutor apenso.
PP) Em 07.05.2013 foi outorgado o contrato de locação referente ao Lote 3 do concurso público n.º 04/EMA/2012, no qual interveio, em representação do Estado Português, a Autoridade Nacional de Proteção Civil, representada pelo respetivo Presidente – cfr. doc. junto ao processo cautelar apenso em 21.05.2013.
QQ) Os presentes autos foram instaurados em 15.03.2013 – cfr. SITAF.
Nos termos dos artigos 662º, n.º1 e 665º, n.ºs 1 e 2, do (novo) CPC, alteram-se e acrescentam-se os seguintes factos por provados:
H) Em 20.08.2012 a Concorrente B, Evejets, deu entrada de petição de contencioso pré-contratual urgente contra as ora demandadas Ema, S.A., e INEM, I.P, cujo teor se dá por reproduzido, acção onde foram Contra interessados os restantes concorrentes no concurso e nomeadamente a ... , Trabalhos e Transporte Aéreo, Representações, Importação e Exportação, SA (... , de ora em diante), Inaer, Helicópter, Lda (Inaer, de ora em diante) e ... , Aviação, Lda (... , de ora em diante), que correu seus termos na 1.ª Unidade Orgânica do TAF de Braga, sob o n.º 1370/12.3BEBRG, no qual foi proferida Sentença em 14.01.2013, com a cópia constante do processo cautelar n.º 247/13.0BESNT, anexo (processo não numerado), que julgou «parcialmente procedente a ação, declarando a ilegalidade do artigo 9.º, n.º 3, alínea d) […] do Programa do Concurso, determinado que os RR. procedam à correção do mesmo» – cfr. docs. 10 e 15 juntos com o requerimento inicial do processo cautelar apenso, acórdão do TCAN de fls. 1204 a 1217 dos presentes autos e cópia da PI junta aos autos pelo despacho antecedente.
V) No âmbito das averiguações relativas aos manuais de voo apresentados pela concorrente B, ... , um membro do grupo técnico, o Comandante ... deslocou-se a Itália e à Suíça, onde os mesmos teriam sido obtidos – por acordo.
W) Em 17.01.2013, o Comandante Francisco Manuel Martinho Martins, declarou, sob compromisso de honra, ter procedido, nesta data, nas instalações do Operador Aéreo “Eliwork, S.R.L.”, à análise e conferência dos MANUAIS DE VOO ORIGINAIS das aeronaves de matrículas I-ELIW, I-GUSA e I-RUFA […], por comparação com os Manuais de Voo fornecidos pelo operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3, e ter identificado as desconformidades que descreve nos pontos 1 a 7, designadamente as seguintes:«
1. A 1ª página numerada e rubricada, por referência a I – RUFA – AS 350 B3 – SERIAL NUMBER 3483 – FLIGHT MANUAL – IEW 001 (F) – VOL. 2, não existe nos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3;
2. A 2ª página numerada e rubricada, por referência a I – RUFA – AS 350 B3 – SERIAL NUMBER 3483 – FLIGHT MANUAL – IEW 001 (F) – VOL. 2, quando comparada com a cópia dos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA- 2012, Lote 3, permite constatar que foi introduzida a matrícula I-RUFA no documento não original;
3. A 3.ª página numerada e rubricada, por referência a I – RUFA – AS 350 B3 – PMV
– DGAC – VOL. 1 – FLIGHT MANUAL, quando comparada com a cópia dos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3, permite constatar que no documento não original a matrícula (I-RUFA) e o número de série (3483) estão manuscritos com caligrafia distinta da constante no documento não original, sendo que a data do documento original está identificada como 24.12.1997 e aquele que foi fornecido pelo Concorrente indica 24.DEC.1997, bem assim como a referência do canto inferior direito (rodapé) do documento original indica 10-11, por contraposição ao documento fornecido pelo Concorrente que menciona 97-40;
4. A 4ª página numerada e rubricada, por referência a AS 350 B3 – PMV – (GUSA) – VOL. 2 – FLIGHT MANUAL, não existe nos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3;
5. A 7ª página numerada e rubricada, por referência a AS 350 B3 – PMV – (GUSA) – VOL. 1 – FLIGHT MANUAL, quando comparada com a cópia dos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3, permite constatar que no documento original existe um averbamento no quadro do lado esquerdo da página até ao SUP. 22, sendo que no documento fornecido pelo Concorrente apenas existem inscrições até ao SUP. 19, sendo inexistentes os SUP. 19.1, SUP. 20, SUP. 21 e SUP. 22.
6. A 8ª página numerada e rubricada, por referência a AS 350 B3 – PMV – (GUSA) – VOL. 1 – FLIGHT MANUAL, quando comparada com a cópia dos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012, Lote 3, permite constatar que no documento original a matrícula foi rasurada/emendada de I-ELIW para I-GUSA, bem como o número de série foi rasurado/emendado de 3301 para 3672, sendo que a data do documento original está identificada como 24.12.1997 e aquele que foi fornecido pelo Concorrente indica 24.DEC.1997, bem assim a referência do canto inferior direito (rodapé) do documento original indica 10-11, por contraposição ao documento fornecido pelo Concorrente que menciona 97-40;”
7. As 9ª, 10ª e 11ª página numerada e rubricada, por referência a AS 350 B3 – PMV – (GUSA) – VOL. 1 – FLIGHT MANUAL, não existem nos Manuais de Voo fornecidos pelo Operador Aéreo “... , Aviação Executiva, S.A.” no âmbito do Concurso Público n.º 04/EMA-2012. Lote 3: – cfr. cópia da declaração junta com o requerimento de 26.03.2013 do processo cautelar apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida, com cópia a fls. 419 e 420 dos presentes autos.
X) A sentença proferida no processo de contencioso pré-contratual n.º 1370/12.3BEBRG, mencionada em H), foi objecto de recursos, interpostos pelos Contra interessados HTA, ... , ... e ... , que foram admitidos, com efeito suspensivo, por despacho 11.02.2013, os quais tiveram o teor constante dos documentos que se juntaram aos presentes autos pelo despacho antecedente e relativamente aos quais foram apresentadas as contra alegações da ... , também com o teor constante do documento que se juntou aos presentes autos pelo despacho antecedente – cfr. doc. 16 junto com o requerimento inicial do processo cautelar apenso e os documentos referidos.
RR) Na petição da providência cautelar, que correu os seus termos na 1.ª Unidade Orgânica do TAF de Braga, sob processo n.º 1370/12.3BEBRG-A, referida em I), requeria-se a suspensão do procedimento em causa e «em especial» a suspensão da eficácia das seguintes normas do Programa do Concurso: artigo 9.°, n.º 3, alínea d); n.º 4, alínea d); n.º 5, alínea d); n.º 6, alínea d); n.º 8, alíneas c), d), e) e f), e anexo XVII do Caderno de Encargos, por remissão do artigo 9.°, n.º 6, alínea e), do Programa do Concurso e a cláusula 4.1,° 4 do Caderno de Encargos, invocando-se a violação dos princípios da concorrência, da imparcialidade, da igualdade, da proporcionalidade, do artigo 49.º do CCP e das directivas comunitárias por a descrição técnica das aeronaves pretendidas restringir de tal modo a concorrência que, em última instância, apenas um potencial interessado pode satisfazer tais requisitos (cf. a decisão ali tomada e a PI apresentada pela ... , juntas com a PI do processo cautelar apenso, processo que não está numerado pelo TAF de Sintra).
SS) Nessa providência cautelar n.º 1370/12.3BEBRG-A, acima referida, os então Contra interessados ... , ... e ... , apresentaram oposição (cf. a decisão ali tomada e requerimento apresentado pela ... a indicar os Contra interessados, juntos com a PI do processo cautelar apenso, processo que não está numerado pelo TAF de Sintra).
TT) Na PI do contencioso pré-contratual urgente n.º 1370/12.3BEBRG, referido em H) requeria-se a declaração de ilegalidade das seguintes normas do Programa do Concurso: artigo 9.°, n.º 3, alínea d); n.º 4, alínea d); nº. 5, alínea d); n.º 6, alínea d); n.º 8, alíneas c), d), e) e 1), e anexo XVII do Caderno de Encargos, por remissão do artigo 9.º, n.º 6, alínea e), do Programa do Concurso e a cláusula 4.3, n.º 4 do Caderno de Encargos, invocando-se como fundamentos da acção a violação dos princípios da concorrência, considerando-se que as normas impugnadas, ao imporem que os interessados submetessem os manuais de voo específicos de cada aeronave que se propunham apresentar, restringiam a concorrência acabando por permitir que apenas um concorrente se encontrasse em condições de apresentar tal documento; da imparcialidade e da igualdade, por se exigir sem que nada o justificasse, a apresentação de um documento aos concorrentes que, a final, resultava no favorecimento daquele que era desde 1998 o seu fornecedor e prestador de serviços em contratos da mesma índole; da proporcionalidade, por a exigência dos manuais de voo revelar-se manifestamente desproporcional e injustificada, face, nomeadamente, à consequência de restringir a apenas um concorrente, a possibilidade de se apresentar a concurso; a violação do artigo 49.º do CCP e das directivas comunitárias, por a descrição técnica das aeronaves pretendidas restringir de tal modo a concorrência que, em última instância, apenas um potencial interessado pode satisfazer tais requisitos (cf. a decisão ali tomada junta com a PI do processo cautelar apenso, não numerado).
UU) Na acção de contencioso pré-contratual urgente n.º 1370/12.3BEBRG, referido em H), os então Contra interessados ... , ... e ... , apresentaram oposição (cf. a decisão ali tomada junta com a PI do processo cautelar apenso, processo não numerado).
VV) Na acção de contencioso pré-contratual urgente n.º 1370/12.3BEBRG, referido em H), foram apresentadas após a sentença, as alegações e contra-alegações de recurso, um requerimento pela ... , no qual dá a conhecer ao processo da resposta apresentada pela ... em sede de audiência prévia ao relatório preliminar do júri do concurso, requerimento a que a ... respondeu, peças processuais que aqui se dão por reproduzidas e que foram juntas aos presentes autos pelo despacho antecedente.
XX) Por acórdão do TCAN no proc. nº 1370/12.3.BEBRG, de 31.05.2013, com cópia constante de fls. 1204 a 1227, que aqui se dá por reproduzido, foi negado provimento aos recursos apresentados e confirmada a decisão de 1º instância referida em H), acórdão que transitou em julgado a 21.07.2013 (cf. também doc. de fls. 1472 verso).
O Direito
Vem o Recorrido Ema invocar a falha dos Recorrentes no ónus de formular conclusões sintéticas e simples, por as suas alegações se estenderem por 220 pontos, a que corresponderam 74 conclusões ao longo de 13 páginas, que se revelam prolixas, confusas, por vezes obscuras e são um repositório caótico de pretensas violações, cuja leitora é desesperante, pelo que requer que sejam os Recorrentes convidados a esclarecer e a sintetizar tais conclusões.
Aceita-se que as presentes alegações de recurso e respectivas conclusões não se apresentem sintéticas e fáceis de ler. Porém, nelas é indicado todo o rol de princípios e normas que se dizem violadas e os fundamentos que no entender dos Recorrentes implicam tais violações. A extensão, desordem ou pouca substanciação que é dada ao rol de violações, não implica uma absoluta deficiência ou obscuridade das conclusões. Lidas as alegações e conclusões de recurso, o Tribunal conseguiu compreender os fundamentos do recurso. Das contra alegações apresentadas, verifica-se, que as contrapartes também compreenderam os termos do recurso e a ele reagiram com propriedade.
O presente processo é urgente, pelo que requer uma tramitação o mais abreviada possível, evitando-se todos os actos que não sejam absolutamente essenciais para o conhecimento do mérito do recurso.
Por essa razão, não se determina nenhum convite à clarificação e sintetização das conclusões.
Da impugnação da matéria de facto
Os Recorrentes vêm invocar erro na fixação da matéria de facto, tal como foi julgada pela decisão recorrida.
Por força dos artigos 5º e 7º da Lei n.º 41/2013, de 26.06, a este recurso são já aplicáveis os artigos 640º e 662º do novo CPC.
Tais artigos, tal como já ocorria na versão anterior do CPC (cf. artigo 685º-B do antigo CPC), mantém como ónus a cargo da parte que impugne a decisão relativa à matéria de facto, a necessidade de especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõe decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Antes de mais, refira-se, que se aceita a dificuldade que os AA. e Recorrentes terão tido na indicação dos documentos para os quais queriam remeter a prova, dificuldade que indicam no ponto 2 das suas alegações de recurso, adveniente da não numeração dos autos apresentados no SITAF e coligidos pelo TAF de Sintra (quanto à numeração do presente processo em suporte de papel, só terá sido feita após a interposição do recurso e para efeitos do envio a este TCAS). Também se aceita a dificuldade na indicação das peças processuais onde foi requerida a junção dos documentos, pois essas peças estão juntas aos autos de forma nem sempre sequencial. Tais peças, por diversas vezes, apresentam-se introduzidas nos autos com cópias sucessivas, que ostentam diferentes datas de envio e de entrada no TAF de Sintra, sem que haja cotas que permitam a compreensão da sua inserção.
Por isso, porque tais dificuldades tem de ser imputadas unicamente ao SITAF e à forma como os tribunais administrativos copilam os seus processos à semelhança desse sistema informático, procurou-se “encontrar” os documentos para os quais se remete neste recurso na impugnação da matéria de facto, mesmo que aquelas remissões não estejam precisa e totalmente correctas nas alegações de recurso dos Recorrentes.
Pela mesma razão, há que entender que os Recorrentes cumpriram o seu ónus de indicarem os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida.
Assim, vêm os Recorrentes dizer que que o facto provado sob a alínea V) deve ser alterado para que seja perceptível que Comandante Francisco Manuel ... é um membro do grupo técnico, pois a qualidade em que o mesmo interveio resulta dos artigos 89º, 90º e 91º da PI e 19º, 22º, 23º da contestação dos RR.
Na realidade, o indicado facto vem alegado nos citados artigos da PI e da contestação da EMA, não tendo sido impugnado pelos Contra interessados. Nos artigos 10º da contestação da EMA e 36º, alíneas g) e h), são impugnados genericamente os factos insertos nos invocados artigos 89º 90º e 91º da PI. No entanto, lido o restante da contestação, compreende-se, que as impugnações são feitas relativamente a alegações factuais ali insertas que não se referem à qualidade de Comandante ... como um dos membros do grupo técnico.
A indicação de que Comandante ... é membro do grupo técnico, tem relevo para a aferição das alegações dos AA. relativas à invocada falsificação e deveres inquisitórios da entidade adjudicante. Assim, alterou-se a matéria provada.
O mesmo ocorre com o facto W), que foi alterado e acrescentado como pugnam os Recorrentes. Na verdade, da declaração junta com o requerimento de 26.03.2013 do processo cautelar apenso, contam descritas desconformidades em 7 pontos e não em 6, como se refere na decisão sindicada. Indique-se, também, que a cópia dessa declaração foi junta a estes autos e consta de fls. 419 a 420, com o teor transcrito.
Para a apreciação da invocada falsificação e deveres inquisitórios da entidade adjudicante tem relevo o descrito naquela declaração, não obstante no facto W) da sentença sindicada já se ter remetido para o seu teor.
Aqui faça-se nota, que não estando o processo cautelar apenso numerado pelo TAF de Sintra, não é possível a simples remissão para o correspondente número de folhas onde está inserto o documento. Por isso, face à dificuldade que deriva de se ter que procurar qualquer documento para o qual se remeta num processo que não está numerado e cujos requerimentos se apresentam inseridos em duplicado e triplicado e assinalados como entregues em diversas datas, aconselha-se, também, a descrição do teor dos documentos para os quais se remete.
Nessa conformidade, foi alterado o facto W), tal como indicado pelo Recorrente.
A alteração do facto X) com a introdução da indicação dos requerentes do recurso, tem também relevo para apreciar a vinculação da entidade adjudicante ao caso julgado e do âmbito subjectivo do mesmo e resulta do indicado doc. 16 anexo à PI do processo cautelar.
Por essa razão, também procede esta alteração.
Mas já no que concerne aos indicados factos RR), SS), TT), UU) e VV), propostos nas alegações de recurso, não tem relevância directa para a resolução do litígio, pelo que não haviam de ser dados por assentes na decisão recorrida.
Os artigos 79º e 80º da PI, onde se fundam os propostos factos UU) e VV), foram impugnados no artigo 10º da ... .
Os primeiros factos serão relativos a um anterior concurso e aos contactos da ... , que aqui não importam directamente.
Quanto aos documentos 3 a 5 juntos com a PI, não são prova suficiente e irrefutável para que se dê por provado os factos propostos no recurso em UU) e VV).
No que diz respeito aos documentos ns.º 3 e 4 juntos com a PI, são fotocópias em inglês de declarações, documentos que não estão sequer traduzidos e que constituem meras fotocópias de documentos particulares.
O documento n.º 5, é também uma fotocópia de um documento particular, na qual se declara a propriedade das aeronaves e no qual se tece observações acerca da «apresentação dos manuais e demais documentos pela ... no concurso». Tal documento, não é um meio idóneo para provar a propriedade de aeronaves, que estão sujeitas a registo, nem será razão suficiente para atestar algo relativamente ao qual o declarante não terá sequer conhecimento directo, já que não participou, ele mesmo, no concurso, nem o terá consultado para saber e atestar que manuais ou documentos foram apresentados.
Acresce, que os Recorrentes apesar de impugnarem a matéria de facto requerendo aquelas ampliações, não especificam minimamente as razões para que se deva considerar aqueles factos como importantes para o dirimir do litígio.
Quanto à providência cautelar intentada, relativa ao processo n.º 1370/12.3BEBRG, está assente em I).
No que diz respeito ao requerido facto XX), a ser acrescido, com o seguinte teor: «Entendeu o júri do concurso fazer novas diligências, desta vez por confronto, por amostragem, das cópias de alguns manuais entregues pelos concorrentes com os respectivos originais», na realidade, ele foi afirmado no artigo 22º da contestação da EMA, mas nada de relevante acrescenta para além do já assente em T), V) e W). Portanto, é irrelevante tal facto face ao já dado por assente.
Mais se nota, que para além das diligências já indicadas desconhece-se que «novas diligências» serão as ali referidas, sendo abstracta e genérica essa afirmação, porque não concretizada com as concretas diligências que fossem «novas».
Quanto ao «confronto, por amostragem, das cópias entregues», é também um facto que não está provado pelos documentos alegadamente juntos pelos AA. em 20.03.2013, que serão os constantes dos autos de fls. 416 a 433.
Aqui assinala-se, que dos autos apenas consta mail datado de 20.03.2013, a fls. 434, «a apresentar a juízo o acto processual anexo». Este mail não tem no seu seguimento nenhum documento ou acto processual que ostente a data de entrada no TAF de Sintra naquela ocasião. Os autos não ostentam também nenhuma cota elaborada pela Secretaria que permitam a compreensão do que é que terá sido junto. Mas a fls. 416 consta um outro requerimento dos AA., para a junção dos documentos de fls. 417 a 433, que tem carimbo de entrada no TAF de Sintra de 21.03.2013. Assim, é quase certo que seja este o acto processual referido no mail de 20.03.2013, a fls. 434, a que neste recurso também se referem os Recorrentes (apesar das divergências de datas).
Os documentos de fls. 417 a 433, são relativos à declaração já indicada em W), a cópias de documentos em inglês relativos a dimensões de aeronaves, com estas manuscritas e correspondentes formulários, assim como, de uma página de diferentes manuais de aeronaves.
Assinale-se, ainda, que por requerimento entrado no TAF de Sintra em 26.03.2013 (que terá sido enviado para este tribunal em 25.03.2013, conforme registo aposto sobre o indicado requerimento, inserto a fls. 438 dos autos) os AA. e ora Recorrentes entregaram nos autos um «suporte informático dos 25 manuais e voo apresentados pela concorrente ... ». Porém, face às datas apostas neste requerimento, não será o mesmo o que suporta a invocação dos Recorrentes neste recurso para a ampliação do facto XX).
Acresce, que os indicados manuais juntos em ficheiro informático também não provam o que se quer ver ampliado como XX).
Quanto aos factos que se quer ver aditados como ZZ) e AAA), irrelevam para a matéria do litígio.
Do doc. n.º 6 junto à PI, a fls. 280 a 290, também não se retira que haja uma «investigação na 2.ª Secção do DIAP, como NUIPC 2023/13.0TDLSB», mas tão só que os AA. e Recorrentes fizeram uma queixa crime contra incertos, queixa cuja cópia juntam naquele documento.
O doc. junto como 7. à PI, a fls. 296 a 298, é na realidade a cópia da participação que terá sido feita ao INAC – Instituto Nacional de Aviação Civil e os AA. fizeram essa alegação no artigo 103º da PI, que não foi impugnado.
Mas tal facto não tem relevo directo na matéria a dirimir, pelo que não há agora que se acrescentar.
Igualmente, não tem interesse directo para o litígio o facto que se quer ver introduzido com a letra BBB), apesar de alegado no artigo 110º da PI, não ter sido impugnado e poder corresponder ao teor do documento junto em cópia como doc. 12 à PI, de fls. 349.
Indique-se, também, que os artigos 102º e 103º da PI, onde se fundam os factos ZZ) e AAA) foram impugnados no artigo 36º, j), da contestação da EMA.
No que diz respeito aos factos CCC) a HHH), tratam-se de conjecturas relativas às intenções ou às possibilidades que os AA. teriam de concorrer se a realidade não tivesse ocorrido como ocorreu, afirmações que constituem factos pessoais dos AA., que teriam de ser por eles provados, designadamente com prova documental, testemunhal e pericial.
Não basta, portanto, para que se dêem por provados tais factos, que os mesmos tenham sido alegados na PI e não especificamente impugnados.
Repare-se, que os ora invocados factos foram alegados nos artigos 212º a 216º e 218º da PI, incluindo-se não no ponto «II-Dos factos relevantes», mas antes no ponto «III – Do Direito». Tendo sido incluídos na PI pelos próprios AA. na matéria relativa às alegações de direito, as contrapartes também assim o entenderam, logo, não procederam à sua impugnação especificada, tal como fizeram quanto aos restantes factos.
Agora, em sede de recurso, vem os AA. dizer que o que alegaram a título «Do Direito», naqueles artigos, são «factos» que teriam de ter sido dados por provados porque as contrapartes os não impugnaram especificadamente.
Porém, essa não impugnação especificada, tal como já se disse, no caso, não releva para efeitos de se ter os factos por acordados. Constituindo aquela factualidade factos pessoais dos AA., a não impugnação pelas contrapartes não conduz à sua aceitação. Logo, não pode agora proceder o invocado erro de julgamento.
Quanto aos factos que se querem ver acrescentados sob as letras III) e JJJ), também foram alegados pelos AA. em sede de «Do Direito», nos artigos 227º e 228º, e não no ponto I, relativos aos factos.
Saber se os manuais são essenciais ou não á execução dos contratos, não é um facto, é uma conclusão.
No que concerne ao programa de concurso prever a apresentação dos manuais e ao momento da respectiva entrega, resulta já provado em C), G) e N).
Por conseguinte, não há que acrescentar aqui o alegado nos artigos 227º e 228º da PI, nos seus precisos termos.
Aceita-se, que a data do trânsito em julgado do acórdão proferido pelo TCAN no processo nº 1370/12.3.BEBRG, tenha interesse para a decisão da causa.
Porém, é um facto de conhecimento superveniente e não constitui a omissão dessa factualidade um erro de julgamento.
Mas porque se considera tal facto relevante e superveniente, acrescentou-se à matéria de facto que ficou dada por provada neste acórdão.
Procede, portanto, parcialmente a impugnação à matéria de facto.
E nos termos do artigo 662º, n.º1 e 665º, n.ºs 1 e 2, do (novo) CPC, acrescentam-se ainda oficiosamente alguns outros factos à matéria provada (meramente instrumentais e concretizadores), por se mostrarem com relevo para a apreciação do recurso.
Do mérito do recurso
Alegam os Recorrentes a nulidade decisória porque a sentença recorrida não se pronunciou sobre a invocada falta de audiência prévia, no que se refere às alterações das regras de concurso, por aplicação da decisão cautelar de 21.01.2013.
Invocam também os Recorrentes um erro de julgamento, dizendo que a decisão recorrida violou os princípios «gerais de direito», os «específicos da contratação pública», nomeadamente do inquisitório, da verdade material, da decisão, da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da transparência, da proporcionalidade, da concorrência, da boa fé, da participação dos interessados no procedimento administrativo, dos princípios da estabilidade das regras do concurso, da inalterabilidade ou intangibilidade das propostas, da comparabilidade das propostas, o dever de decisão e os artigos 267º, n.º 5, 266º, n.º 2, 268º, nº 3 da CRP, 3º, 9º, 56º, 87º, nºs 1 a 3, 100º, 124º, nº 1, alíneas a), c) e e), 100º a 104º, 125º, nºs 1 e 2, do CPA, 1º, nº 4, 50º, n.º 3, 57º, n.º 1, alínea c), 70º, nº 2, alínea g), 79º, nº 1, alínea c), 2, 87º, 130º, 132º, n.º 1, alínea f), 146º, nº 2, alíneas d), m) e o), 148º, nº 1 e 456º do CCP.
Para substanciar a invocação daquelas violações, alegam os Recorrente que a decisão recorrida errou quando considerou não violado os princípios inquisitório, da transparência e o dever de decisão.
Dizem os Recorrentes que também foi errado o entendimento expresso na sentença, de que após a sentença de 21.01.2013, proferida no processo cautelar n.º 1370/12.3BEBRG-A, o júri do concurso ficou dispensado de concluir as averiguações relativas à apresentação de documentos que os Recorrentes haviam denunciado como falsos ou falsificados na proposta do Contra interessado ... .
Consideram os Recorrentes, que esse julgamento foi errado, pois o júri do concurso fez uma errada interpretação dos efeitos da indicada sentença e que devia ter concluído as diligências de prova quanto à denúncia feita, excluindo, depois, a proposta da ... , por a mesma conter documentos falsos ou falsificados.
Dizem os Recorrentes, que no caso se podia concluir da desconformidade dos documentos apresentados com os seus originais, o que está bem evidenciado, pelo menos relativamente a 2 dos 25 manuais de voo apresentados pela ... , conforme a declaração feita por um membro do grupo técnico que assessorou o júri do concurso, o Comandante Martinho Martins.
Invocam os Recorrentes, uma omissão total do relatório final do júri quanto à apresentação de manuais falsificados, por alteração dos ficheiros informáticos dos PDF.
Mais alegam os Recorrentes, que por força do indicado julgado, não poderia o júri ter actuado como se as normas declaradas ilegais não tivessem existido, pois as normas efectivamente existiram e foram eficazes o tempo suficiente para que os concorrentes, ora litigantes, apresentassem (em 25.10.2012) propostas orientadas pelas exigências ali insertas, sendo certo que a decisão foi proferida em 21.01.2013.
Portanto, defendem os Recorrentes que o júri estava obrigado a apreciar da invocada falsidade ou falsificação de documentos e a excluir a proposta da ... , nos termos dos artigos 146º, n.º 2, alínea m) e 148º, n.º1, do CCP, independentemente da averiguação para efeitos de processo crime ou do desfecho desta.
Consideram igualmente os Recorrentes, que a decisão recorrida errou quando julgou não preterido o seu direito de audiência prévia relativamente à interpretação e conclusões que o júri retirou da sentença cautelar de 21.01.2013 e das suas implicações a nível do procedimento concursal.
Invocam os Recorrentes, que a decisão cautelar também nunca permitiria o aproveitamento dos actos antes praticados, não se podendo manter as propostas apresentadas pelos dois concorrentes que se apresentaram a concurso, pois isso implicaria uma alteração de uma regra essencial do concurso e que por aplicação conjugada dos artigos 50º, n.º 3, 79º, n.º1, alínea c), 2, 130º, 132º, n.º 1, alínea f),do CCP, teria sempre a adjudicação que ser anulada, já que a não aplicação das regras consideradas ilegais conduziu a essa alteração.
Mais dizem as Recorrente, que se o concurso tivesse sido lançado sem as regras consideradas ilegais não se teriam apresentado ao concurso em consórcio e apresentariam propostas diferentes, a preços inferiores, assim como, poderiam vir a concorrer diferentes empresas.
Vejamos.
É jurisprudência pacífica que só ocorre a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, nos termos do artigo do CPC, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cf. artigos 660º, nº 2, 668º, n.º 1, alínea d), do antigo CPC, 607º e 615º, n.º 1, alíneas b) a d) do novo CPC). Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Mas só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão.
Também a nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e decisão, terá de ser grave, patente, implicando uma incongruência absoluta.
Ora, no caso em apreço, o tribunal ponderou as questões em litígio e decidiu-as. Para tanto, indicou o tribunal as razões de facto e de direito que levavam à sua decisão.
Explicou o tribunal na decisão recorrida, de forma clara, escorreita e com uma fundamentação completa, o seu raciocínio. Com esta fundamentação era fácil aos Recorrentes compreenderem que não existia omissão ou contradição alguma naquele raciocínio, com o qual podiam, apenas, não concordar.
Em suma, com a fundamentação adoptada pela decisão recorrida ter-se-á de considerar que não ocorre alguma nulidade por omissão de pronúncia ou por contradição entre os fundamentos e a decisão.
Não tinha o Tribunal que rebater os fundamentos esgrimidos pelos Recorrentes até à exaustão.
Sobre a invocada preterição do direito de audiência prévia pronunciou-se o tribunal no ponto autónomo (iii), de fls. 1103 a fls. 1105.
Os Recorrentes podem discordar daquela fundamentação, mas a mesma não é reconduzível a uma nulidade da decisão.
Discordam, os Recorrentes da decisão sindicada, essencialmente, desenvolvendo um raciocínio que em si mesmo é contraditório. Pretendem os mesmos que por força das decisões tomadas pelo Tribunal, no âmbito das acções que foram intentadas pela ... , uma cautelar e outra em sede de contencioso pré contratual, que tiveram por objecto o mesmo concurso e a mesma relação material controvertida, se deva considerar que as decisões ali proferidas não poderiam implicar o prosseguimento do concurso com a posterior adjudicação à concorrente ... . Isto porque, esta empresa para efeitos do cumprimentos das normas que foram declaradas ilegais, apresentou documentos juntos com a sua proposta que os Recorrentes alegam serem falsos ou falsificados, e portanto, tinha de ser excluída do concurso pelo júri, sendo os Recorrentes os vencedores, porque posicionados em 2º lugar. Mas, em simultâneo, dizem os Recorrentes que a afirmação da ilegalidade das normas não podia implicar apenas a sua desaplicação para futuro, mas exigiria um reinício do concurso, sem tais regras contratuais, pois se estas não tivessem existido ab inicio teriam participado no concurso não em consórcio, mas separadamente e teriam apresentado preços maios baixos. Logo, porque o critério da adjudicação era o preço, teriam hipóteses de serem os vencedores do mesmo.
Para se apreciar este recurso, há que começar por se enquadrar o presente litígio na factualidade que o envolve.
Este concurso não está a ser alvo de uma reacção contenciosa pela primeira vez. Diferentemente, uma vez lançado o concurso e publicado o anúncio em 16.07.2012, a Evejets apresentou uma providência cautelar na qual requereu a suspensão de eficácia do procedimento, e ainda, a suspensão de eficácia de diversas normas contratuais. Os ora Recorrentes apresentaram oposição nessa acção.
Em 20.08.2012, a ... apresentou também no TAF de Braga uma PI de uma acção de contencioso pré-contratual, que teve o n.º 1370/12.3BEBRG, na qual vem a indicar como Contra interessados os restantes concorrentes no concurso e nomeadamente os ora Recorrentes. Ali peticionou a declaração de ilegalidade das seguintes normas do Programa do Concurso: artigo 9.°, n.º 3, alínea d); n.º 4, alínea d); nº 5, alínea d); n.º 6, alínea d); n.º 8, alíneas c), d), e) e 1), e anexo XVII do Caderno de Encargos, por remissão do artigo 9.º, n.º 6, alínea e) do Programa do Concurso e a cláusula 4.3, n.º 4 do Caderno de Encargos, invocando-se como fundamentos da acção a violação dos princípios da concorrência, considerando-se que as normas impugnadas, ao imporem que os interessados submetessem os manuais de voo específicos de cada aeronave que se propunham apresentar, restringiam a concorrência acabando por permitir que apenas um concorrente se encontrasse em condições de apresentar tal documento; da imparcialidade e da igualdade, por se exigir sem que nada o justificasse, a apresentação de um documento aos concorrentes que, a final, resultava no favorecimento daquele que era desde 1998 o seu fornecedor e prestador de serviços em contratos da mesma índole; da proporcionalidade, por a exigência dos manuais de voo revelar-se manifestamente desproporcional e injustificada, face, nomeadamente, à consequência de restringir a apenas um concorrente, a possibilidade de se apresentar a concurso; a violação do artigo 49.º do CCP e das directivas comunitárias, por a descrição técnica das aeronaves pretendidas restringir de tal modo a concorrência que, em última instância, apenas um potencial interessado pode satisfazer tais requisitos.
Nessa acção, os então Contra interessados e ora Recorrentes apresentaram oposição.
Estando entretanto a decorrer o prazo para a apresentação das propostas, o qual foi prorrogado até 25.10.2012, apresentaram propostas diversas empresas, entre elas a ... e os ora Recorrentes.
Após a apresentação das propostas e antes da elaboração do relatório preliminar, os Recorrentes alertaram o júri para o incumprimento pela ... do artigo 9º, n.º 3, alínea d), do Programa de Concurso, para a falsidade de documentos e para a prestação de falsas declarações quanto à documentação apresentada por esse concorrente.
Em 15.11.2012, foi elaborado o relatório preliminar e foi o mesmo notificado aos concorrentes para efeitos do exercício do direito de audiência prévia.
Apresentadas as respostas nesta sede pelos concorrentes, o júri iniciou um processo de reanálise das propostas assessorado pelo grupo técnico e pelo grupo jurídico, encetando um conjunto e diligências com vista a confirmar ou desmentir a veracidade das alegações relativas à falsidade dos documentos ou às falsas declarações.
É então proferida em 21.01.2013 a decisão tomada no processo n.º 1370/12.3BEBRG-A, que julgou parcialmente procedente a providência e decretou «a suspensão de eficácia do artigo 9.º, n.º 3, al. d), n.º 5, al. d), n.º 6, al. d), n.º 8, al. c), d), e) e f) do Programa do Concurso» e «[n]o que tange ao pedido de suspensão de eficácia do procedimento concursal, julgou que o mesmo não merece provimento porquanto, decretando-se a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais (…) a Requerente fica em condições de apresentar proposta, ficando acautelada a sua posição jurídica, bem como a utilidade prática do processo principal que a providência cautelar visa acautelar».
Em 13.02.2013, é elaborado pelo júri o relatório final, que ordena as propostas apresentadas para o lote 3, classificando em primeiro lugar o concorrente B (... ), com o preço global de €39.923.000, e em segundo lugar o concorrente A, Agrupamento ... – ... – ... – HTA, com o preço global de € 41.303.500, propondo que a adjudicação referente ao lote 3 recaia sobre a proposta apresentada pelo concorrente B, ... .
Neste relatório final, o júri considera que face aos efeitos devolutivos do recurso que possa ser interposto, lhe cabe, face ao decidido judicialmente, «prosseguir com a tramitação do procedimento pré-contratual até final, procedendo, porém, à desaplicação da norma concursal cuja eficácia de encontra suspensa». Mais entende o júri, que «estando suspensa a aplicação da norma concursal que exigia a apresentação dos manuais de voo das aeronaves que o concorrente se propõe locar, é juridicamente irrelevante, para efeitos concursais, saber (i) se as cópias dos manuais de voo apresentadas pelo concorrente ... , e designadamente as respetivas folhas de rosto e certificados de pesos e centragens, correspondem ou não aos originais desses mesmos manuais de voo, (ii) se essas cópias resultam (ou não) da reprodução copiada de um único manual de voo «deliberadamente alterado (…) ocultando matrículas e, bem assim, datas e assinaturas apostas no manual», bem como, (iii) se o concorrente B contactou (ou não) as empresas proprietárias das aeronaves que se propõe locar e com elas acordou ou encetou quaisquer negociações pré-contratuais com vista à locação ou à aquisição de aeronaves ligeiras que cumpram as especificações técnicas do Caderno de Encargos e seus anexos.».
Mas já antes da prolação da decisão cautelar, por decisão proferida em 14.01.2013, no processo de contencioso pré-contratual n.º 1370/12.3BEBRG, havia sido julgada «parcialmente procedente a ação, declarando a ilegalidade do artigo 9.º, n.º 3, alínea d) […] do Programa do Concurso, determinado que os RR. procedam à correção do mesmo». Desta decisão em processo principal cabia, no entanto, recurso, com efeitos suspensivos.
Em 15.03.2013, é intentada pelos Recorrentes a PI que originou os presentes autos.
Interposto recurso da decisão proferida em 14.01.2013, no processo de contencioso pré-contratual n.º 1370/12.3BEBRG, veio a mesma a ser confirmada pelo TCAN em 31.05.2013.
Por conseguinte, as alegações dos Recorrentes têm de ser enquadradas na situação concreta e designadamente terão de ser aferidas à luz dos anteriores litígios que visaram o presente concurso, relativamente aos quais já houve decisões transitadas em julgado.
Conforme artigo 621º do novo CPC (equivalente ao artigo 674º do antigo Código), a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga.
Por seu turno, determina o artigo 619º do CPC (correspondente ao artigo 671º do antigo Código), que transitada em julgado a sentença que decida o mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pela litispendência e o caso julgado (cf. artigos 580º e 581º do novo CPC e 497º e 498º do antigo).
Conforme os factos provados e acima explanados mais sucintamente, na providência cautelar apresentada pela Evejets requereu-se a suspensão de eficácia do procedimento, e ainda, a suspensão de eficácia de diversas normas contratuais. Na decisão proferida em 21.01.2013, foi julgada parcialmente procedente a providência e decretada «a suspensão de eficácia do artigo 9.º, n.º 3, al. d), n.º 5, al. d), n.º 6, al. d), n.º 8, al. c), d), e) e f) do Programa do Concurso». Mas também se julgou que «[n]o que tange ao pedido de suspensão de eficácia do procedimento concursal, julgou que o mesmo não merece provimento porquanto, decretando-se a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais (…) a Requerente fica em condições de apresentar proposta, ficando acautelada a sua posição jurídica, bem como a utilidade prática do processo principal que a providência cautelar visa acautelar».
Desta decisão foi interposto recurso, que foi admitido com efeitos meramente devolutivos.
Entretanto, foi proferida a decisão no processo pré-contratual n.º 1370/12.3BEBRG, que julgou «parcialmente procedente a ação, declarando a ilegalidade do artigo 9.º, n.º 3, alínea d) […] do Programa do Concurso, determinado que os RR. procedam à correção do mesmo», decisão confirmada pelo TCAN em 31.05.2013.
Vem agora os Recorrentes dizer que a decisão recorrida errou quando entendeu, que face ao teor da sentença proferida no processo cautelar, o júri do concurso podia não prosseguir com as averiguações relativas à apresentação de documentos que os Recorrentes haviam denunciado como falsos ou falsificados na proposta do Contra interessado ... , assim como, quando entendeu que se poderia aproveitar os actos antes praticados, prosseguindo-se o concurso com as proposta já apresentadas.
Acontece, que conforme resulta da decisão proferida no processo cautelar - em 21.01.2013 - foi ali decidido decretar a suspensão de eficácia do artigo 9.º, n.º 3, alínea d), n.º 5, alínea d), n.º 6, alínea d), n.º 8, alíneas c), d), e) e f) do Programa do Concurso, mas não se julgou procedente o pedido de suspensão de eficácia do procedimento concursal, por se entender que a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais, já acautelava a posição da ... , a requerente da providência, que ficava assim «em condições de apresentar proposta».
Ou seja, na decisão tomada nesta providência considerou-se que a suspensão de eficácia das normas julgadas ilegais já permitiria à ... participar no concurso e acautelar a sua posição jurídica, não havendo que se suspender o correspondente procedimento, que poderia continuar desde que a aplicação daquelas normas ficasse suspensa.
Da mesma forma, já antes daquela data, designadamente em 14.01.2013, havia sido proferida a decisão do TAF de Braga, em sede da acção de contencioso pré-contratual que decretou a ilegalidade do artigo 9.º, n.º 3, alínea d), do Programa do Concurso e para os RR. procederem «à correcção do mesmo», decisão que foi alvo de recurso, interposto pelos ora Recorrentes, o qual só veio a ser decidido, no entanto, por acórdão do TCAN de 31.05.2013.
Conforme factos dados por provados em Y) e Z), em 13.02.2013, quando o júri do concurso elaborou o relatório final, pronunciou-se também acerca dos argumentos aduzidos pelas concorrentes em sede de audiência prévia (cf. factos provados em R) e S). Ali considerou-se o teor da decisão proferida no processo cautelar, os efeitos meramente devolutivos do recurso e que «cabe às Entidades Adjudicantes […] prosseguir com a tramitação do procedimento pré-contratual até final, procedendo, porém, à desaplicação da norma concursal cuja eficácia de encontra suspensa».
Na fundamentação da decisão e na apreciação das respostas dadas em audiência prévia, justificou o júri o termo das diligências de investigação quanto à invocada falsidade ou falsificação de declarações e documentos, indicando que «Estando suspensa a aplicação da norma concursal que exigia a apresentação dos manuais de voo das aeronaves que o concorrente se propõe locar, é juridicamente irrelevante, para efeitos concursais» verificar dessas alegações «como causas de exclusão de propostas». Mais disse o júri, que as invocações da concorrente A. não estavam comprovadas, nem comprovavam suficientemente aquelas alegações os documentos que juntou, assim como que «não decorre que o concorrente B tenha prestado falsas declarações juridicamente relevantes no âmbito do presente concurso para os efeitos previstos na alínea m) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP».
Ora, face à decisão tomada pelo TAF de Braga no processo cautelar, impunha-se, na realidade, à entidade contratante desaplicar as normas cuja suspensão se decretou, analisando e avaliando as propostas já apresentadas no concurso, à luz de um programa de concurso expurgado daquelas normas que ficaram com a eficácia suspensa (e que mais tarde vieram a ser declaradas ilegais, pelo que, no caso, a decisão cautelar assegurou no iter processual a utilidade da sentença que veio a ser proferida no processo principal).
Atendendo ao teor da decisão cautelar, que julgou improcedente o pedido de suspensão do próprio procedimento concursal, por considerar que a mera suspensão da norma já acautelava os interesses da Everject e a correspondente legalidade do procedimento, também não poderia a entidade contratante, afrontando o decidido judicialmente, anular todo o procedimento do concurso desde a data da publicação do anúncio e fazê-lo retomar a partir dessa data com o anúncio de um novo programa de concurso donde não constassem as normas cuja eficácia ficou suspensa.
Ou seja, o júri do concurso estava obrigado a prosseguir aquele mesmo procedimento, cujo anúncio já tinha sido publicado, cujo prazo para a apresentação das propostas também já tinha decorrido, analisando e avaliando as propostas já apresentadas, à luz do programa do concurso do qual se expurgasse o estabelecido no artigo 9.º, n.º 3, alínea d), n.º 5, alínea d), n.º 6, alínea d), n.º 8, alíneas c), d), e) e f) do Programa de Concurso (porque a eficácia destas normas ficou suspensa por decisão judicial).
A verificação dos eventuais motivos de exclusão das propostas, materiais e formais, não poderia, assim, ter em conta o exigido naquelas normas, ou seja, não se poderia considerar como exigida a apresentação dos manuais de voo, com especificações ali também indicadas (cf. artigos 70º, n.º 2 e 146º, n.º 2, do CCP e facto dado por provado em G).
Porque julgada, ainda que cautelarmente, suspensa a eficácia das normas estabelecidas no artigo 9.º, n.º 3, alínea d), n.º 5, alínea d), n.º 6, alínea d), n.º 8, alíneas c), d), e) e f) do Programa de Concurso e porque se entendeu na decisão judicial que essa mera suspensão de normas já acautelava a utilidade do litígio da causa principal e a posição da requerente da providência, podendo prosseguir o procedimento concursal com os mesmos concorrentes, outra não podia ser a conduta do júri do concurso, que não aquela que teve.
Devia o júri prosseguir o concurso desconsiderando totalmente as normas cuja eficácia ficou suspensa. Tal era uma imposição dos artigos 674º e 671º do antigo CPC (actuais artigos 619º e 621º do novo CPC).
Se não tivesse agido como agiu e se atendesse se alguma forma aos elementos entregues pelos concorrentes ao abrigo da norma suspensa, o júri do concurso teria desrespeitado a decisão judicial, o que acarretaria a nulidade de todos os actos que praticasse em desconformidade com aquela decisão (podendo ainda os membros do júri incorrer em responsabilidade civil, criminal e disciplinar – cf. artigo 158º do CPTA).
Porque a eficácia daquelas normas estava suspensa, não poderia o júri do concurso apreciar os documentos que tinham sido juntos às propostas para cumprimento do ali exigido, ou seja, os manuais de voo. A junção desses documentos teria que passar a irrelevar em absoluto, considerando-se que os mesmos nunca tinham sido juntos às propostas, pois o programa de concurso também os não poderia exigir.
Estando suspensa a eficácia das referidas normas e não podendo ter qualquer relevância os documentos que haviam sido juntos com as propostas em cumprimento do ali exigido, tornava-se totalmente inútil o prosseguimento de quaisquer averiguações acerca da falsidade dos manuais de voo.
Para efeitos da decisão a tomar no procedimento concursal, não poderia o júri do concurso, por força do teor da decisão judicial proferida, analisar, avaliar ou excluir qualquer proposta com base nos documentos que foram entregues para cumprimento de uma exigência das normas do programa de concurso, normas essas cuja eficácia estava suspensa.
Portanto, o teor daqueles manuais e especificações ali insertas passaram a não poder ter qualquer relevância no procedimento a levar a cabo pelo júri. Deixaram de ser factos essenciais ou determinantes da decisão averiguar, sequer, acerca da entrega dos manuais. Passou a ser indiferente essa entrega, assim como indiferente se tornou o seu conteúdo para efeitos deste concurso.
Saber acerca do conteúdo dos manuais, declarações sobre eles feitas ou especificações ali insertas, passou a não ter qualquer interesse para os actos que se tinham de praticar no procedimento, para a instrução do mesmo ou para a decisão a tomar no seu final. Aliás, como já se disse, tornou-se até obrigatório para o júri, em obediência à decisão proferida, não atentar naqueles manuais, na sua entrega ou omissão, ou no seu conteúdo, sob pena de, na prática, fazer relevar o que se exigia (ilegalmente) nas normas cuja eficácia o tribunal julgou suspensas.
Irrelevando para a instrução e decisão do procedimento aqueles manuais, também não havia que prosseguir-se com mais averiguações acerca das invocadas falsidades ou que recolher mais prova, que pudesse confirmar ou infirmar tais invocações.
O princípio do inquisitório na sua vertente formal apenas exige que a Administração ordene o procedimento, promovendo os ritos adequados a que se alcance uma pronta decisão administrativa, que respeite a legalidade procedimental.
Na vertente material, é um poder-dever que pressupõe que a Administração tome todas as actuações necessárias a alcançar o conhecimento dos factos essenciais e relevantes à decisão a tomar, para os ponderar antes de decidir, assim respeitando os princípios da legalidade, prossecução do interesse público, mas também da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, da justiça e da proporcionalidade (cf. artigos 56º e 86º e ss. do CPA).
Nas palavras de Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e João Pacheco de Amorim, «O princípio do inquisitório, que se contrapõe ao princípio dispositivo, significa que a Administração tem no procedimento uma atitude procedimental activa, impondo-se-lhe deveres de agir oficiosamente em duas dimensões fundamentais: uma de cariz formal –ou ordenador-e outra de cariz material ou de conhecimento .
(…) Esta primeira dimensão do inquisitório traduz-se, pois, no dever de o órgão definir e dirigir a série de actos que nele se realizam (…) e de zelar para que se obtenham as finalidades visadas através de cada uma delas e do seu conjunto, de acordo com os princípios procedimentais aplicáveis.
(…) A segunda dimensão do princípio do inquisitório, a material ou de conhecimento, tem que ver com os poderes de procura, selecção e valoração dos factos relevantes e da lei aplicável à "causa" ou caso jurídico-administrativo.
Neste sentido, o inquisitório (…) tem que ver (…) com os poderes(-deveres) de a Administração proceder às investigações necessárias ao conhecimento dos factos essenciais ou determinantes para a decisão, exigindo-se dela (ou imputando-se-lhe a responsabilidade correspondente) a descoberta e ponderação de todas as dimensões de interesses públicos e privados, que se liguem com a decisão a produzir.
O princípio liga-se, nesta vertente, às ideias de completude instrutória ou de máxima aquisição de (factos e) interesses, cuja inobservância pode projectar uma ilegalidade no acto final do procedimento, por deficit de instrução, e cujo fundamento se encontra, desde logo no art° 91°, n° 2, e nos princípios da legalidade e da prossecução do interesse público -que obrigam a Administração a verificar a ocorrência dos pressupostos do acto a produzir -, bem como nas exigências inerentes ao princípio da imparcialidade» (em Código do Procedimento Administrativo Anotado, Almedina, Coimbra, 2º edição, 2005, págs. 307 e 308).
Porque os manuais entregues o foram unicamente em cumprimento das normas cuja eficácia ficou suspensa por decisão judicial, deixou de ser facto com relevo para a instrução e decisão administrativa averiguar da sua entrega ou conteúdo.
E dos factos dados por assentes, retira-se, que antes dessa decisão judicial, encetou o júri uma série de diligências para averiguar acerca das invocadas falsidades, inclusive assessorando-se de um grupo técnico e um grupo jurídico. De tais diligências não resultou a prova da existência de falsas declarações ou de falsificação de documentos. Nesse sentido foi a fundamentação do júri constante do relatório final (cf. factos T), U) Y), Z), V) e W)).
Face aos factos trazidos aos autos também não se pode considerar que os ora Recorrentes apresentaram uma prova irrefutável, no âmbito do procedimento administrativo, de que existiam declarações falsas ou que foram juntos documentos falsos com a proposta da ... .
E aqui note-se, que da prova carreada para estes autos nem sequer resulta que no procedimento administrativo tenha sido provado que a ... tenha apresentado manuais de voo originais, mas deriva, antes, que terão sido juntas meros ficheiros PDF, que incluíam a fotocópia de manuais de voo, algumas das quais com inscrições manuscritas e rasuras.
No artigo 9º do Programa de concurso referia-se a entrega de «manuais de voo», não se indicando a entrega de fotocópias simples desses manuais.
Conforme declaração dada por reproduzida em W), as «desconformidades» são relativas à comparação de originais dos manuais com meras fotocópias de manuais incompletos, que terão sido reproduzidas em ficheiros PDF. Não fica sequer claro, portanto, que no caso se tenham apresentado em ficheiros PDF os originais dos manuais do voo, falsificados ou alterados, ou que as fotocópias convertidas nos ficheiros PDF fossem indicadas como relativas à reprodução integral de determinados originais de manuais de voo. Isto é, não está provado nestes autos que no procedimento administrativo se fez prova da existência de uma falsificação de documentos ou de falsas declarações. Dos autos também não deriva provado que com a entrega de PDF de fotocópias, se assim assumidas, se estivesse a falsificar documentos ou a ... pretendesse alcançar um benefício ilegítimo (cf. a tipificação do crime de falsificação de documento no artigo 256º e de burla nos artigos 217º e 218º do CC).
Face ao exposto, não procedem as alegações dos Recorrentes relativas ao erro de julgamento, por estarem violados os princípios do inquisitório e da transparência, ou por o júri do concurso ter feito uma errada interpretação dos efeitos da indicada sentença.
Da mesma forma, face ao teor do relatório final, é manifesto que o júri se pronunciou acerca da questão relativa às alegações dos ora Recorrentes concernentes à falsidade dos documentos juntos na proposta da ... . Tal pronúncia foi no sentido de esses documentos não poderem relevar para a instrução e decisão a tomar no procedimento, por força da decisão judicial.
Do teor de tal relatório consta também uma fundamentação de facto e de direito que cumpre as obrigações de fundamentação dos actos a Administração.
Aqui faça-se ainda nota, que face aos factos dados por provados, teremos de concluir que aos ora Recorrentes foi dada a oportunidade de se pronunciarem e de defenderem a sua posição jurídica nos processos cautelar e pré-contratual, que correram no TAF de Braga, pois aí foram indicadas como Contra interessados e ali intervieram.
Notificadas destas decisões, puderam apresentar recurso e reagir.
Discordando da decisão cautelar, por ter determinado a suspensão de eficácia das normas e indeferido o pedido de suspensão do procedimento, considerando que com aquela primeira procedência já poderia a Everjet apresentar a sua proposta ao concurso, logo, indicando que este concurso poderia prosseguir a partir dali apenas com as normas em causa suspensas, poderiam os ora Recorrentes ter apresentado recurso impugnando também essa parte da decisão. Poderiam os Recorrentes arguir, como fizeram nestes autos, que a mera suspensão de eficácia das normas tendo por pressuposto a continuação do procedimento naquela fase, com as propostas já apresentadas, violaria os princípios da transparência, da estabilidade das regras do concurso e da inalterabilidade ou da intangibilidade das propostas.
Também relativamente ao procedimento pré-contratual e à decisão de 1º instância ali tomada, foram os ora Recorrentes indicados como Contra interessados e daquela decisão apresentaram recurso.
Verificando que a ... apenas requereu na PI o expurgo das normas no procedimento em curso, com a sua correcção ou eliminação, pressupondo a sua continuação sem essas normas, nada impedia que os Contra interessados e ora Recorrentes, quando apresentaram a contestação nessa acção e depois as suas contra alegações de recurso, invocassem (e provassem) que aquele simples expurgo os prejudicava, pois prosseguindo o concurso com as propostas já apresentadas, apresentar-se-iam em consórcio, quando inexistindo ab inicio aquelas normas iriam apresentar-se a concurso como concorrentes separados e com um preço mais baixo.
Repare-se, que já em sede desse procedimento pré-contratual arguiram os Contra interessados a ilegitimidade activa da ... e a inutilidade superveniente da lide, por a mesma ter-se efectivamente apresentado ao concurso apresentando os manuais exigidos pelas cláusulas cuja ilegalidade requeria que fosse declarada e esta veio responder em contra alegações acerca do seu interesse no prosseguimento dos autos e do respectivo concurso expurgado das normas ilegais. Também nessas contra alegações a ... contraria as invocações que entretanto terão sido feitas pelos Contra interessados em sede de audiência prévia, relativamente à falsidade dos documentos.
Por requerimento superveniente a ... veio informar da decisão de adjudicação havida em 15.02.2013 e da resposta dada em sede de audiência prévia pela ... .
Ou seja, a questão da continuação do concurso antes lançado, com a manutenção das propostas já apresentadas pelos concorrentes, centrando-se o litígio apenas no expurgo das normas que se invocaram como ilegais, que vieram depois a ter a eficácia suspensa e foram declaradas ilegais no processo de contencioso pré contratual, constitui o litígio que se quis dirimir nas acções cautelar e de contencioso pré-contratual que correram termos no TAF de Braga.
Foi aquela a relação material controvertida que foi trazida a juízo pela ... e na qual os ora Recorrentes intervieram como Contra interessados. Estes Contra interessados, querendo, poderiam ter esgrimido nessas acções quer o seu prejuízo face ao que vinha pedido pela ... – apenas o expurgo das normas ilegais com o prosseguimento do concurso – quer a circunstância superveniente relativa à falsidade dos documentos ou das falsas declarações (sendo certo que resultou provado em P) que esse conhecimento tiveram-no após a apresentação da proposta da ... e antes de 15.11.2012, a data do relatório preliminar, portanto, antes da data da prolação das decisões de 1º instância, quer a proferida nos autos principais – de 14.01.2013, quer a proferida em sede cautelar – de 21.01.2013).
Assim, por um lado, decidido o mérito daquelas causas por sentenças transitadas em julgado, tais decisões ficaram a ter força obrigatória dentro dos processos e fora deles, ficaram os ora Recorrentes, porque ali demandadas como Contra interessados, vinculados ao que foi decidido. Por outro lado, porque aos ora Recorrentes foi dada a oportunidade de intervirem naqueles processos e ali defenderem a sua posição jurídica, o que se decidiu naqueles autos vincula-os directamente.
Face à argumentação atrás expendida, falece consequentemente a alegação dos Recorrentes relativa à apreciação da invocada falsidade ou falsificação de documentos independentemente da averiguação para efeitos de processo crime ou do desfecho desta.
Como se indicou antes, no caso em apreço não ficou provado no procedimento administrativo que a proposta da ... fosse constituída por documentos falsos ou que naquela tivessem sido prestadas falsas de declarações.
Depois, face à decisão tomada nos autos cautelares ficou o júri obrigado a não aplicar as normas cuja eficácia ficou suspensa no procedimento concursal. Estando inibido de aplicar aquelas normas, deixou de relevar ou de ter qualquer interesse para o concurso o facto de os concorrentes terem junto à sua proposta os manuais ou não. Da mesma forma, o conteúdo dos mesmos deixou de poder ser aferido para efeitos de instrução e decisão no concurso.
Por conseguinte, não poderia o júri analisar e pronunciar-se sobre esses manuais entregues junto com a proposta.
Como corolário, também não poderia o júri do concurso excluir a proposta da ... com base na análise dos manuais por ela entregues e seu conteúdo.
Por isso, porque o júri estava inibido de excluir a proposta da ... com base na análise dos manuais por ela entregues ao abrigo das normas cuja eficácia estava suspensa e ainda porque não estava provado sequer que aquela proposta fosse constituída por documentos falsos ou que naquela tivessem sido prestadas falsas de declarações, não eram aplicáveis os artigos 146º, n.º 2, alínea m) e 148º, n.º 1, do CCP.
Como refere Ana Raquel Moniz «a partir da prolação de uma sentença que aprecie a invalide de uma peça do procedimento, ficam as entidades administrativas proibidas de valorar qualquer caso concreto que ocorra no horizonte do procedimento pré-contratual em causa à luz do(s) critério(s) de decisão contante(s) do documento conformador que o tribunal considerou inválido(s) (em “As peças do Procedimento”, Estudos de Contratação Pública, vol. IV, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, pág. 167).
A Autora no caso citado refere-se a uma acção de contencioso pré-contratual. Mas aquela citação é também aqui plenamente válida, pois a decisão cautelar determinou desde logo (ainda que cautelarmente) a suspensão da eficácia das normas e assegurou no iter processual da acção principal – de contencioso pré-contratual – aquela (não) aplicação por banda do júri do concurso, permitindo que o concurso prosseguisse sem a aplicação daquela norma, que acabou por se julgar ilegal no processo principal.
As invocações dos Recorrentes relativamente à obrigação de as normas do concurso se manterem estáveis nos seus elementos essenciais e à obrigação de não adjudicação quando circunstâncias imprevistas obriguem à alteração dos aspectos fundamentais das peças do procedimento após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, são válidas, sim, por regra em todos os concursos públicos.
Decorre da aplicação conjugada dos artigos 50º, n.º 3 e 79º, ns.º 1, alínea c), 2, 130º, 132º, n.º 1, do CCP, que as peças do concurso, nos seus aspectos fundamentais, para além das rectificações a efectuar até ao termo do segundo terço do prazo para a apresentação das propostas, hão-de manter-se estáveis. Caso tenham que ser alteradas «por circunstâncias imprevistas (…) após o termo do prazo para a apresentação das propostas» fica a entidade contratante obrigada a não adjudicar e a dar início a um novo procedimento no prazo máximo de seis meses a contar da decisão de não adjudicação (cf. ainda artigos 80º e 99º do CCP; cf. também Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concurso e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Livraria Almedina, Coimbra, 2001, págs. 210, 211 e 329 e 330).
A proibição da eliminação, aditamento ou da modificação das regras do procedimento visa a garantia da sã concorrência, da igualdade, da imparcialidade, da boa fé e da tutela da confiança e da auto-vinculação administrativa.
Porém, ainda assim, em situações raras pode admitir-se estas alterações, desde que as mesmas não colidam com a essência dos citados princípios (cf. a este propósito, Maria João Estorninho, Curso de Direito dos Contratos Públicos, Almedina, 2012, Coimbra, págs. 561, 565 a 579; Cláudia Viana, Os Princípios Comunitários na Contratação Pública, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, págs. 233 e234; Rodrigo Esteves de Oliveira, “Os Princípios da Contratação Pública”, Estudos de Contratação Pública, vol. I, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, págs.86 a 88 e 113; Ana Raquel Moniz, “As Peças do Procedimento”, Estudos de Contratação Pública, vol. IV, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, págs. 114, 115, 127, 160 e 166 a 170; Ac. do TCAS n.º 9589/12, de 21.02.2013, em www.dgsi.pt.).
No caso ora em apreço, verifica-se, que após o anúncio do concurso (em 16.07.2012) e antes do termo do prazo para a apresentação das propostas (em 25.10.2012), a ... reagiu judicialmente, requerendo a suspensão de eficácia do procedimento aberto e das normas insertas no artigo 9.º, n.º 3, alínea d), n.º 5, alínea d), n.º 6, alínea d), n.º 8, alíneas c), d), e) e f) do Programa de Concurso.
Em 20.08.2012, a ... apresentou a acção principal de contencioso urgente pré contratual.
Não obstante essa reacção a ... apresentou a sua proposta a concurso dentro do prazo estabelecido para o efeito (que foi prorrogado).
Após a elaboração do relatório preliminar, estando-se em fase de audiência prévia, em 14.01.2013, é proferida a decisão nos autos principais, que julgou parcialmente procedente a acção e declarou a ilegalidade do artigo 9º, n.º 3, alínea d), do Programa do Concurso e determinou os RR. que procedessem à correcção do mesmo.
Em 21.01.2013 é proferida a sentença que decretou a suspensão de eficácia das normas, indeferindo o pedido de suspensão de eficácia do procedimento.
Então, o júri, atentos os efeitos devolutivos do recurso que pudesse ser apresentado na providência cautelar, em 13.02.2012, elaborou o relatório final, ordenou as propostas e classificou em 1º lugar a ... , desaplicando as normas cuja eficácia tinha sido julgada suspensa.
Da decisão proferida no processo principal foram interpostos recursos e por acórdão do TCAN de 31.05.2013 foi confirmada a decisão tomada pelo TAF de Braga.
Como já referimos, os termos como foram delimitados os litígios e depois proferidas as decisões tomadas nos mesmos, condicionaram todos os intervenientes no procedimento concursal.
Foi decretada a suspensão de eficácia de várias normas insertas no artigo 9º do Programa de Concurso, mas foi entendido pelo Tribunal que com essa suspensão se acautelava a posição do requerente da providência, que assim já poderia concorrer àquele concurso, pelo que improcedeu o pedido de suspensão do próprio procedimento. Pressupôs-se na decisão, face à causa de pedir tal como vinha configurada e foi contraditada pelas contrapartes, que o procedimento concursal pudesse prosseguir expurgado das normas que foram declaradas suspensas.
No litígio judicial foram demandadas como Contra interessados todos os concorrentes que apresentaram propostas, que assim puderam reagir no litígio.
Os Recorrentes não eram, portanto, um terceiro neutral relativamente à relação jurídico- administrativa que se tinha constituído ou relativamente ao concurso. Antes, eram interessados directos, que passaram a participar na relação contratual desde a data em que apresentaram proposta ao concurso e na relação litigiosa quando foram demandados como Contra interessados naquelas acções.
Aqui há, portanto, que considerar todo o circunstancialismo factual que rodeou este concurso e os interesses envolvidos: o interesse público no lançamento e prosseguimento do concurso, o interesse da ... de ver efectivamente tutelados os seus os direitos através da interposição das acções judiciais e os interesses das contrapartes, aqui se incluindo o das Recorrentes, de participar num concurso que se apresentasse em prol da concorrência e garantidor dos princípios da igualdade e da imparcialidade.
Por último, mas não menos importante, há que atender à própria fisiologia dos meios de tutela judicial criados para o dirimir estes litígios concursais e aos objectivos que se pretendeu com a criação dos mesmos.
Quer o contencioso cautelar contratual, quer o principal, a acção de contencioso pré-contratual, são processos que se pretendem muito rápidos. A legitimidade activa quer-se relativamente alargada (cf. artigos 9º, 55º, 100º e 132º do CPTA). E neles também são concedidos poderes alargados ao juiz para conformar o litígio.
Em sede de medidas cautelares, o artigo 132º, n.º 1, do CPTA, tem um carácter aberto, permite que sejam tomadas pelo juiz todas as providências destinadas a corrigir a ilegalidade ou a impedir que sejam causados outros danos dos interesses em presença.
Por seu turno, da conjugação dos artigos 132º, n.º 1 e 7, 3º, n.º 3 e 95º, ns.º e 4, do CPTA, deriva a permissão ao juiz, quando logo no processo cautelar considere demonstrada a ilegalidade das especificações contidas nos documentos do concurso, que determine a sua correcção, nomeadamente especificando os actos e operações a levar a cabo pela Administração para aquela correcção, se se tratarem de actos totalmente vinculados, porque apenas seja possível na situação concreta uma única actuação da Administração.
A criação destes meios de tutela foi uma por imposição comunitária, directamente decorrente das Directivas 89/665/CEE, de 21.12 e n.º 92/13/CEE, de 25.02.
Visou-se a criação de meios de tutela que garantam os interesses de todos os envolvidos, da entidade contratante e dos demais concorrentes, salvaguardando-se quer o interesse dos concorrentes que se consideram preteridos, a ver a situação rapidamente resolvida e de forma efectiva, quer os interesses dos demais concorrentes e da entidade contratante, a verem o concurso prosseguir e terminar com a correspondente adjudicação.
Quis-se que o normal e célere andamento de qualquer concurso não fosse bloqueado por processos judiciais demasiado longos ou cujas pronúncias não fossem de molde a resolver com eficácia o litígio.
Pretendeu-se que os meios de tutela permitissem uma estabilização rápida da situação, assim se acautelando os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da concorrência, da transparência, da igualdade, mas em simultâneo, garantindo que os interesses públicos e privados (dos demais concorrentes e designadamente do concorrente vencedor da adjudicação), em ver o concurso prosseguir e terminar, não ficassem demasiado sacrificados.
Portanto, porque a ... fez uso dos seus direitos de acesso à via judicial para impugnar as normas do concurso e porque os meios processuais que utilizou estão gizados para que dali resulte uma decisão rápida, eficaz, que aprecie todos as posições em litígio e dirima aquela relação material controvertida na sua plenitude, inclusive, se as partes assim o requererem, com pronúncias condenatórias à Administração nos aspectos que se mostrem nas suas condutas (futuras) como vinculados, há aqui que avaliar a invocada obrigação de as normas do concurso se manterem estáveis nos seus elementos essenciais, à luz do uso daqueles meios processuais pela ... e da conduta processual ali também demonstrada pela Administração e restantes concorrentes Contra interessados.
Por conseguinte, não podem os princípios basilares da contratação pública - da concorrência, da igualdade dos concorrentes, da imparcialidade e da auto-vinculação administrativa – que justificam a obrigação de as normas do concurso se manterem estáveis nos seus elementos essenciais e a obrigação de não adjudicação quando circunstâncias imprevistas obriguem à alteração dos aspectos fundamentais das peças do procedimento após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, imperarem sem restrições sobre todos os restantes princípios que aqui também podem ser invocados.
Há que admitir a possibilidade de, em circunstâncias como a dos autos, dever aceitar-se a alteração das regras concursais depois daquele prazo de apresentação das propostas. Ou seja, há que admitir a possibilidade de os princípios da tutela efectiva (com relação ao concorrente que usou dos meios judiciais ao seu dispor para impugnar as regras do concurso), da boa fé, da tutela da confiança (dos restantes concorrentes que participaram no concurso, ou do que venha a vencer o mesmo), da prossecução do interesse público (da entidade pública, que lançou o concurso com vista a terminá-lo em tempo útil), puderem implicar derrogações ao princípio da estabilidade das regras do concurso, que não pode ser lido como um princípio absoluto.
No caso em análise, face ao teor da decisão proferida no processo cautelar pelo TAF de Braga, teremos que concluir que, na prática, este tribunal considerou que a concorrência e a igualdade entre os concorrentes ficava salvaguardada apenas com a supressão das normas, primeiro suspensas e mais tarde declaradas ilegais.
Por um lado, esta supressão valeu para todos os concorrentes, de igual forma. Por outro, até à data da decisão judicial de suspensão, todos os concorrentes tiveram de conformar as suas propostas com as normas contratuais, apresentando-as nesses termos, porquanto nenhum poderia conhecer ainda o desfecho do litígio e a decisão ali tomada.
Naqueles autos não foi alegado pelas contrapartes que se acaso aquelas normas não tivessem sido publicitadas teriam concorrido com diferentes propostas, ou não se teriam apresentando em consórcio. Mas nada as impedia de fazerem tais alegações, assim defendendo o seu ponto de vista de forma plena.
Nos presentes autos, apesar de os ora Recorrentes fazerem tais alegações (em sede de matéria de direito, como vimos, e sem especificarem factos concretos a partir dos quais se pudesse retirar que tinham efectivamente a possibilidade de apresentarem-se singularmente e com uma proposta a preço mais baixo, sendo que nem sequer afirmam qual seria esse preço), a verdade é que as alegações que fizerem não foram acompanhadas de prova documental, nem se produziu outra prova para se poder dar por assentes aquelas afirmações.
Isto é, aqui não ficou provado que os ora Recorrentes teriam necessariamente capacidade para se apresentarem em separado no concurso e que apresentariam outras propostas a um determinado preço, mais baixo do que aquele que foi apresentado pela ... .
Alias, neste ponto, há notar que a publicitação que a entidade pública fez do concurso, dos seus termos e a auto vinculação que dali resultou, teria sempre que excluir quaisquer cláusulas que fossem ilegais.
A autovinculação administrativa e a protecção da confiança que daí resulta para os particulares pressupõem a sua conformidade com a lei e o direito.
Quer isto dizer, que não pode um concorrente invocar aquela publicitação e a autovinculação que daí deriva para a Administração, para dali resultar uma obrigação de respeito pelo que se publicitou, quando em causa estão cláusulas contratuais ilegais.
Suspensa a eficácia das normas insertas no artigo 9.º, n.º 3, alínea d), n.º 5, alínea d), n.º 6, alínea d), n.º 8, alíneas c), d), e) e f) do Programa de Concurso, porque se julgou naquele processo cautelar serem ilegais tais normas, ilegalidade essa que foi confirmada relativamente ao artigo 9º, n.º 3, alínea d), do Programa de concurso (concernente ao lote 3, o que estava em discussão), na acção de contencioso pré-contratual, já não há aqui que se invocar a existência de qualquer obrigação da Administração actuar em conformidade com o que publicitou (ilegalmente). E cessa em absoluto a protecção que daí pudesse advir para os concorrentes que confiaram naquela publicitação (ilegal), quando isso signifique a exigência da Administração actuar em conformidade com o que publicitou.
Por conseguinte, face à factualidade que rodeia esta situação, não fica certo que aqui haja uma violação dos princípios da autovinculação administrativa, da igualdade, da sã concorrência e da imparcialidade, porque algum concorrente e designadamente a ... ficou em posição favorecida relativamente aos restantes, com a supressão da norma em causa do Programa do concurso.
Da mesma forma, a suspensão da eficácia das indicadas regras não conduzia à necessidade de se dar aos candidatos a possibilidade de alterarem a sua proposta. Bastava não se considerar como exigíveis e desprezar os manuais de voo apresentados, tal como o fez o júri do concurso, para se poder aproveitar todo o restante das propostas já apresentadas ao concurso (pois lembramos, que os ora Recorrentes optaram, nas acções que correram no TAF de Braga, por nada esgrimir relativamente à ora invocada possibilidade de não se apresentarem em consórcio ou com preços mais baixos, não fora a exigência da entrega dos manuais de voo).
Tal como decorre do antes afirmado, os meios de tutela em sede de contratos estão gizados para se alcançar uma intervenção rápida e eficaz por banda dos Tribunais. Para tanto, pressupõe-se que uma vez intentado um litígio emergente de uma relação jurídico contratual, ali tenham todos os interessados a possibilidade de discutir amplamente os termos desse litígio e as suas posições jurídicas, para que a decisão final que seja proferida estabilize a situação e acautele todos os interesses em presença.
Quer-se, portanto, uma justa composição do litígio, com uma justiça plena.
Mas essa justiça apela para um efectivo cumprimento dos deveres de cooperação, de boa fé processual e de respeito pela verdade material, a observar por todas as partes. Apela para a obrigação de todas as partes cooperarem entre si, apresentando os seus argumentos de forma completa e clara e de darem conhecimento ao processo de todas as superveniências que tenham relevo directo para a apreciação do litígio. Isto para que, uma vez proferida a decisão final, se conforme em definitivo todo o litígio, sem mais percalços legais que envolvam aquela mesma situação ou relação jurídico-litigiosa.
Depois de proferida a decisão judicial, transitada que esteja em julgado, a relação jurídico-contratual prosseguirá, com os contornos que derivem do que foi judicialmente estabelecido e já não há que fazer “renascer” vícios que derivem dos anteriormente esgrimidos ou não há que pedir nova intervenção judicial para acautelar a situação que se quis antes já totalmente resolvida (cf. neste sentido os artigos 8º, 51º, ns.º4, 63º, 86º, 95º, n.ºs 3 e 4, 101º e 102º, n.º 4 do CPTA).
Quer isto dizer, que tendo os ora Recorrentes e então Contra interessados a possibilidade de esgrimirem nos litígios que ocorreram no TAF de Braga todos os seus argumentos, pontos de vista ou pretensões, os seus direitos devem ter-se suficientemente acautelados, não havendo agora que invocar-se os princípios da concorrência, da igualdade dos concorrentes, da imparcialidade e da auto-vinculação administrativa, para contrariar aquilo que ficou já decidido ou que deriva do que ficou decidido por via judicial.
Naquelas acções poderiam os Recorrentes terem invocado que o mero expurgo das regras do concurso prejudicava os seus direitos a uma concorrência sã ou em igualdade. Poderiam ter dado conhecimento aos autos e aí discutido as invocadas falsidades ou falsas declarações relativamente aos documentos apresentados pela ... e da invocada obrigação da Entidade contratante excluir aquela proposta mesmo se as cláusulas cuja ilegalidade se requeria declarada, fossem efectivamente declaradas ilegais. Mas optando os ora Recorrentes e então Contra interessados por não terem invocado essas violações, uma vez transitadas as decisões proferidas, que acabaram por lhes ser desfavoráveis, terão de se conformar com os seus termos e aceitar que aquelas decisões resolveram definitivamente o litígio e que constituem caso julgado, nos limites e termos em que se julgou, devendo a Entidade contratante obedecer a tais decisões.
Há que concluir, portanto, que o interesse da ... e dos restantes litigantes nas acções que correram no TAF de Braga, ficaram suficientemente salvaguardados com o prosseguimento do concurso expurgado das normas que foram declaradas com a eficácia suspensa e com a declaração de ilegalidade do artigo 9º, n.º 3, alínea d), do Programa de Concurso, que exigia a apresentação da proposta para o lote 3 acompanhada do manual de voo.
Com esse expurgo não se beneficiou ou prejudicou nenhum concorrente, nem ficou provado que se aquelas normas tivessem inexistido ab inicio haveria outros concorrentes a apresentarem propostas ou por preços diferentes, tendo ocorrido, na situação em apreço, uma potencial ou efectiva restrição do universo de potenciais concorrentes.
Quanto a essa mera possibilidade ou conjectura, que em regra justificaria a obrigação de não adjudicação porque se alterou um elemento essencial das peças do procedimento após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, no caso concreto, pelas razões antes indicadas, aqui não pode prevalecer.
Conforme se extrai da matéria de facto provada, os concorrentes pronunciaram-se em sede de audiência prévia após o relatório preliminar.
Essas pronúncias foram apreciadas no relatório final, que se apresenta fundamentado, como já se disse, ali se tendo ponderado o conteúdo dos argumentos aduzidos pelos concorrentes nas suas respostas dadas ao relatório preliminar.
Não se excluiu qualquer proposta nem se alterou a sua ordenação face ao já ordenado no relatório preliminar.
No que diz respeito à decisão do júri de acatamento da decisão proferida na acção cautelar, com a suspensão de eficácia das normas do Programa do concurso que obrigavam à apresentação dos manuais de voo e de não continuação das diligências de averiguação das alegações dos ora Recorrentes relativas à falsidade ou falsificação, por se terem tornado irrelevantes face àquela decisão judicial, não exigiam aquelas decisões obrigatoriamente a abertura de uma nova fase de audiência prévia, como clamam os Recorrentes.
Aqui está-se num procedimento especial, regulado especialmente pelo CCP, que prevê as fases e razões para que se volte a abrir um período de participação aos concorrentes. Tais situações estão expressamente previstas no artigo 148º, ns.º 1 e 2, do CCP.
Ora, no caso em apreço não ocorreu nenhuma daquelas razões.
O júri também não poderia ter outra conduta que não fosse o acatamento da decisão judicial, nos termos em que ela foi requerida e proferida.
Determinado o expurgo das normas do concurso, com a sua continuação pressuposta com esse expurgo, adveniente da suspensão de eficácia que foi decretada, ao júri apenas competia assim o fazer. Logo, porque o júri estava vinculado aos termos da decisão judicial, seriam sempre irrelevantes os argumentos que pudessem ser trazidos ao procedimento pelas ora concorrentes, no sentido diverso daquele que foi o teor da decisão judicial.
Aqui volta-se a referir que os então concorrentes e ora Recorrentes foram constituídos Contra interessadas nos processos judiciais e ali intervieram. Dessa intervenção tinha também conhecimento o júri, obviamente. Portanto, não havia que pressupor que os termos como o litígio havia sido intentado pela ... e o conteúdo da decisão tomada no processo cautelar eram desconhecidos dos Recorrentes. Diversamente, havia que se entender que estas tinham conhecimento daquele litígio e decisão.
Foram, assim, cumpridos os artigos 100º do CPA e 147º do CCP.
Aliás, nas alegações de recurso são os próprios Recorrentes que afirmam que «não alegaram que o relatório final alterou as regras do Concurso mas sim que as mesmas foram alteradas por força da suspensão de eficácia de uma norma essencial do Programa de Concurso». Ou seja, aceitam os Recorrentes que não houve qualquer alteração das regras do concurso por uma circunstância que possa ser directamente imputável a uma decisão do júri do concurso, mas antes que aquela alteração foi devida unicamente aos efeitos da sentença judicial.
Mas se foi por imposição ou decorrência da decisão judicial que se alteraram as regras, porque passaram a ter a sua eficácia suspensa, não havia aqui lugar a qualquer decisão administrativa autónoma, da qual derivasse a alteração dessas regras e pudesse justificar a abertura de um novo momento de audiência prévia.
Nesta medida, também a invocada violação do artigo 79º, n.º 1, alínea c), do CCP, deixa de fazer sentido, porquanto esta norma se refere a uma alteração das regras do concurso por vontade expressa da entidade adjudicante e no caso sub judice a suspensão da eficácia das normas foi determinada por força da sentença proferida.
Há aqui um elemento exterior à vontade possível da entidade adjudicante, que lhe exige uma única conduta, em obediência ou em simples execução daquilo que foi determinado judicialmente: aplicar o Programa de concurso expurgado das normas cuja eficácia ficou suspensa e que vieram posteriormente a ser declaradas ilegais.
Em suma, no caso em apreço não se mostram violados nenhum dos princípios e normas indicadas neste recurso pelos Recorrentes e não errou a decisão recorrida quando assim o considerou.
Dispositivo
Pelo exposto, acordam em:
a) Negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
b) Condenar os Recorrentes em custas, em partes iguais.

Lisboa, 10/10/2013
(Sofia David)

(Carlos Araújo)

(Teresa de Sousa)