sexta-feira, 20 de setembro de 2013

VALOR DA CAUSA; PROCEDIMENTO PRÉ-CONTRATUAL - CONTEÚDO ECONÓMICO DA ADJUDICAÇÃO



Proc. Nº 09667/13                   TCAS                       11 Abril 2013


1.O arº 34º do CPTA aplica-se apenas aos processos sobre interesses imateriais ou sobre normas administrativas.

2.O “conteúdo económico” da adjudicação, no caso concreto, só pode traduzir-se no valor da proposta que a A. apresenta no âmbito do procedimento concursal, já que é pelo valor da mesma que a A., ganhando a causa, irá outorgar e celebrar com a Administração o contrato - cfr. artºs. 32º nº 3 e 33º (proémio) CPTA


G…… – Companhia ………………. SA, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria dela vem recorrer, concluindo como segue:

1. O valor da causa deve corresponder ao beneficio económico que o autor auferirá se a acção que intentou vier a ser julgada procedente (cf. art.° 31.° n.°l do CPTA).
2. O benefício económico que para a Requerente resultaria da adopção das providências cautelares consistiria no lucro que a mesma auferiria com o fornecimento das refeições ao Município de Abrantes (cf. Acórdão Tribunal Central Administrativo Sul de 10-09-2009, proferido no processo 05403/09, disponível em www.dgsi.pt ).
3. O valor da proposta apresentada pela Uniself não corresponde ao lucro que obteria com o fornecimento de refeições.
4. O preço proposto não reflecte apenas o lucro que o co-contraente irá obter com a prestação dos serviços mas também todos os custos que ele terá que suportar com essa prestação (nomeadamente, matéria-prima alimentar, matéria-prima não alimentar, encargos com pessoal, encargos gerais, etc.) (cf. art.° 97° n.° l do CCP e cláusula 7a, n.° 2, das Cláusulas Jurídicas do Caderno de Encargos do Concurso subjudice). Mais,
5. O lucro que a U………… obteria com a execução do contrato é indeterminável.
6. Com efeito, o lucro obtido variará consoante o número de refeições diárias efectivamente servidas e a duração do fornecimento.
7. O que está determinado é, pois, e apenas, o preço do fornecimento proposto pela U……….., sendo indeterminado o valor do lucro que a U………..obteria com esse fornecimento.
8. Não sendo possível determinar o conteúdo económico do acto de adjudicação há que recorrer ao critério supletivo estipulado no art.° 34.° n.° l do CPTA.
9. Pelo que deveria ter sido fixado à causa o valor de 30.000,01 €, tal como indicado pela Requerente (cf. Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 3 de Fevereiro de 2011, proferido no processo n.° 06801/10, e de 18 de Novembro de 2010, proferido no processo n.° 06614/10, in www.dgsi.pt)
10. Ao atribuir à causa o valor de 300.661,206 (correspondente ao valor da proposta da U…..), violou a sentença recorrida o disposto nos art.os 31.° n.° l, 32° n.° 6, 33.° e 34.° n.° 2 do CPTA.
11. Devendo, em consequência, ser julgado procedente o presente recurso.

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Não houve contra-alegações.

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Com dispensa de vistos substituídos pelas competentes cópias entregues aos Exmos. Juizes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência - art°s. 36° n° 2 CPTA e 707° n° 2 CPC, ex vi art° 140° CPTA.

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Não está em causa a matéria de facto levada ao probatório na sentença cautelar, pelo que ao abrigo do regime do artº 713º nº 6. CPC remete-se para os seus precisos termos.


DO DIREITO

Sobre a questão ora suscitada a pronúncia do Tribunal a quo em sede de fundamentação é a seguinte:
“(..) Às partes cabe atribuir um valor às causas (art° 31° do CPTA), cabendo ao juiz a fixação do valor, utilizando para tanto os critérios gerais, especiais e supletivo.
No caso presente, a prestação pretendida pela ora recorrente, entre o mais, foi a de adjudicação provisória do contrato.
Aliás, com a celebração do contrato em causa (cfr. 108° do requerimento inicial) a ora recorrente tinha a expectativa de auferir o montante de 901.983,606, sendo certo que, no caso, apenas foi considerado o valor relativo a um ano de contrato - 300.661,20€ -, uma vez que a sua prorrogação depende, em cada ano lectivo, de atinente e pontual acto da entidade adjudicante.
De resto, não se vislumbra que face à caracterização de valor indeterminável operada pelo n° 1 do art° 34° do CPTA a situação dos autos devesse ser considerada como sendo de valor indeterminável na situação em causa em que se formula uma pretensão com valor certo e definido, sendo certo que o n° 6 do art° 32° releva precisamente o valor da prestação pretendida a título provisório, como é o caso presente, e não o lucro ou qualquer outro valor.
Julgo de manter a condenação em custas. (..)”

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Na circunstância o valor atribuído à causa pela Requerente cautelar U…….. – Sociedade de …………….., SA foi de 30.000,01 €, alterado pelo Mmo. Juiz para o valor da respectiva proposta apresentada a concurso, de 300.661,20€.
A ora Recorrente G………… – Companhia ……………. SA é Contra-interessada na presente acção cautelar em que foi Requerente U………. – Sociedade ……………., SA que deduziu pedido múltiplo de decretamento de providências nos termos que se transcrevem de fls. 2/3 do requerimento inicial:
I. providência cautelar de suspensão do concurso público para o fornecimento de refeições para as Escolas do 1º Ciclo e Jardins de Infância do concelho de Abrantes – concurso público nº …/2012 - e de suspensão de eficácia do acto de adjudicação à sociedade G……. – Companhia ………………….SA do contrato de prestação de fornecimento de refeições para as Escolas do 1º Ciclo e Jardins de Infância do concelho de Abrantes, consubstanciado no despacho da Senhora Presidente da Câmara Municipal de 10 de Setembro de 2012;
II. providência cautelar de adjudicação provisória do mesmo contrato à Requerente;
III. providência cautelar de intimação do Município de Abrantes para se abster de celebrar o contrato com a G………. – Companhia ………… SA, ou a suspensão da sua eficácia caso o mesmo já tenha ou venha entretanto a ser celebrado, suspendendo-se a respectiva execução.

A matéria em causa já foi objecto de decisões em sentido não coincidente, nomeadamente mediante prolação do acórdão no rec. nº 7958/11 de 07.12.2011, de cuja formação fizemos parte, onde se fundamentou a favor do valor da proposta apresentada a concurso pelo concorrente que assume a posição jurídica de Autor na causa, com voto de vencido, como segue:
“(..) I.1. FACTOS PROVADOS
1. Na presente acção, a A indicou na p.i. Euro 30.000,01 como o valor processual.
2. A proposta da A, ora recorrente, no concurso em causa nestes autos foi no valor de 3.282.335€.

I.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO
O âmbito do recurso jurisdicional, cujo objecto é a decisão recorrida, é delimitado pelo Recorrente nas conclusões (sintéticas e com a indicação das normas jurídicas violadas) das suas alegações (sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso), apenas podendo incidir sobre questões que tenham sido ou devessem ser anteriormente apreciadas e não podendo confrontar o tribunal ad quem com questões (coisa diversa das considerações, argumentos ou juízos de valor) novas ou cobertas por caso julgado.
Vejamos.
O Tribunal a quo entendeu:
Com efeito o que a A. pretende é que lhe seja adjudicada a proposta por si apresentada no citado concurso, em que ficou classificada em terceiro lugar, questionando a admissão dos outros dois concorrentes melhor classificados (1º e 20 lugar). Pelo que ambos os pedidos se dirigem à obtenção de uma única utilidade económica, ou seja adjudicação à ora Autora da aludida proposta.
Então o valor económico da pretensão reclamada nos presentes autos há-de corresponder ao efeito jurídico pretendido e este é indubitavelmente a adjudicação da proposta por si apresentada a concurso.
Assim foi decidido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, em 14.02.2007, no Rec…, cujo sumário se transcreve:
“(..)Respeitando a acção a acto procedimental desenvolvido sob a égide de processo concursal disciplinado pelo DL n. 197/99, de 08/06 e considerando a estrutura do pedido formulado em que o que em última instância a A. visa é obter a adjudicação do concurso temos que o valor da acção, em termos da "utilidade económica imediata do pedido", terá de atender, de harmonia com os arts. 31. n. 1 e 32. 1 em conjugação com o corpo do art. 33.0 todos do CPTA, ao "conteúdo económico do acto", o qual se traduz no valor da proposta que a mesma apresentou no âmbito do procedimento concursal já que é pelo valor da mesma que a A. irá outorgar e celebrar com a Administração o contrato," - disponível in www.dgsi.pt .
Cremos que o legislador não teve em mente a prévia análise contabilística do lucro e custos da proposta para aferir do valor da causa.
Não se trata pois de uma pretensão insusceptível de avaliação económica ou de bens imateriais, nos termos e para os efeitos previstos no art. 34°, n° 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Assim, decide-se fixar à presente acção o valor de € 3.282.335,85 (três milhões, duzentos e oitenta e dois mil trezentos e trinta e cinco euros e oitenta e cinco cêntimos) - vide proposta no processo administrativo apenso. (..).
***
Nos termos do disposto no art. 31°-1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) o valor da causa, enquadrado pelo art. 308º CPC, corresponde à utilidade económica imediata do pedido. Ou ao valor do benefício pretendido com a acção (v. arts. 32º-2 e 33º-1ª parte do CPTA e art. 313º-3-a CPC).
O que a A. pretende efectivamente, com a cumulação aparente de pedidos formulada nesta acção, é que lhe seja adjudicada (por outro acto administrativo) a proposta por si apresentada no citado concurso.
As situações administrativas relativas a “bens imateriais” previstas no art. 34.º-1 do CPTA e pelo mesmo consideradas de “valor indeterminável” dizem respeito àquelas situações em que estejam em causa ou se discutam bens, utilidades, posições jurídicas ou interesses insusceptíveis de avaliação económica ou pecuniária directa ou imediata (i.e., interesses imateriais ou normas administrativas).
Doutra forma: não se aplica às pretensões naturalmente insusceptíveis de avaliação económica, nem se aplica às pretensões temporária ou condicionalmente insusceptíveis de avaliação pecuniária directa; o art. 34º dispõe apenas para os processos sobre interesses imateriais ou sobre normas administrativas - cfr. assim MÁRIO AROSO…, Comentário…, 3ª ed., notas 1 aos arts. 34º, 33º e 32º.
Ora, não é o caso presente. Aqui, como é evidente, o pedido não versa sobre bens imateriais ou normas, pelo que o art. 34º é inaplicável.
Restam-nos os arts. 33º e 32º CPTA.
O benefício ou utilidade económica que a A. irá retirar com a procedência desta acção (adjudicação do concurso e celebração do contrato em conformidade com aquela adjudicação pelo valor da proposta) será o valor que terá de se considerar como sendo o valor da causa, visto, esse ser ou corresponder ao “conteúdo económico do acto” (aqui, é a adjudicação) ou ao benefício ou vantagem de natureza patrimonial, passível de avaliação pecuniária, que se traduz na efectivação do direito à obtenção da emissão do acto devido em termos do procedimento concursal em presença (a adjudicação, no caso concreto).
Note-se, aliás, que as acções que tenham por objecto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução dum contrato o valor da causa afere-se pelo valor do contrato o qual é aferido em função do seu preço ou do seu valor estipulado pelas partes (cfr. n.º 3 do art. 32.º do CPTA).
Concluímos, pois, pela aplicação aqui dos arts. 32º-2 e 33º-proémio do CPTA.
O “conteúdo económico” da adjudicação (v. arts. 32º-2 e 33º- proémio do CPTA), no caso em apreço, só pode traduzir-se aqui no valor da proposta que a A. apresentou no âmbito do procedimento concursal, já que é pelo valor da mesma que a A., ganhando a causa, irá outorgar e celebrar com a Administração o contrato.
III- DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar o recurso improcedente.
(..)
Paulo H Pereira Gouveia, relator
Cristina dos Santos
António Vasconcelos (vencido conforme declaração em anexo)
***
Voto de vencido.
Salvo melhor opinião, afigura-se-me que o recurso merece provimento.
Com efeito, o critério previsto no artigo 34° do CPTA, assumindo-se embora como critério de fixação do valor das causas de carácter subsidiário, é especificamente aplicável aos processos de valor indeterminável e, neste sentido, sobrepõe-se a qualquer outras das regras de feição genérica, como é o caso da enunciada no n° 6 do artigo 32° do mesmo diploma legal.
Situações que originam normalmente lucros cessantes de montante indeterminável e arrastam outras consequências de difícil reparação, nada parece obstar a que se aplique o critério supletivo do artigo 34° n° l, atribuindo-se à causa um valor indeterminável, ou seja considerando-se o mesmo superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo (cfr. n° 2 do citado artigo). (..)”.

*
De modo que, revendo posição relativamente ao sentido dos acórdãos prolatados nos recs. 5403/09 de 10-09-2009 e 8300/11 de 12.01.2012, entendemos que o valor da causa que compete é o resultante da proposta apresentada pela Requerente e aqui Recorrida U……….– Sociedade ……………………………….., SA.
Neste sentido improcede a questão suscitada nos pontos 1 a 10 das conclusões de recurso.


***

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes-Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença proferida.

Custas a cargo da Recorrente.


Lisboa, 11.ABR.2013


(Cristina dos Santos) …………………………………………………………………………

(Paulo Gouveia) …………………………………………………………………………….

(António Vasconcelos) ……vencido conforme declaração em anexo - Salvo melhor opinião, afigura-se-me que o recurso merece provimento. Com efeito, o critério previsto no artº 34º do CPTA, assumindo-se, embora, como critério de fixação do valor das causas de carácter subsidiário, é especificamente aplicável aos processos de valor indeterminável e, neste sentido, sobrepõe-se a qualquer outra das razões de feição genérica, como é o caso da enunciada no nº 6 do artº 32º do mesmo diploma legal.
Situações que originam, normalmente, lucros cessantes de montante indeterminável e arrastam outras consequências de diferente reparação, nada parece obstar a que se aplique o critério supletivo do artº 34º nº 1, atribuindo-se à causa valor indeterminável, ou seja, considerando-se o mesmo superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo (cfr. nº 2 do cit. artigo)

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