quinta-feira, 14 de julho de 2016

CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL - EXCLUSÃO DAS PROPOSTAS - ARTIGO 70º/2/G) CCP



 Proc. Nº 12542/15    TCASul     26  Nov  2015

 I - O recurso interposto das decisões sobre o mérito da causa proferidas ao abrigo do artigo 121º do CPTA, tem efeito meramente devolutivo.
II - O facto de duas concorrentes ao mesmo procedimento concursal apresentarem os mesmos sócios e gerentes não traduz, por si só, falseamento das regras da concorrência; é perante as circunstâncias concretas do caso que terá de se avaliar se tal sucedeu.

 ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

RELATÓRIO

………………………………………………….., SA instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa providência cautelar relativa a procedimento de formação de contratos contra o MUNICÍPIO DE LISBOA, pedindo ao Tribunal que “ordene a adjudicação provisória da proposta [por si apresentada] no âmbito do “Concurso Público para o Estabelecimento de um Acordo Quadro para a Aquisição de Serviços de Manutenção e de Trabalhos de Reabilitação de Espaços Verdes” (Processo n.º 31/DMSC/DA/2011)”.
Indicou como contra-interessados:
1.º - ………………………………………….., Lda;
2.º - ……………………………………………, Lda;
3.º - ………………………………………………, Unipessoal;
4.º - ……………………………………, SL - Sucursal em Portugal;
5º - ……………………………………………., Lda;
6.º - …………………………, SA;
7.º - ………………………………………………., SA;
8.º - …………………….., SA;
9º - ………………………………………….., Lda;
10.º - …………………………………………….., Lda;
11.º - …………………………………………………….., Lda;
12.º - ……………………………………………………., SA.

Por despacho de 26/01/2015, o TAC de Lisboa decidiu, nos termos do disposto no artigo 121º, n.º 1 do CPTA, antecipar o juízo sobre a causa principal, a acção de contencioso pré-contratual, na qual foram formulados os seguintes pedidos: (i) anulação do acto de adjudicação das propostas apresentadas pelas contra-interessadas ………………………………… e ……………………., (ii) a condenação do réu a excluir as referidas propostas, (iii) a condenação do réu a adjudicar a proposta apresentada pela autora e (iv) a anulação do Acordo Quadro celebrado entre o réu e as referidas contra-interessadas.

Na mesma data, o TAC de Lisboa proferiu decisão, que julgou a acção de contencioso pré-contratual “totalmente procedente, declarando-se a anulação dos actos de adjudicação e dos contratos celebrados com as contra-interessadas, condenando-se o R. na prática dos actos de exclusão das propostas das contra-interessadas e de adjudicação da proposta da A.”.

O réu e as contra-interessadas ……………………………………, Lda e …………………………………, Lda interpuseram recurso da referida sentença.

As alegações apresentadas pelo réu culminam com as seguintes conclusões:
“I - Não é minimamente perceptível qual foi afinal o fundamento que, no entender da MM Juíza a quo, deveria ter determinado a exclusão das propostas apresentada pelas contra-interessadas. Qual a alínea do n.º 2 do artigo 70.º ou do n.º 2 do artigo 1.46.", ambos do CCP, que constitui fundamento da exclusão das propostas? Alínea que teria, portanto, sido violada pelo acto de adjudicação ora impugnado.
II - O disposto na alínea j) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP nada tem a ver com o argumento de não exclusão das propostas não se ter atingido a finalidade do concurso público, porque de acordo com esta norma, o motivo da exclusão reside na circunstância da proposta dar origem à celebração de um contrato ilegal.
III - A douta Sentença posta em crise, padece de flagrante incongruência ao invocar jurisprudência que se baseia em legislação já revogada (cfr. alínea b) do n.º 1 do artigo 57.º do Decreto-Lei n.º 197/99,de 8 de junho), e que encontra paralelo, não na alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, mas na alínea g) do mesmo n.º 2, que a sentença acabara de afirmar não se aplicar ao caso presente.”

Por seu lado, as contra-interessadas formulam as seguintes conclusões nas alegações de recurso que apresentaram:
“1.ª - A questão nuclear que se coloca no presente recurso jurisdicional é a de saber a lei ou o programa do concurso aqui em causa (destinado à celebração de um Acordo Quadro) determinam a exclusão de duas propostas apresentadas a esse concurso por dois concorrentes que estejam entre si em relação de grupo ou de domínio;
2.ª - A douta sentença ora recorrida respondeu afirmativamente a esta questão, parecendo, porém, que considerou relevante para esse efeito o pressuposto de as propostas serem rigorosamente iguais e estarem assinadas electronicamente por um dos sócios gerentes de ambas as sociedades;
3.ª - Ora, ao decidir nesse sentido, a sentença recorrida não fez uma correta interpretação do direito aplicável, pois nada na lei ou no programa do concurso determina que aquelas propostas devam ser excluídas;
4.ª - E a conclusão anterior mantém-se válida qualquer eu seja o grau ou a intensidade do conhecimento ou da influência que cada um dos concorrentes teve sobre o outro na elaboração da respectiva proposta; isto é, mesmo que o conteúdo das duas propostas seja o resultado inequívoco de uma intencional concertação entre os dois concorrentes;
5.ª - Importa reconhecer, antes do mais, que a sentença recorrida não merece qualquer censura na parte em que, refutando a alegação da Autora, considerou que a apresentação de duas propostas por duas distintas sociedades que estão entre si numa relação de grupo ou de domínio, não viola o disposto no n.º 7 do artigo 59.º do Código dos Contratos Públicos (CCP);
6.ª - Porém, a decisão impetrada merece toda a censura quando conclui que, não obstante a conclusão anterior, existia motivo de exclusão daquelas duas propostas;
7.ª - Sucede desde logo que, da leitura da sentença recorrida, não é claro qual seja, no entender da Meritíssima juíza, o fundamento jurídico para a exclusão das propostas apresentadas pelas ora Recorrentes: a alínea f) ou a alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP?;
8.ª - Se por um lado parece rejeitar a aplicação da alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP em virtude de este preceito determinar uma remissão para a norma constante do artigo 4.º da Lei da Concorrência (Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, vigente ao tempo dos factos) que descreve práticas proibidas – norma que, como sempre sustentaram as Recorrentes, não se lhes pode aplicar ao caso presente justamente por serem uma única unidade económica – , aplicando então a alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
9.ª - Por outro lado, a mesma sentença respalda-se largamente no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 1 de Junho de 2006, (proferido no processo n.º 01126/05), que concluiu, ainda que ao abrigo da anterior legislação da contratação pública (cfr. n.º 1 do artigo 53.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho), que devem ser excluídas duas propostas apresentadas por dois concorrentes que têm os mesmos sócios e gerentes, na medida em que tal se traduz numa prática restritiva da concorrência;
10.ª - Seja como for, no caso sub judice, atentos os factos dados como provados, nem a alínea f) nem a alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCPconstituem base legal para determinar a exclusão das propostas que foram apresentadas pelas ora Recorrentes;
11.ª - Como aliás também não constituiria essa base legal a mera invocação do princípio da concorrência;
12.ª - Embora a sentença recorrida considere que os factos se subsumem “à ilegalidade prevista na alínea f) do n.º 2 do art.º 70.º do CCP”, isto é, que a adjudicação daquelas duas propostas conduziria à celebração de um contrato – no caso o Acordo Quadro para a Aquisição de Serviços de Manutenção e de Trabalhos de Reabilitação de Espaços Verdes do município de Lisboa – em violação de vinculações legais ou regulamentares aplicáveis (pois é essa a previsão da norma), em parte alguma a sentença recorrida indica quais seriam as normas legais ou regulamentares que sairiam violadas;
13.ª - E não indica porque, muito simplesmente, não ocorre a previsão da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
14.ª - A circunstância de a finalidade do concurso ser a de adjudicar 10 propostas, não é posta em causa por terem sido adjudicadas estas duas propostas;
15.ª - É que, na perspectiva da contratação pública, tal como se chegou à conclusão que cada um destas duas concorrentes (pessoas colectiva societárias) apresentou uma única proposta – não violando, portanto, o n.º 7 do artigo 59.º do CCP – impõe-se concluir também que o Acordo Quadro foi celebrado com dez diferentes prestadores de serviços (dez diferentes sociedades), em resultado da maior vantajosidade das suas próprias propostas relativamente a todas as demais;
16.ª - A circunstância de aquelas duas propostas terem igual conteúdo é, neste plano, totalmente irrelevante, porque, ao contrário do que afirma a sentença recorrida, a finalidade do procedimento concursal não é a adjudicação de 10 propostas diferentes, mas sim é a de celebração de um contrato (o Acordo Quadro) com dez prestadores de serviços;
17.ª - E mesmo numa visão mais abrangente da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP segundo a qual a exclusão das propostas também deve ocorrer nos casos em que a entidade adjudicante tenha a certeza objectiva de que as prestações do contrato a celebrar, tal como foram configuradas na proposta a que o concorrente se vinculou irrevogavelmente, não podem ser executadas sem que o adjudicatário incorra numa ilegalidade, a verdade é que não se vislumbra em que é que a específica execução do Acordo Quadro por banda das ora Recorrentes implica necessariamente um desrespeito de vinculações legais ou regulamentares «aplicáveis» a essa execução;
18.ª - Com efeito, não pode concluir-se que o estrito cumprimento das obrigações contratuais que nascem para estes adjudicatários (pelo conteúdo das respectivas propostas) com a celebração do Acordo Quadro implica inexoravelmente alguma ilegalidade;
19.ª - Ao decidir que a exclusão das propostas se impunha por força da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, a douta sentença recorrida fez uma errada interpretação e aplicação desta norma;
20.ª - No que se refere à aparente aplicação, ao caso dos autos, da alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP (aplicação implícita pela invocação do Acórdão do STA de 1 de Junho de 2006), a douta sentença recorrida merece também total censura;
21.ª - Em primeiro lugar, porque a “doutrina” que a sentença recorrida pretende retirar daquele Acórdão do STA de 2006 não é, verdadeiramente, do STA;
22.ª - Com efeito, o STA transcreve a sentença da primeira instância que, na parte em que concluiu que a apresentação de duas propostas por duas sociedades do mesmo grupo económico constitui a “modalidade extrema” das práticas restritivas da concorrência, não foi objecto de recurso jurisdicional, pelo que o Supremo Tribunal Administrativo não pôde sobre ela pronunciar-se;
23.ª - O recurso a que o STA foi chamado a pronunciar-se dizia apenas respeito à questão do alegado conluio entre todos os concorrentes (que eram três), o que nada tinha a ver com a apresentação das propostas pelos dois concorrentes ligados entre si por relações de grupo ou de domínio;
24.ª - Além disso, aquela pretensa “doutrina” do STA ficou claramente ultrapassada – em sentido contrário – pela que consta do Acórdão do mesmo STA, de 11 de Janeiro de 2011, proferido no processo n.º 0851/10 em que este, lapidarmente concluiu que “não é proibida, só por si, a participação simultânea num mesmo procedimento adjudicatório, com propostas autónomas, de empresas que se encontram entre si numa relação de domínio ou de grupo”;
25ª - Esta última jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo teve, desde logo, o mérito de recordar que o disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP passa unicamente pela interpretação (e aplicação) do artigo 4.º da Lei n.º 18/2003 (Lei da Concorrência então vigente), que estabelece quais são as práticas proibidas às empresas, em nome da defesa da concorrência;
26.ª – Assim, para que as propostas apresentadas pelas ora Recorrentes pudessem ser excluídas com fundamento na alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP – como parece afinal pretender também a douta sentença recorrida – seria necessário que aquele artigo 4.º da Lei da Concorrência se aplicasse ao caso da apresentação de propostas por concorrentes que estão entre si em relações de grupo ou de domínio;
27.ª - Ora – e este é o ponto essencial para a dilucidação da questão que se discute no presente recurso jurisdicional – os acordos (a concertação) de práticas restritivas da concorrência só pode dar-se «entre empresas», como estabelece o n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 18/2003;
28.ª - Ou seja, para a Lei da Concorrência, o tipo legal constante do corpo do n.º 1 do seu artigo 4.º, à semelhança, aliás, do que sucede na norma correspondente do n.º 1 do artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) (e que foi anteriormente o artigo 85.º do Tratado CEE), só se preenche se se verificar, entre outros, o seguinte elemento: estar-se perante duas ou mais empresas;
29.ª - Sucede que como explicam tanto o Tribunal de Justiça da União Europeia, como a Comissão Europeia, como a generalidade das autoridades de defesa da concorrência e a doutrina, a noção de empresa relevante para efeitos do direito da concorrência não corresponde à noção de pessoa jurídica, seja singular ou colectiva; por isso que duas pessoas jurídicas podem ser uma única e mesma empresa, para efeitos da aplicação do direito da concorrência;
30.ª - Em conformidade, o disposto no n.º 2 do artigo 2.º da Lei da Concorrência, estabelece que «considera-se como uma única empresa o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, constituem uma unidade económica ou que mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes dos direitos ou poderes enumerados no n.º 1 do artigo 10.º»;
31.ª - Estando provado nos autos que as ora Recorrentes ………………………. e ………………………….. têm os mesmos sócios, então, para o direito da concorrência, quer nacional quer europeu, este conjunto de duas pessoas jurídicas distintas constitui uma única empresa, pois este conjunto constitui uma unidade económica;
32.ª - Efectivamente, as suas relações caracterizam-se pela falta de independência, pela existência de um poder de controlo único e simultâneo sobre uma e sobre a outra, fruto da participação total no capital social de ambas as sociedades pelas mesmas pessoas;
33.ª - Em suma: para o direito da concorrência, as ora Recorrentes são, indiscutivelmente, uma única empresa;
34.ª - E assim sendo – como de facto é - se estamos perante uma única empresa, e não duas empresas, então o disposto no n.º 1 daquele artigo 4.º não pode ser convocado para aferir se a prática concertada destas duas concorrentes na apresentação das respectivas propostas a um concurso público consistiu, nalguma medida, numa prática restritiva, falseadora ou limitadora da concorrência;
35.ª - E a conclusão anterior permanece intocável qualquer que seja a concreta actuação concertada desses concorrentes (isto é, mesmo que seja mais do que evidente a identidade da estrutura formal e gráfica das respectivas propostas, a rigorosa igualdade dos preços apresentados, a completa e simultânea reprodução das mesmas condições contratuais, incluindo as mesmas gralhas ou os mesmos erros de ortografia…; em suma, ainda que seja mais do que evidente – seja certeza, mesmo! – que houve intencional combinação dos preços e dos restantes atributos das propostas);
36.ª - Todos esses actos, acordos ou concertações – porque praticas no seio de operadores económicos ligados por relações de grupo ou de domínio –, não são proibidos pelo disposto no artigo 4.º da Lei n.º 18/2003;
37.ª - E aliás o que resulta inequivocamente da abundante jurisprudência do Tribunal de Justiça citada nas presentes alegações: ponto 134 do Acórdão de 14 de Julho de 1972, proc. C-48/69 (ICI/Comissão; ponto 41 do Acórdão de 31 de Outubro de 1974 – proc. C-15/74 (Sterling Drug); ponto 19 do Acórdão de 4 de maio de 1988 – proc C-30/87 (Bodson); ponto 35 do Acórdão de 11 de Abril de 1989 – proc. C-66/86 (Ahmed Saeed Flugreisen); pontos 51 e 54 do Acórdão de 24 de Outubro de 1996 – proc C-73/95 (ponto 35 do Acórdão de 11 de Abril de 1989 – proc. C-66/86 (Ahmed Saeed Flugreisen);
38.ª - Em suma e em conclusão: como as sociedades ora Recorrentes (enquanto concorrentes ao concurso público em causa) atuam como uma unidade económica, o artigo 4.º da Lei da Concorrência de 2003 (correspondente ao artigo 101.° do TFUE que era o antigo artigo 85.º do Tratado CEE) não poderá ser aplicado;
39.ª - Pois se fosse, a prática por elas adoptada no concurso aqui em causa constituiria contraordenação prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º da Lei n.º 18/2003, de 11 de Junho, o que determinaria, inclusive, a necessidade de participação oficiosa dos factos nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 24.º da mesma Lei;
40.ª - A conclusão de que não pode haver práticas restritivas da concorrência, nos termos do artigo 4.º da Lei n.º 18/2003, no comportamento recíproco das entidades integrantes de um grupo económico que se apresentam simultaneamente ao mesmo procedimento concursal – não é posta em causa pelo teor do já célebre Acórdão Assitur do Tribunal de Justiça ou do Acórdão do STA de 11 de Janeiro de 2011 (proc. n.º 0851/10);
41.ª - Quando tais arestos admitem a possibilidade de estas propostas serem, ainda assim, excluídas quando as circunstâncias concretas da actuação destes concorrentes revelarem algum falseamento da concorrência, isso só pode significar a aplicação do disposto na Lei da Concorrência em matéria de abuso de posição dominante (artigo 6.º da Lei n.º 18/2003 e artigo 102.º do TFUE, antigo artigo 86.º do Tratado CEE) ou de abuso de dependência económica (artigo 7.º da Lei n.º 18/2003);
42.ª - Todavia, os factos dados como provados no caso sub judice nada permitem concluir a este respeito;
43.ª - Mesmo tendo presente que se trata de adjudicações para a celebração de um Acordo Quadro, seria preciso ter demonstrado – o que não foi feito –: i) que o grupo económico em que se integram as ora Recorrentes detém, à partida, uma posição dominante no mercado relevante em causa, que é o dos serviços de manutenção e reabilitação de espaços verdes e, simultaneamente, ii) que a circunstância de ter passado a deter no Acordo Quadro celebrado com o Município de Lisboa duas posições contratuais, entre as dez possíveis, lhe permitirá explorar abusivamente essa sua (não demonstrada) muito elevada quota de mercado;
44.ª - Além do mais seria preciso ter sido dado às ora Recorrentes a possibilidade de se pronunciarem sobre essa conclusão, a fim de demonstrarem que a unidade económica em que se inserem não só não tem uma posição dominante como, mesmo que a tivesse, não obtém, por via das duas adjudicações que recaíram nas propostas por elas apresentadas, uma exploração abusiva dessa sua hipotética posição dominante;
45.ª - Em conclusão: as propostas apresentadas pelas ora Recorrentes não podiam também ser excluídas com fundamento em práticas restritivas da concorrência, sejam elas as previstas no artigo 4.ª, sejam as previstas no artigo 6.º da lei n.º 18/2003, pelo que não poderia ter sido aplicada a alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
46.ª - O princípio da concorrência (que estaria aflorado na alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP) não pode também ser invocado, só por si, para determinar a exclusão de propostas;
47.ª - Mesmo que se demonstrasse que tal princípio tem algum conteúdo normativo (o que nunca se demonstra!), tal norma-princípio não seria densa o suficiente para vedar ou proibir comportamentos concretos e específicos como sejam aqueles que aqui estão em causa: a apresentação de propostas em procedimentos de contratação pública, os quais constituem, aliás, afloramento inquestionável da liberdade de iniciativa económica de que goza qualquer empresa;
48.ª - Na falta de regra que preveja a exclusão da proposta numa dada situação de facto, não pode admitir-se que a mera invocação de um princípio da concorrência o legitime; seria o triunfo da incerteza e da insegurança;
49ª - Aliás, na senda do Acórdão do STA de 11 de Janeiro de 2011 (proc. n.º 0851/10), nos termos do qual “a densificação do conceito de prática restritiva da concorrência passa pela interpretação do artigo 4º, nº 1, alínea a) da Lei nº 18/2003, de 11/6, que aprovou o regime jurídico da concorrência”, não seria admissível que uma situação que a Lei da Concorrência não considera ilícita, defraudante, reprovável na lógica da protecção da concorrência, pudesse constituir afinal motivo de exclusão das propostas apresentadas a um procedimento de contratação pública em nome dessa mesma ideia de promoção ou defesa da “concorrência”;
50.ª - Ao não haver fundamento legal ou regulamentar (norma ínsita no programa do concurso) para a exclusão das propostas apresentadas pelas ora Recorrentes, a sentença ora recorrida infringiu, por errada interpretação, o disposto nas alíneas f) e g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
51.ª - Supletivamente, para o caso remoto de se entender que, embora com fundamento diferente do adoptado pela sentença recorrida, isto é, fundamento na autonomia normativa do princípio da concorrência, as propostas apresentadas pelas recorrentes deveriam ter sido excluídas, ainda assim, ocorreria violação do princípio da proporcionalidade;
52.ª - É que a aplicação do princípio da concorrência teria aqui de ser ponderada com a aplicação do princípio da transparência (esse sim com o conteúdo normativo que impõe às as entidades adjudicantes estabeleçam, nos seus programas de concurso, regras claras, precisas e inequívocas sobre como os operadores económicos podem participar nos procedimentos concursais, nomeadamente as que estabelecem os requisitos, as condições e quaisquer outras exigências (positivas ou negativas) que os concorrentes devem preencher);
53.ª - Com efeito, os princípios jurídicos não podem ser aplicados numa lógica de tudo ou nada, que é própria das regras;
54.ª - Não havendo no programa do concurso qualquer regra com que os operadores económicos interessados pudessem contar no sentido da limitação à apresentação de apenas uma proposta no caso de entidades que pertencem ao mesmo grupo económico, determinando por isso o princípio da transparência a não exclusão de qualquer das propostas apresentadas; mas impondo, em contrapartida, o princípio da concorrência, que a apresentação de duas ou mais propostas por entidades em relações de grupo ou de domínio não é admissível à luz de uma ideia de restrição da concorrência, a ponderação destes dois princípios teria de levar, em homenagem ao princípio da proporcionalidade, a uma exclusão de apenas uma das duas propostas desses concorrentes;
55.ª - Determinar a exclusão de todas as propostas apresentados pelos concorrentes que, entre si, estão em relação de grupo ou de domínio, seria pois desproporcionado, violando o disposto no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição e no n.º 2 do artigo 5.º do Código do Procedimento Administrativo.”

A autora/recorrida apresentou contra-alegações com referência aos recursos interpostos pelo réu e pelas contra interessadas, requerendo, ainda:
a. “caso se entenda que (i) o Tribunal a quo procedeu a uma errada aplicação do direito (ii) e que o art. 149º do CPTA não permite ao TCAS conhecer dos demais fundamentos apresentados pela ora recorrida em primeira instância, (…) ao abrigo do disposto no art. 636º, n.º 1 do CPC, e a título subsidiário, que o TCAS conheça dos fundamentos em que a parte vencedora decaiu”;
b. que o efeito a fixar a ambos os recursos seja meramente devolutivo.
No que concerne ao recurso interposto pelo réu, a autora/recorrida termina as contra-alegações formulando as seguintes conclusões:
“A. O Recorrente não imputa à sentença recorrida qualquer erro de julgamento de facto.
B. O Recorrente não põe, assim, em causa que as propostas apresentadas pela …………………………. e ………………………. sejam materialmente idênticas, e que tal não se tratou de uma coincidência, visto que (i) os sócios-gerentes da …………………….. e da ……………………… são os mesmos; (ii) a sócia-gerente das duas entidades assinou electronicamente as duas propostas; (iii) e não existiam minutas/templates para os documentos apresentados pelas referidas Contra-interessadas.
C. Em primeiro lugar, o Recorrente alega que não seria perceptível o fundamento invocado pelo Tribunal a quo para determinar a exclusão das propostas apresentadas pelas referidas Contra-interessadas.
D. No entanto, a sentença recorrida identifica, de forma clara, qual a norma que sustenta a exclusão das propostas apresentadas pelas referidas Contra- interessadas: o art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP.
E. Em segundo lugar, o Recorrente sustenta que a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP não seria aplicável à situação em apreço.
F. No entanto, atenta a qualificação jurídica dos factos adoptada pelo Tribunal a quo – em que se atendeu ao facto de o contrato em formação ser um acordo-quadro a celebrar com 10 entidades – a mencionada causa de exclusão afigura-se inteiramente aplicável.
G. Entendeu o Tribunal a quo que, atentas as particularidades da figura em questão (acordo-quadro a celebrar com vários operadores económicos), para que o instrumento contratual em apreço fosse respeitado, o acordo-quadro deveria ser outorgado entre o Município de Lisboa e os autores das 10 melhores propostas.
H. Como o Tribunal a quo entendeu, e bem, que a celebração de um acordo-quadro com os autores de duas propostas idênticas, em que materialmente existe uma única declaração de vontade, contrariaria tal instrumento contratual, que pressupõe 10 declarações de vontade distintas, afigura-se aplicável a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP.
I. Na verdade, ao adjudicar duas propostas apresentadas por um mesmo operador económico, posto que as duas Contra-interessadas constituem uma única unidade económica, estar-se-ia a violar o regime legal previsto para o instrumento contratual em apreço (acordo-quadro a celebrar com vários operadores económicos).
J. Como bem refere a sentença, “no limite, se, além da …………………… e da ………………………., tivessem sido utilizadas outras oito entidades (rectius: veículos), com propostas idênticas, todos os demais (…) concorrentes teriam sido afastados da celebração do Acordo Quadro”.
K. Em terceiro lugar, o Recorrente insurge-se contra a citação, constante da sentença recorrida, do acórdão do STA de 01/06/2006, sustentando que a mesma (i) se baseia em legislação já revogada; (ii) e que apenas serviria para sustentar a aplicação da causa de exclusão prevista na alínea g) do n.º 2 do art. 70.º e já não na sua alínea f).
L. Sucede que, a mera circunstância de o acórdão citado ter sido proferido ao abrigo de um diploma já revogado nada nos diz quanto à pertinência da invocação dessa mesma jurisprudência para sustentar uma solução a retirar ao abrigo da legislação agora em vigor.
M. A análise do acórdão do STA revela, pelo contrário, a pertinência dessa citação, já que no mesmo se sustenta que entre duas empresas, cujos sócios-gerentes são os mesmos, “não pode haver concorrência pois, na realidade, não são opositoras entre si”.
N. A circunstância de a causa de exclusão discutida no âmbito do referido acórdão do STA ser mais próxima da agora prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g) do CCP não retira pertinência à invocação da referida jurisprudência, que confirma o juízo do Tribunal a quo, segundo o qual materialmente existe uma única proposta/entidade.
O. Sem prescindir, caso o TCAS entenda que a situação em apreço não se subsume à causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, não deve o mesmo deixar de, ao abrigo do disposto no art. 149.º do CPTA, reexaminar as questões que constituíam o objecto do litígio, substituindo a decisão impugnada pela decisão que lhe afigura ser a correcta à luz do quadro legal existente.
P. Ainda que assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, a Recorrida requer, ao abrigo do disposto no 636.º, n.º 1 do CPC, e a título subsidiário, apenas para o caso de o TCAS entender que a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP não é aplicável, que o TCAS conheça dos fundamentos em que a parte vencedora decaiu, designadamente: (i) a necessidade de exclusão das propostas apresentadas pela ………………………. e pela ………………….. com fundamento no disposto no art. 146.º, n.º 2, alínea i), do CCP e a consequente anulação do acordo-quadro celebrado entre as mesmas e o Município de Lisboa e adjudicação da proposta apresentada pela ora Recorrida; (ii) e a necessidade de exclusão das propostas apresentadas pela …………………. e pela …………………. com fundamento no disposto no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP e a consequente anulação do acordo-quadro celebrado entre as mesmas e o Município de Lisboa e adjudicação da proposta apresentada pela ora Recorrida.
Q. Tendo-se concluído que, embora formalmente distintas, a ………………… e a ………………… constituem materialmente um único concorrente – conclusão a que o Tribunal a quo chegou – as propostas em apreço devem também ser excluídas por aplicação do disposto no art. 146.º, n.º 2, alínea i), do CCP.
R. O único elemento que poderia obstar à conclusão de que estamos perante um único concorrente seria o “véu” da personalidade jurídica societária.
S. No entanto, a identidade das duas propostas apresentadas a concurso (elemento objectivo), aliado à composição dos órgãos sociais da …………………… e da …………………………… (elemento subjectivo), legitima a desconsideração da personalidade societária.
T. A desconsideração da personalidade jurídica, numa situação como a descrita, não tem por efeito proibir, de forma genérica, a participação, num determinado procedimento, de empresas pertencentes a um mesmo grupo económico.
U. O levantamento desse “véu” societário tem, sim, uma consequência bem precisa e determinada: impedir a participação num mesmo procedimento (maxime num procedimento destinado à formação de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades) de empresas que, em concreto, se comportam como se fossem um único concorrente.
V. Ao invés, a não desconsideração da personalidade societária permitiria, no limite, que, através da utilização de diversas entidades jurídicas, um mesmo concorrente impedisse outros (verdadeiros) concorrentes de aceder ao acordo-quadro, colocando a entidade adjudicante, durante os 4 anos de duração desse instrumento contratual, à mercê desse único concorrente, no que seria uma total aniquilação da concorrência pretendida com a celebração de um acordo-quadro com diversas entidades.
W. O STA já tem admitido a desconsideração da personalidade jurídica em situações menos evidentes do que a objecto do presente processo.
X. Levantado o “véu” societário, o que temos é uma ilegalidade ostensiva ou grosseira: a apresentação de duas propostas por um mesmo concorrente, quando o procedimento simplesmente não o permite.
Y. O Tribunal a quo entendeu, porém, não aplicar a causa de exclusão prevista no art. 146.º, n.º 2, alínea i) do CCP, que remete para o disposto no art. 59.º, n.º 7 do CCP, por considerar que a mesma depende da apresentação de duas propostas que sejam diferentes.
Z. Sucede que, o art. 59.º, n.º 7 do CCP prevê que “cada concorrente só pode apresentar uma única proposta”, sem aludir à natureza e relação entre as propostas apresentadas (variantes, ou não, diferentes, ou não).
AA. Mais, no âmbito de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades, duas propostas iguais podem ser efectivamente adjudicadas (em cumulação), “empurrando” outros concorrentes para fora do leque das empresas admitidas a concorrer aos procedimentos a lançar ao abrigo desse mesmo acordo-quadro, situação que, em concreto, se verificou.
BB. Nesta medida, uma restrição do âmbito de aplicação do disposto no art. 59.º, n.º 7 do CCP aos casos em que as duas propostas apresentadas são diferentes, fará com que, no âmbito de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades, se possa mais facilmente lançar mão de práticas como as adoptadas pela ……………………. e pela ………………….., aniquilando a concorrência pretendida pela entidade adjudicante ao nível dos “call-offs” e sacrificando o interesse público prosseguido com os mesmos.
CC. O art. 59.º, n.º 7 do CCP deve ser interpretado à luz do princípio da concorrência, “trave-mestra” da contratação pública, a que o art. 1.º, n.º 4 do CCP manda especialmente atender.
DD. O princípio da concorrência não só permite, como impõe que o art. 59.º, n.º 7, do CCP, seja interpretado no sentido de abranger os casos em que, num concurso destinado a apurar quem pode aceder aos procedimentos a abrir ao abrigo de um acordo-quadro a celebrar com diversas entidades, duas dessas entidades, cujos titulares dos órgãos de administração são os mesmos, se comportam como se fossem um único concorrente, apresentando propostas materialmente iguais e impedindo, desta forma, que outros concorrentes possam, também, ter acesso aos referidos procedimentos.
EE. O comportamento adoptado pela …………………….. e pela ……………….. não pode, também, deixar de conduzir à exclusão das suas propostas por aplicação do disposto no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP.
FF. Com efeito, embora constituam verdadeiramente um único concorrente, a ………………………….. e a ……………………… apresentaram duas propostas, impedindo que outros concorrentes pudessem, também, celebrar o acordo-quadro com o Recorrente e, por essa forma, participar nos “call-offs” a celebrar ao seu abrigo, numa clara prática anti-concorrencial.
GG. O Tribunal a quo entendeu, porém, não aplicar a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP, por considerar que entre a ……………………. e a …………………………… não poderia existir concorrência, aceitando o argumento segundo o qual, por constituírem “uma única empresa e uma unidade económica”, um acordo entre a ……………………. e a ……………………… não pode ser qualificado como acordo ou prática concertada para efeitos do disposto no art. 4.º da Lei da Concorrência.
HH. A sentença recorrida desconsidera, porém, dois elementos essenciais: (i) o de que o disposto no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP não se pode reduzir às “práticas abrangidas pelos tipos contra-ordenacionais previstos na Lei da Concorrência ou em legislação de defesa da concorrência”; (ii) e o de que mesmo que se entenda que entre a ………………………. e a ………………… não pode existir um acordo ou prática concertada, o seu comportamento não pode deixar de ser qualificado como um acto anti-concorrencial.
II. Apesar de o art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP ter uma “clara inspiração nas normas jus concorrenciais”, não significa que o mesmo se reduz, para efeitos de exclusão de uma proposta apresentada a concurso (sublinhe-se que é apenas para este efeito que a norma releva e não para aplicar qualquer das sanções previstas na Lei da Concorrência), aos tipos legais aí taxativamente previstos.
JJ. Acresce que, a doutrina vem sustentando que a noção de actos anti- concorrenciais, referida no art. 70.º, n.º 2, alínea g), se deve estender a actos praticados por empresas em posição não dominante.
KK. Uma das situações abordadas pela doutrina (cfr. cfr. JOÃO MOREIRA, – “Cartelização em Contratação Pública”, in Estudos de Contratação Pública – III, Coimbra Editora, 2010, p. 240) é justamente a do caso em que um procedimento restringe o número de concorrentes (como sucede no acordo-quadro, posto que apenas os adjudicatários poderão participar nos concretos “call-offs”) e em que duas entidades, que constituem materialmente uma única unidade económica, apresentam duas propostas, para ocupar dois lugares de um número máximo pré- estabelecido.
LL. No âmbito do presente processo foi isso que aconteceu: a …………………. e a ……………………….., que constituem “uma única empresa e uma unidade económica”, ocuparam 2 dos 10 lugares disponíveis, impedindo que outros concorrentes pudessem aceder ao leque de co-contratantes e, dessa forma, pudessem participar nos procedimentos a lançar ao abrigo do acordo-quadro.
MM. Mesmo que se entenda que o comportamento da …………………… e da …………………., neste concurso, não é qualificável como acordo ou prática concertada, forçoso se torna concluir que o mesmo constitui um acto (i.e. uma única manifestação de vontade desta unidade económica) anti-concorrencial.
NN. O art. 70.º, n.º 1, alínea g), do CCP deve ser interpretado à luz do princípio da concorrência, entendendo-se que actos susceptíveis de falsear as regras da concorrência abrangem situações em que duas entidades, cujos titulares dos órgãos de administração são os mesmos, apresentam duas propostas exactamente iguais para ocupar dois dos lugares, num máximo de dez, que permitem celebrar o acordo-quadro e, desta forma, aceder aos procedimentos a lançar ao seu abrigo.
OO. Atenta a identidade das propostas apresentadas, das pessoas que subscreveram as ofertas, e dos titulares dos respectivos órgãos de administração, os indícios desse acto anti-concorrencial não são apenas fortes [como exige art. 70.º, n.º 2, alínea g)], mas evidentes.”

Nas contra-alegações apresentadas com referência ao recurso interposto pelos contra-interessados, a autora/recorrida formula as seguintes conclusões:

“A. As Recorrentes delimitaram o objecto do seu recurso à parte da sentença que anulou os actos de adjudicação das propostas apresentadas pelas Recorrentes, condenando o Município de Lisboa à exclusão e tais propostas e a adjudicar a proposta apresentada pela ora Recorrida.
B. Por não terem atacado a parte da sentença que, na sequência do pedido de ampliação do objecto do processo impugnatório, anulou os contratos (de acordo- quadro) celebrados entre o Município de Lisboa e cada uma das Recorrentes, não pode deixar de se entender que, no que às Recorrentes respeita, essa parte da sentença já transitou em julgado.
C. Nesta medida, o presente recurso carece de qualquer utilidade, pois mesmo que as Recorrentes pudessem afastar a sentença que determinou a exclusão das suas propostas, já não podem aceder à celebração do contrato visado pelo procedimento no âmbito do qual tais propostas foram apresentadas.
D. Sem prescindir, as Recorrentes não imputam à sentença recorrida qualquer erro de julgamento de facto.
E. As Recorrentes não põem, assim, em causa que as propostas que apresentaram foram materialmente idênticas, e que tal não se tratou de uma coincidência, visto que (i) os sócios-gerentes das Recorrentes são os mesmos; (ii) a sócia-gerente das Recorrentes assinou electronicamente as duas propostas; (iii) e não existiam minutas/templates para os documentos apresentados pelas Recorrentes.
F. Em primeiro lugar, as Recorrentes alegam que não seria claro o fundamento invocado pelo Tribunal a quo para determinar a exclusão das suas propostas, referindo-se ao acórdão do STA, citado na sentença, o qual apenas teria relevo para a aplicação da causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g) do CCP.
G. No entanto, a sentença recorrida identifica, de forma clara, qual a norma que sustenta a exclusão das propostas apresentadas pelas referidas Contra- interessadas: o art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP.
H. Acresce que, a citação do referido acórdão do STA tem pertinência para sustentar a aplicação da causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP.
I. A análise do acórdão do STA revela a pertinência dessa citação, já que no mesmo se sustenta que entre duas das empresas envolvidas, cujos sócios-gerentes eram os mesmos, “não pode haver concorrência pois, na realidade, não são opositoras entre si”, conclusão a que o Tribunal a quo chega, ao referir que existe uma única empresa e uma proposta, embora formalmente tenham sido apresentadas duas propostas por duas entidades distintas.
J. Em segundo lugar, as Recorrentes sustentam que a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP não seria aplicável à situação em apreço.
K. No entanto, atenta a qualificação jurídica dos factos adoptada pelo Tribunal a quo – em que se atendeu ao facto de o contrato em formação ser um acordo-quadro a celebrar com 10 entidades – a mencionada causa de exclusão afigura-se aplicável.
L. Entendeu o Tribunal a quo que, atentas as particularidades da figura em questão (acordo-quadro a celebrar com vários operadores económicos), para que o instrumento contratual em apreço fosse respeitado, o acordo-quadro deveria ser outorgado entre o Município de Lisboa e os autores das 10 melhores propostas.
M. Como o Tribunal a quo entendeu, e bem, que a celebração de um acordo-quadro com os autores de duas propostas idênticas, em que materialmente existe uma única declaração de vontade, contrariaria tal instrumento contratual, que pressupõe 10 declarações de vontade distintas, deve aplicar-se a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP.
N. Na verdade, ao adjudicar duas propostas apresentadas por um mesmo operador económico, posto que as duas Contra-interessadas constituem uma única unidade económica, estar-se-ia a violar o regime legal previsto para o instrumento contratual em apreço (acordo-quadro a celebrar com vários operadores económicos).
O. Como bem refere a sentença, “no limite, se, além da ………………………. e da ………..………….., tivessem sido utilizadas outras oito entidades (rectius: veículos), com propostas idênticas, todos os demais (…) concorrentes teriam sido afastados da celebração do Acordo Quadro”.
P. Apesar de referirem que, para efeitos de aplicação das normas jus-concorrenciais, constituem uma única empresa, as Recorrentes sustentam que, afinal e para efeitos do direito da contratação pública, seriam duas concorrentes diferentes e que, nesta medida, o acordo-quadro havia sido celebrado com “dez diferentes prestadores de serviços (dez diferentes sociedades)”.
Q. No âmbito de um procedimento de adjudicação, uma mesma realidade (provada e aceite pelas Recorrentes) – dois concorrentes, com os mesmos sócios-gerentes, que intencionalmente apresentaram propostas idênticas com o propósito de ocupar 2 dos 10 lugares de um acordo-quadro, o que vieram a conseguir – não pode ser qualificada como uma entidade [para efeitos de aplicação da causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g) do CCP] e como duas entidades distintas [para efeitos de aplicação das causas de exclusão previstas nos arts. 70.º, n.º 2, alínea f) e 146.º, n.º 2, alínea i) do CCP].
R. Esta divisão é sustentada pelas Recorrentes numa alegada particularidade do direito da contratação pública: a de que o mesmo não admitiria a desconsideração da personalidade jurídica, por tal implicar, por si só, uma proibição genérica de participação num mesmo procedimento de empresas pertencentes ao mesmo grupo económico, algo que a jurisprudência comunitária (maxime o acórdão Assitur) pretenderia afastar.
S. O Acórdão Assitur não impede a desconsideração da personalidade jurídica, apenas proibindo as disposições dos Estado-membros que impeçam a apresentação de propostas por empresas em relação de domínio ou associadas entre si “sem lhes dar a possibilidade de demonstrar que a dita relação não teve influência sobre o seu comportamento respectivo no âmbito desse concurso”.
T. O acórdão do STA, de 11/01/2011 (proc. 0851/10), propende no mesmo sentido, não constituindo qualquer “cheque em branco” à apresentação de propostas por parte de empresas que, na prática, constituem uma única unidade económica.
U. Em suma, a jurisprudência europeia e nacional apenas exigem que a exclusão não seja automática, mas alicerçada no concreto comportamento adoptado pelas entidades em questão.
V. No caso em apreço, além de se ter provado a relação de grupo existente entre as Recorrentes, provou-se que estas apresentaram intencionalmente propostas idênticas.
W. É, pois, a identidade das duas propostas apresentadas a concurso (elemento objectivo), e não apenas a composição dos órgãos sociais das Recorrentes ou a relação de grupo existente (elemento subjectivo), que legitima a desconsideração da personalidade societária.
X. A desconsideração da personalidade jurídica, numa situação como a descrita, não tem por efeito proibir, de forma genérica, a participação, num determinado procedimento, de empresas pertencentes a um mesmo grupo económico.
Y. O levantamento desse “véu” societário tem, sim, uma consequência bem precisa e determinada: impedir a participação num mesmo procedimento (maxime num procedimento destinado à formação de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades) de empresas que, em concreto, se comportam como se fossem um único concorrente.
Z. Ao invés, a não desconsideração da personalidade societária permitiria, no limite, que, através da utilização de diversas entidades jurídicas, um mesmo concorrente impedisse outros (verdadeiros) concorrentes de aceder ao acordo-quadro, colocando a entidade adjudicante, durante os 4 anos de duração desse instrumento contratual, à mercê desse único concorrente, no que seria uma total aniquilação da concorrência pretendida com a celebração de um acordo-quadro com diversas entidades.
AA. Apesar de o Tribunal a quo não ter mobilizado a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g) do CCP, as Recorrentes sustentam que a mesma não lhes é aplicável.
BB. Se o TCAS vier a entender que a situação em apreço não se subsume à causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP, o que apenas por mera cautela de patrocínio aqui se admite, não pode o mesmo deixar de, ao abrigo do disposto no art. 149.º do CPTA, reexaminar as questões que constituíam o objecto do litígio, averiguando, inter alia, da aplicação da causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g) doCCP.
CC. Ainda que assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, a Recorrida requer, ao abrigo do disposto no 636.º, n.º 1 do CPC, e a título subsidiário (apenas para o caso de o TCAS entender que a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP não é aplicável), que o TCAS conheça dos fundamentos em que a parte vencedora decaiu, designadamente a necessidade de exclusão das propostas apresentadas pelas Recorrentes com fundamento no disposto no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP e a necessidade de adjudicação da proposta apresentada pela ora Recorrida.
DD. Com efeito, embora constituam verdadeiramente um único concorrente, a …………………………… e a …………………….. apresentaram duas propostas, impedindo que outros concorrentes pudessem, também, celebrar o acordo-quadro com o Recorrente e, por essa forma, participar nos “call-offs” a celebrar ao seu abrigo, numa clara prática anti-concorrencial.
EE. O Tribunal a quo entendeu, porém, não aplicar a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP, por considerar que entre a …………………….. e a ………………………………. não poderia existir concorrência, aceitando o argumento segundo o qual, por constituírem “uma única empresa e uma unidade económica”, um acordo entre a …………………….. e a …………………………. não pode ser qualificado como acordo ou prática concertada para efeitos do disposto no art. 4.º da Lei da Concorrência.
FF. A sentença recorrida desconsidera, porém, dois elementos essenciais: (i) o de que o disposto no art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP não se pode reduzir às “práticas abrangidas pelos tipos contra-ordenacionais previstos na Lei da Concorrência ou em legislação de defesa da concorrência”; (ii) e o de que mesmo que se entenda que entre a ……………………… e a …………………….. não pode existir um acordo ou prática concertada, o seu comportamento não pode deixar de ser qualificado como um acto anti-concorrencial.
GG. Apesar de o art. 70.º, n.º 2, alínea g), do CCP ter uma “clara inspiração nas normas jus concorrenciais”, não significa que o mesmo se reduz, para efeitos de exclusão de uma proposta apresentada a concurso (sublinhe-se que é apenas para este efeito que a norma releva e não para aplicar qualquer das sanções previstas na Lei da Concorrência), aos tipos legais aí taxativamente previstos.
HH. Acresce que, a doutrina vem sustentando que a noção de actos anti- concorrenciais, referida no art. 70.º, n.º 2, alínea g), se deve estender a actos praticados por empresas em posição não dominante.
II. Uma das situações abordadas pela doutrina (cfr. cfr. JOÃO MOREIRA, – “Cartelização em Contratação Pública”, in Estudos de Contratação Pública – III, Coimbra Editora, 2010, p. 240) é justamente a do caso em que um procedimento restringe o número de concorrentes (como sucede no acordo-quadro, posto que apenas os adjudicatários poderão participar nos concretos “call-offs”) e em que duas entidades, que constituem materialmente uma única unidade económica, apresentam duas propostas, para ocupar dois lugares de um número máximo pré- estabelecido.
JJ. No âmbito do presente processo foi isso que aconteceu: a ………………………….. e a ……………………, que constituem “uma única empresa e uma unidade económica”, ocuparam 2 dos 10 lugares disponíveis, impedindo que outros concorrentes pudessem aceder ao leque de co-contratantes e, dessa forma, pudessem participar nos procedimentos a lançar ao abrigo do acordo-quadro.
KK. Mesmo que se entenda que o comportamento da ………………….. e da ………………………., neste concurso, não é qualificável como acordo ou prática concertada, forçoso se torna concluir que o mesmo constitui um acto (i.e. uma única manifestação de vontade desta unidade económica) anti-concorrencial.
LL. O art. 70.º, n.º 1, alínea g), do CCP deve ser interpretado à luz do princípio da concorrência, entendendo-se que actos susceptíveis de falsear as regras da concorrência abrangem situações em que duas entidades, cujos titulares dos órgãos de administração são os mesmos, apresentam duas propostas exactamente iguais para ocupar dois dos lugares, num máximo de dez, que permitem celebrar o acordo-quadro e, desta forma, aceder aos procedimentos a lançar ao seu abrigo.
MM. Atenta a identidade das propostas apresentadas, das pessoas que subscreveram as ofertas, e dos titulares dos respectivos órgãos de administração, os indícios desse acto anti-concorrencial não são apenas fortes [como exige art. 70.º, n.º 2, alínea g)], mas evidentes.
NN. As Recorrentes pretendem reconduzir a parte final do acórdão Assitur – na qual se adverte para a necessidade de demonstração que não houve uma influência recíproca – aos casos de abuso de posição dominante.
OO. No entanto, em nenhuma parte do acórdão Assitur se limita tal necessidade aos casos de abuso de posição dominante, no que seria uma severa restrição do seu âmbito de aplicação.
PP. Se o acórdão Assitur pretendesse reduzir (drasticamente) o seu âmbito de aplicação a situações tão específicas, certamente tê-lo-ia indicado, o que não fez.
QQ. Em Quarto lugar, as Recorrentes sustentam que o princípio da concorrência não pode ser invocado como causa autónoma de exclusão das suas propostas.
RR. No entanto, nem a sentença recorrida, nem a ora Recorrida, invocaram o princípio da concorrência como causa autónoma de exclusão das propostas apresentadas pelas Recorrentes.
SS. O que a ora Recorrida fez, na sua petição inicial, foi invocar a necessidade de interpretar as causas de exclusão previstas no CCP à luz do princípio da concorrência, o que é coisa bem diferente.
TT. Com efeito, e sob pena de inutilidade do disposto no art. 1.º, n.º 4 do CCP, o princípio da concorrência não pode deixar de ser invocado para interpretar as causas de exclusão previstas nos arts. 70.º, n.º 2, alínea f), 70.º, n.º 2, alínea g), e 146.º, n.º 2, alínea i) do CCP.
UU. Em quinto lugar, as Recorrentes sustentam que a ser admitida, a decisão de exclusão das duas propostas violaria o princípio da proporcionalidade.
VV. No entanto, se apenas uma das propostas fosse excluída, o comportamento adoptado por esta unidade económica (formada pela …………………. e pela ………………..) não seria verdadeiramente sancionado, posto que uma das entidades sempre poderia aceder aos “call-offs” a abrir ao abrigo do acordo-quadro.
WW. Em geral, se fosse permitida, nestes casos, a exclusão de apenas uma das propostas envolvidas, não haveria qualquer desincentivo a estas práticas, já que a unidade económica prevaricadora veria, pelo menos, uma das suas propostas avaliada.
XX. A exclusão de apenas uma as propostas, essa sim, seria uma decisão violadora do princípio da proporcionalidade, porque desadequada ao fim que se pretende atingir com as normas que consagram as causas de exclusão: impedir que este tipo de comportamentos seja adoptado no mercado público.
YY. Ainda que assim não se entenda, o que por merca cautela de patrocínio se admite, a não exclusão de uma das propostas apresentadas pelas Recorrentes em nada viria perturbar a condenação do Município de Lisboa a adjudicar a proposta apresentada pela ora Recorrida.
ZZ. A circunstância de uma das 10 adjudicações iniciais ter caducado e de se ter adjudicado a proposta ordenada em 11.º lugar, faz com que, na presente data, a proposta apresentada pela ora Recorrida (então ordenada em 12.º lugar) esteja no lugar subsequente para ocupar a “vaga” deixada em aberto pela proposta apresentada pelas Recorrentes que venha a ser excluída.
AAA. Sem prescindir, se o TCAS vier a entender que a situação em apreço não se subsume à causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP, o que apenas por mera cautela de patrocínio aqui se admite, não pode o mesmo deixar de, ao abrigo do disposto no art. 149.º do CPTA, reexaminar as questões que constituíam o objecto do litígio, averiguando também da aplicação da causa de exclusão prevista no art. 146.º, n.º 2, alínea i), do CCP.
BBB. Ainda que assim não se entenda, o que apenas por mera cautela de patrocínio se admite, a Recorrida requer, ao abrigo do disposto no 636.º, n.º 1 do CPC, e a título subsidiário (apenas para o caso de o TCAS entender que a causa de exclusão prevista no art. 70.º, n.º 2, alínea f) do CCP não é aplicável), que o TCAS conheça dos fundamentos em que a parte vencedora decaiu, designadamente a necessidade de exclusão das propostas apresentadas pelas Recorrentes com fundamento no disposto no art. 146.º, n.º 2, alínea i), do CCP e a necessidade de adjudicação da proposta apresentada pela ora Recorrida.
CCC. Na verdade, tendo-se concluído que, embora formalmente distintas, a …………………….. e a ………………………… constituem materialmente um único concorrente – conclusão a que o Tribunal a quo chegou – as propostas em apreço devem também ser excluídas por aplicação do disposto no art. 146.º, n.º 2, alínea i), do CCP.
DDD. O único elemento que poderia obstar à conclusão de que estamos perante um único concorrente seria o “véu” da personalidade jurídica societária.
EEE. No entanto, a identidade das duas propostas apresentadas a concurso (elemento objectivo), aliado à composição dos órgãos sociais da ……………………. e da ………………………. (elemento subjectivo), legitima a desconsideração da personalidade societária.
FFF. O STA já tem admitido a desconsideração da personalidade jurídica em situações menos evidentes do que a objecto do presente processo.
GGG. Levantado o “véu” societário, o que temos é uma ilegalidade ostensiva ou grosseira: a apresentação de duas propostas por um mesmo concorrente, quando o procedimento simplesmente não o permite.
HHH. O Tribunal a quo entendeu, porém, não aplicar a causa de exclusão prevista no art. 146.º, n.º 2, alínea i) do CCP, que remete para o disposto no art. 59.º, n.º 7 do CCP, por considerar que a mesma depende da apresentação de duas propostas que sejam diferentes.
III. Sucede que, o art. 59.º, n.º 7 do CCP prevê que “cada concorrente só pode apresentar uma única proposta”, sem aludir à natureza e relação entre as propostas apresentadas (variantes, ou não, diferentes, ou não).
JJJ. Mais, no âmbito de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades, duas propostas iguais podem ser efectivamente adjudicadas (em cumulação), “empurrando” outros concorrentes para fora do leque das empresas admitidas a concorrer aos procedimentos a lançar ao abrigo desse mesmo acordo-quadro, situação que, em concreto, se verificou.
KKK. Nesta medida, uma restrição do âmbito de aplicação do disposto no art. 59.º, n.º 7 do CCP aos casos em que as duas propostas apresentadas são diferentes, fará com que, no âmbito de um acordo-quadro a celebrar com várias entidades, se possa mais facilmente lançar mão de práticas como as adoptadas pelas Recorrentes, aniquilando a concorrência pretendida pela entidade adjudicante ao nível dos “call-offs” e sacrificando o interesse público prosseguido com os mesmos.
LLL. O art. 59.º, n.º 7 do CCP deve ser interpretado à luz do princípio da concorrência, “trave-mestra” da contratação pública, a que o art. 1.º, n.º 4 do CCP manda especialmente atender.
MMM. O princípio da concorrência não só permite, como impõe que o art. 59.º, n.º 7, do CCP, seja interpretado no sentido de abranger os casos em que, num concurso destinado a apurar quem pode aceder aos procedimentos a abrir ao abrigo de um acordo-quadro a celebrar com diversas entidades, duas dessas entidades, cujos titulares dos órgãos de administração são os mesmos, se comportam como se fossem um único concorrente, apresentando propostas materialmente iguais e impedindo, desta forma, que outros concorrentes possam, também, ter acesso aos referidos procedimentos.” 

Em cumprimento do despacho de 11/08/2015, foram o réu e os contra-interessados, ora recorrentes, notificados para responderem, querendo, à ampliação do âmbito do recurso requerida pela autora/recorrida.
O réu/recorrente pronunciou-se no sentido de não ser “admitida a ampliação da matéria de recurso” e, caso assim não se entenda, ser a mesma julgada totalmente improcedente.
Os contra-interessados/recorrentes concluíram que “se vier a ser analisada esta matéria a título de ampliação do âmbito do recurso jurisdicional, deverá ser julgado totalmente improcedente o argumento da recorrida de que as propostas apresentadas pelas ora recorrentes deveriam ter sido excluídas com fundamento na alínea i) do n.º 2 do artigo º do CCP.

O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não se pronunciou.
*
Com referência aos recursos interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas, a questão que importa decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, por violação do disposto no artigo 70º, n.º 2, als. f) e g) do CCP, ao concluir pela existência de fundamento para a exclusão das propostas apresentadas pelas contra-interessadas …………………………………….., Lda e ………………………………………, Lda; previamente, porém, e no que concerne ao recurso interposto pelas contra-interessadas, importa saber se o mesmo carece de utilidade [cfr. conclusões A) a C) das contra-alegações da recorrida, relativas ao recurso das contra-interessadas].
A recorrida requereu, a título subsidiário, a ampliação do objecto do recurso, a qual coloca a questão de saber se as propostas das contra-interessadas deveriam ter sido excluídas nos termos dos artigos 146º, n.º 2, al. i) e 70º, n.º 2, al. g) do CCP, com a consequente anulação do acordo-quadro celebrado entre as mesmas e o Município de Lisboa e a adjudicação da proposta apresentada pela recorrida [cfr. conclusões P) a OO) das contra-alegações apresentadas pela recorrida com referência ao recurso do réu e conclusões CC) a MMM) das contra-alegações apresentadas pela recorrida com referência ao recurso das contra-interessadas].
Previamente importa fixar o efeito do recurso, tendo presente que a recorrida requereu que “o efeito a fixar a ambos os recursos seja meramente devolutivo”.
*
Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTAÇÃO

1. Matéria de facto

O Tribunal a quo deu como assente a seguinte matéria de facto:
1 - Através de Anúncio, publicado na II Série do Diário da República, de 30 de Junho de 2011, o R. publicitou o concurso público para a formação de um “Acordo Quadro para a aquisição de serviços de manutenção e de trabalhos de reabilitação de espaços verdes -Processo n.º 31/DMSC/DA/2011” - cfr. anúncio do procedimento, programa do concurso e caderno de encargos juntos aos autos.
2 - O número de propostas a adjudicar no âmbito do referido concurso é de 10 (dez) - cfr. art. 13.º do programa do concurso.
3 - O concurso não admite a apresentação de propostas variantes - cfr. art. 14.º do programa do concurso.
4 - O Acordo Quadro é celebrado entre o R. e 10 (dez) co-contratantes - cfr. cláusula 4.ª, n.º 2, do caderno de encargos.
5 - O Acordo Quadro tem a duração de 4 (quatro) anos, contados da data da respectiva assinatura - cfr. cláusula 6.ª do caderno de encargos.
6 - Só são convidados a participar nos procedimentos a lançar ao abrigo do Acordo Quadro os respectivos adjudicatários - cfr. cláusula 1.ª, alínea d), e cláusula 11.ª, n.º 1, do caderno de encargos.
7 - O Acordo Quadro tem por objecto a “definição dos termos a que estão sujeitos os Concursos e os Contratos para a prestação de Serviços de Manutenção e dos Trabalhos de Reabilitação de espaços verdes no concelho de Lisboa” – cfr. cláusula 2.ª, n.º 1, do caderno de encargos.
8 - Além dos espaços verdes definidos no Anexo I do caderno de encargos, o Acordo Quadro contempla quaisquer “espaços verdes compreendidos no concelho de Lisboa” os quais podem vir a ser incluídos nos contratos a celebrar ao abrigo do Acordo Quadro - cfr. cláusula 2.ª, n.º 2, do caderno de encargos.
9 - Bastará, para tal, que a entidade adjudicante defina esse espaço verde, através da sua localização e da classificação estabelecida no Anexo II do caderno de encargos, no concreto procedimento a lançar ao abrigo do Acordo Quadro - cfr. cláusula 2.ª, n.º 3, do caderno de encargos e acordo).
10 - A A. apresentou a sua proposta no âmbito do referido concurso, no dia 23/09/2011 (cfr. proposta apresentada pela A. junta aos autos).
11 - Em 28/12/2011, a A. foi notificada do Relatório Preliminar (cfr. Relatório Preliminar junto ao processo administrativo e doc. n.º 4 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
12 - Consta do referido Relatório Preliminar que o Júri admitiu, avaliou e propôs a adjudicação, em primeiro e segundo lugares, das propostas apresentadas pelas Contra- Interessadas ……………………………. e ……………………………….

http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/fd4d0bbd2668eb0a80257f0f003b6429/DECTINTEGRAL/15.4312?OpenElement&FieldElemFormat=gif


















http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/fd4d0bbd2668eb0a80257f0f003b6429/DECTINTEGRAL/47.33FA?OpenElement&FieldElemFormat=gif


cfr. Relatório Preliminar junto ao processo administrativo e doc. n.º 4 junto ao processo cautelar (pp. 40 e 41).
13 - A proposta apresentada pela A. ficou ordenada em décimo segundo lugar - cfr. Relatório Preliminar junto ao processo administrativo e doc. n.º 4 junto ao processo cautelar (p. 40).
14 - Em 03/01/2012, a A. pronunciou-se, por escrito, no exercício do direito de audiência prévia, sobre o referido Relatório Preliminar - audiência prévia junta ao processo administrativo e doc. n.º 5 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido - tendo aí pedido a exclusão das propostas apresentadas pela ………………………… e pela ……………………….. e a consequente adjudicação da proposta por si apresentada, a qual, com as referidas exclusões, ficaria ordenada no décimo lugar.
15 - As propostas apresentadas pela ………………………. e pela ……………………… apresentam preços mensais iguais para as 34 Zonas definidas no Anexo I do Caderno de Encargos - cfr. “Lista de Preços Mensais Propostos para os Serviços de Manutenção das Zonas”, docs. que integram as propostas apresentadas pela …………………… e …………………………., juntas ao processo administrativo, e docs. n.º 6 e 7 juntos ao processo cautelar, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
16 - O documento “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos”, apresentado juntamente com a proposta pela ……………………….. é exactamente igual ao documento “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos”, apresentado juntamente com a proposta pela ……………………, incluindo os erros ortográficos, constantes dos referidos documentos, são os mesmos (cfr., a título de exemplo, “equipa opracional” nos fluxogramas constantes da p. 15 do doc. n.º 8 junto ao processo cautelar e p. 16 do doc. n.º 9 junto ao processo cautelar e documentos que integram as propostas apresentadas pela …………………. e …………………, juntas ao processo administrativo e o conteúdo integral dos docs. n.ºs 8 e 9 juntos ao processo cautelar, cada um dos quais com mais de 20 páginas, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
17 - O conteúdo e a forma da “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo e Gestão da Qualidade”, apresentada pela …………………… e pela ……………………, são iguais, designadamente, o conteúdo e forma dos fluxogramas, o conteúdo e forma dos quadros constantes dos referidos documentos, cfr. documentos que integram as propostas apresentadas pela …………………… e ………………….., juntas ao processo administrativo, e docs. n.ºs 10 e 11 juntos ao processo cautelar, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
18 - Os documentos designados por “Nota Introdutória da Proposta ……………, Lda.” (da …………………..) - doc. que integra a proposta apresentada pela …………………, junta ao processo administrativo, e doc. n.º 12 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido - e “Apresentação da Proposta da………………………, Lda.” (da …………………………..) - doc. que integra a proposta apresentada pela …………………….., junta ao processo administrativo, e doc. n.º 13 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzida - têm, também, uma parte introdutória exactamente igual e, após a indicação do valor mensal global, apresentam idêntica estrutura e conteúdo.
19 - As peças do procedimento não ofereciam minutas/”templates” para documentos como a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos” ou a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo e Gestão da Qualidade”.
20 - Tal como consta do voto de vencido exarado no relatório preliminar do júri, não impugnado, cf. fls. 170-171 dos autos:


http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/fd4d0bbd2668eb0a80257f0f003b6429/DECTINTEGRAL/103.3532?OpenElement&FieldElemFormat=gif

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21 - Os preços mínimos estabelecidos no Anexo VI Modelo de Avaliação das Propostas do programa de concurso (p. 19-20), são os seguintes:
 Preço mensal mínimoz é o preço mensal mínimo a pagar para a prestação de SERVIÇOS de MANUTENÇÃO na zona z, de acordo com a tabela seguinte:
Zona (cf. Anexo I do caderno de encargos) 
Preço mensal mínimoz (€)
1A 50.769,50
1B 15.830,88
1C 5.454,53
1D 7.510,39
1E 3.301,27
2A 21.828,48
2B 5.562,60
2C 8.416,62
3A 16.299,28
3B 5.507,00
3C 9.696,55
3D 16.135,88
3E 10.129,98
4A 18.196,84
4B 21.608,28
4C 10.498,54
4D 9.791,41
5A 14.971,24
5B 6.843,14
5C 4.374,33
5D 1.865,15
6A 11.224,59
6B 13.344,18
6C 7.141,79
7A 58.494,06
7B 10.002,62
7C 6.469,17
7D 4.406,37
8A 17.402,79
8B 13.310,74
8C 12.639,36
8D 13.705,39
8E 21.177,70
8F 21.814,30
22 - De acordo com a cláusula 7.ª do caderno de encargos, Parâmetros base do ACORDO QUADRO, os preços mensais propostos para a prestação dos SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO nas ZONAS não poderiam ser superiores aos parâmetros base indicados na tabela seguinte sob pena de exclusão da proposta nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, a saber:
1A 59.728,82
1B 18.624,57
1C 6.417,09
1D 8.835,75
1E 3.883,85
2A 25.680,57
2B 6.544,24
2C 9.901,91
3A19.175,62
3B 6.478,82
3C 11.407,71
3D 18.983,39
3E 11.917,62
4A 21.408,05
4B 25.421,51
4C 12.351,22
4D 11.519,31
5A 17.613,22
5B 8.050,75
5C 5.146,27
5D 2.194,29
6A 13.205,40
6B 15.699,03
6C 8.402,11
7A 68.816,54
7B 11.767,79
7C 7.610,79
7D 5.183,96
8A 20.473,87
8B 15.659,69
8C 14.869,83
8D 16.123,99
8E 24.914,94
8F 25.663,88
Cf. p. 14-15 do caderno de encargos junto aos autos.
23 - Os preços apresentados pelas várias propostas, com excepção das da A. e C.I.s, são os constantes das listas de preço constantes do p.a. e incorporadas nos autos.
24 - A gerência da ……………………… é composta por (i) Maria………………………; (ii) Fernando …………………………….; (iii) e João …………………………… - cfr. doc. n.º 14 junto ao processo cautelar (certidão permanente apresentada a concurso pela ……………………….), que aqui se dá por integralmente reproduzido.
25 - A gerência da ………………… é composta por (i) Maria ……………………………..; (ii) Fernando……………………………..; (iii) e João………………………………….. - cfr. doc. n.º 14 junto ao processo cautelar (certidão permanente apresentada a concurso pela …………………..), que aqui se dá por integralmente reproduzido.
26 - O suporte de papel da proposta apresentada pela ……………….. foi assinado por João………………………………. (cfr. proposta junta ao processo administrativo) e electronicamente subscrita por Maria………………………………… (acordo).
27 - Desde 03/06/2011, João António Assunção Alho é também gerente da …………………………. - cfr. doc. n.º 15 junto ao processo cautelar (consulta às publicações on-line de actos societários - Portal da Justiça), que aqui se dá por integralmente reproduzido.
28 - Tanto o suporte de papel como o suporte electrónico da proposta da ……………………. foram assinados por Maria …………………………, cfr. proposta junta ao processo administrativo e acordo.
29 - Em 24/04/2012, a A. foi notificada do Relatório Final (cfr. Relatório Final junto ao processo administrativo e doc. n.º 16 junto ao processo cautelar - Relatório Final, sem anexos).
30 - De acordo com o referido Relatório Final, o Júri deliberou, por maioria (com o voto de vencido do 1.º Vogal Efectivo), manter a proposta de decisão relativa à admissão das propostas apresentadas pela ………………………… e pela ……………………. NÃO AS EXCLUINDO (cfr. p. 3 do Relatório Final), tendo para tal acolhido a fundamentação constante do parecer jurídico que anexou ao Relatório Final - cfr. p. 3 do Relatório Final, parecer junto ao processo administrativo e doc. n.º 17 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
31 - O Júri deliberou, assim, manter a proposta de adjudicação, ordenando em primeiro e segundo lugares, as propostas apresentadas pelas Contra-Interessadas ……………………….. e pela …………………………. - cfr. pp. 43 e 44 do Relatório Final.
32 - O Júri deliberou, ainda, manter a ordenação, em décimo segundo lugar, da proposta apresentada pela A. (cfr. p. 43 do Relatório Final).
33 - Em 24/04/2012, a A. foi notificada do acto de adjudicação (deliberação n.º 199/CM/2012), praticado pela Câmara Municipal de Lisboa, em 11/04/2012 cujo teor integral consta de fls. 453 e segts. dos autos de processo principal e doc. n.º 18 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido).
34 - No dia 26.10.2012, foi celebrado um contrato com a ……………….., de “Fornecimento de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes, ao abrigo do Acordo-Quadro”, cf. fls. 427-432, repetido a 763-768 dos autos em suporte de papel.
No dia 26.10.2012, foi celebrado um contrato com a ………………………., de “Fornecimento de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes, ao abrigo do Acordo-Quadro”, cf. fls 433-438, repetido a fls 769-774 dos autos em suporte de papel.
36 - No dia 9.4.2013, foi celebrado um contrato com a ……………………., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 7, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 004AQ/7A/2013)”, cf. fls. 439- 443, repetido a fls. 775-779 dos autos em suporte de papel.
37 - No dia 29.4.2013, foi celebrado um contrato com a …………………., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 4C, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 03AQ/4C/2013)”, cf. fls. 504-508, repetido a fls. 657-661 dos autos em suporte de papel.
38 - No dia 31.5.2013, foi celebrado um contrato com a ……………….., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 6B, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 018AQ/6B/2013)”, cf. fls. 537- 541, repetido a fls. 685-689 dos autos em suporte de papel.
39 - No dia 31.5.2013, foi celebrado um contrato com a …………………., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 7B, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 15AQ/7B/2013)”, cf. fls. 519-523, repetido a fls. 671-674 dos autos em suporte de papel.
40 - No dia 31.5.2013, foi celebrado um contrato com a ……………………, mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 8A, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 05AQ/8A/2013)”, cf. fls. 529-532, repetido a fls. 677-680 dos autos em suporte de papel.
41 - No dia 30.8.2013, foi celebrado um contrato com a ………………….., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 6C, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 038AQ/6C/2013)”, cf. fls. 627-631, repetido a fls. 784-788 dos autos em suporte de papel.
42 - No dia 30.8.2013, foi celebrado um contrato com a ……………………, mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 7B Ajuda, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 041AQ/7B Ajuda/2013)”, cf. fls. 632-635, repetido a fls. 789-792 dos autos em suporte de papel.
43 - No dia 6.9.2013, foi celebrado um contrato com a …………………., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 4B, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 040AQ/4B/2013)”, cf. fls. 636-640, repetido a fls. 793-797 dos autos em suporte de papel.
44 - No dia 6.9.2013, foi celebrado um contrato com a …………………., mediante ajuste directo da “Aquisição de Serviços de Manutenção e Trabalho de Reabilitação de Espaços Verdes para a Zona 1A, lançado ao abrigo do Acordo-Quadro (Concurso n.º 039AQ/1A/2013)”, cf. fls. 641-645, repetido a fls. 798-802 dos autos em suporte de papel.

2. Do Direito

2.1. Questão prévia - efeito do recurso
Com referência aos recursos interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas, requereu a autora que seja fixado efeito meramente devolutivo, para o que sustenta, em síntese, que “apesar de a decisão recorrida ter sido proferida ao abrigo do disposto no art. 121º, n.º 1 do CPTA, ou seja, em antecipação do juízo sobre a causa principal, a mesma deve entender-se como uma decisão respeitante à adopção de uma providência cautelar, para efeitos de aplicação do disposto no art. 143º, n.º 2 do CPTA”.
Vejamos.
A decisão recorrida foi proferida ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 121º do CPTA, isto é, antecipando o juízo sobre a causa principal. Assim sendo, pareceria, num primeiro olhar sobre a questão, que os recursos da mesma interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas, teriam efeito suspensivo, pois que estamos perante uma decisão que se pronuncia sobre a matéria do processo principal e não sobre a adopção de providência cautelar (cfr. artigo 143º, n.ºs 1 e 2 do CPTA).
A verdade, porém, é que não podemos deixar de ter presente que, a ser assim entendido, o requerente da providência cautelar/autor da acção principal ficaria desprovido de qualquer tutela cautelar, ficando na mesma situação em que se encontrava anteriormente à instauração da providência cautelar.
Como referem a este propósito Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “se, uma vez proferida, ao abrigo deste artigo 121º, uma sentença favorável ao requerente da providência cautelar, os efeitos desta sentença ficassem suspensos, o interessado ficaria colocado na mesma situação em que já se encontrava, sem providência cautelar, que não lhe foi concedida, pese embora o tribunal ter entendido que lhe assistia razão” quando a verdade é que “o juiz lançou mão do mecanismo deste artigo 121º (…) por entender que a situação do requerente, pela “natureza das questões” e a “gravidade dos interesses envolvidos”, exigia uma definição urgente e formulou um juízo favorável ao requerente” (in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª edição revista, 2010, págs. 826/827).
De modo a ultrapassar os efeitos perniciosos desta interpretação literal dos preceitos em causa, impõe-se fazer “uma interpretação extensiva do artigo 143º, n.º 2 em conformidade com o princípio da tutela jurisdicional efectiva, de modo a enquadrar as decisões sobre o mérito da causa proferidas ao abrigo deste artigo 121º na categoria das “decisões respeitantes à adopção de providências cautelares” a que aquele preceito se refere” (in ob. cit., pág. 827). 
Em face do exposto, defere-se o requerido pela recorrida e, em consequência, fixa-se aos recursos interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas efeito devolutivo.
2.2. Da utilidade do recurso interposto pelas contra-interessadas [cfr. conclusões A) a C) das contra-alegações da recorrida]
Sustenta a recorrida que o recurso apresentado pelas contra-interessadas carece de utilidade, uma vez que as mesmas delimitaram “o [seu] objecto (…) à parte da sentença que anulou os actos de adjudicação das propostas apresentadas pelas Recorrentes, condenando o Município de Lisboa à exclusão de tais propostas e a adjudicar a proposta apresentada pela ora Recorrida” e “não [atacaram] a parte da sentença que, na sequência do pedido de ampliação do objecto do processo impugnatório, anulou os contratos (de acordo-quadro) celebrados entre o Município de Lisboa e cada uma das Recorrentes”, razão pela qual, entende aquela “que, no que às Recorrentes respeita, essa parte da sentença já transitou em julgado” (cfr. conclusões A) e B) das contra-alegações da recorrida).
Assim sendo, conclui a recorrida que o recurso das contra-interessadas “carece de qualquer utilidade, pois mesmo que as Recorrentes pudessem afastar a sentença que determinou a exclusão das suas propostas, já não podem aceder à celebração do contrato visado pelo procedimento no âmbito do qual tais propostas foram apresentadas” (cfr. conclusão C) das contra-alegações).
Sem razão, porém.
O pressuposto da decisão de anular os contratos celebrados foi o de que as propostas das contra-interessadas deveriam ter sido excluídas; isto é, a anulação dos contratos surge como consequência da exclusão dessas propostas.
Assim sendo, torna-se evidente que não podemos dissociar uma coisa da outra, o que vale por dizer que se se decidir que assiste razão às contra-interessadas no recurso que interpuseram, então forçoso é concluir que o Tribunal a quo andou mal quando determinou a exclusão das suas propostas e, consequentemente, a anulação dos contratos.
2.3. Entrando agora na apreciação dos fundamentos dos recursos interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas, a questão que importa decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito ao concluir pela existência de fundamento para a exclusão das propostas apresentadas pelas contra-interessadas …………………………………….., Lda e …………………………………………, Lda.
2.3.1. E o primeiro problema que temos de enfrentar neste domínio - tanto mais que o mesmo foi expressamente suscitado pelos recorrentes - é o de determinar com precisão qual foi(ram) o(s) vício(s) que Tribunal a quo considerou verificado(s) para concluir naquele sentido, problema este que contende com o âmbito dos recursos do réu e das contra-interessadas e também com o âmbito da ampliação do objecto do recurso requerida pela recorrida, ou melhor, com a delimitação das questões que tais recursos colocam.
Vejamos, então.
Lendo atentamente a sentença recorrida, outra conclusão não podemos retirar que não seja a de que o TAC de Lisboa entendeu que as propostas apresentadas pelas contra-interessadas deveriam ter sido excluídas ao abrigo do disposto no artigo 70º, n.º 2, als. f) e g) do CCP.
Apreciando o vício de violação de lei invocado pela autora, consubstanciado na infracção do disposto no artigo 70º, n.º 2, al. g) doCCP, refere-se na sentença recorrida o seguinte: “No caso em apreço, a ………………………. e a …………………, que constituem “uma única empresa e uma unidade económica” (p. 21 do parecer), apresentaram substancialmente, uma única proposta, como se referiu anteriormente. Inexiste, pois, concorrência entre as formalmente duas propostas por si apresentadas, desde logo, por inexistir o pressuposto de base, i.é., duas propostas substancialmente distintas. Daí que subsuma os factos à ilegalidade prevista na al. f) do n.º 2 do art. 70º do CCP, pois nem sequer a finalidade do concurso público se atingiria, ao não terem sido adjudicadas 10 propostas diferentes. Trata-se, assim, de qualificação jurídica diferente dos mesmos factos e não da apreciação de causa de invalidade diferente da invocada”.
Ou seja, pese embora tenha começado por enquadrar a questão em termos de violação das regras da concorrência, entendendo que a mesma se verificava - na medida em que afirma, e passamos a citar, “inexiste, pois, concorrência entre as formalmente duas propostas” -, o TAC de Lisboa acaba por concluir, não pela aplicação da al. g) do n.º 2 do artigo 70º do CCP como fundamento para a exclusão das propostas das contra-interessadas - como à partida pareceria mais lógico -, mas sim da al. f) do mesmo preceito.
Mas mais: ciente de que a autora não havia alegado tal vício, refere que do que se trata não é da apreciação de uma causa de invalidade diferente da invocada, mas antes de uma diferente qualificação jurídica dos mesmos factos.
E assim, numa primeira e menos atenta leitura da sentença recorrida, poderíamos ser levados a concluir que o Tribunal a quoentendeu que as propostas das contra-interessadas deveriam ter sido excluídas unicamente com fundamento na al. f) do aludido preceito.
Só que o discurso fundamentador da sentença recorrida não se fica por aí, antes prossegue com a transcrição do Acórdão do STA de 1/06/2006, proc. n.º 1126/05, pois que se entendeu que a doutrina aí expendida “revela utilidade para o presente caso”. Ora, sendo embora verdade que - como alegam os recorrentes - grande parte da transcrição respeita à citação que o STA fez da sentença proferida em 1ª instância que estava sob recurso, o certo é que foi pelo mesmo acolhido o entendimento de que “tendo duas das empresas concorrentes a um concurso público de concessão e exploração como único sócio e gerente a mesma pessoa, entre elas não pode haver concorrência, pelo que se impõe a respectiva exclusão do concurso” (cfr. ponto 1. do sumário do acórdão em referência). 
Assim sendo, ao transcrever tal Acórdão do STA por entender que o mesmo é útil para a solução do caso e tendo presente a doutrina nele acolhida, forçoso é concluir que o TAC de Lisboa considerou que as propostas das contra-interessadas deveriam ter sido excluídas dada a existência de actos susceptíveis de falsear as regras de concorrência, isto é, (também) com fundamento na al. g) do n.º 2 do artigo 70º do CCP.
Importa, assim, apreciar o erro de julgamento de que alegadamente padece a sentença recorrida nessa dupla vertente, isto é, por violação do disposto na alínea f) e na alínea g) do n.º 2 do artigo 70º do CCP.
2.3.2. Da violação do artigo 70º, n.º 2 al. f) do CCP
Como vimos, entendeu o Tribunal a quo que, constituindo “a ……………… e a ………………… …) uma única empresa e uma unidade económica” e tendo, por isso, apresentado “substancialmente, uma única proposta”, estamos perante a “ilegalidade prevista na al. f) do n.º 2 do art. 70º do CCP, pois nem sequer a finalidade do concurso público se atingiria, ao não terem sido adjudicadas 10 propostas diferentes”.
Ou seja, entendeu o TAC de Lisboa que a finalidade do concurso público em causa nos autos era a celebração de um acordo-quadro que tivesse por base a adjudicação de 10 propostas diferentes, o que não foi respeitado, dado que as contra-interessadas apresentaram “substancialmente, uma única proposta”; concluiu, assim, que as propostas por elas apresentadas deveriam ter sido excluídas, nos termos do disposto no artigo 70º, n.º 2, al. f) do CCP. 
A sentença recorrida não refere expressamente quais as “vinculações legais ou regulamentares” que foram violadas e que determinam a exclusão das propostas das contra-interessadas ao abrigo desta disposição legal; tão só considerou que não foi atingida a finalidade do concurso público. Perante tal afirmação, outra conclusão não podemos tirar que não seja a de que o Tribunal a quo entendeu que foram violadas as regras impostas pelas peças do procedimento, designadamente pelo Programa de Concurso e pelo Caderno de Encargos, pois que são elas que definem a finalidade, o objectivo do concurso público.
Os recorrentes discordam do assim decidido, alegando, em síntese, que:
- O disposto naquele preceito “nada tem a ver com o argumento de não exclusão das propostas não se ter atingido a finalidade do concurso público, porque de acordo com esta norma, o motivo da exclusão reside na circunstância da proposta dar origem à celebração de um contrato ilegal” [cfr. conclusão II das alegações do Município de Lisboa];
- “A circunstância de a finalidade do concurso ser a de adjudicar 10 propostas, não é posta em causa por terem sido adjudicadas estas duas propostas”; “é que, na perspectiva da contratação pública, tal como se chegou à conclusão que cada um destas duas concorrentes (pessoas colectiva societárias) apresentou uma única proposta – não violando, portanto, o n.º 7 do artigo 59.º do CCP– impõe-se concluir também que o Acordo Quadro foi celebrado com dez diferentes prestadores de serviços (dez diferentes sociedades), em resultado da maior vantajosidade das suas próprias propostas relativamente a todas as demais” [cfr. conclusões 14.ª e 15.ª das alegações das contra-interessadas];
- “A circunstância de aquelas duas propostas terem igual conteúdo é, neste plano, totalmente irrelevante, porque, ao contrário do que afirma a sentença recorrida, a finalidade do procedimento concursal não é a adjudicação de 10 propostas diferentes, mas sim é a de celebração de um contrato (o Acordo Quadro) com dez prestadores de serviços” [cfr. conclusão 16.ª das alegações das contra-interessadas];
- “(…) mesmo numa visão mais abrangente da alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP segundo a qual a exclusão das propostas também deve ocorrer nos casos em que a entidade adjudicante tenha a certeza objectiva de que as prestações do contrato a celebrar, tal como foram configuradas na proposta a que o concorrente se vinculou irrevogavelmente, não podem ser executadas sem que o adjudicatário incorra numa ilegalidade, a verdade é que não se vislumbra em que é que a específica execução do Acordo Quadro por banda das ora Recorrentes implica necessariamente um desrespeito de vinculações legais ou regulamentares «aplicáveis» a essa execução” [cfr. conclusão 17.ª das alegações das contra-interessadas].
Vejamos.
O artigo 70º, n.º 2, al. f) do CCP prevê como causa de exclusão das propostas a circunstância de o contrato a celebrar implicar “a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis”.
Do que se trata é, pois, de não permitir a existência de propostas que irão dar origem à celebração de contratos que não observem as normas legais e regulamentares que disciplinam as actividades a desenvolver.
Como referem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, o preceito em causa torna “claro que os atributos e termos e condições das propostas, e estas mesmas, além de conformes (ou compatíveis) com as exigências das peças do procedimento, devem ser também compatíveis com os preceitos imperativos da lei ou regulamento respeitantes às actividades a desenvolver ao abrigo do contrato em causa ou ao próprio regime legal dessa espécie ou género contratual. Não deve pois uma proposta violar, por exemplo, por qualquer meio, as normas da Parte III do CCP, sobre o regime substantivo dos contratos administrativos. O que significa ter de excluir-se, num procedimento para aquisição de serviços de segurança, a proposta que apresente valores relativos a encargos sociais obrigatórios inferiores aos valores mínimos previstos na convenção colectiva de trabalho aplicável ou uma proposta donde constasse um termo inicial do prazo de execução da obra de empreitada diferente do que resulta do art. 362º doCCP. E concluem: “quando a lei se refere a “vinculações legais ou regulamentares aplicáveis”, está a reportar-se não a vinculações de natureza pré-contratual (incluindo aquelas que constem do caderno de encargos), mas a regras de lei ou de regulamentos gerais (…), aplicáveis ao contrato, em si mesmo” (in Concursos e outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, págs. 939/940).
Ora, como é bom de ver, não é disso que se trata quando o Tribunal a quo conclui que as propostas das contra-interessadas não permitem atingir a finalidade do concurso público. O que está aí em causa é um juízo de conformidade das propostas com as regras estabelecidas no Programa de Concurso e no Caderno de Encargos e não com as normas legais e com os regulamentos que disciplinam a actividade a desenvolver ao abrigo do contrato a celebrar ou o regime legal dessa espécie ou género contratual.
Vale isto por dizer que não estamos perante uma situação que tenha enquadramento na al. f) do n.º 2 do artigo 70º do CCP.
Além disso e como quer que seja, o que a entidade adjudicante pretendia era celebrar um acordo-quadro com dez co-contratantes, os quais apresentassem outras tantas propostas (cfr. pontos 2) e 4) do probatório) e isso não foi posto em causa com as propostas apresentadas pelas contra-interessadas. Na verdade, embora sejam os mesmos os seus sócios gerentes, cada uma delas constitui uma pessoa jurídica autónoma com personalidade própria.
Como se refere no Acórdão do STA de 11/01/2011, proc. n.º 0851/10, ainda no caso das empresas coligadas, por força da relação de domínio ou de grupo existente entre elas, as mesmas “mantêm a sua autonomia jurídica, que subsiste em todas as situações em que a mesma não seja afastada por lei. E, no âmbito da contratação pública, o Código dos Contratos Públicos não a afastou, pois que consagrou uma definição de concorrente alicerçada no conceito tradicional de personalidade jurídica, estabelecendo que é concorrente a “pessoa”, singular ou colectiva, que apresente uma proposta (artigo 53.º), pelo que, tais pessoas, não estando agrupadas para efeitos de um concurso (de acordo com o estabelecido no artigo 54.º), são pessoas autónomas com propostas autónomas”.
Concluímos, em face do exposto, que mal andou o TAC de Lisboa ao concluir pela exclusão das propostas das contra-interessadas ao abrigo do disposto no artigo 70º, n.º 2, al. f) do CCP.
2.3.3. Da violação do artigo 70º, n.º 2 al. g) do CCP
Questão diferente é a de saber se o facto de terem sido apresentadas duas propostas absolutamente idênticas por dois concorrentes que têm a mesma estrutura societária e os mesmos gerentes impunha a sua exclusão nos termos do referido preceito.
As recorrentes respondem negativamente a esta questão, aduzindo, em síntese, os seguintes argumentos:
- Para que as propostas por si apresentadas pudessem ser excluídas com fundamento na alínea g) do n.º 2 do artigo 70.º do CCPseria necessário que o artigo 4.º da Lei da Concorrência se aplicasse ao caso da apresentação de propostas por concorrentes que estão entre si em relações de grupo ou de domínio; 
- Ora, “a noção de empresa relevante para efeitos do direito da concorrência não corresponde à noção de pessoa jurídica, seja singular ou colectiva”, sendo que, nos termos do n.º 2 do artigo 2º da Lei da Concorrência, considera-se “como uma única empresa o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, constituem uma unidade económica ou que mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes dos direitos ou poderes enumerados no n.º 1 do artigo 10.º”;
- Mostrando-se provado que as contra-interessadas “têm os mesmos sócios, então, para o direito da concorrência, quer nacional quer europeu, este conjunto de duas pessoas jurídicas distintas constitui uma única empresa, pois este conjunto constitui uma unidade económica”, na medida em que “as suas relações caracterizam-se pela falta de independência, pela existência de um poder de controlo único e simultâneo sobre uma e sobre a outra, fruto da participação total no capital social de ambas as sociedades pelas mesmas pessoas”;
- E “se estamos perante uma única empresa, e não duas empresas, então o disposto no n.º 1 daquele artigo 4.º não pode ser convocado para aferir se a prática concertada destas duas concorrentes na apresentação das respectivas propostas a um concurso público consistiu, nalguma medida, numa prática restritiva, falseadora ou limitadora da concorrência”;
- Os actos, acordos ou concertações praticados no seio de operadores económicos ligados por relações de grupo ou de domínio, não são proibidos pelo disposto no artigo 4º da Lei n.º 18/2003.
Vejamos.
Nos termos do disposto no artigo 70º, n.º 2, al. g) do CCP, devem ser excluídas as propostas cuja análise revele “a existência de fortes indícios de actos, acordos, práticas ou informações susceptíveis de falsear as regras da concorrência”.
Como decidiu o STA no acórdão de 11/01/2011, proc. n.º 0851/10, nesta matéria importa “determinar o conteúdo do conceito de situações susceptíveis de influenciarem a concorrência, para aferir da ocorrência dessa situação no caso presente”, o que “passa pela interpretação do artigo 4º da Lei n.º 18/2003, de 11/6 (Lei da Concorrência), que aprovou o regime jurídico da concorrência, no qual, sob a epígrafe "práticas proibidas", se dispõe: "1 - São proibidos os acordos entre empresas, as decisões de associações de empresas e as práticas concertadas entre empresas, qualquer que seja a forma que revistam, que tenham por objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente as que se traduzam em (…)”. E conclui: “constitui uma prática proibida a prática concertada entre empresas, qualquer que seja a forma que revista, que tenha como objecto ou como efeito impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência no mercado”.
No caso em apreço, resultam apurados os seguintes factos com relevância para a apreciação da questão em análise:
- As propostas apresentadas pela ………………………. e pela ……………………… apresentam preços mensais iguais para as 34 Zonas definidas no Anexo I do Caderno de Encargos (cfr. ponto 15) do probatório);
- O documento “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos”, apresentado juntamente com a proposta pela ……………………….. é exactamente igual ao documento “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos”, apresentado juntamente com a proposta pela ………………….., incluindo os erros ortográficos, constantes dos referidos documentos, são os mesmos (cfr., a título de exemplo, “equipa opracional” nos fluxogramas constantes da p. 15 do doc. n.º 8 junto ao processo cautelar e p. 16 do doc. n.º 9 junto ao processo cautelar e documentos que integram as propostas apresentadas pela …………………. e ……………………, juntas ao processo administrativo e o conteúdo integral dos docs. n.ºs 8 e 9 juntos ao processo cautelar, cada um dos quais com mais de 20 páginas, que aqui se dão por integralmente reproduzidos (cfr. ponto 16) do probatório);
- O conteúdo e a forma da “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo e Gestão da Qualidade”, apresentada pela …………………… e pela ……………………, são iguais, designadamente, o conteúdo e forma dos fluxogramas, o conteúdo e forma dos quadros constantes dos referidos documentos (cfr. ponto 17) do probatório);
- Os documentos designados por “Nota Introdutória da Proposta …………………., Lda.” (da ……………………..) - doc. que integra a proposta apresentada pela ……………………, junta ao processo administrativo, e doc. n.º 12 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzido - e “Apresentação da Proposta da …………………., Lda.” (da ……………………………) - doc. que integra a proposta apresentada pela ……………………….., junta ao processo administrativo, e doc. n.º 13 junto ao processo cautelar, que aqui se dá por integralmente reproduzida - têm, também, uma parte introdutória exactamente igual e, após a indicação do valor mensal global, apresentam idêntica estrutura e conteúdo (cfr. ponto 18) do probatório);
- As peças do procedimento não ofereciam minutas/”templates” para documentos como a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos” ou a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo e Gestão da Qualidade” (cfr. ponto 19) do probatório);
- A gerência da ……………………. é composta por (i) Maria ……………………; (ii) Fernando …………………………..; (iii) e João ………………………………… (cfr. ponto 24) do probatório);
- A gerência da ………………….. é composta por (i) Maria …………………………………; (ii) Fernando ………………………..; (iii) e João ………………………………. (cfr. ponto 25) do probatório);
- O suporte de papel da proposta apresentada pela …………….. foi assinado por João ………………………………… (cfr. proposta junta ao processo administrativo) e electronicamente subscrita por Maria …………………………………. (cfr. ponto 26) do probatório);
- Desde 03/06/2011, João …………………………… é também gerente da …………………… (cfr. ponto 27) do probatório);
- Tanto o suporte de papel como o suporte electrónico da proposta da ……………………. foram assinados por Maria ………………………………….. (cfr. ponto 28) do probatório).
Pese embora as contra-interessadas apresentem a mesma estrutura societária e os mesmos gerentes, o certo é que, como atrás referimos, são pessoas jurídicas autónomas, detendo personalidade jurídica própria e, nessa medida considera-se que estamos perante duas concorrentes, apresentando cada uma a sua proposta (cfr. artigo 53º CCP).
Mas será que a circunstância de as duas concorrentes terem os mesmos sócios e gerentes traduz, por si só, a existência de fortes indícios de actos, acordos, práticas ou informações susceptíveis de falsear as regras da concorrência?
Citando uma vez mais o Acórdão do STA de 11/01/2011, diremos que “a LC não estabelece qualquer presunção (…) de que da simples relação de domínio entre as empresas resulte o falseamento das regras de concorrência, antes exigindo que existam acordos, decisões ou práticas concertadas susceptíveis de falsear as regras da concorrência, ou seja, situações reais e não meramente hipotéticas ou potenciais, que possam ser precisamente objectivadas como tendo levado a prejudicar essa concorrência.
E foi também essas situações que o CCP visou evitar, tendo consagrado a existência de fortes indícios, que não significa outra coisa que não a detecção da existência de situações, no caso concreto, que tenham prejudicado efectivamente a concorrência. Esse prejuízo tem, pois, que resultar do real comportamento dos concorrentes no âmbito do concurso, não podendo resultar de meras hipóteses ou probabilidades. Tem que resultar de uma concertação, no caso concreto, susceptível de falsear as regras da concorrência, que não pode ser considerada preenchida com uma antecedente, porventura longínqua e duradoura situação jurídica, que opera no dia-a-dia das empresas e que não se sabe se influencia e em que medida influencia o exercício da sua actividade”
. 
Esta é a interpretação correcta da norma em análise, a qual, aliás, está de acordo com o entendimento do TJUE, designadamente no acórdão Assitur, de 19/5/2009.
O TJUE decidiu então que as causas de exclusão enunciadas no artigo 29.º da Directiva n.º 92/50 do Conselho, de 18/6/1992, não são taxativas, podendo os Estados Membros estabelecer outras causas de exclusão que visem impedir a violação da concorrência; entendeu, porém, que o direito comunitário não permite uma disposição nacional que consagre uma proibição absoluta, para as empresas entre as quais exista uma relação de domínio ou que estejam associadas entre si, de participar de forma simultânea num mesmo concurso, sendo que só através da análise concreta do comportamento dessas empresas no âmbito do concurso e das propostas por elas apresentadas se pode aferir se houve ou não entre elas uma prática concertada violadora do princípio da concorrência.
Isto posto e sendo certo que, pelo facto de apresentarem a mesma estrutura societária e os mesmos gerentes, as contra-interessadas não estavam impedidas de participar no procedimento concursal em causa nos autos, importa agora apreciar se os factos provados permitem concluir pela existência de fortes indícios de actos, acordos, práticas ou informações susceptíveis de falsear as regras da concorrência.
A resposta é afirmativa.
Tendo presentes os factos acima referidos, impõe-se concluir que as contra-interessadas conheciam as propostas mutuamente. Com efeito, pese embora as peças do procedimento não oferecerem minutas/”templates” para a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo de Gestão dos Prazos” e para a “Nota Técnica sobre a Metodologia de Controlo e Gestão da Qualidade”, o certo é tais documentos apresentados pelas contra-interessadas são exactamente iguais, incluindo os erros ortográficos. Como iguais são os preços mensais por elas indicados nas respectivas propostas para as 34 Zonas definidas no Anexo I do Caderno de Encargos. Como igual é a parte introdutória dos documentos designados por “Nota Introdutória da Proposta …………………………., Lda” e “Apresentação da Proposta da …………………………., Lda”. Acresce que, as propostas apresentadas pelas duas contra-interessadas foram assinadas electronicamente por Maria …………………………………….
Resulta destes factos que a confidencialidade das propostas não estava assegurada, na medida em que pelo menos aquela sócia gerente conhecia as duas propostas antes da sua abertura pública, propostas essas em tudo idênticas.
Existem, pois, fortes indícios de práticas concertadas entre as contra-interessadas na elaboração e apresentação das suas propostas, as quais são susceptíveis de falsear as regras da concorrência, o que determina a sua exclusão nos termos do disposto no artigo 70º, n.º 2, al. g) do CCP.
Concluímos, em face do exposto, que a sentença recorrida não incorreu no erro de julgamento que os recorrentes lhe imputaram, improcedendo, consequentemente, os recursos pelos mesmos interpostos.
Fica, assim, prejudicado o conhecimento “dos fundamentos em que a parte vencedora decaiu”, pedido por formulado pela autora/recorrida ao abrigo do disposto no artigo 636º, n.º 1 CPC.
*

DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em:
1. Fixar aos recursos interpostos pelo réu e pelas contra-interessadas efeito devolutivo;
2. Negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida com a actual fundamentação.
Custas pelos recorrentes.



Lisboa, 26 de Novembro de 2015

_________________________ 
(Conceição Silvestre)


_________________________ 
(Cristina dos Santos)


_________________________ 
(Paulo Pereira Gouveia

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