transitou em
julgado em 25 de Novembro de 2010
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ACÓRDÃO Nº 39 /10 –
03.NOV.-1ª S/SS
Processos nºs 1175 a 1178/2010
Ajuste directo - admissibilidade
da contratação – regime de pagamentos
I. RELATÓRIO
A Administração
da Região Hidrográfica do Norte. I.P., (doravante designada por ARH do
Norte) remeteu a este Tribunal, para fiscalização prévia, os seguintes quatro
contratos de aquisição de serviços celebrados entre aquela entidade e a Sérvulo
& Associados - Sociedade de Advogados, R.L:
a) Contrato para a definição do modelo
legal e institucional dos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica, que integram
as regiões hidrográficas 1, 2 e 3, consagradas na Lei n.º 58/2005, de 29 de
Dezembro (Lei da Água), com o preço contratual de € 340.000,00;
b) Contrato para o apoio e acompanhamento
jurídicos na elaboração dos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica das
mencionadas três regiões hidrográficas, pelo preço de € 343.000,00;
c) Contrato para o desenvolvimento do
sistema de apoio à decisão do licenciamento das utilizações privativas dos
recursos hídricos dos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica que integram
aquelas três regiões hidrográficas, no valor de € 330.000,00;
d) Contrato para o desenvolvimento do
sistema de gestão e recursos humanos dos Planos de Gestão de Bacia
Hidrográfica, no montante de € 338.600,00.
II. DOS FACTOS
Para além do referido
no número anterior e nos pontos subsequentes, são dados como assentes e
relevantes para a decisão os seguintes factos:
a) Os quatro contratos
foram precedidos das Informações n.ºs 868/DPIC/2009, 869/DPIC/2009,
870/DPIC/2009 e 871/DPIC/2009, cada uma das informações respeitando a um dos
contratos, mas todas elas subscritas, em 20 de Julho de 2009, pelo Coordenador
do Departamento de Planeamento, Informação e Comunicação da ARH do Norte,
propondo, em todos os casos, a adopção de procedimento de ajuste directo à Sérvulo
& Associados – Sociedade de Advogados, R.L;
b) Sobre cada uma das
quatro informações foi exarado, em 30 de Julho de 2009, despacho de autorização
do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento
Regional;
c) Junto a cada um dos
processos encontra-se um despacho diferente, em todos os casos assinado em 29
de Julho de 2009, pelo mesmo Ministro, autorizando a realização da despesa,
determinando o recurso ao procedimento pré-contratual de ajuste directo e
estabelecendo que a proposta deveria ser solicitada à Sérvulo &
Associados – Sociedade de Advogados, R.L;
d) Todos os quatro
despachos ministeriais qualificaram os serviços a adquirir nos quatro contratos
como de assessoria jurídica;
e) Do texto das
informações referidas em a), do conteúdo dos despachos referidos em c) e do
teor dos contratos consta a fundamentação para a opção pelo procedimento
pré-contratual de ajuste directo e para escolha da Sérvulo &
Associados – Sociedade de Advogados, R.L, invocando-se:
i. O que se dispõe no
artigo 27.º, n.º 1, alínea b), do Código dos Contratos Públicos;
ii. Que a ARH do Norte,
tendo entrado em funcionamento em 1 de Outubro de 2008, não está capacitada na
respectiva estrutura funcional interna de recursos humanos, para desenvolver os
trabalhos em causa;
iii. Que “a
natureza dos serviços a adquirir, de carácter eminentemente intelectual, não é
compatível com a definição de especificações contratuais necessárias à
adjudicação de uma proposta de acordo com a tramitação inerente aos
procedimentos concursais previstos no Código dos Contratos Públicos,
concretamente a adjudicação com recurso ao critério da proposta economicamente
mais vantajosa”;
iv. Que se trata de “um
tipo de serviço em que a escolha do prestador assenta, fundamentalmente, nas
respectivas qualidades e experiência técnico-jurídicas no âmbito dos recursos
hídricos, do domínio público hídrico, do ambiente e do ordenamento do
território e não em características objectivas de eventuais propostas de
prestação de serviços”;
v. Que o que está em
causa é “uma situação em que a escolha do prestador de serviços assenta em
razões ligadas à sua experiência e características” – nomeadamente o facto
de aquele ter participado activamente em trabalhos de natureza técnico jurídica
relativos à elaboração do Plano Nacional da Água, do Plano Regional da Água da
Região Autónoma dos Açores, no processo de implementação das Administrações de
Região Hidrográfica criadas pela Lei da Água, bem como em trabalhos relativos a
matéria de emprego público, “que lhe conferem especial aptidão para a
execução do objecto das prestações de serviços a contratar”;
vi. Que “o fundamento
para a escolha do prestador dos serviços assenta numa relação cujos
pressupostos são a base da confiança entre entidade adjudicante e
adjudicatário, factor este que, em si mesmo, é imensurável”;
f) Em 31 de Julho de
2009, o Presidente da ARH do Norte remeteu à Sérvulo & Associados –
Sociedade de Advogados, R.L, quatro convites para apresentação de proposta
no âmbito dos procedimentos de ajuste directo adoptados para a celebração dos
contratos de prestação de serviços referidos em I, através dos ofícios n.ºs
8216, 8217, 8218 e 8219, daquela data;
g) Em 10 de Agosto de 2009, a Sérvulo &
Associados – Sociedade de Advogados, R.L, subscreveu quatro propostas
para a realização dos referidos serviços;
h) As referidas propostas
diferem na respectiva Cláusula I (Objecto dos Serviços Jurídicos a Prestar)
e no valor dos honorários e dos pagamentos parcelares. Em tudo o mais,
nomeadamente na definição dos produtos a entregar, da equipa, do escalonamento
dos pagamentos, do plano de trabalhos e do prazo contratual, as propostas são
idênticas;
i) Em 14 de Agosto de
2009, o Presidente da ARH do Norte adjudicou as quatro aquisições de serviços à
Sérvulo & Associados – Sociedade de Advogados, R.L, pelos
valores propostos, sem negociação, nos termos propostos pelo Coordenador do
Departamento de Planeamento, Informação e Comunicação nas Informações n.ºs
971/DPIC/2009, 972/DPIC/2009, 973/DPIC/2009 e 974/DPIC/2009, da mesma data;
j) Todos os quatro
contratos foram assinados em 1 de Setembro de 2009;
k) Todos os contratos
foram celebrados pelo prazo máximo de 18 meses;
l) Todos os contratos
entraram em vigor no dia seguinte ao da sua assinatura;
m) Em todos eles ficou
convencionada, nos exactos termos constantes das propostas, a apresentação de
um Relatório de Metodologia no prazo de cinco dias, contados da data da outorga
do contrato, e a entrega dos produtos decorrentes da execução do contrato nos
termos definidos nesse Relatório;
n) Em todos os contratos
se estabeleceu que a Sérvulo & Associados – Sociedade de Advogados,
R.L se vinculou à afectação de recursos humanos, devidamente
qualificados e especializados, para a prestação dos serviços, podendo a ARH do
Norte impor o reforço, modificação ou substituição dos meios técnicos,
materiais e humanos utilizados pela empresa em caso de verificar que os mesmos
são insuficientes ou inadequados à boa execução do contrato;
o) Os encargos
financeiros dos contratos enquadram-se num financiamento comunitário FEDER,
contratado no âmbito do Programa Operacional Regional do Norte;
p) Em 5 de Agosto de 2010, a Autoridade de
Gestão do Programa Operacional Regional do Norte, no âmbito da tramitação de
pedidos de reembolso de despesas incorridas no âmbito dos contratos, comunicou
à ARH do Norte dúvidas sobre o recurso a quatro procedimentos autónomos para as
aquisições de serviços, sobre um eventual fraccionamento da despesa visando furtar
os contratos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas e sobre o respeito
pela Comunicação Interpretativa da Comissão Europeia n.º 2006/C/179/02
(relativa ao direito comunitário aplicável à adjudicação de contratos não
abrangidos, ou apenas parcialmente abrangidos, pelas directivas comunitárias
relativas aos contratos públicos);
q) A referida Autoridade
havia solicitado um parecer a um consultor externo (CEJUR - Centro de Estudos
Jurídicos do Minho). A versão final deste parecer concluiu no seguinte sentido:
i. A opção de celebrar os
contratos por ajuste directo, nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea b), do
Código dos Contratos públicos, está em conformidade com o direito comunitário;
ii. Os contratos referidos
nas alíneas a) e d) do ponto I têm autonomia;
iii. A autonomização
dos contratos descritos nas alíneas b) e c) do mesmo ponto I, relativamente ao
referido na alínea a), não está objectivamente justificada, pelo que se
verificou um fraccionamento indevido da despesa e, atento o somatório dos
respectivos preços contratuais, deveriam esses contratos ter sido submetidos a
fiscalização prévia do Tribunal de Contas;
r) Em 23 de Agosto de 2010, a ARH do Norte
remeteu os quatro contratos em referência para fiscalização prévia do Tribunal
de Contas, a coberto do ofício n.º 12159, tendo os mesmos sido registados neste
Tribunal em 30 de Agosto de 2010;
s) Nesse ofício, a ARH do
Norte explicita pormenorizadamente por que razões considera que os contratos
têm plena autonomia, que não houve fraccionamento indevido da despesa e que os
mesmos não estavam nem estão sujeitos ao visto deste Tribunal. Para esse
efeito, invoca, em síntese, que:
i. A proibição prevista
no n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, dirige-se tão
só a evitar que as regras de competência para a autorização das despesas
públicas sejam torneadas através de uma divisão artificial dessas despesas;
ii. Quando, “como
ocorreu no presente caso – a despesa a suportar com a execução de cada um
daqueles contratos tenha sido autorizada pelo órgão competente para autorizar a
realização da despesa equivalente ao valor acumulado dos mesmos, o n.º 2 do
artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, não impede o
fraccionamento da despesa”;
iii. O ordenamento
jurídico nacional não proíbe, antes autoriza, as entidades adjudicantes a
dividir as prestações abstractamente integráveis no objecto de um único
contrato por diferentes instrumentos contratuais, o que poderá, aliás, ser
aconselhável por razões de conveniência administrativa, de ordem
técnico-funcional ou de ordem financeira;
iv. A figura do
fraccionamento da despesa para efeitos de fiscalização preventiva do Tribunal
de Contas não tem acolhimento no Direito escrito, não estando, portanto,
previstos os seus específicos pressupostos;
v. Uma situação de
eventual fraccionamento indevido da despesa, no sentido em que “o
fraccionamento se transformou num artifício especificamente vocacionado a
iludir a aplicação de um determinado regime jurídico” exige uma “análise
de alcance subjectivo orientada a confirmar ou infirmar a existência de um
intuito deliberado de escapar ao regime”, sendo necessário averiguar da
existência ou não de intenção fraudulenta;
vi. A operação de
celebração dos quatro contratos serve interesses legítimos das partes, está
alicerçada em diferenças que significativamente separam os respectivos objectos
contratuais e é impossível detectar no caso a existência de uma vontade especificamente
vocacionada a burlar a aplicação da norma delimitadora do campo de
aplicação do regime de fiscalização preventiva pelo Tribunal de Contas;
vii. Mesmo quando as
prestações sejam juridicamente aglutináveis no objecto de um único contrato,
essa circunstância não basta para que a sua dispersão por distintos
instrumentos contratuais possa ser juridicamente qualificável como
fraccionamento indevido da despesa;
viii. A circunstância
de os contratos “se encontrarem todos finalisticamente orientados para o
propósito único de elaboração dos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica das
Regiões Hidrográficas 1, 2 e 3” é insuficiente para demonstrar a unidade dos seus
objectos e o seu fraccionamento indevido;
ix. As prestações
contratuais só são aglutináveis no objecto de um único contrato quando à sua
interdependência ou interconexão funcional acresça uma interconexão ou
independência económica, “em termos que propiciem a identificação de um
único segmento de operadores económicos aptos a executar todas as prestações
contratuais” em causa;
x. No que se refere ao
contrato referido na alínea a) do ponto I, o seu objecto orienta-se para a
concepção, elaboração e redacção da Resolução do Conselho de Ministros que
aprova os Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica, em compatibilidade com os
objectivos definidos na Directiva Quadro da Água. Este objecto contratual “traduz-se
na assessoria jurídica directa à elaboração destes instrumentos de planeamento
e gestão dos recursos hídricos das regiões hidrográficas 1, 2 e 3, permitindo
directamente a prossecução daquela que é a primeira atribuição da ARH do Norte”;
“O traço unificador destas prestações contratuais – e, simultaneamente,
diferenciador dos restantes contratos celebrados entre a ARH do Norte, I.P., e
a Sérvulo & Associados - traduz-se no emprego de conhecimentos da área do
Direito do Ambiente e do Ordenamento do Território, maxime da legislação
comunitária e nacional sobre a gestão e ordenamento dos recursos hídricos. Está
essencialmente em causa garantir a compatibilidade jurídica dos novos
instrumentos de planeamento e gestão dos recursos hídricos das regiões
hidrográficas 1, 2 e 3 com os objectivos estatuídos na já referida Directiva
Quadro da Água, na Lei da Água e no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão
Territorial”;
xi. Quanto ao contrato
referido na alínea b) do ponto I, o mesmo tem titulado a assessoria jurídica a
prestar nas fases de formação e execução de diversos contratos públicos
necessários à elaboração dos Planos de Gestão de Bacias Hidrográficas. Não
obstante o clausulado desse contrato não reflectir esse conteúdo, mas um outro
diferente, verificou-se “uma menos correcta expressão daquela que foi a
vontade contratual da ARH do Norte, I.P. e da Sérvulo & Associados, pois
não são estas as relações contratuais que têm sido efectivamente tituladas por
este instrumento contratual e não foi à regulação destas obrigações que se
destinou a celebração deste contrato”, só podendo ter-se por lapso de
escrita que figurem no respectivo objecto contratual referências à elaboração e
validação de conteúdos a integrar nos PGBH;
Os serviços jurídicos
abrangidos pelo objecto deste contrato envolvem conhecimentos na área do
Direito da Contratação Pública e da Teoria Geral dos Contratos Administrativos,
o que é um factor distintivo relativamente aos restantes, por força da
dissemelhança das áreas do conhecimento jurídico a que cabe recorrer;
xii. No que concerne
ao contrato referido na alínea c) do ponto I, os serviços implicam a elaboração
de um manual de procedimentos a seguir na tramitação dos pedidos de
licenciamento de utilização privativa do domínio público hídrico localizado na
área abrangida pelas regiões hidrográficas 1, 2 e 3, a concepção dos
modelos-tipo das peças a utilizar nesses procedimentos administrativos de
licenciamentos, o apoio à concepção de critérios e de um modelo de
hierarquização de prioridades que norteiem a atribuição dos direitos de
utilização privativa, o acompanhamento da definição do portal informático onde
será possível aceder à documentação e a obrigação de acompanhamento jurídico da
ARH do Norte nos procedimentos promovidos por particulares com vista a obter o
licenciamento da utilização privativa de bens do domínio público hídrico
abrangidos pelas regiões hidrográficas em causa.
Apesar de também neste
caso se verificarem lapsos de escrita na descrição do conteúdo contratual, não
há identidade ou unidade entre o objecto deste contrato e as prestações
contratuais dos restantes porquanto este inclui serviços que se dirigem à
consecução de uma outra atribuição da ARH do Norte: não já a elaboração dos
Planos de Gestão de Bacias Hidrográficas, mas a decisão e emissão dos títulos
de utilização de recursos hídricos e a fiscalização do cumprimento da sua
aplicação.
Os serviços jurídicos
abrangidos neste contrato envolvem conhecimentos na área da regulação jurídica do
domínio público, mais especialmente do domínio público hídrico e dos mecanismos
jurídico-procedimentais de atribuição de títulos de utilização ou exploração
desses bens dominiais;
xiii. Por força do
contrato referido na alínea d) do ponto I, deve ser prestada assessoria
jurídica à ARH do Norte na definição da quantidade de recursos humanos a
contratar para assegurar a implementação dos instrumentos de planeamento e
gestão dos recursos hídricos, dos respectivos perfis académicos e experiências
profissionais exigíveis, na identificação do tipo de vínculo jurídico a
estabelecer com os diferentes recursos humanos, na tramitação e decisão dos
procedimentos administrativos necessários à formação dos actos administrativos
ou contratos que enquadrem a alocação desses meios humanos à implementação dos
Planos de Gestão de Recursos Hídricos e na modelação da organização e
funcionamento da ARH do Norte.
Os serviços jurídicos
abarcados pelo objecto deste contrato envolvem conhecimentos na área do Direito
Administrativo Geral e do Direito da organização administrativa, bem como do
regime jurídico das relações de emprego em funções públicas, o que funciona
como factor diferenciador deste contrato relativamente aos demais;
xiv. Tal como todos
os contratos que a ARH do Norte celebre, os objectos contratuais em exame estão
funcionalmente interligados, destinando-se, de modo directo ou indirecto, a
assessorar a elaboração ou a execução e implementação dos Planos de Gestão de
Bacia Hidrográfica, mas isso não impõe a sua aglutinação no objecto de um único
contrato.
xv. Acresce que os
objectos dos contratos também não estão economicamente interligados, pois
apesar de estarmos perante prestações do mesmo tipo (de natureza jurídica) não
há um único segmento de operadores económicos aptos a executar todas as
prestações contratuais.
A
pluridisciplinaridade envolvida nos objectos contratuais, implicando o emprego
de distintos e específicos saberes da área do Direito, e a sua crescente
especialidade, tornam inviável “que uma mesma pessoa singular, prestador de
serviços jurídicos, congregue os conhecimentos jurídicos necessários à execução
destes diversos serviços que apenas aparentemente são do mesmo tipo”.
xvi. Os diversos
ramos e sub-ramos do Direito envolvidos “constituem, em abstracto, segmentos
diferentes de negócio dentro do universo profissional da advocacia,
susceptíveis, portanto, de suscitar o interesse em contratar por diferentes
grupos de destinatários. Ocorre apenas que, em virtude da diversificação e
crescente especialização dos serviços jurídicos por elas prestados, as
sociedades de advogados, enquanto estruturas empresariais e profissionais
multifacetadas, respondem a esse diferentes segmentos do negócio da advocacia”;
xvii. Não existe
qualquer conexão económica entre as prestações contratuais em exame, que
imponha a aglutinação dos diferentes serviços no objecto de um único contrato,
pois, se tivesse sido escolhido um procedimento concursal em lugar de um ajuste
directo para a formação de cada um dos quatro contratos, o universo de
destinatários que responderia ao apelo à concorrência não seria exactamente o
mesmo, podendo os respectivos anúncios provocar o interesse de diferentes
segmentos de destinatários;
t) No que se refere à
opção pelo procedimento pré-contratual de ajuste directo, e à identificação
precisa da sociedade convidada a apresentar as propostas, a ARH do Norte veio
ainda referir, no ofício n.º 12159, de 23 de Agosto de 2010, que:
i. A definição de
atributos de natureza quantitativa era manifestamente desadequada face aos
objectivos da aquisição pretendida, já que a prioridade da entidade adjudicante
consiste na obtenção de serviços de elevada qualidade e não na obtenção de um
qualquer serviço ao mais baixo preço ou no prazo mais curto possível;
ii. O objectivo da
entidade adjudicante foi o de escolher o co-contratante em função da qualidade
intrínseca da prestação;
iii. Essa qualidade
não pode ser verdadeiramente revelada pelos atributos da sua proposta, mas
apenas deduzida dos atributos do proponente, que geram no adquirente a
confiança dessa qualidade;
iv. Assim, a escolha do
co-contratante assenta fundamentalmente nas suas qualidades técnicas pessoais,
maxime no seu currículo e na confiança que dele emana para o adquirente dos
serviços;
v. O juízo de avaliação
da sua aptidão técnica não pode ser fundamentado em elementos objectivamente
mensuráveis, o que constitui uma consequência necessária de a prestação de
serviços de advocacia se basear numa relação de estrita confiança subjectiva
que o beneficiário deposita nas qualidades pessoais do prestador de serviços;
vi. A decisão de escolha
do prestador de serviços jurídicos concretiza-se na escolha de um operador
económico cuja identidade é directamente apurada, em razão da sua preferência
subjectiva, pelo órgão competente da entidade adjudicante;
vii. O ajuste
directo é o procedimento mais adequado à formação de um contrato de aquisição
de serviços jurídicos, visto que qualquer outro tipo de procedimento
pré-contratual pode potencialmente conduzir a entidade adjudicante a iniciar
uma relação contratual com um prestador em quem não deposita a sua confiança;
viii. “Essa é,
aliás, a razão pela qual, reconhecendo a inaptidão genérica do regime de
contratação pública para a formação de contratos de aquisição de serviços
jurídicos, a própria Directiva n.º 2004/18/CE (…) exclui esses serviços do seu
âmbito de aplicação, permitindo que a entidade adjudicante adopte um
procedimento não concorrencial e seleccione directamente os prestadores que
pretende convidar para apresentar uma proposta (cfr. artigo 21.º e Anexo II-B
da Directiva);
ix. O parecer referido em
q) concluiu pela possibilidade do ajuste directo.
u) De acordo com a
cláusula 7.ª dos contratos, o segundo outorgante deveria apresentar um
Relatório de Metodologia no prazo de cinco dias a contar da data de outorga do
contrato;
v) Nos termos da Cláusula
12.ª dos contratos, o pagamento do preço é efectuado nos termos da proposta
apresentada, da seguinte forma:
“a) Primeiro pagamento
no montante de 30% do preço contratual (…) com a entrega do Relatório de
Metodologia e início dos trabalhos;
b) Pagamento seguinte,
no montante de 30% do preço contratual (…) até final de Outubro de 2009;
c) Pagamento seguinte,
no montante de 30% do preço contratual (…) até final de Março de 2010;
d) Pagamento de 10% do
preço contratual (…) com a conclusão dos trabalhos”;
w) Nos Relatórios de
Metodologia apresentados para cada um dos contratos, os quais, nos termos dos
Cadernos de Encargos, deveriam definir os planos de trabalhos, refere-se:
i. “ (…) os serviços a
executar no âmbito do contrato são, manifestamente, de natureza de assessoria e
consultoria jurídica, cuja dinâmica está ínsita ao desenvolvimento do próprio
contrato. Ou seja, é, também, no desenvolvimento da relação entre contraentes
que hão-de vir a detectar-se outras necessidades elementares que integram o
objecto do contrato, necessidades essas não determinadas à partida mas
determináveis com a execução contratual. (…) Este aspecto assume uma
importância crucial para poder justificar-se que a métrica dos trabalhos a
serem prestados não pode inferir-se com base num cronograma de execução
contratual associados a um plano de trabalhos e reportado a determinados
produtos concretos que devam surgir a cada momento. Esta situação não impede,
contudo, que a execução do contrato possa “ser medida” com base num número de
horas total de serviços jurídicos prestados e cujo cômputo reflectirá,
necessariamente, o número de colaboradores que a Sérvulo & Associados venha
a afectar à execução de todas as tarefas a executar, com maior ou menor grau de
complexidade.”
ii. No ponto 1, a descrição das principais
obrigações contratuais;
iii. “(…) a
metodologia para o desenvolvimento dos serviços a prestar (…) compreende:
2.1. A elaboração de
memorandos técnicos, informações, pareceres e outros documentos escritos (troca
de e-mails, proposta de minutas de documentos internos da ARH Norte I.P., peças
de procedimento administrativo/peças de procedimento de contratação
pública/peças de procedimentos concursais e outras de procedimentos
administrativos1 e toda uma outra
actividade de suporte à decisão mas reportada ao objecto do contrato que pode
incluir, em muitos casos, conferências telefónicas, participação em reuniões de
trabalho internas da ARH Norte I.P., ou desta com entidades terceiras/apoio
a júris de concurso, entre outras);
2.2. Afectação
adequada de recursos humanos, devidamente qualificados e especializados à
prestação directa de serviços objecto do contrato, em regime de colaboração com
a ARH Norte, I. P., e segundo um modo de permanência nas respectivas
instalações e durante o período e horário normal de expediente, bem como
serviços prestados pela Sérvulo & Associados, nos seus escritórios do Porto
e Lisboa, consoante os casos e a complexidade da matéria o justifique ou que
resulte de acordo estabelecido com a ARH Norte I.P.”
iv. “2.3.Para a
execução do contrato prevê-se a afectação pela Sérvulo & Associados de
um número de colaboradores a acordar com a ARH Norte I.P., ainda que de
diferentes níveis de qualificação (seniores e juniores)/ de, pelo menos,
quatro(4)/ cinco (5)) colaboradores, de diferentes níveis de qualificação
(seniores e juniores3),
estimando-se o valor médio do custo/hora da prestação de serviços no montante
de 175,00 € (…)”
v. “2.4. De acordo
com a cláusula 3.ª do contrato o prazo de execução do mesmo tem início a 2 de
Setembro de 2009 e termina em Março de 2011, isto é, decorridos que sejam 18
meses, contados da data de outorga do contrato.”
vi. “2.5.Considerando o
disposto na cláusula contratual que regula o preço e as condições de pagamento,
é devido pela ARH Norte, I.P., à Sérvulo & Associados e pelos serviços
prestados no âmbito da execução do contrato, o montante de (…). Tomando como
referência o valor médio do custo/hora da prestação de serviços (…) e o prazo
de execução contratual (…), serão prestadas, aproximadamente, (…) horas de
trabalho, distribuídas pelas mais diversas tarefas que integram a execução do
objecto do contrato e repartidas pelos colaboradores a elas afectos pela
Sérvulo & Associados”.
x) Questionada sobre o
instrumento de verificação utilizado para garantir que os pagamentos a realizar
têm efectiva contrapartida em serviços prestados, a ARH do Norte informou, no
ofício n.º 16368, de 22 de Outubro:
“(…) O instrumento de
verificação utilizado pela ARH do Norte I.P. para garantir que os pagamentos
realizados têm efectiva contrapartida em serviços prestados é baseado numa
métrica de valor hora médio (€ 175,00),
associando-se esta a uma premissa não variável que radica na integral
satisfação de todas as necessidades de serviços jurídicos que se imponham no
âmbito da execução do contrato e atento o seu objecto. (…)”
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. Da sujeição dos
contratos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas
A primeira questão que
se suscita nestes processos é a da sua sujeição, ou não, a fiscalização prévia
deste Tribunal.
Do disposto nos
artigos 5.º, n.º 1, alínea c), 46.º, n.º 1, alínea b), e 48.º da Lei de
Organização e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC), resulta que os contratos
de aquisição de serviços celebrados por institutos públicos estão sujeitos a
visto do Tribunal de Contas quando impliquem despesa de valor igual ou superior
a um montante fixado anualmente nas leis do Orçamento.
O valor fixado nos
termos do artigo 48.º da LOPTC foi, em 2009, e em 20106, de € 350.000.
Como se refere nas
alíneas a) a d) do ponto I e j) do ponto II deste Acórdão, os contratos em
causa foram celebrados, em 1 de Setembro de 2009, pelos valores de,
respectivamente, € 340.000, € 343.000, € 330.000 e €
338.600.
À data em que foram
celebrados, e tendo estritamente em atenção o seu valor unitário, que em todos
os casos se aproximava mas não atingia € 350.000, os contratos não estariam,
pois, de per si, sujeitos a visto deste Tribunal.
No entanto, foi
suscitada pela Autoridade de Gestão a questão de alguns deles deverem ser
considerados em conjunto, já que poderíamos estar perante um fraccionamento
indevido da despesa com o objectivo de furtar os contratos ao controlo prévio
deste Tribunal.
A ARH do Norte
produziu extensa argumentação no sentido de não ter ocorrido esse
fraccionamento, da qual se deu nota na alínea c) do ponto II.
Ao analisar a
situação, verificamos que os quatro contratos:
São celebrados entre os mesmos
outorgantes;
Foram autorizados e celebrados
simultaneamente;
Declaram destinar-se todos eles à
prestação de serviços de assessoria jurídica;
Baseiam-se em propostas idênticas, que
apenas diferem na discriminação dos respectivos objectos detalhados e no valor;
Têm articulados idênticos, excepto no que
respeita aos seus objectos detalhados e valor11;
São celebrados pelo mesmo prazo e nas
mesmas condições;
Estão todos “finalisticamente
orientados para o propósito único de elaboração dos Planos de Gestão de Bacia
Hidrográfica das Regiões Hidrográficas 1, 2 e 3”;
Podia, pois, o
conteúdo desses contratos facilmente constituir objecto de um único contrato.
Invoca a ARH do Norte14 que
a ordem jurídica não proíbe que as prestações abstractamente integráveis no
objecto de um único contrato sejam divididas por diferentes instrumentos
contratuais, o que pode ser aconselhável por razões de conveniência
administrativa, de ordem técnico-funcional ou de ordem financeira.
Pretende ainda a ARH
do Norte demonstrar a autonomia dos contratos, com base na diferenciação dos
respectivos objectos e na sua independência económica, “pois, se tivesse
sido escolhido um procedimento concursal em lugar de um ajuste directo para a
formação de cada um dos quatro contratos, o universo dos destinatários que
responderia ao apelo à concorrência não seria exactamente o mesmo, podendo os
respectivos anúncios provocar o interesse de diferentes segmentos de destinatários”.
O que a ARH do Norte
não esclarece é por que razões de natureza administrativa, técnico-funcional ou
financeira optou, no caso concreto, por celebrar no mesmo exacto tempo15 quatro
contratos de assessoria jurídica em vez de um único.
De resto, a análise do
conteúdo dos contratos evidencia alguma confusão na definição dos serviços
neles abrangidos, o que gera natural controvérsia sobre a respectiva
autonomia16.
Existem sobreposições
nomeadamente nos domínios da validação dos contributos das diversas áreas
temáticas de elaboração dos PGBH, da validação do processo e resultados da
participação e discussão públicas e da definição do modelo institucional e
organizacional da ARH do Norte ou das possíveis alternativas para esse efeito.
Em face destas sobreposições,
veio agora alegar-se ter havido lapsos de escrita e incorrecta formulação da
vontade dos outorgantes. É surpreendente que esses lapsos nunca tenham sido
antes detectados e tenham ficado consagrados, sem qualquer correcção, em todos
os documentos, de ambas as partes: informações, cadernos de encargos, propostas
contratuais, contratos e relatórios de metodologia.
O sucedido leva também
a questionar da utilidade ou conveniência da divisão da prestação de serviços
em vários contratos.
Tal como suscita
naturais dúvidas sobre a forma como foram, ou não, correctamente calculados os
respectivos valores.
E se o critério da
independência económica dos contratos, tal como vem proposto, pode até ser
conceptualmente útil para delimitar os casos em que se verifica interesse na
divisão das prestações por mais de um instrumento contratual, a verdade é que, no
caso concreto, não tem qualquer relevância, uma vez que a ARH do Norte
preconizou desde o primeiro momento o ajuste directo de todos os quatro
contratos à mesma sociedade17, nunca tendo equacionado um apelo à
concorrência.
Não havendo qualquer
razão económica concreta para a separação dos contratos, não tendo sido
apresentados concretos inconvenientes para a possível aglutinação do
respectivo objecto e valor, e obedecendo os contratos, no mais, às mesmas
exactas condições de execução, só pode concluir-se que a principal
consequência da divisão feita foi a não submissão dos contratos a fiscalização
prévia do Tribunal de Contas.
Saber se essa
consequência foi a motivação da divisão e se se verificou, ou não, “uma
vontade especificamente vocacionada a burlar a aplicação da norma delimitadora
do campo de aplicação do regime de fiscalização preventiva”, de modo a
integrar uma figura de fraccionamento indevido da despesa que, no
entender da ARH do Norte, “não tem acolhimento no Direito escrito”,
levar-nos-ia a elaborar sobre a lei aplicável, sobre uma eventual situação de
fraude à lei e sobre as circunstâncias que rodearam a formação da vontade
contratual.
Tratando-se de matéria
relevante para a qualificação de eventuais infracções financeiras, não é, no
entanto, determinante para decidir sobre se os presentes processos estão, ou
não, sujeitos a fiscalização prévia deste Tribunal, decisão que só pode ser
norteada por critérios objectivos.
Ora, o artigo 138.º da
Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril (Lei do Orçamento do Estado para 2010),
estabelece, para efeitos do disposto no artigo 48.º da LOPTC, que ficam isentos
de fiscalização prévia do Tribunal de Contas os “actos e contratos,
considerados isolada ou conjuntamente com outros que aparentem estar
relacionados entre si18,
cujo montante não exceda o valor de € 350 000 ”.
Como resulta da
legislação que regula a competência dos tribunais, as regras aplicáveis ao
exercício da competência de fiscalização prévia são aquelas que estejam em
vigor no momento em que ela se exerce, ou seja, no momento em que os respectivos
processos dão entrada neste Tribunal19.
Uma vez que os quatro
processos em causa foram registados neste Tribunal em 30 de Agosto de 201020,
aplica-se aos mesmos o disposto naquele artigo 138.º da Lei n.º 3-B/2010.
Decorre dos termos
desse preceito que estão inequivocamente sujeitos a fiscalização prévia os
contratos que, considerados conjuntamente com outros que aparentem estar
relacionados entre si, sejam de valor superior a € 350 000.
No caso, e face a tudo
o que até agora se referiu, não há dúvidas de que estamos perante quatro
contratos que estão relacionados entre si e que, embora sejam de valor unitário
inferior àquele montante, representam um valor global muito superior.
Note-se que o
legislador se basta, para este efeito, com uma mera aparência. Para que
o valor a considerar para efeitos de fiscalização prévia seja o valor conjunto
é suficiente que determinados contratos aparentem estar relacionados entre si,
sem ter de se demonstrar que efectivamente o estão.
Com esta formulação, o
legislador terá, precisamente, querido evitar subtilezas jurídicas na
delimitação de contratos que poderiam ser agregados e não o foram.
No caso concreto, essa
aparência é mais do que evidente.
Os contratos foram
negociados e outorgados simultaneamente, entre os mesmos outorgantes, para o
mesmo tipo de serviços, com condições contratuais idênticas e com uma
significativa convergência funcional.
Tanto basta para que
devam ser considerados, para efeitos de fiscalização prévia, pelo seu valor
conjunto.
Não há, pois, para
este efeito, que analisar quaisquer aspectos de natureza subjectiva.
2. Da admissibilidade
da contratação
Nos termos do artigo
1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 208/2007, de 29 de Maio, as Administrações de
Região Hidrográfica (ARH) são institutos públicos periféricos integrados
na administração indirecta do Estado.
Enquanto institutos
públicos, devem dispor dos recursos indispensáveis à prossecução das suas
atribuições (Cfr. artigo 33.º, n.º 1, da Lei-quadro dos Institutos
Públicos (LQIP), aprovada pela Lei n.º 3/2004, de 15 de Janeiro, alterada pela
Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 200/2006, de 25 de
Outubro, e pela Lei n.º 105/2007, de 3 de Abril)
Podem, em alternativa,
recorrer à contratação de serviços externos para o desenvolvimento das
actividades a seu cargo, mas apenas quando tal método assegure um controlo
mais eficiente dos custos e da qualidade do serviço prestado.
O recurso à assessoria
jurídica externa no âmbito do desenvolvimento das normais atribuições dos
institutos públicos carece, pois, legalmente, de uma demonstração
específica da maior eficiência desse mecanismo.
Significa isto que a
decisão de recorrer à contratação de assessoria jurídica externa para o apoio
ao desenvolvimento das atribuições das ARH não é uma decisão inteiramente
livre, mas obedece a um pressuposto legalmente vinculado. Essa
contratação só é admissível se for demonstrado que, para a adequada realização
dessas atribuições, essa modalidade é a mais apta à realização dos objectivos e
é menos onerosa e garante mais qualidade do que a utilização de serviços
próprios.
Tal resulta, aliás,
também do artigo 5.º, n.º 2, da LQIP, quando refere que “Os órgãos de
direcção dos institutos públicos devem assegurar que os recursos públicos de
que dispõem são administrados de uma forma eficiente e sem desperdícios,
devendo sempre adoptar ou propor as soluções organizativas e os métodos de
actuação que representem o menor custo na prossecução eficaz das atribuições
públicas a seu cargo”.
Por outro lado, o
artigo 9.º, n.º 6, da Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, estabelece que as
Administrações das Regiões Hidrográficas devem realizar um conjunto de
atribuições, em que se incluem a elaboração dos planos de gestão de bacias
hidrográficas e a decisão e emissão dos títulos de utilização de recursos
hídricos e respectiva fiscalização, através dos seus órgãos e serviços.
Ora, conforme resulta
dos artigos 3.º e 5.º da Portaria n.º 394/2008, de 5 de Junho, a ARH do Norte
dispõe de unidades orgânicas para o desenvolvimento das suas missões,
nomeadamente de um Departamento Financeiro, Administrativo e Jurídico,
que assegura o apoio jurídico e o apoio à gestão de recursos humanos.
Se analisarmos a
descrição das prestações incluídas nos contratos, verificamos que nelas se
incluem matérias e tarefas que se enquadram nas competências de natureza
corrente do referido Departamento Financeiro, Administrativo e Jurídico, como
sejam a preparação, organização e acompanhamento dos procedimentos
administrativos de contratação pública e a gestão e desenvolvimento dos
procedimentos e actividades relativos à gestão de pessoal e respectiva formação
profissional (Cfr. artigo 5.º, n.º 2, da Portaria n.º 394/2008, de 5
de Junho).
Sendo certo que da
página 19 do Relatório de Actividades de 2009 da ARH do Norte24 se
verifica que esse departamento está dotado de pessoal, fica também por
demonstrar a necessidade e justificação para o recurso à contratação externa
nessas matérias.
Conforme consta da
alínea e)ii do ponto II deste Acórdão, a ARH do Norte justificou as presentes
contratações de serviços externos com a alegação de que “tendo entrado em
funcionamento em 1 de Outubro de 2008, não está capacitada na respectiva
estrutura funcional interna de recursos humanos para desenvolver os trabalhos
em causa”.
Face à imposição legal
de utilização dos seus serviços internos25 e
de recurso à contratação externa apenas quando isso represente inequívocos
ganhos de eficiência, facilmente se conclui que a justificação avançada é, de
todo, insuficiente para comprovar e se dar por verificado o pressuposto
vinculado de que depende a contratação.
3. Do procedimento de
formação dos contratos.
A terceira questão que
importa resolver é a de saber se os contratos em apreciação podiam ser
adjudicados directamente à Sérvulo & Associados - Sociedade de
Advogados, R.L.
3.1. Do princípio da
concorrência
O princípio da
concorrência é, de há muito, um dos princípios axilares da contratação pública,
tanto no âmbito nacional como no comunitário.
Tal sucede, aliás, na
generalidade dos Estados de Direito, como não podia deixar de ser, já que se
apresenta como imprescindível à protecção do princípio fundamental da
igualdade, que lhes é inerente, e, simultaneamente, como a melhor forma de
proteger os interesses financeiros públicos.
Na ordem jurídica
portuguesa, e, tal como tem sido expresso na doutrina e na jurisprudência,
estão constitucionalmente estabelecidos os princípios da igualdade e da concorrência
e a obrigação de a Administração Pública os respeitar na sua actuação26,
seja em que circunstâncias for, em nome simultaneamente dos valores
fundamentais, da ordem económica e da prossecução do interesse público.
Estes princípios
constitucionais aplicam-se a qualquer actuação da Administração Pública, mesmo
que de gestão privada27 e têm uma especial incidência em matéria de
Contratação Pública.
Nessa linha, o Código
dos Contratos Públicos28 estabelece, no n.º 4 do seu artigo 1.º, que
à contratação pública são especialmente aplicáveis os princípios da
transparência, da igualdade e da concorrência.
Estes princípios estão
também claramente estabelecidos na ordem jurídica comunitária a que nos
encontramos vinculados.
Os tratados europeus
afirmam um objectivo de integração económica, a realizar através do respeito
pelas «liberdades fundamentais» (livre circulação de mercadorias, pessoas,
serviços e capitais), de onde deriva a obrigatoriedade de os Estados Membros da
União Europeia legislarem e agirem de modo a assegurarem a mais ampla
concorrência possível e a prevenirem quaisquer favorecimentos.
Como se referiu, entre
outros, nos processos do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE)
n.ºs C-458/03, Parking Brixen, e C-324/98, Telaustria O recente
acórdão de 20 de Maio de 2010, tirado no processo T-258/06, é bastante
esclarecedor nessa matéria), quando uma autoridade pública confia o
exercício de uma actividade económica a terceiros, aplica-se o princípio da
igualdade de tratamento e as suas expressões específicas, nomeadamente o
princípio da não-discriminação, bem como os artigos 43.º e 49.º do Tratado CE29,
sobre a liberdade de estabelecimento e a livre prestação de serviços. O TJCE
afirma ainda que estes princípios implicam uma obrigação de transparência, que
consiste em assegurar a todos os potenciais concorrentes um grau de publicidade
adequado, que permita abrir o mercado de bens e serviços à concorrência.
Ainda que as
directivas emitidas para a coordenação dos procedimentos nacionais de
adjudicação de contratos públicos excluam do seu âmbito algumas áreas da
contratação, o TJCE tem sido claro e afirmativo no sentido de que os princípios
referidos se aplicam mesmo que não sejam aplicáveis as directivas relativas aos
contratos públicos, uma vez que derivam directamente dos Tratados30.
Os princípios da
igualdade e da concorrência impõem-se, pois, à actividade contratual pública,
tanto por via constitucional como por via comunitária.
Ora, o respeito pelos
princípios em causa, e, em particular, pelo princípio da concorrência, implica
que se garanta aos interessados em contratar o mais amplo acesso aos
procedimentos, através da transparência e da publicidade adequada.
É também esse o modo
de garantir a melhor protecção dos interesses financeiros públicos, já que é em
concorrência que se formam as propostas competitivas e que a entidade
adjudicante pode escolher aquela que melhor e mais eficientemente satisfaça o
fim pretendido.
As teorias dos jogos e
dos leilões demonstram matematicamente que assim é, sendo que, nos termos do
artigo 42.º, n.º 6, da Lei de Enquadramento Orçamental31,
nenhuma despesa pode ser autorizada ou paga sem que satisfaça os princípios da
economia e da eficiência.
Em suma, o respeito
pelo princípio da concorrência e seus corolários subjaz a qualquer actividade
de contratação pública, por força de imperativos comunitários, por directa
decorrência de normas constitucionais, por previsão da lei aplicável à
contratação e por imposição da legislação financeira e dos deveres de
prossecução do interesse público e de boa gestão.
Donde resulta que para
a formação de contratos públicos devem ser usados procedimentos que promovam o
mais amplo acesso à contratação dos operadores económicos nela interessados.
3.2. Dos procedimentos
de contratação pública
As Directivas
europeias de contratação pública (em especial a Directiva n.º 2004/18/CE) e, no
plano nacional, o Código dos Contratos Públicos, estabelecem um conjunto de
procedimentos a seguir, consoante as situações, para a formação de contratos
públicos.
Em ambos os casos são
estabelecidos como regra procedimentos concorrenciais abertos.
No entanto, ambos os
diplomas estabelecem também excepções à utilização desses procedimentos
concorrenciais abertos, admitindo que há situações em que não se justifica ou
não é possível desenvolvê-los.
A este respeito
importa ter presentes dois aspectos bem clarificados na jurisprudência do TJCE,
os quais são também plenamente transponíveis e aplicáveis no plano
exclusivamente nacional.
Em primeiro lugar, as
directivas comunitárias de contratação pública (tal como a Parte II do Código
dos Contratos Públicos), procedendo à definição de procedimentos a utilizar na
adjudicação de contratos públicos, têm de ser vistos como meros instrumentos de
realização dos princípios e objectivos mais amplos referidos no ponto anterior.
Donde resulta que, mesmo quando os procedimentos típicos estabelecidos nas
directivas ou na legislação nacional não sejam aplicáveis, a entidade pública
está vinculada a adoptar práticas de contratação que salvaguardem a
concorrência.
Por outro lado, sempre
que a lei estabeleça excepções aos procedimentos concorrenciais mais abertos
deve ser-se muito rigoroso e exigente na interpretação e na aplicação dessas
excepções, procurando sempre a salvaguarda máxima do princípio da concorrência
e admitindo a realização de procedimentos fechados apenas quando não haja
alternativa concorrencial possível.
O ajuste directo, tal
como descrito no artigo 112.º do Código dos Contratos Públicos, e tal como foi
aplicado nos casos, constitui um procedimento completamente fechado, que não
integra qualquer nível de concorrência.
Só deve, pois,
aceitar-se a sua utilização quando se demonstre inviável qualquer outra solução
procedimental que melhor salvaguarde a concorrência.
3.3. Da aquisição de
serviços intelectuais
A Directiva 2004/18/CE
reconhece, no seu artigo 30.º, n.º 1, alínea c), que as prestações de
carácter intelectual podem ser de molde a impossibilitar a
elaboração de especificações com precisão suficiente para permitir a
adjudicação do contrato através da selecção da melhor proposta de acordo com as
regras que regem os concursos.
Na sequência desse
reconhecimento, permite-se que os contratos relativos a esses serviços possam
ser precedidos de um procedimento de negociação, mas sempre com publicação
de anúncio.
Ou seja, admite-se
para casos de serviços intelectuais um procedimento mais flexível, com
possibilidade de adaptação das propostas aos requisitos
pretendidos, mas não
se dispensa, antes se impõe, um procedimento concorrencial aberto.
O artigo 27.º do
Código dos Contratos Públicos, previu na alínea b) do seu n.º 1, que pode ser
adoptado o ajuste directo quando estejam em causa prestações de natureza
intelectual que não permitam a elaboração de especificações contratuais
suficientemente precisas para que sejam qualitativamente definidos atributos
das propostas necessários à fixação de um critério de adjudicação e não seja
adequada a definição quantitativa de outros atributos.
Mas, o mesmo artigo,
no seu n.º 3, estabelece que, nos casos em que estejam em causa contratos de
aquisição de serviços abrangidos pela directiva comunitária e de valor superior
aos limiares para a sua aplicação, já não poderá ser assim. Nesses casos, e não
obstante estarmos perante serviços de natureza intelectual em relação aos quais
não é aparentemente possível a definição de especificações e de atributos para
aplicação de um critério de adjudicação, está proibida a adopção do ajuste
directo.
O n.º 4 do mesmo artigo
27.º proíbe também a adopção do ajuste directo quando o serviço intelectual a
adquirir, mesmo quando insusceptível de ser especificado e avaliado, consista
na elaboração de um plano, de um projecto ou de uma qualquer criação conceptual
nos domínios artístico, do ordenamento do território, do planeamento
urbanístico, da arquitectura, da engenharia ou do processamento de dados.
Ou seja, em todos
estes casos, e apesar da impossibilidade da elaboração das
especificações contratuais e da definição qualitativa e quantitativa dos
factores de avaliação das propostas, a entidade adjudicante é forçada a seguir
procedimentos de natureza concorrencial e a encontrar a melhor forma de avaliar
e seleccionar as propostas.
Assim, deve
concluir-se que a caracterização dos serviços a adquirir como de natureza
intelectual e uma eventual impossibilidade ou dificuldade em definir as
respectivas especificações e atributos a valorar não autoriza, só por si, a não
utilização de procedimentos concorrenciais.
3.4. Da aquisição de
serviços jurídicos
Os artigos 52.º e
seguintes do Tratado CE32 estabeleceram que a liberalização de
serviços no âmbito europeu se faz prioritariamente em determinados tipos
de serviços, identificados como os que mais influem nos custos de produção e que
mais contribuem para fomentar a circulação de bens.
Nessa linha, a
Directiva n.º 2004/18/CE subdividiu os serviços em duas categorias.
Uma, a descrita no
anexo II A da Directiva33, respeita aos serviços a que se aplicam
integralmente as disposições da directiva de modo a permitir “a plena
concretização do potencial de crescimento do comércio transfronteiras”34.
A outra, a descrita no
Anexo II B, engloba os serviços aos quais, durante um período transitório,
não se aplica a totalidade das normas da directiva, ficando, entretanto,
sujeitos a controlo, até que seja tomada uma decisão sobre a aplicação integral
da directiva35. Estes serviços são vulgarmente conhecidos
como os serviços não prioritários.
Mas a não aplicação a
esta segunda categoria de serviços da maioria das regras processuais
estabelecidas na directiva não significa a sua não subordinação aos princípios
decorrentes dos Tratados.
Conforme se refere no
considerando (2) da directiva e se estabelece claramente no acórdão do TJCE
tirado no processo T-258/06, apesar de os procedimentos específicos e rígidos
previstos pelas directivas comunitárias relativas à coordenação dos processos
de adjudicação de contratos públicos se aplicarem unicamente aos contratos por
elas integralmente abrangidos, isso não significa que os restantes contratos
públicos estejam excluídos do âmbito de aplicação do direito comunitário. É
entendimento do Tribunal de Justiça que as obrigações decorrentes do direito
primário relativas à igualdade de tratamento e à transparência se aplicam de
pleno direito a contratos excluídos do âmbito das directivas e a contratos
relativos a serviços incluídos no Anexo II B36.
O referido acórdão
afirma também inequivocamente que a obrigação de transparência decorrente dos
princípios do Tratado CE implica que os referidos contratos sejam precedidos de
um procedimento que, ainda que não siga as regras da directiva, deve
envolver necessariamente uma publicitação prévia, que permita a potenciais
interessados manifestar o seu interesse na obtenção do contrato.
Os serviços
jurídicos estão incluídos no Anexo II B da Directiva 2004/18/CE,
aplicando-se-lhes integralmente a jurisprudência acabada de referir.
É, pois, completamente
desajustado o que é alegado pela ARH do Norte e transcrito na alínea t)viii do
ponto II. Ao invés, e ao contrário do que esta entidade refere:
Os contratos de aquisição de serviços
jurídicos não estão excluídos do âmbito de aplicação da Directiva 2004/18/CE,
mas sim sujeitos a uma aplicação parcial da mesma;
Essa aplicação parcial não permite que a
entidade adjudicante adopte um procedimento não concorrencial e seleccione
directamente os prestadores que pretende convidar para apresentar uma proposta,
uma vez que, como já vimos, esse procedimento é, em princípio, proibido pelo
direito comunitário primário e pela interpretação que dele é feita pelo TJCE.
Por outro lado, não há
qualquer fundamento para considerar que o direito comunitário reconhece a
inaptidão genérica do regime de contratação pública para a formação de
contratos de aquisição de serviços jurídicos.
Desde logo, e como já
vimos, a aplicação das obrigações de transparência e publicidade para os
serviços incluídos no Anexo II B resulta do direito primário europeu e da
jurisprudência do TJCE.
Por outro lado,
prevê-se que a aplicação parcial da directiva apenas persista durante um período
transitório.
Depois, estabelece-se
que, desde já, se eliminem especificações discriminatórias37,
o que só se compreende no quadro de processos concorrenciais.
Pode ainda referir-se
que no considerando 47 da directiva em referência se refere a relação dos
critérios de adjudicação com honorários de advogados, o que também só se
compreende no quadro da aplicação de processos concorrenciais a serviços de
advocacia.
Vários sinais existem,
assim, de que não se estabelece ou reconhece qualquer incompatibilidade na
utilização de procedimentos concorrenciais para a aquisição de serviços
jurídicos, mas tão só que se reconhecem esses serviços como não prioritários no
estabelecimento do mercado interno.
No plano nacional, o
Código dos Contratos Públicos não excluiu os contratos de aquisição de serviços
jurídicos do regime de formação dos contratos públicos nele estabelecido,
apesar de o ter feito relativamente a outros serviços mencionados no anexo II B
da Directiva 2004/18/CE38.
É certo que os
serviços não prioritários incluídos no Anexo II B da directiva, como é o caso
dos serviços jurídicos, não se encontram sujeitos ao disposto no artigo 30.º da
Directiva 2004/18/CE nem se encontram abrangidos no regime do n.º 3 do artigo
27.º do Código dos Contratos Públicos, que proíbe o recurso ao ajuste directo.
Mas, a não ser que se
lhe aplique em concreto uma das bem delimitadas excepções previstas, a
aquisição de serviços jurídicos parece subordinar-se aos princípios gerais de
aplicação dos procedimentos concorrenciais, em função dos valores envolvidos,
porque disso não está expressamente excluída no Código, para além de que se
subordina à aplicação directa dos princípios do Tratado e da nossa
Constituição, o que a sujeita a uma obrigação geral de concorrência, transparência
e publicidade.
Ou seja, ao contrário
do que vem alegado, não há nenhuma cláusula geral ou princípio que declare a
aquisição de serviços jurídicos insusceptível de se subordinar a uma escolha
concorrencial. Antes pelo contrário.
Por todas as razões
acima referidas, a aplicação de uma excepção como a que consta do artigo 27.º,
n.º 1, alínea b), do Código dos Contratos Públicos, que foi invocada nos casos,
permitindo a utilização de ajuste directo para aquisições de serviços
intelectuais, e eventualmente jurídicos, de elevado valor, tem de estar
inequivocamente justificada, fundamentada e demonstrada, em termos de afastar, em
concreto e não em abstracto, a viabilidade de qualquer outra solução
concorrencial.
Como já referimos,
devemos ser muito rigorosos e exigentes na interpretação e na aplicação da
excepção, procurando sempre a salvaguarda possível e máxima do princípio da
concorrência.
Significa isso que,
para efeitos da aplicação do disposto no artigo 27.º, n.º 1, alínea b), do
Código dos Contratos Públicos, teria de demonstrar-se inequivocamente no
caso concreto que não é de todo possível a definição de atributos
qualitativos das propostas para integrar o critério de adjudicação nem de todo
adequada a definição de atributos quantitativos, não bastando apenas afirmá-lo.
Mas teria também de
demonstrar-se inequivocamente no caso concreto que não podia utilizar-se
qualquer forma de concorrência, mesmo que mitigada.
3.5. Dos serviços
abrangidos nos contratos em análise
No essencial, as
informações referidas na alínea a) do ponto II detalhavam já os aspectos em que
se pretendia a assessoria e os principais produtos a obter, e foram esses os
aspectos que se fizeram constar dos cadernos de encargos, das propostas e dos
contratos.
Ficou contratualmente
consagrado que o co-contratante apresentaria, no prazo de cinco dias a partir
da outorga dos contratos, Relatórios de Metodologia, os quais vieram
basicamente reproduzir as obrigações constantes dos contratos, embora tenham,
nalguns casos, procedido a algumas especificações adicionais.
Sobre o conteúdo dos
serviços abrangidos pelos contratos, e tendo em atenção o que consta desses
contratos e dos vários documentos que os antecederam e que os concretizaram,
incluindo os referidos Relatórios de Metodologia, importa salientar alguns
aspectos importantes:
- Nenhum dos contratos abrange o
estabelecimento de mandato forense;
- Em todos os documentos referidos, e no
que concerne a todos os contratos, ficou consagrado como primeira obrigação
integrada nos objectos contratuais a criação e redacção de conteúdos
técnico-jurídicos a incorporar nos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica
(PGBH);
- Os contratos estão todos “finalisticamente
orientados para o propósito único de elaboração dos Planos de Gestão de Bacia
Hidrográfica das Regiões Hidrográficas 1, 2 e 3”.
- O contrato referido na alínea a) do ponto
I:
Traduz-se na assessoria jurídica directa
à elaboração dos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica (PGBH), enquanto
instrumentos de planeamento e gestão dos recursos hídricos das regiões
hidrográficas 1, 2 e 3;
Envolve a estruturação, fundamentação,
criação e redacção do conteúdo e forma jurídica finais dos PGBH,
considerando os trabalhos produzidos pelas diversas áreas temáticas de
elaboração do plano e a ponderação dos resultados da participação e discussão
públicas;
Envolve a elaboração, criação e
redacção do projecto de Resolução do Conselho de Ministros que aprova os PGBH e
definição dos elementos que a acompanham43.
• O contrato
referido na alínea b) do ponto I:
Prevê o apoio na validação dos conteúdos
técnicos a incorporar no PGBH.
• O contrato
referido na alínea c) do ponto I envolve:
A estruturação, criação e redacção de
guias e manuais de apoio ao licenciamento das utilizações privativas dos
recursos hídricos do domínio público integrados nas bacias hidrográficas das RH
1, 2 e 3;
A definição, criação e redacção de
procedimentos-administrativos-tipo relativos ao licenciamento de utilizações
privativas dos referidos recursos hídricos;
A definição, criação e redacção de
critérios e modelo de hierarquização de prioridades para utilizações privativas
concorrenciais relativas a um tipo de utilização dos referidos recursos
hídricos;
A análise e definição da importância da
atribuição de títulos de licenciamento e concessão de captações de água para
produção de energia eléctrica e respectivo impacte no âmbito dos PGBH e das RH
1, 2 e 3;
O acompanhamento da definição do portal
informático para acesso à documentação, procedimentos-tipo, critérios e
condicionantes de licenciamento das utilizações privativas dos referidos
recursos hídricos.
• O contrato
referido na alínea d) do ponto I inclui:
A identificação das disponibilidades
existentes e das necessidades da ARH do Norte em matéria de recursos humanos;
A definição da quantidade e do perfil
mais adequado de recursos humanos a contratar pela ARH do Norte para execução
dos PGBH;
A identificação das necessidades de
formação relativamente aos recursos humanos existentes;
O apoio à tramitação e decisão dos
procedimentos administrativos e necessários à formação dos actos administrativos
ou contratos que enquadrem a alocação desses meios humanos;
A determinação e hierarquização de
soluções organizacionais alternativas;
O apoio à modelação da organização e
funcionamento da ARH do Norte, reflectidas na definição de uma Visão e Missão
Estratégica articulada com as diversas estruturas e órgãos das distintas
Regiões Hidrográficas 1, 2 e 3, sede e Gabinetes.
Constata-se, assim,
que todos os contratos declaram orientar-se para a elaboração dos Planos de
Gestão de Bacia Hidrográfica (PGBH), sendo isso especialmente evidente nos
casos dos contratos referidos nas alíneas a) e b) do ponto I (Interessa-nos
aqui o que consta expressamente dos contratos, pois é isso que é relevante para
efeitos da sua fiscalização prévia. Os alegados lapsos na descrição do objecto
deles constante ou os desvios na sua execução não relevam nesta sede).
Mas constata-se também
que os contratos em referência incluem serviços jurídicos e serviços não
jurídicos.
Nomeadamente, são
serviços de natureza prevalentemente não jurídica a elaboração de manuais de
procedimentos, a criação de modelos de apoio à decisão, incluindo a definição
de critérios e hierarquização de prioridades, a análise da importância e do
impacto da atribuição de títulos de licenciamento, a análise dos recursos
humanos existentes, a definição da quantidade e perfil de recursos humanos a
contratar, a definição das necessidades de formação e a análise e proposta de
modelos organizacionais.
É claro que o direito
regula toda a actividade humana e é sempre possível invocar que a elaboração
dos documentos em causa e as opiniões a formular envolvem a aplicação de normas
jurídicas. Mas também isso sempre sucederá na elaboração de um projecto técnico
de engenharia, em que a lei regula o respectivo conteúdo necessário e um
conjunto variado de padrões técnicos a observar, não sendo por isso que esse
projecto passa a ser qualificado como um serviço jurídico.
Os serviços que
referimos são qualificáveis como serviços de consultoria em gestão e alguns
deles como serviços de consultoria em matéria de gestão de recursos humanos,
não estando de modo algum reservados a advogados.
Os contratos que, de
forma mais evidente, incluem estes serviços não jurídicos são os contratos
referidos nas alíneas c) e d) do ponto I.
3.6. Do regime
pré-contratual a aplicar aos serviços contratados
Como referimos, e
independentemente das especificidades de cada um, todos os contratos se
destinam à criação e redacção de conteúdos técnico-jurídicos a incorporar
nos Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica (PGBH), sendo mesmo propósito do
contrato referido na alínea a) do ponto I a estruturação, fundamentação,
criação e redacção do conteúdo e forma jurídica finais dos PGBH e a elaboração,
criação e redacção do projecto de Resolução do Conselho de Ministros que aprova
os PGBH e definição dos elementos que a acompanham.
Estes Planos de Gestão
de Bacia Hidrográfica são inquestionavelmente planos de ordenamento do
território.
Nos contratos que ora
nos ocupam está, pois, inequivocamente em causa a aquisição de serviços para a
elaboração de planos no domínio do ordenamento do território.
Ora, nos termos do n.º
4 do artigo 27.º do Código dos Contratos Públicos, para a elaboração de um
plano no domínio do ordenamento do território está proibido o recurso ao ajuste
directo ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo.
Ou seja, mesmo que
consideremos estar perante serviços de natureza intelectual ou jurídica48,
e que não descortinemos as especificações ou critérios a utilizar, a lei é
peremptória: não podemos utilizar o ajuste directo. Teremos de encontrar uma
forma de escolha mais aberta.
Pode sempre tentar
invocar-se que estes contratos não se destinam a elaborar especificamente um
plano de ordenamento do território, mas apenas a apoiar juridicamente a sua
elaboração. Seriam, assim, meramente acessórios da elaboração desse plano.
Como consta dos
processos e da lei, compete exclusivamente à ARH do Norte elaborar os Planos de
Gestão de Bacia Hidrográfica, sendo essa uma das suas atribuições.
Mas, conforme também
consta dos processos, os referidos planos envolvem diversas valências e áreas
temáticas e integram a definição do respectivo modelo legal e institucional,
tendo a ARH do Norte considerado que, face ao seu nível actual de capacitação,
necessitava de adquirir externamente serviços no âmbito dessas várias
valências, incluindo a jurídica.
Não é pelo facto de os
contributos necessários à elaboração dos planos terem sido parcelados por
diversos contratos de aquisição de serviços, em função das várias valências
necessárias, que devemos deixar de aplicar a norma constante do n.º 4 do artigo
27.º do Código dos Contratos Públicos.
De facto, tanto se
justifica a proibição de ajuste directo para a elaboração integral de um plano
de ordenamento do território, como para a elaboração de partes desse plano,
como para a assessoria na elaboração desse plano.
De resto, o contrato a
que se refere a alínea a) do ponto I é aquele que se destina à elaboração da
versão final e formal dos planos em causa e, portanto, o que mais se aproxima
da descrição legal.
O nível de confiança
técnica que se exige é muito próximo daquele que se deve ter em quem se delega
a elaboração integral de um plano.
Quando se delegue a
elaboração integral de um plano deste tipo deve até garantir-se um nível maior
de confiança técnica, pois não se está no controlo da situação. E, ainda assim,
não é legalmente possível recorrer a um ajuste directo.
Por maioria de razão,
não o deve ser se adquirirmos serviços parcelares destinados ao mesmo fim.
Nesta segunda hipótese
deve seguir-se, obviamente, o mesmo regime, até para salvaguardar o efeito útil
da norma proibitiva e prevenir que a mesma seja contornada de forma artificial.
Por outro lado, e como
também já assinalámos, os contratos a que se referem as alíneas c) e d) do
ponto I, incluem a aquisição de serviços de consultoria em gestão, os quais
estão indicados no Anexo II A da Directiva n.º 2004/18/CE. Ora, nos termos do
n.º 3 do artigo 27.º do Código dos Contratos Públicos e do artigo 30.º da
Directiva, essa circunstância impede também a adopção do ajuste directo.
Mas, mesmo que assim
não fosse, e na parte em que eventualmente assim não seja, estariam verificados
os pressupostos de aplicação da excepção prevista na alínea b) do n.º 1 do
artigo 27.º do Código dos Contratos Públicos, invocada como autorizadora do
ajuste directo?
3.7. Da fundamentação
para a aplicação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 27.º do Código dos
Contratos Públicos
A norma em referência
refere que pode adoptar-se o ajuste directo para a aquisição de serviços quando
a natureza das respectivas prestações não permita a elaboração de
especificações contratuais suficientemente precisas para que sejam
qualitativamente definidos atributos das propostas necessários à fixação de um
critério de adjudicação nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo
74.º, e desde que a definição quantitativa, no âmbito de um procedimento de
concurso, de outros atributos das propostas seja desadequada a essa fixação,
tendo em conta os objectivos da aquisição pretendida.
Vejamos se se encontra
demonstrada nos casos a verificação destes requisitos.
Conforme ressalta do
exposto nas várias alíneas do ponto II, e do teor dos documentos e dos
contratos, foram definidos, para cada contrato, as principais áreas em que a
assessoria da adjudicatária deveria desenvolver-se, sem prejuízo de não serem
identificáveis em pormenor todas as intervenções concretamente necessárias.
Trata-se de uma
situação relativamente comum nos serviços de consultoria e assessoria, mesmo de
natureza não jurídica, como são os casos da consultoria de gestão e da
consultoria científica e técnica, abrangidos no Anexo II A da Directiva
2004/18/CE.
Não obstante isso
conduza a dificuldades na descrição exaustiva dos trabalhos a desenvolver, tal
não impede uma descrição dos parâmetros que devem balizar esses trabalhos, tais
como as matérias que devem abranger, os critérios a que devem obedecer, os
prazos de resposta e os produtos que devem ser presentes.
São especificações
desse tipo que constaram dos cadernos de encargos dos presentes procedimentos.
Por isso, e como se
refere no documento a que alude a alínea w)i do ponto II, o valor contratual
foi determinado, não com base no preço de cada um dos trabalhos a desenvolver,
mas por referência a um número de horas de serviços jurídicos prestados e a um
determinado valor hora desses serviços jurídicos.
Tal circunstância não
impede, por si, a comparação de propostas, como terá, aliás, de suceder em
consultorias abrangidas no referido Anexo II A da Directiva 2004/18/CE.
Como se dá nota nas
alíneas e) e t) do ponto II, o objectivo da ARH do Norte foi escolher o
co-contratante exclusivamente em função da qualidade intrínseca da
prestação.
No entanto, a ARH do
Norte considerou que essa qualidade não poderia ser revelada pelos atributos
da proposta.
Eis a primeira
afirmação não demonstrada e que é um pressuposto de aplicação da norma legal
invocada.
Porque é que os
atributos da proposta não podiam ser, no caso, critério de apreciação da
respectiva qualidade?
O que é que diferencia
estes casos de um outro contrato para aquisição de serviços no âmbito do Plano
de Gestão das Bacias Hidrográficas do Norte,
recebido neste
Tribunal49, e referente a serviços de análise
económica, no qual a ARH do Norte realizou um concurso público e propôs-se
avaliar a qualidade técnica das metodologias propostas, a qualidade das equipas
técnicas propostas e o preço proposto?
Nos presentes casos, a
ARH do Norte considerou que a pretendida qualidade das prestações só podia ser
deduzida das qualidades técnicas pessoais do proponente, únicas que lhe
poderiam gerar confiança na qualidade do serviço.
Mais entendeu que as
qualidades técnicas pessoais do proponente só poderiam ser aferidas pela sua experiência,
pelo seu currículo e pela confiança que eles lhe inspiram.
A ARH do Norte invocou
ainda que só podia percepcionar essas qualidades pessoais com base no que ela
própria conhece do prestador de serviços e com base na confiança subjectiva que
nele deposita50. Porquê? Não explicita.
A entidade afirma que
não podia avaliar a aptidão técnica do prestador de serviços com base em
elementos objectivamente mensuráveis. No entanto, invoca como justificação para
a escolha do mesmo a sua experiência em trabalhos de natureza técnico jurídica
relativos à elaboração do Plano Nacional da Água, do Plano Regional da Água da
Região Autónoma dos Açores, no processo de implementação das Administrações de
Região Hidrográfica criadas pela Lei da Água, bem como em trabalhos relativos a
matéria de emprego público, “que lhe conferem especial aptidão para a
execução do objecto das prestações de serviços a contratar”51.
Todos estes elementos são objectivamente mensuráveis.
Admite-se que nos
serviços de natureza intelectual, a avaliação da aptidão técnica do
prestador de serviços seja, para o adquirente, a forma mais fiável de prever a
qualidade das prestações a adquirir. E que, por isso, a entidade pública
prefira avaliar essa aptidão técnica a avaliar aspectos da proposta, que
poderiam redundar em apreciações meramente formais de documentos sem conteúdo
verdadeiramente relevante para as aquisições em causa.
Admite-se também que a
avaliação da aptidão técnica do prestador de serviços não pode integrar os
elementos de definição do critério da proposta economicamente mais vantajosa,
nos termos previstos para os concursos.
Mas não pode
concluir-se daí que a mera percepção subjectiva dessa aptidão técnica
seja legalmente reconhecida como critério de escolha e adjudicação.
Em primeiro lugar, a
aptidão técnica só é reconhecida como único critério de escolha pelo artigo
24.º, n.º 1, alínea e), do Código dos Contratos Públicos, e pelo artigo 31.º,
n.º 1, alínea b) da Directiva 2004/18/CE. Ora, estes preceitos só o admitem
para as situações em que apenas um operador económico determinado detenha a
aptidão necessária para a execução do contrato, excluindo, portanto, essa
possibilidade nos restantes casos.
Ora, não é claramente
essa a situação no caso, em que, como a própria ARH do Norte reconhece, há
vários operadores económicos a fornecer os serviços.
Em segundo lugar, em
inúmeras situações em que a avaliação da aptidão técnica do prestador seria
adequada e em que a questão da confiança subjectiva no prestador se podia equacionar,
o legislador afastou expressamente a possibilidade de essa avaliação ser feita
de forma puramente subjectiva e de fundar uma atribuição directa.
É claramente o caso
das criações conceptuais previstas no artigo 27.º, n.º 4, do Código dos Contratos
Públicos e dos serviços indicados no Anexo II A da directiva.
Por outro lado, o
legislador previu a possibilidade de incluir nos processos concorrenciais a
definição de requisitos de qualificação técnica dos concorrentes, permitindo
definir patamares desejáveis de qualidade técnica e afastar os concorrentes que
não os satisfaçam.
Esses requisitos podem
ser aferidos por parâmetros curriculares, referenciados a matérias trabalhadas,
respectiva extensão e resultados.
Tendo a ARH do Norte
definido as valências do Direito importantes para cada contrato53,
não demonstra a mesma porque é que não podia ter definido requisitos mínimos de
currículo e experiência nessas valências, de modo a seleccionar vários
potenciais prestadores dos serviços.
Tanto mais que reconhece
que os objectos contratuais implicam um grau de pluridisciplinaridade e
especialidade que não se pode encontrar numa só pessoa, que os contratos eram
susceptíveis de suscitar a diferentes destinatários o interesse em contratar, e
que as sociedades de advogados, enquanto estruturas empresariais e
profissionais multifacetadas, respondem aos diferentes segmentos de negócio
envolvidos.
Ora, tudo isso são
razões para promover o concurso de vários proponentes, capazes de apresentar
diversas valências e experiências.
Invocou a entidade que
a sociedade escolhida tem uma especial aptidão para a execução dos serviços em
apreço, atendendo à sua experiência técnico-jurídica nos domínios em causa,
designadamente relativos ao domínio público hídrico e a matérias de emprego
público.
Fica por demonstrar
que outros prestadores e outras sociedades não tivessem aptidão equivalente.
Tanto mais que não
lhes foi dada a oportunidade de o demonstrar.
Tanto mais que os
serviços deverão ser prestados por um número variável de colaboradores
indeterminados de diferentes níveis de qualificação55,
sendo eventualmente comparável a dimensão, composição, qualificação e
experiência das equipas propostas.
E não se diga que para
a aquisição de serviços de assessoria jurídica só faz sentido a escolha directa
do prestador de serviços, já que qualquer outro tipo de procedimento
pré-contratual “pode potencialmente conduzir a entidade adjudicante a
iniciar uma relação contratual com um prestador em quem não deposita a sua
confiança”.
Estamos perante
matéria de simples assessoria, nalguns casos de natureza corrente, para a qual
uma qualificação técnica pode trazer confiança suficiente.
Refira-se, aliás, que,
como já vimos, a referida assessoria deve, em circunstâncias normais, ser desenvolvida
por recursos humanos próprios da entidade pública. Estes recursos humanos
estarão ao abrigo de relações jurídicas de emprego público, as quais só podem
ser constituídas na sequência de concursos públicos. Não é por isso que, nesse
cenário, deixaria de haver confiança.
Para além disso, não
está demonstrado que no caso concreto a confiança técnica não fosse
avaliável por elementos curriculares, que, de resto, precisamente se invocaram
para a concreta escolha feita57.
Foi invocado que a
prioridade da entidade adjudicante consistia na obtenção de serviços de elevada
qualidade e não na escolha do serviço em função do preço mais baixo ou do prazo
mais curto, razão pela qual os critérios de natureza quantitativa não eram supostamente
adequados à escolha das propostas.
Admitindo-se que o
critério do preço pudesse não ser o único a relevar, afigura-se, no entanto,
que o mesmo não poderia ser afastado de uma escolha como aquela que estava
envolvida nas presentes contratações, pois que, como já referimos, a própria
lei manda atender na contratação externa a parâmetros de eficiência, que, pela
sua própria natureza, implicam a avaliação de custos.
Ademais, o disposto no
artigo 42.º, n.º 6, alínea c), da Lei de Enquadramento Orçamental impõe, como
já referimos, que nenhuma despesa possa ser autorizada ou paga sem que
satisfaça os princípios da economia e da eficiência, pelo que os critérios
ligados ao custo dos serviços não podem ser completamente arredados dos
processos de escolha e compra dos mesmos.
Uma combinação de
requisitos de qualificação técnica do prestador com critérios quantitativos de
avaliação da proposta poderia ser adequada.
Finalmente, mesmo que
ficasse demonstrado, que não ficou, que era impossível a definição de atributos
adequados à definição de um critério de adjudicação nos termos dos
procedimentos rígidos fixados, os princípios já acima identificados apontam
para a necessidade de assegurar adequados níveis de transparência e
concorrência, o que, face aos significativos valores envolvidos e à existência
de mercado no sector, não é compatível com um ajuste directo sem qualquer
consulta ou negociação.
A falta de obtenção ou
procura de outras propostas conduziu, por outro lado, à aceitação simples do
que foi proposto pela única sociedade convidada, sem que tenha ocorrido
qualquer negociação para obtenção de melhores condições, nomeadamente
financeiras.
Em suma, considera-se
que a impossibilidade de definir e utilizar atributos qualitativos e
quantitativos para a escolha da proposta, estando afirmada, não está
suficientemente demonstrada em termos de poder conduzir a uma escolha dirigida
a um único prestador de serviços.
4. Do regime de
pagamentos.
Os contratos têm um
prazo de 18 meses, as prestações vão sendo executadas ao longo desse tempo e
são, em princípio, “medidas” em função do número de horas de serviços
prestados.
Ora, verifica-se que o
plano de pagamentos, consagrado na cláusula 12.ª dos contratos, conduz a que
30% do preço contratual seja pago com o início dos trabalhos e que 60% esteja
pago ao fim de apenas 2 meses de execução contratual.
Tal aponta para o
pagamento de prestações ainda por realizar, pelo menos no que respeita à
primeira prestação.
De facto, o primeiro
pagamento de 30% foi, em todos os contratos, efectuado com o início dos
trabalhos, contra a entrega do respectivo Relatório de Metodologia, o qual,
como se constata da alínea w) do probatório, consubstancia apenas uma definição
genérica do desenrolar dos trabalhos. Por outro lado, considerando que o preço
contratual corresponde a um determinado número de horas de prestação de
serviços, e que esse valor foi pago no início, não se pôde verificar a
proporcional prestação das correspondentes horas.
Foram, assim, pagos,
no total dos quatro contratos, 405.480 € sem
contrapartida em prestações realizadas de igual valor, o que consubstancia uma
violação do disposto no artigo 292.º do Código dos Contratos Públicos, uma vez
que não foi prevista qualquer caução para estes adiantamentos.
O segundo pagamento
pode ainda ser violador do disposto na alínea a) do n.º 1 do referido artigo
292.º, por exceder a percentagem máxima prevista para os adiantamentos.
5. Da relevância das
ilegalidades verificadas
Conforme decorre do
exposto, nas contratações em causa verificaram-se as seguintes ilegalidades:
Recurso à contratação externa de serviços
de assessoria jurídica sem que se mostrem verificados os pressupostos
estabelecidos nos artigos 5.º, n.º 2, e 33.º, n.º 3, da Lei–quadro dos
Institutos Públicos e em violação do disposto no artigo 9.º, n.º 6, da Lei n.º
58/2005 e no artigo 42.º, n.º 6, alínea c), da Lei de Enquadramento Orçamental;
Contratação de serviços por ajuste
directo, com violação do disposto no artigo 27.º, n.º 1, alínea b), n.º 3 e n.º
4, do Código dos Contratos Públicos, dada a natureza dos serviços envolvidos e
a insuficiente fundamentação e demonstração da verificação dos pressupostos
legais para o recurso a essa modalidade de adjudicação;
Violação dos princípios da igualdade,
concorrência e transparência, resultantes dos Tratados europeus e da
Constituição e lei portuguesas;
Violação do disposto no artigo 292.º do
Código dos Contratos Públicos, no que s refere ao pagamento adiantado do preço.
As ilegalidades
verificadas implicam a susceptibilidade de alteração do resultado financeiro
dos procedimentos.
Isto é, se não
tivessem ocorrido as violações de lei referidas, é possível que tivessem sido
obtidos resultados diferentes, com melhor protecção dos interesses financeiros
públicos.
Enquadram-se, pois,
tais violações no disposto na alínea c) do nº 3 do artigo 44º da LOPTC, quando
aí se prevê, como fundamento para a recusa de visto, “ilegalidade que …
possa alterar o respectivo resultado financeiro.”
Sublinhe-se que, para
efeitos desta norma, quando aí se diz “[i]legalidade que (…) possa alterar o
respectivo resultado financeiro” pretende-se significar que basta o simples
perigo ou risco de que da ilegalidade constatada possa resultar a alteração do
respectivo resultado financeiro.
As normas acima
indicadas são, ainda, normas de protecção dos interesses financeiros públicos,
pelo que igualmente se verifica a violação de normas financeiras referida na
alínea b) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC.
Há pois fundamentos
para recusa do visto.
IV. DECISÃO
Pelos fundamentos
indicados, e nos termos do disposto nas alíneas b) e c) do nº 3 do artigo 44.º
da Lei nº 98/97, acordam os Juízes do Tribunal de Contas, em Subsecção da 1.ª
Secção, em recusar o visto aos contratos acima identificados.
São devidos
emolumentos nos termos do artigo 5º, n.º 3, do Regime Jurídico dos Emolumentos
do Tribunal de Contas59.
Lisboa, 3 de Novembro
de 2010
Os Juízes
Conselheiros,
(Helena Abreu Lopes -
Relatora)
(Alberto Fernandes
Brás)
(João Figueiredo)
Fui presente
(Procurador Geral Adjunto)
(Daciano Pinto)
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