sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

CONTRATAÇÃO PÚBLICA – NOTIFICAÇÃO - VALIDADE ACTO IMPUGNADO - FACTOS RELEVANTES PROVA DOCUMENTAL - PROVA TESTEMUNHAL - DECISÃO DE NÃO ADJUDICAÇÃO - ACORDO CELEBRADO POR TRÊS CONCORRENTES À MARGEM CONCURSO - ARTIGO 79º N.°1, ALÍNEA D) CÓDIGO CONTRATOS PÚBLICOS - PRINCÍPIO CONCORRÊNCIA



Proc. Nº 01735/11.8BEBRG    19.10.2012    TCAN

1. A notificação não se prende com a validade do acto mas é algo externo ao acto que apenas releva em sede da sua eficácia, e, designadamente, para o prazo de impugnação, pelo que os factos atinentes à notificação não têm interesse para a decisão de uma acção de contencioso pré-contratual em que se impugna a decisão de não adjudicação.
2. Estando suficientemente comprovados por documentos os factos que o Requerente linha interesse em provar e não se impondo contra provar qualquer outro, não se justifica a produção de prova testemunhal por si requerida.
3. Viola o disposto no artigo 79°, n.º 1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos, o acto de não adjudicação de serviços para o transporte escolar de alunos, posto a concurso, em virtude de três das empresas concorrentes terem celebrado, à margem do concurso e antes de este estar aberto, um acordo para a criação de um novo título de transporte (passe estudante) no âmbito de uma concessão de que é titular uma destas empresas, e que apenas deram a conhecer no procedimento concursal depois de conhecidas as demais propostas.
4. Viola também o princípio da concorrência o acto de adjudicação praticado nestas circunstâncias pois, apesar de o acordo em causa ser externo ao concurso teve directa e imediata influência no mesmo, levando ao seu termo, em beneficio de três das concorrentes - as que celebraram o acordo - e em detrimento das demais.

EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
A Agência …, Lda. interpôs o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador de 29.03.2012, a fls.114, que dispensou a produção de prova testemunhal requerida pelas partes, e da sentença de 06.07.2012, a fls. 176 a 187, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual movida contra o Município de Fafe e R…, S.A., e outras, para declaração de invalidade da deliberação da Câmara Municipal de Fafe, de 22.09.2011, que determinou a não adjudicação de serviços para o transporte escolar de alunos, posto a concurso, ao abrigo do artigo 79º, nº 1, al d) do Código dos Contratos Públicos.
Invocou para tanto e em síntese que: ocorreu nulidade processual decorrente de omissão de pronúncia sobre a invocada nulidade do despacho saneador; foi omitida produção de prova indispensável para a fixação de factos relevantes; foram desconsiderados factos relevantes controvertidos; finalmente, a sentença recorrida violou, entre outras normas, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, o disposto no artigo 79º, nº 1, al d) do Código dos Contratos Públicos, ao validar o acto impugnado que decidiu, com base neste preceito, não adjudicar o serviço posto a concurso.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer, a fls. 272-273, no sentido da improcedência do recurso.

*

Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

*

São estas as conclusões das alegações e que definem o objecto do recurso:
A - A nulidade do despacho saneador, arguido pela Recorrente não foi objecto de decisão pelo tribunal, ocorrendo, assim, e quanto à mesma, omissão de pronúncia.
B - A Recorrente apenas tomou conhecimento dessa omissão com a notificação da sentença ora recorrida.
C- Sendo, à vista disso, o presente recurso a sede própria para invocar e reagir contra a sobredita omissão de pronúncia.
D - Porquanto ficou a faltar a exposição completa dos factos que lhe servem de fundamento, como, também, a apreciação de facto essenciais para a boa decisão da causa.
E - Incumprido este requisito, volverá impraticável o uso, pelos tribunais superiores, dos seus poderes cassatórios e anulatórios.
F - A escolha da matéria de facto pelo tribunal a quo revela manifestas insuficiências, tendo sido preteridos factos determinantes para a justa resolução do conflito de interesses em questão.
G - Concretamente a matéria factual alegada nos artigos 10º a 17º da petição inicial é essencial à boa decisão da causa.
H - Através desses factos, tornar-se-iam claros os pressupostos da decisão de contratar e, concretamente, se, como, e em que medida tais premissas vieram a ser, expost circunstancialmente alteradas.
I - A decisão de contratar resultou da seguinte equação: necessidade de transporte especial escolar/inexistência de carreiras públicas apropriadas à satisfação de tais necessidades.
J - Em ordem a decidir, no plano da justiça material, a verificação da efectiva alteração destes pressupostos não basta a documentação constante dos autos.
L - Sendo imprescindível apreciar os factos alegados pela autora, sujeitando-os, para tanto, em pleno, à dinâmica da prova.
M - Sob pena de ocorrer, como efectivamente ocorreu, omissão de produção de prova.
N - Que conduziu à construção de uma decisão meramente formal, destituída de substância.
O - Verificou-se, assim, a omissão de uma formalidade que, claramente, veio a influir na decisão da causa, constituindo, por isso, uma nulidade prevista no art. 201. CPC.
P - A Recorrente ficou impossibilitada de poder demonstrar os factos que alegou e por consequência de igualmente provar a existência de vícios do acto administrativo.
Q - Violando, assim, o direito de acesso à prática e a tutela jurisdicional efectiva consagrada no artigo 20º da constituição.
R - Mormente, constituindo, no caso sujeito, a matéria probatória em questão, condição de procedência da pretensão da Recorrente.
S - Viola a CRP – artigo 20º - 1 a interpretação da norma dos artigos 87º-1- e 90º-1 CPTA no sentido de que inexistindo factos provados por confissão ou documentos não é permitida a abertura da fase instrutória.
T - O alegado acordo celebrado entre as empresas supra identificadas no artigo 40º não satisfaz, nunca poderia satisfazer, o pressuposto que obrigou ao lançamento do concurso.
U - Sendo certo que tal acordo estabeleceu, somente, um passe combinado de transporte multi-empresas para percursos já existentes à data do concurso.
V - Mas não cria, como era exigido pelo concurso em apreço, circuitos especiais dedicados, para alunos do ensino básico, que observem as regras do Regime Jurídico do Transporte Colectivo de Criança e Jovens (Lei nº 13/2006 – 17-04).
X - De resto a concessão de carreiras públicas é outorgada pelo IMTT nos termos do RTA (DL nº 37272 – 31.12.1948).
Z - A adjudicação torna-se uma verdadeira obrigação, após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas,
AA - Excepto se sobreviverem circunstâncias que, alterando os elementos de facto e de direito, justifiquem a não adjudicação.
AB - No caso sujeito, não houve qualquer alteração dos pressupostos da decisão de contratar.
AC - Em Julho 2011 inexistiam carreiras públicas que garantissem os transportes dos alunos do 1º Ciclo, havendo, por isso, necessidade de criar transporte especial com regras específicas, nomeadamente as enunciadas supra no art.61 das alegações.
AD - Tais carreiras foram posteriormente criadas para substituírem os lotes postos a concurso.
AE - Mormente não foram criadas as carreiras referidas na cl. 3ª do supra identificado acordo de transporte inter-empresas;
AF - Tal acordo pretendia transportar crianças do ensino básico em carreiras que lhes haviam sido outorgadas para transportar publico de passageiros em geral, sem as exigências do cumprimento das requisitos especiais impostos pela Lei nº 13/2006 – 17-04 (RJTCCJ).
AG - O sobredito acordo inter-empresas altera unilateralmente as condições da concessão que lhes foi outorgada,
AH – Alteração configurada designadamente na:
- exclusividade de acesso a alunos do 1º Ciclo;
- modificação dos preços dos passes mensais;
AI - Neste caso, o acordo em questão consubstancia uma verdadeira proposta apresentada ao concurso em apreço.
AJ - A qual foi submetida extemporaneamente e propondo um preço total mais elevado do que o da Recorrente.
AL - Pelo que a sua escolha viola o princípio da concorrência.
AM - Os fundamentos da não adjudicação têm que ser demonstrados pela Recorrida.
A decisão do tribunal a quo violou os preceitos dos artºs. 20º-1 a 4, 208º-1, CRP, 87º-1-c, 90º-1 CPTA, 264º-3, 515, 712º CPCivil, 79º-1-d) Cód. Contratos Públicos;
O Tribunal a quo devia ter interpretado as normas no sentido de:
- permitir a plena produção de prova requerida, considerando procedente a nulidade arguida;
- existência do vinculo de contratação por parte da Recorrida;
- considerar a proposta da recorrente a mais vantajosa;

*

A) O recurso do despacho saneador.
1. A nulidade processual decorrente da não apreciação da invocada nulidade deste despacho.
Invoca a este propósito a Recorrente que a nulidade do despacho saneador, arguida pela Recorrente, não foi objecto de decisão pelo tribunal, ocorrendo, assim, e quanto à mesma, omissão de pronúncia; ocorreu omissão de prova imprescindível apreciar os factos alegados pela autora o que conduziu à construção de uma decisão meramente formal, destituída de substância; verificou-se, assim, a omissão de uma formalidade que, claramente, veio a influir na decisão da causa, constituindo, por isso, uma nulidade prevista no artigo 201º Código de Processo Civil; a Recorrente ficou impossibilitada de poder demonstrar os factos que alegou e por consequência de igualmente provar a existência de vícios do acto administrativo violando-se, assim, o direito de acesso à prática e a tutela jurisdicional efectiva consagrada no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa; viola este preceito a interpretação da norma dos artigos 87º, n.º1, 90º, n.º1, Código Processo Tribunal Administrativo no sentido de que inexistindo factos provados por confissão ou documentos não é permitida a abertura da fase instrutória.
Vejamos.
No seu requerimento, a fls. 132, o ora Recorrente veio invocar que deveria ter sido produzida prova e, não o tendo sido, que foi cometida uma nulidade processual.
Sobre este requerimento nada foi dito.
E nada havia a dizer, em bom rigor.
Este requerimento, em termos substantivos, traduz a afirmação de uma discordância com o despacho onde se decidiu não produzir prova para além da documental já apresentada.
A discordância com o despacho saneador na parte em que indeferiu a produção de prova deve manifestar-se em recurso jurisdicional, o que, de resto, a Recorrente fez.
Por outro lado a resposta à questão suscitada no requerimento a fls. 132 já estava contida no próprio despacho saneador: não se mostrava necessário produzir prova para além da prova documental já apresentada pelas partes, dado que os factos essenciais resultavam já desta prova.
Afirmação que, como veremos, se mostra correcta, de resto.
Não se verifica, pois, a apontada nulidade processual.
2. A preterição de prova.
Alegou a Recorrente nesta parte que era relevante e essencial para a boa decisão da causa a matéria factual alegada nos artigos 10º a 17º da petição inicial sobre a qual se impunha produzir prova testemunhal; pelo que ocorreu omissão de produção de prova o que conduziu à construção de uma decisão meramente formal, destituída de substância, mostrando-se, assim, violado o direito de acesso à prática e a tutela jurisdicional efectiva consagrada no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa na interpretação da norma dos artigos 87º, n.º1, e artigo 90º, n.º1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no sentido de que a prova testemunha é facultativa e não é permitida a abertura de fase instrutória inexistindo factos provados por confissão ou por documentos.
Mas não tem razão quanto à necessidade de produção de prova para além da documental.
É o seguinte o teor dos artigos que refere:
“10.- Ora, é falso que desde 23/8/2011 tenham sido criadas carreiras públicas que substituíssem os lotes postos a concurso, nomeadamente com os percursos e horários expressamente estabelecidos no anexo II do caderno de encargos.
(…)
11.- Por se levantarem dúvidas quanto ao teor da notificação que lhe foi dirigida a Autora pediu a notificação dos seguintes elementos:
- plano de transportes escolares para este ano lectivo.
- despacho do Presidente da Câmara Municipal de Fafe de 25/7/2011 (decisão de contratar);
- deliberação camarária de 22/9/2011;
(…)
12.- Elementos estes que ainda não lhe foram notificados.
13.- No entanto, e apesar de não conhecer os motivos que levaram à alteração do pressuposto da decisão de contratar, a Autora pode, desde já, alegar que o acto impugnado (decisão de não adjudicação) viola o disposto no art. 79º/1/d do CCP.
14.- Dispõe esta norma que não há lugar adjudicação quando:
“d) circunstâncias supervenientes ao termo do prazo fixado para a apresentação das proposta, relativas aos pressupostos da decisão de contratar, o justifiquem”.
15.- Ora, a decisão de contratar teve como pressuposto a necessidade de transporte especial para os alunos do 1º ciclo e pré-escolar com regras próprias, nomeadamente:
- lotação dos autocarros entre 17 e 27 lugares;
- com lugares sentado e sistemas de retenção de crianças;
- motoristas com certificado emitido pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, conforme o disposto no art. 6º da lei 13/2006 de 17/4;
- necessidade de vigilantes;
- um percurso em que se preveja uma recolha próxima da habitação dos alunos (percorrendo várias localidades) até às respectivas escolas;
- cumprimento das normas da Lei nº 1372006 de 17/4.
16.- Para se substituir este tipo de transporte teriam que ter sido licenciados novos transportes públicos com percursos coincidentes com os do concurso público e que obedecessem às regras especiais do Regime Jurídico do Transporte Colectivo de Crianças e Jovens (Lei nº 13/2006, de 17/4).
O que não sucedeu.
17- Pelo que não estão preenchidos os requisitos legais para a decisão de não adjudicação”.
Desde logo, a primeira parte do artigo 10º onde se refere “é falso” trata-se de mera conclusão e não um facto susceptível de qualquer tipo de prova.
Apenas se mostra relevante, como matéria de facto, o que vem afirmado logo a seguir no artigo 10º, mas sob a forma positiva – que interessa ao Réu e Contra-Interessadas - e não na sua formulação negativa, assim como o que consta da parte final do artigo 16º (a negrito e sublinhado):
Desde 23/8/2011 foram criadas carreiras públicas que substituem os lotes postos a concurso, com os percursos e horários expressamente estabelecidos no anexo II do caderno de encargos.
Isto porque, como a própria Recorrente defende, trata-se de matéria cujo ónus da prova, nesta formulação positiva, cabia à Entidade Demandada e Contra-Interessados.
E cuja formulação negativa – do teórico interesse da Recorrente – nada acrescenta para o caso concreto, sendo absolutamente irrelevante para o desfecho do processo.
Relevante mostra-se, apenas, a prova – ou falta dela – daquele facto na sua formulação positiva.
Mas este facto – ou mais precisamente a falta de prova dele - resulta da leitura dos documentos juntos ao processo.
Não se vislumbra qualquer relevo ao que as testemunhas poderiam dizer sobre o circuito das carreiras, para além daquilo que os próprios documentos comprovam.
Quanto aos factos constantes dos artigos 11º e 12º prendem-se com a notificação ao ora Recorrente de elementos essenciais para atacar o acto impugnado.
Ora a notificação nada tem a ver com a validade do acto – e é esse o objecto do presente processo – mas é algo externo ao acto que apenas releva em sede da sua eficácia, e, designadamente, para o prazo de impugnação, questão que aqui não se suscita (ver, a propósito, entre muitos outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2005, processo n.º 0716/04).
No que respeita à matéria dos artigos 13º,14º, 16º, primeira parte, e 17º, trata-se de meras conclusões e alegações de direito; não se trata, portanto, de factos sobre os quais devesse ser produzida qualquer prova.
Finalmente o que consta do artigo 15 prova-se, tão-só, documentalmente e, de resto, deu-se como provado nos pontos 1 a 4 da matéria de facto alinhada na sentença, onde se deu por reproduzido o teor do anúncio do concurso, publicado em Diário da República e o caderno de encargos, em particular o anexo II onde se refere o tipo e modalidades de transporte posto a concurso.
Mostra-se, portanto, acertada a decisão de prescindir de prova testemunhal.
E não existe aqui qualquer violação do direito de acesso aos tribunais e de tutela jurisdicional efectiva, consagrada no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, na interpretação da norma dos artigos 87º, n.º1, e artigo 90º, n.º1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Estes preceitos apenas impõem a realização de “diligências de prova … necessárias para o apuramento da verdade” (citado artigo 90º).
A produção de provas desnecessárias não só não é imposta como é vedada pelo artigo 137º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
A prática de actos inúteis, como seja a produção de prova testemunhal dispensável no caso concreto, também não só não tem cobertura como está vedada pelo invocado preceito constitucional, o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa: o direito de acesso à Justiça e à tutela jurisdicional efectiva passa também por uma justiça célere e esta só é possível com a eliminação de actos inúteis, incluindo a produção de prova desnecessária.
Pelo que também este vício do despacho saneador se não verifica, improcedendo nesta parte o recurso.
B) O recurso da sentença.
1. A matéria de facto.
A Recorrente entende que, produzida a prova testemunhal que ofereceu, deveriam dar-se como provados os factos articulados sob os n.ºs 10º a 17º da petição inicial.
Mantém-se aqui o que se disse a propósito da alegada preterição de prova testemunhal: nenhum facto é aqui alegado de relevante e o que é relevante está provado documentalmente e foi alinhado na sentença.
Devemos, assim, ter por assentes os seguintes factos, considerados na sentença:
1-Por despacho do Presidente da Câmara Municipal de Fafe, de 25.07.2011, foi determinada a abertura de concurso público tendo em vista a aquisição de serviços para o transporte escolar de alunos para o ano lectivo de 2011/2012.
2-Pretendia-se que, no âmbito do transporte escolar, fossem realizados os circuitos identificados na cláusula 1ª do caderno de encargos e anexo II cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls17 a 26 e 466 a 469 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
3-Todos estes circuitos seriam realizados de segunda a sexta-feira, nos períodos de manhã e tarde – cfr. anexo II do caderno de encargos cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
4-O anúncio relativo a este procedimento foi publicado no DR a 11.08.2011 (anúncio nº 154/2011) - cfr. fls. 39 a 42 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
5-Foram apresentadas propostas até 23.08.2011 pelos contra-interessados e pela Autora.
6-A Autora apresentou uma proposta do circuito lote 1 - circuito 1 serviço regular especializado, ano lectivo 2011/2012, circuito Várzea Cova – EB1 Padre Joaquim Flores (Revelhe) -, pelo preço total de 28.906,00Euros, do circuito lote 2 pelo preço de 28.906,00 Euros, pelo circuito lote 3 pelo preço de 24.056,00 Euros e pelo circuito lote 4 pelo preço de 25.181,00 Euros e uma proposta variante para a realização da totalidade dos lotes pelo preço total de 96.344,10 Euros – cfr. fls. 52 a 96 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
7-A contra-interessada R..., SA apresentou uma proposta do circuito lote 1, pelo preço total de 25.684,41 Euros e do circuito lote 2 pelo preço total de 27.660,13 Euros – cfr. fls 342 a 389 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
8-A contra-interessada Auto V. …, Lda. apresentou uma proposta do circuito lote 3, pelo preço total de 25.025,84 Euros – cfr. fls 301 a 341 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
9-A contra-interessada AP. …, Lda. apresentou uma proposta do circuito lote 4, pelo preço total de 21.632,00 Euros – cfr. fls 172 a 300 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
10-A R..., SA, a AP. …, Lda. e a Auto V. …, Lda. celebraram “Acordo Constitutivo de Titulo Combinado de Transporte”, datado de 25 de Julho de 2011 – cfr. fls. 51 a 53 dos autos cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
11-A 24 de Agosto de 2011, o Júri procedeu à abertura das propostas apresentadas.
12-Em 25.08.2011, a empresa R…, SA, deu entrada na CM Fafe, a ofício, datado de 19.08.2011, comunicando a criação de um novo titulo combinado de transporte em parceria com as empresas AP. …, Lda. e Auto V. …, Lda., designado “Passe Estudante Sub /10, Fafe” – cfr. fls. 447 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
13-A 29.08.2011, reuniu o Júri do Procedimento e elaborou relatório preliminar onde, além do mais, propôs como intenção de adjudicação a aqui Autora, pelo valor da proposta variante de 96.344,10 Euros - cfr. fls. 452 a 454 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
14- A 02.09.2011, a empresa R…, SA remeteu via e-mail uma cópia do acordo constitutivo de titulo combinado de transportes nos termos do qual o passe mensal terá o preço de 72 Euros, com IVA, à taxa legal, incluído - cfr. fls. 448 a 451 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
15-Em 05.09.2011, foi elaborada informação relativa ao “passe estudante sub 10-Fafe - cfr. fls. 455 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
16-Em 07.09.2011, pelo Departamento Administrativo Municipal foi proferido parecer - cfr. fls. 456 a 460 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
17-A 12.09.2011 deu entrada nos serviços da CM Fafe cópia do acordo constitutivo de título combinado de transportes, nos termos do qual o passe mensal terá o preço de 72 Euros, com IVA, à taxa legal, incluído - cfr. fls. 461 a 465 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
18-A 14.09.2011, o Júri do Procedimento propôs a não adjudicação ao abrigo do disposto no art.º 79º, nº 1, al. d) do CCP - cfr. fls. 470 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
19-Em reunião ordinária de 22.09.2011, a C M Fafe deliberou aprovar por unanimidade a proposta do Júri- cfr. fls. 470 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
20- A 23.09.2011, foi a Autora notificada da deliberação da C.M. Fafe, datada de 22.09.2011, que determinava a não adjudicação, nos termos do art.º 79º, nº 1, al. d) do CCP com fundamento em “existência de uma modalidade que se reporta a transportes regulares de carreiras colectivas que integram os circuitos especiais, cumprindo com as condições de transporte especial, e enquadrável na aplicação do DL nº 299/28 que refere a obrigatoriedade de utilização de carreiras públicas”. – cfr. doc. nº 1 cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
21-A 30.09.2011, deu entrada na CM Fafe cópia do “Acordo Constitutivo de Título Combinado de Transportes”, datado de 25.07.2011, assinado pelos outorgantes, nos termos do qual o passe mensal terá o preço de 69,00 Euros, com IVA, à taxa legal, incluído - cfr. fls. 471 a 473 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
22-Em 04.11.2011, o Júri do Procedimento elaborou informação, dando conhecimento da versão final do Acordo - cfr. fls. 474 do PA cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
23-O Presidente da CMFafe determinou, a 11.11.2007, que fosse dado conhecimento à CMF.
24-As contra-interessadas R…, SA, a AP. …, Lda. e a Auto V. …, Lda. são titulares de concessões de serviço público no Município de Fafe.
25-A petição inicial relativa à presente acção foi entregue, neste tribunal, a 24.10.2011.
2. O enquadramento jurídico.
Previamente cabe referir o seguinte:
A Recorrente termina as suas conclusões nestes termos:
“O Tribunal a quo devia ter interpretado as normas no sentido de:
- permitir a plena produção de prova requerida, considerando procedente a nulidade arguida;
- existência do vínculo de contratação por parte da Recorrida;
- considerar a proposta da recorrente a mais vantajosa;”
Ora o Tribunal recorrido nunca poderia decidir no sentido pretendido nos dois últimos parágrafos, de reconhecer a existência de um vínculo de contratação e de considerar a proposta da Recorrente como a mais vantajosa.
Pela simples razão de que o Tribunal está tematicamente vinculado à causa de pedir e ao pedido deduzido – alíneas d) e e) do n.º 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto nos artigos 1º e 140º, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
E no caso concreto o pedido deduzido (com manifesto lapso de escrita, de resto) é o de simples anulação do acto impugnado.
Em consonância, apenas são invocados como causa de pedir factos que traduzem ilegalidades cometidas no acto. Não são invocados factos dos quais se possa concluir que a única solução possível por parte da Entidade Recorrida seria a de adjudicar o serviço à ora Recorrente.
Pelo que se deverá respeitar esses limites objectivos do processo, das ilegalidades do acto e do pedido de impugnação.
Posto isto:
2.1. A violação do disposto no artigo 79º, n.º1, alínea d), do Código dos Contratos Públicos.
Invoca a recorrente a este propósito que: o alegado acordo celebrado entre as empresas identificadas no artigo 40º do articulado inicial não satisfaz, nunca poderia satisfazer, o pressuposto que obrigou ao lançamento do concurso; tal acordo estabeleceu, somente, um passe combinado de transporte multi-empresas para percursos já existentes à data do concurso mas não cria, como era exigido pelo concurso em apreço, circuitos especiais dedicados, para alunos do ensino básico, que observem as regras do Regime Jurídico do Transporte Colectivo de Criança e Jovens (Lei nº 13/2006 – 17-04); a concessão de carreiras públicas é outorgada pelo IMTT nos termos do RTA (DL nº 37272 – 31.12.1948); a adjudicação torna-se uma verdadeira obrigação, após o termo do prazo fixado para a apresentação das propostas; no caso concreto não houve qualquer alteração dos pressupostos da decisão de contratar; em Julho 2011 inexistiam carreiras públicas que garantissem os transportes dos alunos do 1º Ciclo, havendo, por isso, necessidade de criar transporte especial com regras específicas; o referido acordo pretendia transportar crianças do ensino básico em carreiras que lhes haviam sido outorgadas para transportar público de passageiros em geral, sem as exigências do cumprimento dos requisitos especiais impostos pela Lei nº 13/2006 – 17-04 (RJTCCJ).
Vejamos.
Importa transcrever o teor do anúncio a que alude o ponto da matéria de facto, o anúncio n.º 4091/2011 de 11.08.2011, publicado no DR II Série, n.º 154:
“(…)
MODELO DE ANÚNCIO DO CONCURSO PÚBLICO
1 - IDENTIFICAÇÃO E CONTACTOS DA ENTIDADE ADJUDICANTE
NIF e designação da entidade adjudicante:
506841561 - Município de Fafe
506841561 - Município de Fafe
Endereço: Av.ª 5 de Outubro
Código postal: 4824 501
Localidade: Fafe
Telefone: 00351 253700400
Fax: 00351 253700409
Endereço Electrónico: geral@cm-fafe.pt
2 - OBJECTO DO CONTRATO
Designação do contrato: Concurso Público por lotes, para contratação de prestação de serviços de transporte escolar de alunos para o ano lectivo 2011/2012 - Serviço Regular Especializado - Circuitos 1,2,3 e 4.
Tipo de Contrato: Aquisição de Serviços
Valor do preço base do procedimento 134557.00 EUR
Classificação CPV (Vocabulário Comum para os Contratos Públicos)
Objecto principal
Vocabulário principal: 60130000
3 - INDICAÇÕES ADICIONAIS
O concurso destina-se à celebração de um acordo quadro: Não
O concurso destina-se à instituição de um sistema de aquisição dinâmico: Não
É utilizado um leilão electrónico: Não
É adoptada uma fase de negociação: Não
4 - ADMISSIBILIDADE DA APRESENTAÇÃO DE PROPOSTAS VARIANTES: Sim
5 - DIVISÃO EM LOTES, SE FOR O CASO
Lote n.º 1
Designação do lote: CIRCUITO 1 Serviço Regular Especializado - Ano Lectivo 2011/2012 - Circuito Várzea Cova - EBI Padre Joaquim Flores (Revelhe);
Descrição sucinta do objecto do lote: Transporte escolar Várzea Cova - Bastelo - Aboim - Lagoa - Gontim - Pedraído - EBI Padre Joaquim Flores;
Preço base do lote: 36661.00 EUR
Classificação CPV (Vocabulário Comum para os Contratos Públicos)
Objecto principal
Vocabulário principal: 60130000
Lote n.º 2
Designação do lote: CIRCUITO 2 Serviço Regular Especializado - Ano Lectivo 2011/2012 - Circuito Luilhas (S. Miguel do Monte) - EBI Padre Joaquim Flores (Revelhe);
Descrição sucinta do objecto do lote: Transporte escolar Luilhas (S. Miguel do Monte) - Igreja (Queimadela) - Cruzamento para St.ª Cruz (Queimadela) - Cheda (Queimadela) - Cruzamento de Felgueiras - Ameixedo (Queimadela) - EBI Padre Joaquim Flores;
Preço base do lote: 36661.00 EUR
Classificação CPV (Vocabulário Comum para os Contratos Públicos)
Objecto principal
Vocabulário principal: 60130000
Lote n.º 3
Designação do lote: CIRCUITO 3 Serviço Regular Especializado - Ano Lectivo 2011/2012 - Circuito Arnozela - EBI Silvares
Descrição sucinta do objecto do lote: Transporte escolar Arnozela - Ardegão - EBI Silvares;
Preço base do lote: 29294.00 EUR
Classificação CPV (Vocabulário Comum para os Contratos Públicos)
Objecto principal
Vocabulário principal: 60130000
Lote n.º 4
Designação do lote: CIRCUITO 4 Serviço Regular Especializado - Ano Lectivo 2011/2012 - Circuito Portela - EB1 / JI Ferreiros (Arões São Romão);
Descrição sucinta do objecto do lote: Transporte escolar Capela de Sto. Antão (Rua José Dias de Castro) - Estrada Nacional 206 - Rua do Picadouro - Rua do Assento - EB1 / JI Ferreiros;
Preço base do lote: 31941.00 EUR
Classificação CPV (Vocabulário Comum para os Contratos Públicos)
Objecto principal
Vocabulário principal: 60130000
6 - LOCAL DA EXECUÇÃO DO CONTRATO
Concelho de Fafe
País: PORTUGAL
Distrito: Braga
Concelho: Fafe
Código NUTS: PT113
7 - PRAZO DE EXECUÇÃO DO CONTRATO
Restantes contratos
Prazo contratual de 169 dias a contar da celebração do contrato
9 - ACESSO ÀS PEÇAS DO CONCURSO E APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS
9.1 - Consulta das peças do concurso
Designação do serviço da entidade adjudicante onde se encontram disponíveis as peças do concurso para consulta dos interessados: Departamento de Gestão de Recursos Humanos e Educação (DGRHE)
Endereço desse serviço: Av.ª 5 de Outubro
Código postal: 4824 501
Localidade: Fafe
Telefone: 00351 253700400
Fax: 00351 253700409
Endereço Electrónico: escolas@cm-fafe.pt
9.2 - Meio electrónico de fornecimento das peças do concurso e de apresentação das propostas
Plataforma electrónica utilizada pela entidade adjudicante: http://www.vortalgov.pt
10 - PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS OU DAS VERSÕES INICIAIS DAS PROPOSTAS SEMPRE QUE SE TRATE DE UM SISTEMA DE AQUISIÇÃO DINÂMICO
Até às 24 : 00 do 12 º dia a contar da data de envio do presente anúncio
11 - PRAZO DURANTE O QUAL OS CONCORRENTES SÃO OBRIGADOS A MANTER AS RESPECTIVAS PROPOSTAS
66 dias a contar do termo do prazo para a apresentação das propostas
12 - CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO
Mais baixo preço
13 - DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO: Sim
14 - IDENTIFICAÇÃO E CONTACTOS DO ÓRGÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO
Designação: Presidente da Câmara Municipal de Fafe
Endereço: Av.ª 5 de Outubro
Código postal: 4824 501
Localidade: Fafe
Telefone: 00351 253700400
Fax: 00351 253700409
Endereço Electrónico: geral@cm-fafe.pt
15 - DATA DE ENVIO DO ANÚNCIO PARA PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO DA REPÚBLICA
2011/08/11
16 - O PROCEDIMENTO A QUE ESTE ANÚNCIO DIZ RESPEITO TAMBÉM É PUBLICITADO NO JORNAL OFICIAL DA UNIÃO EUROPEIA: Não
17 - OUTRAS INFORMAÇÕES
Regime de contratação: DL nº 18/2008, de 29.01
18 - IDENTIFICAÇÃO DO AUTOR DO ANÚNCIO
Nome: José Manuel Martins Ribeiro
Cargo: Presidente da Câmara Municipal de Fafe.
(…)”
Olhemos agora para o disposto na invocada alínea d) do n.º 1do artigo 79º do Código dos Contratos Públicos:
Aqui se dispõe que não há lugar a adjudicação, entre outras hipóteses, quando “Circunstâncias supervenientes ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, relativas aos pressupostos da decisão de contratar, o justifiquem”.
Como referem os autores deste Código, Sérvulo Correia & Associados, no seu Manual de Procedimentos – Contratação Pública de Bens e Serviços (do início do procedimento à formação do contrato), ed. 2008, páginas 43 a 46, “a consagração de um dever legal de adjudicar assenta na lógica de que a entidade adjudicante, quando inicia um procedimento pré-contratual, dando dele conhecimento ao mercado (através de convite ou de anúncio), fica vinculada a essa espécie de “oferta ao público”, não podendo, em nome do princípio da boa -fé, defraudar as expectativas legítimas de contratar que suscitou junto dos operadores económicos”. E, mais adiante, “como contrapartida deste dever, os concorrentes têm o direito de recorrer a uma acção administrativa especial de condenação à prática do acto devido para obrigar a entidade adjudicante a tomar a decisão de adjudicação, caso se encontre ultrapassado o prazo legal de manutenção das propostas”.
E João Henrique Pinheiro, em “Âmbito de aplicação do Código de Contratos Públicos e normas comuns de adjudicação”, CEDIPRE OnLine 5, Fevereiro 2012, página 123, “esta causa de não adjudicação quando invocada pela entidade adjudicante, impõe um dever especial de fundamentação da decisão de não adjudicação; Deverão ser enunciados e justificados não apenas os motivos da imprevisibilidade das alterações verificadas, como a sua repercussão em aspectos fundamentais da contratação em curso”, entendimento que se colhe da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 02.06.2005, processo n.º C-394 /02, caso Comissão vs. Grécia).
No caso concreto não houve inércia da Administração mas um acto expresso de não adjudicação e daí a adequação do presente meio processual, de impugnação.
Assim, como se refere na sentença recorrida, o artigo 79º do Código dos Contratos Públicos consagra verdadeiras causas de justificação para a decisão de não adjudicação – que determina a revogação da decisão de contratar, nos termos do artigo 80º, nº 1, do mesmo diploma -, fundadas em razões de interesse público e sem as quais o acto impugnado seria ilegal por violação do princípio da boa-fé, na espécie tutela da confiança (artigo 6º-A do Código de Procedimento Administrativo).
Vejamos por isso se se verificam ou não “circunstâncias supervenientes … que o justifiquem”.
Em matéria de transporte escolar e respectivos concursos, o regime legal previsto é aquele que se mostra definido pelo Decreto-Lei n.º 299/84, de 05.09, e pela Portaria n.º 766/84.
Este regime não foi revogado pelo novo regime jurídico em matéria de transporte colectivo de crianças introduzido pela Lei n.º 13/2006,de 17.04, com excepção do n.º 2 do artigo 12º, expressamente revogado pelo artigo 27ºda nova Lei.
Determina o artigo 6º do Decreto-Lei n.º 299/84, sob a epígrafe “Meio de transporte a utilizar”:
1-Na efectivação do transporte da população escolar serão utilizados, em princípio, os meios de transporte colectivo (rodoviário, ferroviário ou fluvial) que sirvam os locais dos estabelecimentos de ensino e de residência dos alunos, nos termos dos artigos 11º a 14° deste diploma.
2-Para os efeitos referidos no número anterior, serão considerados os meios de transporte colectivo cujos terminais ou pontos de paragem se situem a distância não superior a 3 km da residência dos alunos ou do estabelecimento de ensino e, bem assim, os que não obriguem os estudantes a tempos de espera superiores a 45 minutos, ou a tempos de deslocação superiores a 60 minutos, em cada viagem simples.
3-Sempre que os meios de transporte colectivo não preencham as condições fixadas nos números anteriores ou, preenchendo-as, não satisfaçam regularmente as necessidades do transporte escolar no que se refere quer ao cumprimento dos horários quer à realização dos desdobramentos que se revelem necessários, poderão ser utilizados veículos em regime de aluguer ou de propriedade dos municípios para a realização de circuitos especiais, de acordo com o disposto nos artigos 15.°a 17.º”
Por seu turno, determina o artigo 15º deste diploma:
“1-Os circuitos especiais podem ser efectuados directamente pelos municípios através de veículos próprios ou adjudicados mediante concurso.
2-O concurso a que se refere o número anterior será promovido pelas câmaras municipais até ao dia 20 de Abril e reger-se-á por normas específicas, a fixar em portaria dos Ministérios da Administração Interna e do Equipamento Social, ouvida a Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
(…)
4-Os veículos utilizados na realização dos circuitos especiais deverão estar identificados nos termos da Portaria n ° 324/82, de 25 de Março, com a redacção que lhe foi dada pela Portaria n ° 475/83, de 22 de Abril.”
No caso concreto, a decisão de não adjudicação fundou-se no facto de a aqui contra-interessada R…, SA - após o prazo de aceitação de candidaturas no âmbito do concurso para transportes escolares (circuitos especiais) – ter comunicado à Câmara Municipal de Fafe a criação de um novo título de transporte (passe estudante sub/10), em parceria com as também aqui contra-interessadas empresas AP. … e Auto V. ….
A questão que se coloca desde logo é a de saber se este acordo cobre as necessidades de transporte que se pretendiam satisfazer com o concurso em causa, ou seja, se o objecto de um e de outro são coincidentes.
Antes de mais importa referir que o ónus da prova da existência de uma causa justificativa para a não adjudicação cabe à entidade demandada.
Estamos perante um acto de conteúdo positivo, o acto que põe revoga a anterior decisão de contratar.
Ora, como nos diz Mário Aroso de Almeida, nos Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 20, p. 48-49:
“… há que distinguir, nesta matéria, consoante o acto impugnado é um acto de conteúdo positivo, que exprime uma posição da Administração cujos fundamentos a ela cumpre demonstrar pela positiva ou, pelo contrário, é um acto de conteúdo negativo, que se limita a refutar uma pretensão que tinha sido apresentada pelo particular.
Pois consoante se trate de um ou de outro caso, assim se diferenciam as posições em que as partes se encontram colocadas no quadro da relação subjacente ao recurso.
Comecemos, pois, pela hipótese, estruturalmente mais simples, do recurso de impugnação de um acto de conteúdo positivo. É neste domínio que as partes figuram no recurso em posições invertidas em relação àquelas que lhes pertencem no quadro da relação jurídica substantiva.
(…)
Ora, esta diferença de natureza substantiva deve, a nosso ver, projectar-se no plano da definição das regras de decisão com base nas quais o tribunal deve decidir nas situações em que nenhuma conclusão clara tiver resultado de toda a prova reunida em favor de qualquer das partes.
a) Assim, se o recorrente alegar o não preenchimento dos pressupostos do acto, deve recair sobre a Administração o risco da falta de prova da respectiva verificação.”
No mesmo sentido se pronunciou Vieira de Andrade, em “A Justiça Administrativa”, p. 271.
E, citando esta doutrina, chegou-se à mesma conclusão nos Acórdãos deste Tribunal Central Administrativo Norte de 07.12.2004, no recurso 00105/04, de 13.01.2011, processo n.º 02258/05.0BEPRT, de 01.04.2011, processo n.º 461/08.0BEPRT, e de 15.04.2011, no processo n.º 00338/06.3BEMDL.
Sucede que da matéria de facto provada não resulta que o objecto posto a concurso seja coincidente com o objecto do acordo celebrado.
O objecto posto a concurso foi o de transporte especial para os alunos do 1º ciclo e pré-escolar.
Este transporte tem regras próprias, as que resultam da Lei n.º 13/2006, de 17.4, em particular:
- motoristas idóneos e com certificado emitido pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres – artigos 6º e 7º;
- necessidade de vigilantes – artigo 8º;
- lotação dos autocarros – artigo 10º;
- lugares de sentado e sistemas de retenção de crianças – artigo 11º;
E também a exigência do citado artigo 6º do Decreto-Lei n.º 299/84:
- um percurso em que se preveja uma recolha próxima da habitação dos alunos e com um período máximo de espera.
Ora do acordo celebrado verifica-se que não são cumpridas integralmente estas exigências.
Apenas se refere, de forma equívoca, que “garante o direito a lugar sentado, em autocarros que respeitem a Lei n.º 13/2006, de 17 de Abril, com excepção do n.º 2 do artigo 8º; em cada autocarro deverá ser assegurada a presença de um acompanhante”.
Foram aliás, as próprias empresas que celebraram o contrato, em 25.07.2011 – fazendo fé no teor do documento particular feito pelas próprias e reproduzido a fls. 51-53 e no ponto 12 dos factos provados –, que assumiram implicitamente que este acordo não cobria as necessidades que se pretendiam satisfazer com a adjudicação em causa, dado que também se apresentaram ao concurso, aberto por aviso de 11.08.2011, com propostas que satisfaziam as exigências do concurso e não referiram logo a celebração desse acordo.
Só se lembraram de o referir depois de conhecidas todas as propostas.
Ou seja, jogando em dois tabuleiros, o da concessão e o do concurso, as empresas que celebraram o acordo em causa estavam em vantagem em relação às demais empresas concorrentes.
E objectivamente usaram essa vantagem para pôr cobro ao concurso, certamente considerando mais vantajoso o uso da concessão ou prevendo não ganhar o concurso.
O que contraria as regras da boa-fé.
Em conclusão, ao contrário do decidido, o acto de não adjudicação não se mostra justificado por circunstância superveniente ao termo do prazo fixado para a apresentação das propostas, antes se mostra objectivamente fundado em circunstâncias contrárias aos ditames da boa-fé.
Termos em que, desde logo, se verifica a apontada violação do artigo 79º, nº 1, al. d) do Código dos Contratos Públicos.
2.2. A violação do princípio da concorrência.
Alega a Recorrente neste capítulo que: o acordo em causa, celebrado entre empresas concorrentes, altera unilateralmente as condições da concessão que lhes foi outorgada e consubstancia uma verdadeira proposta apresentada ao concurso em apreço apresentada extemporaneamente e propondo um preço total mais elevado do que o da Recorrente, pelo que a sua escolha viola o princípio da concorrência.
E também aqui tem razão.
Não estando aqui em causa o contrato de concessão, teremos de nos centrar apenas no acto de não adjudicação.
O princípio da concorrência encontra-se consagrado, entre outros, nos artigos 1º, n.º4, e 16º, ambos do Código dos Contratos Públicos.
Como refere Rodrigo Esteves de Oliveira em “Os princípios gerais da contratação pública, nos Estudos de Contratação Pública”, Tomo I, CEDIPRE, Coimbra Editora, 2008, página 66, «o princípio da concorrência é actualmente a trave-mestra da contratação pública».
Sendo uma trave mestra da contratação pública, não se aplica apenas aos procedimentos dentro do próprio concurso mas também, e por maioria de razão, à decisão de adjudicar ou não adjudicar.
O princípio da concorrência visa, além de outros objectivos, a escolha da melhor solução para uma determinada necessidade pública. Ora esta necessidade melhor se satisfaz com a submissão a concurso do que com a entrega a um concessionário preterindo o concurso.
E no caso concreto é manifesta, em nosso entender, a violação deste princípio.
Embora o acordo seja um facto exterior ao concurso não lhe é alheio, como se reconhece na decisão recorrida.
Mas não apenas não é alheio como teve repercussão directa e imediata no concurso.
Desde logo é um acordo celebrado entre candidatos ao concurso em apreço.
E serviu de fundamento à revogação da decisão de contratar, favorecendo objectivamente as empresas que celebraram o acordo em detrimento dos demais candidatos.
Assim, também ao contrário do decidido, se tem por verificada a violação do princípio da concorrência.
Ainda que tal não se considerasse, sempre o princípio do “favor” do procedimento, dos concorrentes e das propostas, impunha a decisão de contratar no caso concreto.
Como sustenta Rodrigo Esteves de Oliveira, obra citada, página 113: “Se valores jurídicos fundamentais – como o da concorrência, da transparência, da imparcialidade e da igualdade – não funcionarem, é dizer, não impuserem a anulação do acto da entidade adjudicante ou dos actos dos concorrentes, então deve dar-se primazia aos valores sócio – administrativos inerentes à abertura do procedimento e aos sacrifícios e incómodos, muitas vezes desmesurados, que apresentar uma candidatura ou proposta envolve”.

*

Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso jurisdicional, pelo que:
A) Revogam a sentença recorrida;
B) Anulam o acto impugnado, de não adjudicação, por violação do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 79º do Código dos Contratos Públicos, e do princípio da concorrência.

*

Porto, 19 de Outubro de 2012
Ass. Rogério Martins
Ass. João Beato de Sousa
Ass. Antero Salvador

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