terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

ASSINATURA DO CONTRATO - CADUCIDADE DA ADJUDICAÇÃO



Proc. Nº 09258/12     18.10.2012    TCAS


I- Não estando a minuta do contrato assinada nos termos convencionados, com a assinatura dos dois gerentes que vinculavam o Adjudicatário como «O Segundo Outorgante, não pode considerar-se o contrato como devidamente outorgado e por isso válido e eficaz.
II-Persistindo o adjudicatário na não correcção do erro, é aplicável o 105º, n.º1 e 2 do CCP, implicando a não outorga do contrato a caducidade da adjudicação

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul
Vem interposto recurso da decisão do TAF de Beja que julgou improcedente a acção de contencioso pré-contratual, através do qual se impugna a deliberação de 02.02.2012 e os actos posteriores, designadamente o acto de adjudicação à empresa B..., Construções, Lda, proferidos no âmbito do procedimento de concurso público de empreitada de «Construção das BNovas Instalações Oficinais na ZIR».
Em alegações são formuladas pelo Recorrente as seguintes conclusões: «A) Deve ser alterado Facto Provado I) no sentido de o mesmo passar a ter a seguinte redacção: «Em 2001-09-08. a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato à A., para esta promover o reconhecimento das assinaturas do Senhor C...e da senhora D...na qualidade e com poderes para o acto.»
B) Com efeito, do ofício que acompanhou o segundo exemplar do contrato (documento 3 junto à PI e do de fls.372 do PA), nada mais resulta a não ser isto (designadamente, não resulta que o novo exemplar tivesse sido enviado para que a A. o assinasse correctamente), o que é confirmado pelo teor da PI.
C) Deve ainda ser aditado à matéria provada o seguinte facto: «P) A Entidade Demandada não devolveu à A. o contrato a que se refere a alínea H, por esta assinado e remetido àquela em 2011- 08-30.»
D) Este facto foi alegado pela A. na sua PI e não foi contrariado pelo R ..
E) Quanto à assinatura dos legais representantes da A. é apenas verdade que uma das assinaturas de um dos seus legais representantes foi aposta, por lapso manifesto, no local errado, mas tal facto, na verdade, em nada interfere com a vinculação da A. ao contrato, tanto mais que, da própria leitura do contrato, designadamente da identificação dos primeiro e segundo contraentes, resulta que o senhor Manuel Monteiro assina como legal representante da A. e não da entidade Demandada.
F) Pelo que a A. cumpriu assim o seu dever: quando notificada pelo R. para assinar o contrato, assinou-o e devolveu-o a este.
G) O R. é que, sabe-se agora, não terá cumprido o seu dever, já que, pelos vistos, não assinou o contrato, facto a que a A. é completamente alheia, não podendo ser prejudicada por isso.
H) Ora, em face disto, o novo envio de um contrato em branco para os representantes legais da A. assinarem na qualidade e com poderes para o acto, sem concessão de qualquer prazo para o efeito, e sem qualquer outra explicação, não pode ser entendido, como o tribunal fez, como um novo convite para a celebração do contrato, pois o contrato já havia sido validamente assinado por dois dos representantes da A. e já os vinculava.
I) O contrato estava, por conseguinte, assinado pela A. e em condições de a vincular e de produzir os seus efeitos.
J) É, neste contexto, por conseguinte, que tem de ser interpretada a carta da A. a que se refere a alínea K) da matéria provada.
K) Se bem atendermos no seu conteúdo, verificamos, desde logo, que a mesma se traduz numa mera proposta de "rescisão amigável" e não numa declaração efectiva de rescisão e que tal proposta parte do pressuposto de que o contrato foi efectivamente celebrado entre as partes, que ele existe e que é válido e eficaz (na verdade, o contrato foi assinado pela A. e remetido para o R. cabendo a este assiná-lo, sendo que, se o não fez, tal só a ele é imputável).
L) A conclusão do tribunal de que a HA., entretanto, inequivocamente" demonstrou "a perda do seu interesse em contratar" (.-l, "tanto mais que convidada a suprir a omissão, a A. não só não regularizou as assinaturas, como sobretudo propôs a rescisão" não é correcta e assenta em pressupostos que não são verdadeiros.
M) Em primeiro lugar, porque não se pode "perder o interesse em contratar' de algo que já está contratado.
N) Em segundo lugar, porque não se pode concluir inequivocamente que alguém perdeu o interesse em contratar com base numa carta que essa pessoa remete à outra, contendo uma mera proposta para uma rescisão amigável de um contrato que a pessoa está convencida de que até foi validamente celebrado.
O) Proposta à qual o Município, se agisse de boa fé, deveria ter respondido, dizendo à A. se aceitava rescindir amigavelmente o contrato ou não.
P) Sendo certo que, caso rejeitasse a proposta da A., esta proposta não produziria qualquer efeito.
Q) Na verdade, uma qualquer proposta para ter efeito tem de ser aceite, como é óbvio.
R) Mas o Município não fez nem uma nem outra coisa, tendo, ao arrepio dos mais elementares princípios da boa fé e apesar de ele próprio não ter assinado o contrato, decidido, sem mais, declarar a caducidade da adjudicação.
S) Face ao exposto. a deliberação de caducidade da adjudicação é, por conseguinte. manifestamente ilegal.
T) Desde logo, porque carece de norma habilitante, não se enquadrando no disposto do artigo 105° do CCP: a A. assinou o contrato que lhe foi remetido, além de que o pedido de reconhecimento de assinatura na qualidade e com poderes para o acto, desacompanhado de qualquer outra informação, não tinha o mínimo de fundamento.
U) Acresce que, não tendo sido concedido à A. qualquer prazo para o efeito e não tendo o R. respondido à proposta de rescisão amigável do contrato formulado pela A., sempre ficaria por demonstrar que tal falta (a verificar-se) fosse imputável à A.
V) Para além de que tal acto se traduziu. manifestamente. numa revogação implícita de um acto válido constitutivo de direitos. o acto de adjudicação praticado a favor da A. em 30/06/2011, com violação do art.140°, n.? 1, alínea b), do CPA
W) Mas mesmo que assim não fosse, sempre a aludida deliberação de declaração da caducidade da adjudicação padeceria do vício de violação de lei por inobservância do dever de promoção do direito de audiência prévia, nos termos do artigo 100° do CPA, e por violação de lei por violação dos princípios da proporcionalidade (Artigo 5°/2 do CPA) e da boa fé (artigo 6°-A do CPA), o que comporta a sua anulabilidade.
X) Ilegalidade esta e vícios que foram pela A. invocados na sua PI, e sobre os quais o tribunal não se pronunciou, por ter entendido estar prejudicado pela decisão tomada.
Y) Ora, não podemos aceitar tal entendimento, tanto mais que, tendo em conta tudo o exposto na Petição Inicial e os documentos constantes do autos, impunha-se ao tribunal pronunciar-se sobres todos esses vícios invocados.
Z) Não o tendo feito, incorreu a douta sentença na nulidade prevista na alínea d) do n.º1 do artigo 6680 do CPC, que aqui, desde já, se invoca.
AA) Decidindo, como decidiu, violou o Exmo. Juiz, designadamente, o disposto nos artigos 668°/1 alínea d) do CC, 105°/1 do CCP, 6°, 6°·A e 100° do CPA. ».
O Recorrido Município de Santiago de Cacém (MSC) as contra alegações formulou as seguintes conclusões: «A - Inexiste contrato, porque a recorrente não o assinou devidamente e instada para suprir a irregularidade, se recusou a a fazê-lo.
S - Houve, deste modo, recusa de outorga de contrato, cuja cominação é, nos termos do art. 105° do CCP, a caducidade da adjudicação, com todas as consequências legais.
C - Tendo julgado, e bem, que a declaração de caducidade da adjudicação à recorrente a a adjudicação ao segundo classificado no concurso respectivo observou a lei, está prejudicada a apreciação dos demais vícios invocados pela recorrente.
D- Pelo que, também, neste particular, a douta sentença não merece qualquer censura e deve ser mantida.
E- Mesmo que assim não fosse, o que só se admite por facilidade de raciocínio e sem transigir, os vícios invocados seriam improcedentes.
F - O R. fez audiência oral à A. , previamente à deliberação posta em crise ( v. acta da reunião de 21/12/2012), sendo certo que o art. 103° nº 1 alínea a) dispensaria a audiência da recorrente, porquanto a decisão em causa era urgente, porque urgente era a obra objecto do contrato de empreitada posto a concurso (Alíneas A) ,8) e C) da matéria assente)
G - O recorrido relacionou-se e agiu com a recorrente, com total e absoluta boa-fé, tendo sido aquela que, ao contrário, foi desleal para com a entidade pública demandada, defraudando a legítima expectativa desta de ver a obra pública realizada em tempo, e causando directa e necessariamente prejuízos ao interesse público, pelo que, a haver violação do art. 6° A do CPA, teria sido a recorrente a praticar essa infracção.
H - A decisão da recorrente não violou o art. 5° do CPA não foi desproporcionada aos prejuízos que a recorrente lhe causou.
I - Ao " abdicar do contrato", não realizando a obra, a recorrente renunciou ao direito que a deliberação de adjudicação do contrato lhe conferiu, pelo que a deliberação de caducidade daquela adjudicação não poderia ter violado o art. 140° nº1 alínea b) do CPA.
J - A douta sentença recorrida julgou bem , interpretou e aplicou correctamente o direito e não merece qualquer censura. »
Por despacho de fls. 207 foi sustentada a decisão.
A DMMP não emitiu pronúncia.
Sem vistos, vem o processo à conferência.
Os Factos
Na 1º instância foram dados por provados os seguintes factos:
«A) A desadequação das actuais instalações da oficina de carpintaria da CÂMARA MUNICIPAL DE SANTIAGO DO CACÉM - situadas em zona habitacional da cidade, em edifício degradado - obrigou a Entidade Demandada a encontrar soluções para a deslocação daquela oficina para a ZIL de Santiago do Cacém: cfr. Doc. N.º1 junto com a Oposição;
B) Em 2010-06-08, a Entidade Demandada contraiu um empréstimo bancário, sob a forma de abertura de crédito, com o BPI, destinado a financiar a execução de diversos investimentos, entre os quais "Instalações municipais (novas instalações oficinais na ZIL de Santiago do Cacém) até ao montante de EUR 300 000 (trezentos mil euros): cfr. Doc. N.º 2 junto com a Oposição;
C) Tal empréstimo terá de ser utilizado no prazo de 2 anos, a contar da obtenção do visto do Tribunal de Contas, o que sucedeu em 2010-08-19: cfr. Doc. N..º2 junto com a Oposição;
D) Em 2011-03-11, a Entidade Demandada abriu concurso público para a empreitada de obra pública designada de "Construção das Novas Instalações Oficinais na ZIL": cfr. anúncio publicado no D.R. nº 50, II Série;
E) A esse concurso apresentaram-se vários concorrentes, entre os quais a A e a Contra-interessada;
F) Em 2011-06-30, face ao critério do mais baixo preço, foi deliberado, em reunião de Câmara, adjudicar a aludida empreitada à A, ficando a Contrainteressada ordenada em segundo lugar: cfr. PA;
G) A A apresentou os documentos de habilitação e prestou caução de € 11 335,53: cfr. PA;
J) A A. fica vinculada com a assinatura de dois gerentes: cfr. Doc. n.º 4 junto com a PI;
K) Em 2011-11-15, a A. remeteu à Entidade Demandada carta, salientando e propondo que: " ... devido ao facto de nos encontrarmos numa situação financeira bastante difícil somos a propor a vossas Excelências uma rescisão amigável do contrato da obra em epígrafe. A nossa proposta visa não criar nenhuma situação que seja constrangedora para ambas as partes, as dificuldades de tesouraria que atravessamos não nos permitiam concretizar o trabalho em tempo útil, assim sendo, preferimos abdicar do contrato e não vos causar nenhuma situação bastante desagradável ... ": cfr. Doc. n.º 5 junto com a PI;
L) Em 2011-12-21, realizou-se entre a A. e a Entidade Demandada uma reunião com vista ao cabal esclarecimento do assunto acima melhor identificado: por acordo;
M) Deliberação impugnada:
Em 2012-02-02, a Entidade Demandada deliberou declarar a caducidade de adjudicação deliberada em 2011-06-30 e adjudicar a execução da empreitada de obra pública designada de "Construção das Novas Instalações Oficinais na ZIL" à Contra-interessada, que apresentou a proposta classificada em lugar subsequente, de acordo com o constante no Relatório Final de análise de propostas, pelo montante global de 285.584,93€, a que acrescerá o IVA à taxa legal em vigor: cfr. Doc. n.º 7 junto com a PI;
N) Em 2012-02-08, foi a A. notificada de que: " ... após vários contactos e tentativas no sentido de se celebrar o contrato que titularia a execução da referida empreitada foi por vós declinada assinatura do mesmo tendo por base a difícil situação económica e financeira com que essa Sociedade Comercial se debate (. . .) declarada a caducidade da adjudicação do dia 30 de Junho de 2011, de acordo com o previsto no n.º1 do artigo 105 do Código dos Contratos Públicos. Mais, se informa que, conforme o disposto no nº 2 do dito art°105° do CCP, foi considerada perdida a favor do Município a caução prestada através da Garantia bancária n00342.004095.993n o montante de 11.335,53€ (onze mil trezentos e trinta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos), emitida pela Caixa Geral de Depósitos ... ": cfr. Doc. n. º 6 junto com a PI;
O) EM 2009-09-03, deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja a presente acção: cfr. fls. 1 do SITAF. »
Nos termos do artigo 712º, n.º 1, alíneas a) e b), do CPC, são alterados os factos I) e H), passando a ser dados por assentes, por provados, os seguintes factos:
I) Em 2011-09-08, a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato à A, constando do correspondente ofício que tal envio visava o seguinte: «a fim de que se dignem promover que : 1 – Seja efectuado o reconhecimento da assinatura do Senhor C...e da Senhora D..., na qualidade e com poderes para o acto. 3 – Seja tudo devolvido a estes Serviços, após o cumprimento dos pontos anteriores» (cf. doc. de fls. 24)
H) Em 2011-08-12, a A recepcionou o contrato enviado pela Entidade Demandada e devolveu-o, em 2011-08-30, com a assinatura de um dos representantes da A, aposta no lugar da assinatura do Presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém: cfr. fls. 366 do PA; Doc. n.º 1 e Doc. n.º 2 juntos com a PI.



O Direito
Da nulidade da decisão recorrida
Nas conclusões v) a aa) das alegações do recurso, o Recorrente vem arguir a nulidade da decisão sindicada, por ter sido julgada válida a deliberação da caducidade da adjudicação e consequentemente considerado prejudicado o conhecimento dos restantes vícios arguidos pelo Recorrente.
É jurisprudência pacífica que só ocorre a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 668, n.º1, alínea d), do CPC, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, que são todas as que lhe forem submetidas e que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras (cf. artigo 660º, nº 2, do CPC). Deve o juiz apreciar as questões respeitantes ao pedido e à causa de pedir, e ainda, os argumentos, as razões ou fundamentos invocados pelas partes para sustentarem a sua causa de pedir. Mas só a falta absoluta de fundamentação gera a nulidade da decisão.
A decisão sindicada não padece de falta absoluta de fundamentação. Nela foi julgada válida a deliberação da caducidade da adjudicação, o que justificou dar-se por prejudicado o conhecimento dos restantes questões. Tal não se reconduz a qualquer nulidade, mas a uma decorrência lógica face ao decidido, relativamente ao qual o Recorrente discorda dos seus termos. Por conseguinte, falece a invocada nulidade da decisão.
Do recurso à matéria de facto
Alega o Recorrente nas conclusões a) a e) das alegações de recurso, erro na fixação da matéria de facto.
Diz o Recorrente que deve ser alterado o facto provado em I) no sentido de o mesmo passar a ter a seguinte redacção: «Em 2001-09-08. a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato à A., para esta promover o reconhecimento das assinaturas do Senhor C...e da senhora D...na qualidade e com poderes para o acto.».
Na sentença recorrida tal facto foi provado nos seguintes termos: «I) Em 2011-09-08, a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato à A, para esta o assinar correctamente e reconhecer as assinaturas na qualidade e com poderes para o acto: cfr. fls. 372 do PA; e Doc. n.º 3 junto com a PI; »
Compulsados os autos, verifica-se, que tal como é defendido pelo ora Recorrente, o indicado documento de fls. 24 (o doc. n.º 3 junto com a PI), não refere que a Entidade Demandada tivesse enviado um novo exemplar do contrato à A, para esta o «assinar correctamente e reconhecer as assinaturas na qualidade e com poderes para o acto». Diferentemente, do teor desse ofício apenas consta que é enviado tal contrato indicando-se o seguinte: «a fim de que se dignem promover que : 1 – Seja efectuado o reconhecimento da assinatura do Senhor C...e da Senhora D..., na qualidade e com poderes para o acto. 3 – Seja tudo devolvido a estes Serviços, após o cumprimento dos pontos anteriores».
Porém, na PI, no artigo 6º, o A. e ora Recorrente alegou o seguinte: «Por ofício datado de 8/09/2011, o R. solicitou à A. (…) que as assinaturas dos representantes legais da A. (Manuel Monteiro e Zélia Canau), fossem reconhecidas na qualidade e com poderes para o acto, conforme ofício que junta como DOC. 3».
A esta alegação do A. correspondeu a impugnação constante dos artigos 18º, 19º e 20º da contestação, na qual o R. e Recorrido diz que combinou com o A. o envio de novo exemplar do contrato «para que a A. o assinasse devidamente» e que a Câmara «inutilizou o exemplar devolvido pela A. com assinaturas incorrectamente apostas» e que foi enviado o oficio em questão «à A. para esta o assinar correctamente e reconhecer as assinaturas na qualidade e com poderes para o acto».
Ou seja, alegado o facto em apreço pelo A., no artigo 6º da PI, é o mesmo expressamente impugnado pelo R. nos artigos 18º, 19º e 20º da contestação. E na decisão sindicada, com base na prova documental junta aos autos – o indicado oficio – é dada por assente, por provada, a matéria factual nos moldes em que é alegada pelo R. e Recorrido.
Como decorre do acima transcrito, o facto I) corresponde ao alegado pelo R. e não coincide com o teor preciso do documento de fls. 24, para o qual remete.
Nestes autos discute-se a assinatura correcta, ou não, do contrato e suas consequências jurídicas.
Logo, face às alegações das partes não poderia ser assente o facto I) nos moldes alegados pelo R. – não totalmente coincidentes com a alegação do A. – e de forma também não correspondente com o teor do documento que suporta a prova do facto.
Por conseguinte, tem razão o A. e Recorrente quando alega erro na fixação da matéria de facto, mas apenas pelo facto I) não corresponder na íntegra ao teor do doc. de fls. 24, único facto provado.
Nessa medida, foi alterado o facto I) que passou a ter a seguinte redacção: «I) Em 2011-09-08, a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato à A, constando do correspondente ofício que tal envio visava o seguinte: «a fim de que se dignem promover que : 1 – Seja efectuado o reconhecimento da assinatura do Senhor C...e da Senhora D..., na qualidade e com poderes para o acto. 3 – Seja tudo devolvido a estes Serviços, após o cumprimento dos pontos anteriores» (cf. doc. de fls. 24)
Impugna ainda o Recorrente a matéria de facto, clamando pelo aditamento à matéria assente do seguinte facto: «P) A Entidade Demandada não devolveu à A. o contrato a que se refere a alínea H, por esta assinado e remetido àquela em 2011- 08-30.». Diz o Recorrente que este facto foi alegado pelo A. na sua PI e não foi contrariado pelo R.
Verificada a PI, porém, não vem tal facto alegado pelo ora Recorrente. Nos artigos 5. a 8 da PI o ora Recorrente diz que remeteu em 24.08.2011 o contrato «devidamente assinado», com cópia como doc. 2 e que o Município o «não juntou» ao oficio de 08.09.2011. O R. nos artigos 21º, 22º e 24º a 31º da contestação impugna a realidade que o A. aduziu nos artigos 5 a 7 da PI e afirma que é falso o indicado no artigo 8º da PI.
Assim, o facto que o A. e Recorrente quer ver assente foi impugnado pelo R.
Acresce, que este facto é contraditado pelo próprio A. na PI, nos artigos 6., 9 e 10, quando discute a validade da assinatura do contrato.
Tal é também a questão em litígio nos autos.
Logo, é errado pretender-se dar-se como facto assente um facto impugnado pela contraparte, que “resolve” parte do litígio de direito, ao afirmar conclusivamente que o contrato foi remetido «assinado». O facto que se quer ver provado também não decorre dos docs. de fls. 19 a 23 da PI (docs. juntos como n..ºs 1 e 2).
Ou seja, falece a alegação do Recorrente relativa a este erro na fixação da matéria de facto.
Não obstante não proceder tal alegação, ter-se-á, no entanto, que alterar a alínea H) dos factos assentes da sentença recorrida quando se refere «indevidamente». Esta qualificação de «indevida» não é um facto, mas uma conclusão que se retira da circunstância de uma das assinaturas ter sido feita «no lugar da assinatura do Presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém». É, portanto, matéria conclusiva ou de direito, que não há que constar nos factos.
Motivos porque se alterou a matéria assente em H).
Do mérito do recurso
Alega o Recorrente nas conclusões e) a u) do recurso que a decisão recorrida errou porque existiu um lapso na aposição no contrato da assinatura de um dos seus representantes, mas tal lapso é irrelevante, devendo considerar-se que o contrato foi validamente assinado pelos representantes da A., que assim se vinculou. A carta referida em K) deve, portanto, ser entendida como uma rescisão amigável do contrato eficaz porque validamente assinado e não como uma declaração de rescisão. Considera o Recorrente que, por isso, é ilegal a declaração de caducidade da adjudicação. Porque havia um contrato válido e eficaz, a caducidade não se pode enquadrar no artigo 105º do CCP. Consequentemente, diz o Recorrente que a declaração de caducidade da adjudicação constitui a revogação implícita de um acto válido constitutivo de direitos, que não foi precedida de audiência prévia e viola os princípios da proporcionalidade e da boa fé.
Conforme resulta dos factos provados, foi adjudicada ao ora Recorrente a empreitada posta a concurso. Assim, foi enviado o correspondente contrato pelo Recorrido ao A. e Recorrente, que após ter o ter recebido, devolveu-o, com a assinatura de um dos representantes do A, aposta no lugar da assinatura do Presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém. Porque tal assinatura figurava no local errado, e portanto havia sido indevidamente aposta, em 08.09.2011, a Entidade Demandada enviou um novo exemplar do contrato ao A, constando do correspondente ofício que tal envio visava o seguinte: «a fim de que se dignem promover que : 1 – Seja efectuado o reconhecimento da assinatura do Senhor C...e da Senhora D..., na qualidade e com poderes para o acto. 3 – Seja tudo devolvido a estes Serviços, após o cumprimento dos pontos anteriores».
Ora, o Recorrente, em vez corrigir o erro em que antes incorrera, apondo a assinatura dos dois gerentes, no local devido, em 15.11.2011 enviou ao Recorrido uma carta «propondo» «uma rescisão amigável do contrato da obra em epígrafe».
Na sequência desta carta, o Recorrido, enviou ao Recorrente o ofício de 08.03.2012, no qual diz que «após vários contactos e tentativas no sentido de se celebrar o contrato que titularia a execução da referida empreitada foi por vós declinada assinatura do mesmo tendo por base a difícil situação económica e financeira com que essa Sociedade Comercial se debate (. . .) declarada a caducidade da adjudicação do dia 30 de Junho de 2011, de acordo com o previsto no n.º1 do artigo 105 do Código dos Contratos Públicos». E por deliberação de 02.02.2012, o Recorrido declarou a «caducidade de adjudicação deliberada em 2011-06-30 e adjudicar a execução da empreitada de obra pública designada de "Construção das Novas Instalações Oficinais na ZIL" à Contra-interessada, que apresentou a proposta classificada em lugar subsequente».
Com este enquadramento fáctico facilmente se conclui que a assinatura do contrato pelo ora Recorrente não foi válida e eficaz. O Recorrente vinculava-se com a assinatura de dois gerentes. Logo, haveriam os mesmos que assinar como «segundo outorgante», para a sociedade se vincular correcta e validamente (vide contrato de fls. 20 a 24). Terá sido cometido um lapso ao apor-se uma assinatura no local indicado como sendo a assinatura do «primeiro outorgante», que era o Município. O Recorrido solicitou ao Recorrente a correcção do lapso, para que o contrato passasse a ficar validamente assinado, remetendo-lhe novo exemplar. O Recorrente não corrigiu o alegado lapso, não assinou correcta, valida e eficazmente o contrato, e em vez disso enviou a carta de 15.11.2011 «propondo» «uma rescisão amigável do contrato da obra em epígrafe».
Conforme decorre do artigo 104º, n.º1, do CCP, a outorga do contrato deve ter lugar no prazo de 30 dias após a aceitação da minuta do contrato ou da decisão sobre a reclamação, caso esta tenha existido (cf. também o n.º 3). Por aplicação do artigo 105º, n.º1 e 2, do CCP, se por razões imputáveis ao adjudicatário o contrato não for outorgado, por este não comparecer na data e local indicados, a adjudicação caduca. Ora, este mesmo preceito deve ser aplicado ao caso dos autos, relativamente aos quais se verificou que a outorga do contrato, de forma válida e eficaz, não teve data e local marcado, mas foi feita por recurso ao envio por correio.
No caso em apreço, conclui-se, que a minuta do contrato inicial não foi correctamente assinada por razões unicamente imputáveis ao adjudicatário. Foi-lhe então pedido pela entidade adjudicante que corrigisse o erro. Para tal, foi-lhe enviada nova minuta, para ser validamente assinada. Mas o adjudicatário não assinou o novo contrato de forma válida, e em vez disso, veio propor ulteriormente rescisão do contrato (ainda não assinado de forma válida). Ora, sem dúvida que este enquadramento é subsumível na previsão do artigo 105º, n.º1 e 2 do CCP. Haverá que considerar-se que no caso sub judice o contrato não foi outorgado por razões imputáveis ao adjudicatário, implicando essa não outorga a caducidade da adjudicação.
Quanto à alegação do Recorrente relativa a não lhe ter sido indicado um prazo para proceder à correcção da assinatura e devolução do contrato assinado, irreleva, porquanto já lhe tendo sido anteriormente apresentada pela entidade adjudicante a minuta do contrato, para a sua outorga, só se pode entender o envio da 2º minuta como uma “facilidade” concedida pelo Recorrido, visando o suprimento da falha inicial. Consequentemente, o suprimento do erro, com a outorga desta segunda minuta, de forma correcta e eficaz, deveria ter sido feita prontamente, ou seja, o mais rapidamente possível. Acresce, que dos autos resulta que o Recorrente nunca assinou validamente a segunda minuta.
O contrato em apreço apresenta-se como um negócio solene, formal, tendo sido convencionado pelas partes deste “negócio” que teria a forma escrita, com o teor que consta do documento de fls. 20 a 23. Por conseguinte, para que a vontade de contratar se manifestasse adequadamente e o contrato se tornasse eficaz, teria de ser assinado pelas partes contratantes da forma convencionada como correcta, ou seja, teria o Recorrente que assinar por baixo da indicação «O Segundo Outorgante», devendo assinar conforme se vinculava, isto é, com a assinatura dos dois gerentes (cf. também artigos 106º, 278º, 279º, 280º, 283º, 284º, 285º, 287º do CCP e artigos 220º, 222º, n.º1, 223º, n.º1 e 224º, do CC).
Não estando a minuta do contrato assinada nos termos convencionados, com a assinatura dos dois gerentes que vinculavam o Recorrente como «O Segundo Outorgante, não poderia considerar-se o contrato como devidamente outorgado e por isso válido e eficaz.
Por conseguinte, quando em 15.11.2011 o Recorrente enviou a carta ao Recorrido «propondo» «uma rescisão amigável do contrato da obra em epígrafe», não havia ainda um contrato válido e eficaz que pudesse ser rescindido.
Consequentemente, tal como se referiu na decisão recorrida, com aquela carta o Recorrente terá «inequivocamente, demonstrado a perca do interesse a contratar» e que se impõe «a conclusão de que a falta de assinatura do contrato de empreitada traduz-se, no caso, numa formalidade ad substanciam, cuja falta determina, efectivamente, a caducidade da adjudicação, por não poder degradar-se em mera irregularidade».
Na verdade, aliada a conduta omissiva do Recorrente com a manifestação de não querer prosseguir com o contrato, há que concluir pela perda de interesse a contratar. Em consequência, mesmo que se pudesse considerar que o erro na assinatura da 1º minuta era uma formalidade não essencial e que não invalidava a contratação por ainda poder ser corrigida (nomeadamente com a assinatura correcta da segunda minuta do contrato), sempre haveria, também, de entender-se a declaração do ora Recorrente no sentido de não querer prosseguir com o contrato como uma intenção de não querer proceder ao aproveitamento do negócio convencionado, com a correspondente correcção da assinatura. Dito de outro modo, porque declarou não ter interesse em contratar, o Recorrente também não teria interesse em sanar a formalidade em falta, para que assim tornasse o contrato perfeito e eficaz e pudesse prosseguir com a sua subsequente execução.
A outorga nos termos convencionados do contrato, teria de seguir a tramitação prevista no CCP e ali determina-se a caducidade da adjudicação se por facto imputável ao adjudicatário o contrato não for outorgado – cf. artigo 105º do CCP. E não se exige nessa tramitação que se proceda à audiência prévia a essa declaração.
Pelo exposto, não padece a deliberação impugnada das invalidades que lhe são assacadas pelo Recorrente. A declaração de caducidade é enquadrável no artigo 105º do CCP e não revoga implicitamente nenhum anterior acto válido constitutivo de direitos, ou feriu o direito de audiência prévia ou ofende os princípios da proporcionalidade e da boa fé, porquanto não havia sido celebrado anteriormente, de forma válida e eficaz, qualquer contrato.
Improcede, assim, in totum, o presente recurso.
Pelo exposto, acordam em:
a) Negar provimento ao recurso, mantendo a decisão proferida.
b) Condenar o Recorrente nas custas.

Lisboa, 18/10/2012
(Sofia David)

(Carlos Araújo)

(Teresa de Sousa

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