terça-feira, 26 de junho de 2012

EMPREITADA OBRA PÚBLICA - ASSINATURA DOCUMENTOS QUE COMPÕE A - PROPOSTA FORMALIDADE AD PROBATIONEM


Proc. Nº 619/11.4BEAVR  TCANorte   27 de Abril de 2012

1. Face ao disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 18º e, em particular, ao disposto no n.º 1 do artigo 27º da Portaria 701-G/2008, de 29 de Julho, devem ser assinados todos e cada um dos documentos que compõem a proposta no procedimento de empreitada de obra pública, submetida à plataforma electrónica oficial.
2. No entanto, a aposição da assinatura electrónica, na submissão à plataforma de uma pasta compactada - que continha todos esses documentos – sem que cada um dos documentos fosse assinado, não traduz um vício substancial mas meramente formal, de uma formalidade ad probationem que, cumprida, cria uma tripla presunção, estabelecida no artigo 7º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2.8, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3.4 a saber, que: a) a pessoa que apôs a assinatura electrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica qualificada; b) a assinatura electrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento electrónico; e c) o documento electrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura electrónica qualificada.
3. Comprovado nos autos que a assinatura aposta na pasta compactada era da empresa concorrente, foi aposta com a intenção de subscrever cada um dos documentos e que estes documentos electrónico não sofreram qualquer alteração, tanto assim que o seu teor foi assumido integralmente no contrato entretanto celebrado com a Administração, não é de atribuir qualquer eficácia invalidante à irregularidade formal verificada


EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
J. … – Sociedade de Construções do Cavado, S.A. interpôs o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 26.01.2012, a fls. 140-172, pela qual foi julgada improcedente a acção de contencioso pré-contratual movida contra o Município de Ílhavo - e em que foi identificada como contra Interessada, entre outras empresas, a E. … – Engenharia, SA –na qual se pede a anulação do despacho do Presidente daquela edilidade que lhe indeferiu a reclamação apresentada contra a decisão de adjudicação da empreitada objecto do Concurso Público urgente nº 206/2011, denominada «REGENERAÇÃO URBANA DE ÍLHAVO – AMPLIAÇÃO DO MUSEU MARÍTIMO DE ÍLHAVO» à referida Contra-Interessada, bem como se pede a condenação do Município demandado à prática do acto alegadamente devido, a exclusão da proposta vencedora e a adjudicação da empreitada à Autora.
Invocou para tanto e em síntese que a sentença recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, do disposto nos artigos 57º, 62º, 70º do Código de Contratos Públicos, nos artigos 15º, 18º e 27º da Portaria 701-G/2008, no artigo 7º do Decreto-Lei 290-D/99, e nos artigos 373º e 376º do Código Civil.
A Contra-Interessada contra-alegou, defendendo a manutenção do decidido.
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

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São estas as conclusões das alegações do presente recurso jurisdicional e que definem respectivo objecto:
A - A sentença a quo faz uma errada aplicação do direito, encontrando-se frontalmente em oposição com os art.ºs 57º, 62º, 70º CCP, art.ºs 15º, 18º e 27º da Portaria 701-G/2008, art.º 7º do Decreto-Lei 290-D/99, 373º e 376º CC.
B - A sentença a quo considerou legítima a adjudicação de uma empreitada de obras públicas a uma proposta inserida na plataforma “Vortalgov” através de um ficheiro ZIP, que não é passível de ser assinado electronicamente, carregado na plataforma, e contendo os vários documentos constitutivos da proposta, sem aposição de assinatura electrónica qualificada, em formato PDF.
C - A sentença a quo afirma que a assinatura electrónica de um ficheiro ZIP cria a presunção de que os documentos inseridos nesse ficheiro também foram assinados pela pessoa que tenha aposto assinatura electrónica qualificada, o que é falso.
D - Um ficheiro ZIP não pode ser assinado porquanto não encera em si qualquer declaração de ciência ou de vontade, não tendo qualquer função de representação ou reprodução de uma pessoa, coisa ou objecto, uma vez que se trata meramente de um formato de compressão de dados informáticos. Nem o ZIP tem a referida capacidade reprodutiva ou representativa de uma pessoa, nem a sua arquitectura permite que ele seja assinado, o que é natural face à ausência de qualquer documento declaratório no mesmo – não é possível apor uma assinatura electrónica a um ficheiro ZIP do género das prescritas no Decreto-Lei 209-D/99.
E - O que foi assinado, no caso concreto, foi tão-somente a submissão do ficheiro ZIP na plataforma Vortalgov, não o ficheiro ZIP em si nem nenhum dos vários documentos em si comprimidos.
F - A partir do momento em que o ficheiro PDF é descomprimido e retirado do ficheiro compressor ZIP, e uma vez que não está assinado, jamais poderá quem quer que seja garantir a conformidade do PDF com o original, porquanto não surge dotado de assinatura que certifique qualquer tipo de alteração posterior – a sua integridade é, pois, comprometida, bem como a sua autenticidade.
G - Por outro lado, um ficheiro PDF já é um documento uma vez que já tem a capacidade de reproduzir ou representar uma pessoa, facto, ou objecto – vd. Art.ºs 373º e 376º CC. Como tal, só este documento pode consubstanciar uma qualquer declaração cuja integridade cumpra assegurar.
H - Ao contrário do que afirma a sentença a quo, um ficheiro PDF é alterável por programa facilmente acessível a qualquer pessoa no Google, conforme o demonstra a alteração feita pela recorrente no ficheiro Mapa de Resumo.pdf que integrava a proposta da contra-interessada E..., alteração essa feita sem qualquer propósito de ludibriar quem quer que seja e apenas para demonstração de ciência pertinente para os presentes autos, alterando o valor total final do Mapa de Resumo original – vd. doc. 1 e 2.
I - Tal alteração é bem demonstrativa da importância da assinatura de todos os documentos que compõem a proposta. Não assinando um que seja, a sua integridade surge impossível de afirmar. Logo, se este PDF tivesse sido assinado electronicamente de modo qualificado, a sua integridade estaria assegurada através do aviso de corrupção de assinatura que qualquer alteração despoletaria.
J - No tocante à Portaria 701-G/2008, os art.ºs 15º, n.º 1, n.º 2 e n.º 6 são claros ao afirmar que os documentos é que constituem as propostas apresentadas, distinguindo-se dos ficheiros que as contenham.
K - O art.º 18º refere a necessidade de aposição de assinatura electrónica aquando do acto de carregamento, mas o art.º 18º, n.ºs 3 e 4, afirma inequivocamente que os ficheiros da proposta devem seguir todos já encriptados e assinados, com recurso a assinatura electrónica qualificada, antes do carregamento. Portanto, a assinatura do carregamento e a assinatura dos ficheiros carregados são duas opções distintas e independentes, às quais o proponente se encontra obrigado. A E... não observou este ónus, tendo apenas assinado o carregamento e não todos os documentos que integravam o ficheiro carregado.
L - Foi posta em causa a manifestação de vontade, que deixa de ser correctamente manifestada, ao não abranger com a sua validade a totalidade dos documentos exigidos para preencher o conceito de proposta, nem uma vontade completa e firme em contratar, conforme o disposto nos art.ºs 57º, 62º, 70º CCP, art.º 27º da Portaria 701-G/2008, e art.º 8º, n.º 1 do Decreto-Lei 143-A/2008.
M - É importante realçar que o documento assinado electronicamente com assinatura electrónica qualificada certificada por uma entidade certificadora credenciada tem a força probatória de documento particular assinado, nos termos dos artigos 3º, n.º2 do Decreto-Lei 290-D/99 e 363º, n.º 2, 373º, n.º3 e 376º do Código Civil, fazendo prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, e cria a presunção de que “a) A pessoa que apôs a assinatura electrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica qualificada; b) A assinatura electrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento electrónico; c) O documento electrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura electrónica qualificada.” (artigo 7º, n.º1 do DL 290-D/99).
N - São, como tal, particularmente gravosas as consequências decorrentes da aposição de tal certificado, que cumpre assegurar, mas que vinculam e expressam inequivocamente a vontade de contratar das partes, em termos claros e seguros, desde logo por assegurar que todos os documentos que constituem a proposta não foram alterados desde que lhes foi aposta a assinatura electrónica qualificada. No caso concreto, tal não é possível de assegurar, surgindo abalada a concorrência e a segurança do concurso.

*

I –Matéria de facto:
A Recorrente critica o ponto 3 da matéria de facto por conter uma imprecisão técnica.
Diz que, em rigor, o ficheiro ZIP não foi assinado porque tal é, pura e simplesmente, impossível. Não é possível apor uma assinatura electrónica nos termos do DL 290-D/99 a um ficheiro ZIP; o que vem assinada é a submissão do ficheiro na plataforma. Portanto, a submissão é assinada, mas não o ficheiro.
Mais adiante defende que o ponto três da matéria de facto dada com assente faz apelo aos documentos contidos dentro do ficheiro ZIP, elencando a lista dos mesmos, encerrando em si já a contradição da própria fundamentação.
Não existe, no entanto qualquer contradição nos termos da decisão de facto; mas existe de facto uma expressão que faz o compromisso com uma leitura que tecnicamente não se mostra correcta, a de que foi o ficheiro ZIP, a pasta compactada, o que foi assinado.
Daí que se imponha alterar a redacção deste ponto da matéria de facto provada.
Devemos, assim, dar como provados os seguintes factos:
1. A Câmara Municipal de Ílhavo lançou o Concurso Público Urgente nº 206/2011 para adjudicação da empreitada de obra pública denominada «Regeneração Urbana de Ílhavo – ampliação do Museu Marítimo de Ílhavo», cujo Programa de Concurso (PC) e o Caderno de Encargos (CE) e respectivos Anexos, constam de fls. 10 seguintes do Processo Administrativo e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

2. Foram as seguintes as propostas submetidas ao concurso, à data e hora ali mencionada, pelas referidas concorrentes, nos termos vertidos na respectiva plataforma electrónica do concurso (Processo Administrativo apenso):
(....)

3. A concorrente E. … – Engenharia, SA submeteu a sua proposta na plataforma electrónica Vortal, apondo a sua assinatura electrónica e através de um ficheiro electrónico *ZIP, o qual continha os seguintes documentos:


4. O Júri do Concurso elaborou em 04-07-2011 o Relatório Final (constante de fls. 23 do Processo Administrativo, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido), no qual após graduar as propostas a admitir, de acordo com critério único do mais baixo preço, concluiu propondo a adjudicação da empreitada à concorrente E. …, SA, por apresentar o preço mais baixo.
5. A proposta da aqui Autora, J. … – SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES DO CÁVADO, SA, ficou graduada em 2º lugar na graduação efectuada pelo Júri do Concurso naquele Relatório Final.
6. Aquele Relatório Final foi aprovado na reunião da Câmara Municipal de Ílhavo de 06-07-2011 (cuja respectiva ata consta de fls. 26 do Processo Administrativo).
7. Notificada a Autora dirigiu ao Presidente da Câmara Municipal de Ílhavo o requerimento datado de 08-07-2011 (que junta sob Doc. nº 2 com a Petição Inicial, a fls. 22 seguintes dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido) pelo qual disse vir reclamar daquela decisão de adjudicação, requerendo a final a exclusão da proposta da concorrente E. ..., SA e a ordenação da sua proposta em 1º lugar.
8. Aquela reclamação mereceu em 18-07-2011 a seguinte análise (junta sob Doc. nº 1 com a Petição Inicial, a fls. 19 ss. dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido):
....
9. O que mereceu o despacho de concordância de 19-07-2011 sobre ela aposto, com o seguinte teor:
10. O Contrato de Empreitada objecto daquele concurso (junto a fls. 93 seguintes dos autos) foi celebrado entre o Réu Município de Ílhavo e a aqui contra-interessada E...., SA em 01-08-2011.
11. O visto do Tribunal de Contas foi concedido em 19-10-2011 (cfr. ofício daquele Tribunal, junto a fls. 91 dos autos).

12. A consignação da obra ocorreu em 04-11-2011 (cf. respectivo auto, junto a fls. 96 dos autos).
*
Enquadramento jurídico.
A Recorrente imputa à decisão recorrida a violação, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, do disposto nos art.ºs 57º, 62º e 70º, do Código dos Contratos Públicos, nos artigos 15º, 18º e 27º da Portaria 701-G/2008, no artigo 7º do Decreto-Lei 290-D/99, e nos artigos 373º e 376º do Código Civil.
No seu entender a proposta da Contra-Interessada, ora recorrida, deveria ter sido excluída do concurso em apreço (dado não ter assinado os documentos que submeteu à plataforma electrónica), em vez de ser ganhadora (por apresentar o preço mais baixo), e ser escolhida, para a adjudicação, a sua proposta (por ser o segundo preço mais baixo, único critério de escolha no concurso).
Vejamos.
Dispõe o n.º2 do artigo 146º do Código dos Contratos Públicos (aprovado pelo Decreto Lei n.º 18/2008, de 29.01, aplicável ao caso concreto), na parte aqui relevante, que:
“No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas:
(…)
d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 57.º;
(…)
l) Que não observem as formalidades do modo de apresentação das propostas fixadas nos termos do disposto no artigo 62.º;
(…)
o) Cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º”
Nos termos do artigo 57.º deste diploma:
“1- A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração do concorrente da aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do anexo I ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos que, em função do objecto do contrato a celebrar e dos aspectos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule.”
(…)”
Por seu turno, dispõe o artigo 62º, ainda do mesmo Código, sob a epígrafe “Modo de apresentação das propostas”:
1 - Os documentos que constituem a proposta são apresentados directamente em plataforma electrónica utilizada pela entidade adjudicante, através de meio de transmissão escrita e electrónica de dados, sem prejuízo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 115.º
(…)
3 - A recepção das propostas é registada com referência às respectivas data e hora, sendo entregue aos concorrentes um recibo electrónico comprovativo dessa recepção.
4 - Os termos a que deve obedecer a apresentação e a recepção das propostas nos termos do disposto nos n.ºs 1 a 3 são definidos por diploma próprio
(…)”
Finalmente, deste diploma, o artigo 70º, na alínea a) do n.º2, prevê a exclusão das propostas que não respeitem o disposto na já citada alínea b) do n.º 1 do artigo 57º.
O n.º1, do artigo 15º da Portaria 701-G/2008, de 29 de Julho, prevê que:
“A entidade adjudicante pode fazer exigências quanto a características dos ficheiros que contêm os documentos que constituem as propostas apresentadas pelos concorrentes nas plataformas electrónicas, devendo para o efeito incluir as respectivas especificações no programado procedimento.”
Prevê-se no artigo 18º desta Portaria, sob o título “Carregamento das propostas”
“1 - As plataformas electrónicas devem permitir o carregamento progressivo da proposta, ou propostas, pelo interessado, até à data e hora prevista para a abertura das propostas.
2 - O carregamento mencionado no número anterior é feito na área reservada em exclusivo ao interessado em causa e relativa ao procedimento em curso.
3 - A plataforma electrónica deve disponibilizar ao interessado as aplicações informáticas que lhe permitam encriptar e apor uma assinatura electrónica nos ficheiros de uma proposta, localmente, no seu próprio computador, aquando do acto de carregamento.
4 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando o interessado realizar o carregamento, na plataforma electrónica, de um ficheiro de uma proposta, este deve estar já encriptado e assinado, com recurso a assinatura electrónica qualificada.
5 - As plataformas podem conceder aos interessados a possibilidade de os ficheiros das propostas serem carregados de forma progressiva na plataforma electrónica, sem necessidade de encriptação e assinatura electrónica, permitindo a permanente alteração dos documentos na própria plataforma até ao momento da submissão.
(…)
7 - A plataforma electrónica só pode permitir o carregamento dos ficheiros que compõem uma proposta após a introdução do respectivo código por parte do interessado, segundo a codificação descrita no anexo I da presente portaria.
8 - As plataformas electrónicas devem assegurar que o código referido no número anterior está sempre visível para o utilizador, quando este procede ao carregamento dos ficheiros que compõem a proposta.
9 - Quando se verifique um erro de identificação, deve ser possível ao interessado corrigir o código da proposta que está em fase de carregamento, ou que foi já submetida, até à data e à hora fixadas para a disponibilização e abertura das propostas pelo júri.
10 - As plataformas electrónicas disponibilizam, em permanência, a cada interessado, a lista de códigos das suas propostas que estejam em fase de carregamento e já submetidas.
(…)”
Finalmente, no artigo 27º da mesma Portaria, sob a epígrafe “Assinatura electrónica”:
“1 - Todos os documentos carregados nas plataformas electrónicas deverão ser assinados electronicamente mediante a utilização de certificados de assinatura electrónica qualificada.
2 - Para efeitos da assinatura electrónica, as entidades referidas no n.º 3 do artigo anterior devem utilizar certificados digitais emitidos por uma entidade certificadora do Sistema de Certificação Electrónica do Estado.
3 - Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar directamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeterá plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante.”
Do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2.8, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3.4, o artigo 7º:
“1 - A aposição de uma assinatura electrónica qualificada a um documento electrónico equivale à assinatura autógrafa dos documentos com forma escrita sobre suporte de papel e cria a presunção de que:
a) A pessoa que apôs a assinatura electrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica qualificada;
b) A assinatura electrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento electrónico;
c) O documento electrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura electrónica qualificada.”
A Recorrente tem razão num ponto de partida: a de que, face ao disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 18º e, em particular, o disposto no n.º 1 do artigo 27º da Portaria 701-G/2008, de 29 de Julho, cada um dos documentos que compõem a proposta devem ser assinados, o que não sucedeu no caso concreto.
Este procedimento é o que dá maiores garantias de que o concorrente quis apresentar todos e cada um dos documentos que submeteu à plataforma electrónica.
A força desta garantia não se verifica no caso concreto pois o candidato, remetendo os documentos numa pasta compactada sem os assinar individualmente, poderia ter comprimido na pasta um ou mais documentos por lapso ou, também por engano, uma versão provisória e não a última e definitiva que queria submeter.
Sendo assinado cada um dos documentos, individualmente, o compromisso contido em cada um é inequivocamente assumido com a assinatura.
Esta é a solução que inequivocamente resulta da expressão Todos os documentos carregados nas plataformas electrónicas deverão ser assinados electronicamente”, constante do n.º1, do artigo 27º da Portaria 701-G/2008, de 29 de Julho, com sublinhado nosso.
No entanto não se segue daqui, como pretende a Recorrente, para a conclusão de que o erro verificado é substancial e que a proposta ganhadora deveria, por esse motivo, ser excluída.
A Recorrente parte implicitamente do pressuposto de que a aposição da assinatura electrónica, tal como a Contra-Interessada a realizou na submissão electrónica da sua proposta, não tem qualquer relevo.
Mas tem.
A assinatura electrónica tem pelo menos a virtualidade de indicar que a concorrente quis mandar e vincular-se a uma proposta. Deverá presumir-se, por ilação natural, que quis mandar e vincular-se a uma proposta com aqueles concretos documentos e não outros pois o erro é excepção.
Por outro lado, a possibilidade de falsear um documento contido num ficheiro ZIP não é substancialmente diferente da possibilidade de falsear um documento em formato PDF assinado individualmente. Tanto num como noutro caso é tecnicamente fácil alterar o conteúdo de um ficheiro digital.
Mas é igualmente fácil, em qualquer dos casos, detectar se o documento foi alterado depois de ter sido submetido à plataforma electrónica.
No caso de documento assinado digitalmente de forma individual, pelo aviso de corrupção da assinatura.
E no caso do documento comprimido numa pasta ZIP, pela análise das suas propriedades, em concreto pela verificação da data da última alteração.
Acresce que o n.º7, do artigo 18º da Portaria 701-G/2008, de 29 de Julho, estabelece um mecanismo que torna difícil a alteração ou adulteração de uma proposta submetida por via electrónica, por parte de terceiros:
“A plataforma electrónica só pode permitir o carregamento dos ficheiros que compõem uma proposta após a introdução do respectivo código por parte do interessado, segundo a codificação descrita no anexo I da presente portaria.”
Em todo o caso, resulta do disposto no artigo 7º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2.8, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 62/2003, de 3.4, que a assinatura não traduz, neste contexto, uma formalidade essencial mas antes uma mera formalidade ad probationem que cria a tripla presunção aí mencionada, a saber, que:
a) A pessoa que apôs a assinatura electrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa colectiva titular da assinatura electrónica qualificada;
b) A assinatura electrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento electrónico;
c) O documento electrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura electrónica qualificada.”
O mesmo resulta do disposto nos artigos373º e 376º do Código Civil, invocados pela Recorrente (dando de barato que se aplicam ao caso concreto dos contratos públicos por força do disposto no artigo 7º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2.8) pois o segundo desses preceitos, com o qual o primeiro deve ser compaginado, tem precisamente como epígrafe “força probatória”, aludindo à assinatura.
Tratando-se de mera formalidade ad probationem não tem a virtualidade de tornar a declaração negocial nula (e menos ainda inexistente) pois a nulidade é um vício intrínseco, atinente a um elemento essencial ou constitutivo da declaração.
Ver a este propósito o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17.01.2007, no recurso 01013/06; na doutrina, Rui Nogueira Lobo de Alarcão e Silva “Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Teixeira Ribeiro”, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, número especial, III, Jurídica, Coimbra 1983, páginas 609 e seguintes.
Portanto, ao contrário do sustentado pela ora Recorrente, não “estamos perante a não observação de um requisito de forma, que é pressuposto da validade do negócio e que cuja falta conduz à nulidade da proposta”.
A eventual consequência, em sede administrativa, da falta de assinatura de uma proposta não será, por isso, a sua exclusão mas antes o convite ao suprimento da formalidade em falta (neste sentido o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 29-04-2010, processo n.º 05862/10).
Como defende Rodrigo Esteves de Oliveira, em “Os princípios gerais da contratação pública”, nos “Estudos de Contratação Pública” (CEDIPRE), I volume, Coimbra Editora, 2008, página 111, seguindo o entendimento anti-formalista prevalecente na nossa doutrina e jurisprudência, “…haverá uma situação de irrelevância do vício de procedimento sempre que (e na medida em que) os fins específicos que a imposição legal (ou regulamentar) da formalidade visava atingir tenham sido comprovadamente alcançados, ainda que por outra via” (na jurisprudência, seguindo este entendimento, ver os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22.10.2010, no processo n.º 323/10.0 BECBR, de 27.01.2011, processo n.º 228 10.5 BEVIS, e de 22.06.2011, processo n.º 00770 10.8 BECBR).
Acresce que, no caso concreto, a eventual inexistência de presunção de que os documentos contidos na pasta compactada apresentada pela Contra-Interessada foram por esta subscritos- ou por seu legal representante –, traduziram fielmente os termos em que se quis vincular e não foram posteriormente alterados, por falta da assinatura de cada documento individualmente, sempre estaria suprida:
Ninguém pôs em causa nos autos, nem a própria Recorrente, que os documentos juntos correspondem exactamente à declaração de vontade negocial da Contra-Interessada, ou seja, correspondem aos exactos termos em que esta se quis vincular e não foram alterados.
Com o que se conseguiu o desiderato legal, a não permitir a exclusão da proposta ganhadora, assegurar que os documentos apresentados pela Contra-Interessada traduziram com exactidão a sua declaração de proposta negocial.
Declaração esta confirmada no contrato celebrado na sequência (e como consequência) do acto de adjudicação posto em crise na presente acção.
Termos em que se impõe julgar improcedente o pedido de anulação do acto de adjudicação e, consentaneamente, manter a sentença recorrida que o manteve na ordem jurídica, embora por fundamentos não completamente coincidentes.
*
Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional, mantendo a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
*

Porto, 27 de Abril de 2012
Ass. Rogério Martins
Ass. João Beato Oliveira Sousa
Ass. Antero Pires Salvador



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