sexta-feira, 16 de novembro de 2012

ESCLARECIMENTOS DAS PROPOSTAS – ARTº 72º Nº 1 E 2 CCP




Proc. Nº 8847/12   5 de Julho de 2012     TCAS

Caso o Júri do concurso entenda que subsiste falta de clareza relativa a um dado aspecto da proposta, cumpre ao Júri, ponderado o âmbito de expansão de princípios potencialmente conflituantes – o princípio da concorrência, da igualdade e da transparência versus princípio do favor do procedimento na vertente dos concorrentes e das propostas -, pender a favor do regime de poderes oficiosos instrutórios estatuído no artº 72º nºs 1 e 2 CCP, solicitar de forma fundamentada e especificada os esclarecimentos tidos por necessários

ICP-ANACOM – Autoridade Nacional das Comunicações e A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA, ambas com os sinais nos autos, inconformadas com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vêm recorrer, concluindo como segue:

- Recurso da A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA:
1. O help desk é uma expressão informática que em termos práticos se traduz nas actividades de atendimento de telefonemas, na recepção de mensagens por via electrónica ou em suporte papel (fax), dos utilizadores que pretendam colocar questões.
2. Por isso, quando, em qualquer contexto, é afirmado "o Help Desk da ANACOM" ou que o "Help Desk pertence à ANACOM", o que tal significa é que esta entidade é detentora desse serviço, embora quem o execute seja obviamente o prestador de serviços, no caso a Recorrente, enquanto adjudicatária.
3. A proposta da Recorrente destina-se à execução de um conjunto de tarefas, desdobradas por diversas actividades, que de modo algum podem deixar de passar pela criação do Help Desk, bem como pela execução dos serviços de help desk e, concomitante e subsequentemente, pela sua gestão e manutenção.
4. Daí poder afirmar-se que o help desk é pertença de quem o adquire - o ICP-ANACOM - mas sem deixar de ter presente que a sua execução cabe ao prestador de serviços contratado.
5. Toda a proposta da Recorrente se cinge, portanto, à estrita vinculação ao Caderno de Encargos, nela se incluindo, obviamente, a execução pela Recorrente das tarefas de help desk do ICP-ANACOM.
6. Existe uma contradição insanável na sentença: de páginas 18 a 25 analisa a noção de ambiguidade e de esclarecimentos, mas, depois, a páginas 25 afirma que afinal a questão central é outra, que desenvolve em três parágrafos, sem estabelecer qualquer ligação com o antes afirmado.
7. A incorrecta identificação das questões que lhe competia solucionar, acrescida da contradição entre os fundamentos e a conclusão, implica, por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.
8. A formulação do Tribunal, utilizando de forma arrevesada duas negativas - construção que em bom português é sempre sinónimo da existência de uma alternativa (logicamente superior) -, revela que o Tribunal continuava a raciocinar com fundamento na existência de ambiguidades, e isto mesmo depois de ter afirmado que as mesmas não existiam.
9. O que implica, igualmente por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alínea c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.
10. Deu o Tribunal como assente, em K), factos sobre os quais depois se não pronunciou, constituindo essa omissão de pronúncia também uma violação do princípio do contraditório, o que implica ainda, por força do artigo 94.°, n.° 1, do CPTA e alínea c) do n.° 1 do artigo 668.° do CPC, a nulidade da sentença.
11. A simples leitura e verificação do conteúdo dos slides 51 e 52, permite concluir em sentido oposto do que revela a sentença.
12. É absurda a conclusão extraída do slide 55, porquanto nesse mesmo parágrafo da sentença que a contém, se conclui o contrário do que começa por ser afirmado.
13. Verifica-se, pois, que os três exemplos apontados para fundar a decisão retirados da análise incompleta e errada dos slides 51, 52 e 55 permitem concluir precisamente o contrário do que foi expresso na sentença.
14. Na verdade, o que dos citados três slides resulta inequivocamente é que a proposta da Recorrente se propõe executar todas as actividades inerentes ao help desk.
15. Acresce que no slide 56 (seguinte ao 55) afirma-se expressamente a forma como serão resolvidas as consultas provenientes dos utilizadores, referindo, na indicação das "Actividades Principais", designadamente, a "Recepção da consulta encaminhada pelo Help Desk".
16. Também os slides 86 e 87 o confirmam plenamente, em especial no que se refere ao "Funcionamento do Serviço de Desk" e a toda a descrição envolvente e explicativa do funcionamento das tarefas incluídas nessa prestação de serviços.
17. De igual modo, todos os slides 85 a 91 se referem ao help desk como um serviço a cumprir durante a execução do contrato.
18. O que significa que a análise de todos os demais slides, com destaque para os supra mencionados, permitiria confirmar, por evidente, que a Recorrente se propõe executar as funções do Help Desk.
19. O help desk não é, como resulta do entendimento do julgador da primeira instância, um objecto que seja detido ou possa ser detido, sem ligação a um serviço prestado a utilizadores. É uma função que faz parte integrante da prestação de serviços e que se enquadra, desdobra e multiplica por diversas fases e actividades e com as outras fases e actividades.
20. Deste modo, quando se refere que o help destk é detido pelo ICP-ANACOM ou que o ICP-ANACOM é detentor do help desk, o que está em causa é a assunção de que perante os utilizadores o help desk assim surge, assim se apresenta.
21. Para além de todos os documentos e slides que constituem a proposta da Recorrente se encontrarem em consonância com o Caderno de Encargos, a Recorrente declarou e assinou, consciente e responsavelmente, a declaração anexa ao CCP, que contém uma inequívoca declaração de vontade de aderir, sem reservas, ao que dela é esperado na execução da prestação de serviços.
22. A declaração negocial da Recorrente tem de ter o alcance que advém do disposto no artigo 236.° do Código Civil, porquanto "vale com o sentido que um declaratárío normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante".
23. E, mesmo que alguma imperfeição tivesse subsistido, ela teria de ser interpretada e compatibilizada com a previsão do artigo 238.° e, consequentemente, avaliada positivamente, no sentido de ser conforme com a proposta, no seu conjunto, pois existe suficiente correspondência literal para apoiar a interpretação que a Recorrente expõe.
24. A jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Sul e do Tribunal de Contas vão no sentido de permitir que a falta de indicação de determinados termos ou condições na proposta sobre aspectos de execução do contrato subtraídos à concorrência regulados no Caderno de Encargos não seja causa determinante de exclusão do procedimento por a situação não se subsumir na hipótese do art. 70° n° 2 b) CCP.
25. Por isso, embora a situação subjudice não o configure, deveria o julgador de primeira instância ter analisado a referida expressão dos três slides nesta perspectiva.
26. A sentença não avaliou a proposta no seu todo e esqueceu o verdadeiro sentido da declaração negociai emitida pela Recorrente, quer em primeiro lugar por aplicação do artigo 236.° do Código Civil, quer em segundo lugar ( ainda que apenas por hipótese de se admitir uma incorrecção ), pelo subsequente artigo 238°.
27. Face à nota de rodapé n.° 6 da página 28 da sentença e tendo admitido a páginas 18 que a proposta continha "inicialmente ambiguidades", a consequência lógica e juridicamente correcta teria sido a de aceitar os esclarecimentos.
28. Os esclarecimentos não foram para além da mera confirmação que a Recorrente tinha feito da correcta menção na proposta ao help desk do ICP-ANACOM, pois a resposta aos esclarecimentos apenas veio confirmar o verdadeiro sentido da afirmação da Recorrente.
29. 29 Consequentemente, os esclarecimentos prestados são uma interpretação autêntica da menção aos serviços de help desk do ICP- ANACOM, sendo juridicamente relevantes em sede de análise e avaliação da proposta, no sentido de que ab initio a Recorrente se obriga a prestar esse serviço, assumindo como sua essa função.
30. Contrariamente ao que o Tribunal a quo pretende, o acórdão T 195-08 do Tribunal Geral da União Europeia, de que a sentença cita apenas uma parte do n.° 4, vai no sentido de entender, como defende a Recorrente, designadamente nos seus n.°s 54 a 59, que, quando confrontada com uma proposta ambígua e se um pedido de esclarecimento sobre o conteúdo proposto puder garantir a segurança jurídica da mesma forma que a exclusão imediata da proposta, a entidade adjudicante deve pedir esclarecimentos ao proponente em causa, em vez de optar pela exclusão pura e simples da sua proposta.
31. O direito ao esclarecimento da proposta encontra-se legalmente consagrado e a sua utilização no caso subjudice é inquestionável e sem margem para dúvidas. O entendimento contrário constitui, em consequência, um erro manifesto de apreciação da avaliação da prova e uma violação do artigo 72.°, n.° 2, do CCP
32. O que se verifica, pois, é que o esclarecimento da proposta tem o inteiro apoio da lei e vale como interpretação autêntica, pelo que a confirmação do sentido da sua proposta pela Recorrente tem de ser entendida no sentido de ser ela a executar o help desk.
33. E, ainda que o entendimento do julgador fosse distinto, deveria, seguindo os princípios jurídicos aplicáveis, ter aceite o sentido que é mais favorável à Administração, concluindo não subsistirem razões para excluir a proposta da Recorrente, sobretudo depois de esta esclarecer de forma autêntica que assumia e cumpriria e de que forma essa assunção e esse cumprimento se conjugariam com os outros elementos da proposta.
34. Embora se aceite que um receptor de boa fé pudesse ter dúvidas - como evidencia o facto de os slides terem sido deficientemente entendidos e interpretados pelo julgador da primeira instância - os esclarecimentos prestados confirmaram, na íntegra, a proposta apresentada e sem em nada a contradizer, porquanto a proposta apresentada e o esclarecimento em nada se contradizem, constituindo o esclarecimento uma interpretação autêntica e vinculativa para a Recorrente (artigo 238.° do C.Cv).
35. A Recorrente o que fez foi apresentar à entidade adjudicante a interpretação comum no sector de help desk, enquanto termo técnico de conhecimento e de uso comum por todos os profissionais e utilizadores dos serviços de informação aos utentes, como é o caso deste contrato.
36. Consequentemente, é errada a afirmação da sentença recorrida quanto a não serem tais esclarecimentos admissíveis à luz do artigo 72.°, n.° 2 do CCP.
37. Sobretudo depois de dar como assente e como questão central, haver dúvidas, ao referir-se às ambiguidades inicialmente existentes.
38. Vinca-se, por último, que se o julgador se tivesse colocado na posição de um homem médio, à luz do que prevê o n.° 1 do artigo 236.° do Código Civil, a propósito de da apreensão do sentido da declaração negociai por um declaratário normal, certamente teria decidido de modo diferente e concluído que a proposta da Recorrente não ofende o disposto no artigo 70.° n.° 2, alínea b) do CCP.
Termos em que deve ser anulada a douta sentença recorrida, por violação dos artigos 94.°, n.° 1 do CPTA, e 668°, n.° 1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil e, porque o processo contém todos os elementos necessários, este Venerando Tribunal conheça de mérito e revogue a sentença recorrida por erro de julgamento na apreciação da prova e por violação dos artigos 72.°, n.° 2, do CCP e 232° a 238° do Código Civil.

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- Recurso da ICP- ANACOM – Autoridade Nacional das Comunicações
a) O presente recurso jurisdicional tem por objecto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 24 de Fevereiro de 2012, que julgou procedentes os pedidos formulados pela Autora, aqui Recorrida, por ter entendido que o ato de adjudicação impugnado violou o disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 70.°, a norma do n.° 2 do artigo 72.° do CCP e o princípio da intangibilidade das propostas, e os princípios da concorrência, da igualdade e da imparcialidade.
b) A questão central sub judice é singelamente esta: por um lado, se a proposta adjudicada, apresentada pela A..., viola um específico aspecto de contratual execução não submetido à concorrência pelo Caderno de Encargos do Concurso (a saber, a responsabilidade pela gestão e execução dos serviços de help-desk de primeira linha) e, correlativamente, se o esclarecimento que veio a ser prestado pela Contra-interessada A... no âmbito do Concurso, a respeito desse aspecto da sua proposta, é admissível face ao disposto no artigo 72.° do CCP.
c) A fim de dilucidar esta dúplice questão, tudo reside em saber qual a interpretação que deve ser conferida à expressão help-desk da ANACOM» (ou help-desk/PUC da ANACOM» que se encontra inscrita na proposta adjudicada e, mais concretamente, se esta proposta e essa expressão — quer em virtude da interpretação literal desta expressão, quer em virtude da sua interpretação sistemática no contexto da proposta adjudicada — apresentam um sentido unívoco, representando inequivocamente a não assunção pelo concorrente (adjudicatário) da obrigação de gestão/execução dos serviços de help-desk (caso em que a proposta da A... está condenada à exclusão); ou se, inversamente, a proposta adjudicada e a referida expressão apresentam um sentido relativamente ambíguo (admitindo-se, nesse caso, como sentido real da declaração de vontade do concorrente adjudicatário, aquele que veio a ser esclarecido pelo próprio no âmbito do Concurso).
d) É justamente a esta questão que o Tribunal a quo responde, formulando uma conclusão de facto — «não se verificam quaisquer ambiguidades no conteúdo da proposta da contra-interessada a respeito do termo ou condição respeitante à assunção do serviço de helpdesk de primeira linha na comunicação de incidências», pois que «resulta da proposta, de forma expressa e inequívoca, que seria utilizado o helpdesk da ANACOM» — que constituiu o alicerce único dos juízos formulados na sentença recorrida a respeito de todas e de cada uma das (alegadas) causas de invalidade do ato de adjudicação impugnado.
e) Sucede que essa conclusão de facto é fruto, quer da errada decisão sobre a matéria de facto promovida pelo Tribunal a quo, quer do manifesto erro sobre os pressupostos de facto, mais concretamente na interpretação das declarações de vontade insiras à proposta adjudicada, em que labora a sentença recorrida; aos quais se junta, a.flagrante oposição entre os fundamentos e a decisão em que incorreu o Tribunal a quo.
f) Em primeiro lugar, o Tribunal só pôde extrair aquela errónea conclusão de facto — que, repete-se, subjaz a toda a sentença recorrida — porque procedeu a uma errada seleção da matéria de facto provada e relevante para a decisão da causa, desprezando seis factos alegados e provados pela ora Recorrente, que são dotados de uma indesmentível pertinência para a cabal compreensão do (ambíguo) sentido da vontade declarada pela A... na proposta apresentada.
g) Com efeito, o Tribunal a quo reproduziu nas alíneas BB) a FF) o conteúdo dos slides 51, 52 e 54 a 56 da proposta adjudicada, mas desprezou o conteúdo do slide 50 daquela proposta, que permite contextualizar as declarações de vontade vertidas nos slides 51, 52 e 55, que foram objecto de apreciação pelo Tribunal a quo: as representações esquemáticas dos slides 51 e 52 da proposta adjudicada permitem enquadrar o serviço de lielp-desk de primeira linha no âmbito das componentes de service management e service delivery, mas é só a confrontação do conteúdo das declarações contidas no slide 50 que permite perceber (/') que esses componentes de service management e service delivery correspondem aos designados nível de gestão táctica e nível operacional, bem como (n) que esses são dois dos três níveis do modelo operacional do SIC que têm intervenção por parte da A... na posição de adjudicatário.
h) Mais ainda: na selecção da matéria de facto provada e relevante, o Tribunal a quo desprezou os factos referentes (i) à previsão no Caderno de Encargos de níveis de serviço a cumprir pelo adjudicatário na prestação dos serviços de help-desk, sob pena da aplicação de penalidades, (ii) à assunção no slide 86 da proposta adjudicada do compromisso de cumprimento de determinados níveis de serviço no «funcionamento do service desk» e (iii) a relevância reconhecida a esta circunstância na fundamentação do ato de adjudicação impugnado.
i) Uma vez que a questão central subjudice reside em saber se as declarações de vontade contidas na proposta adjudicada eram expressas e inequívocas no sentido da não assunção pela A... da obrigação de gestão e execução do serviço de help-desk de primeira linha, tais factos apresentam uma auto-explicativa importância, visto que, como se intui, a obrigação de cumprimento de determinados níveis de qualidade de serviço da service desk só pode ser assumida por quem se obrigue, simultaneamente, a operar e gerir o serviço de help-desk.
j) Deste modo, o juízo de facto formulado pelo Tribunal a quo — que o conduziu a concluir que as declarações de vontade vertidas na proposta da A... são expressas e inequívocas no sentido da não assunção pelo concorrente da execução dos serviços de help-desk de primeira linha — está forçosamente eivado do vício de ausência de ponderação destes seis factos "sonegados" e, em consequência, dos contributos hermenêuticos que deles se extraem para efeitos da determinação do carácter unívoco ou ambíguo da vontade efectivamente declarada na proposta adjudicada, devendo a sentença recorrida ser, por isso, revogada com fundamento na errada decisão sobre a matéria de facto.
k) Em segundo lugar, a (errónea) conclusão de facto que alicerça a sentença recorrida resulta de uma determinada valoração e interpretação das declarações de vontade ínsitas na proposta adjudicada, rectius nos seguintes dois fundamentos: (í) a proposta adjudicada refere-se «à utilização da componente de help-desk da ANACOM» e (n) a restante matéria de facto (sonegada, repete-se, dos seis factos atrás identificados) não sugere entendimento contrário, centrando-se, de seguida, o Tribunal a quo na análise dos slides 51, 52 e 55 da proposta adjudicada.
l) No primeiro fundamento, a sentença recorrida denuncia o primeiro erro de interpretação que contagia toda a fundamentação: «utilização da componente de help-desk da ANACOM» tem um sentido unívoco, o qual é sinónimo de utilização de help-desk gerido/executado pela ANACOM — sendo, por isso, que a sentença recorrida conclui que da proposta adjudicada resulta «de forma expressa e inequívoca» uma violação da disposição do Caderno de Encargos no sentido de que o «prestador de serviços assegure o helpdesk de primeira linha na comunicação de incidências».
m) Sucede que o a menção «help-desk/PUC da ANACOM» se presta a um outro sentido possível, qual seja o de que o help-desk que pertence à ANACOM, que é propriedade da ANACOM, não só por força da utilização da preposição de conjugada com o artigo feminino a (da), vulgarmente utilizada na linguagem comum para determinar a propriedade de determinada coisa, mas igualmente porque a expressão em causa não inclui qualquer referência expressa à execução ou à gestão do help-desk — donde, contrariamente ao pretendido pela sentença recorrida, apenas a utilização de expressões como help-desk gerido pela ANACOM ou help-desk gerido pela ANACOM podiam ser tidas como declaração expressa e inequívoca de que o adjudicatário não se obrigava a executar os serviços de help-desk.
n) Não quer isto dizer que o referente imputado pela sentença recorrida ao referencial «help-desk da ANACOM» não seja umas das interpretações possíveis de tal expressão; mas apenas que (i) «help-desk da ANACOM» não significa expressa e inequivocamente help-desk gerido pela ANACOM e, bem assim, que (ii) essa expressão se presta a outro possível significado qual seja o de help-desk pertencente à ANACOM, sem prejuízo de quem "nos bastidores" proceda à gestão e execução desses serviços.
o) Trata-se, em suma, de dois significados possíveis que apresentam um mínimo de correspondência com a referência textual «help-desk da ANACOM» e que, em consequência, reúnem os requisitos impostos pelo n.° l do artigo 238.° do Código Civil para serem tidos como interpretação válida da vontade declarada na proposta adjudicada — donde resulta comprovada a natureza ambígua e não unívoca dessa expressão que "protagoniza" o litígio subjudice e o consequente erro de interpretação em que incorreu a sentença recorrida.
p) O que é tanto mais grave quanto é certo que foi inspirado na (errónea) ideia de que «help-desk da ANACOM» é sinónimo de help-desk gerido pela ANACOM que o Tribunal a quo filtrou o conteúdo restante da proposta adjudicada: não procedeu a uma "leitura" holística da descrição visual e esquemática do modelo conceptual de funcionamento do SIC tal como proposto pela A..., mas, antes e como se o ónus da prova da violação do Caderno de Encargos se tivesse subitamente invertido, cingiu a sua análise à procura, nos restantes excertos da proposta adjudicada, de uma afirmação textual e expressa de que a gestão e execução do help-desk ficaria («afinal», como o próprio refere) a cargo do adjudicatário, para poder concluir se/que a restante matéria de facto não sugere entendimento contrário à sua pré-compreensão (segundo fundamento da errónea conclusão de facto atrás mencionada).
q) Com efeito, a análise dos slides 51 e 52 da proposta adjudicada conjugada com a análise do slide 50 — que o Tribunal a quo desprezou na selecção da matéria de facto dada como provada — ter-lhe-ia permitido concluir no sentido da integração sistemática dos serviços de help-desk de primeira linha no contexto dos componentes do SIC de service management e service delivery que (i) correspondem aos níveis de controlo tático e controlo operacional mencionados no slide 50 e que (n) estes são dois dos três níveis do modelo operacional do SIC que têm intervenção por parte da capgemim na posição de adjudicatário.
r) É, por isso, evidente que a sentença recorrida labora em erro de interpretação das declarações de vontade vertidas na proposta adjudicada quando conclui que as menções constantes dos slides 51 e 52 da proposta «não suger[em] que, afinal, a gestão desses serviços seja realizada pela A...».
s) No slide 55 da proposta adjudicada (i) definem-se os «objectivos» do help-desk de primeira linha, (n) elencam-se as «actividades principais» integradas no componente de help-desk e (iii) definem-se quais os «resultados e entregáveis» esperados no âmbito dessa componente do SIC, o que (como "entra pelos olhos dentro") só é logicamente compatível com a intenção pela A... de assunção da gestão e execução dos serviços de help-desk, escrevendo assim as actividades que se propõe executar, os objectivos que se propõe alcançar e os resultados que se compromete a entregar.
t) Em evidente erro sobre os pressupostos de facto, a sentença recorrida conclui que «o conteúdo do slide 55 (...) não é incompatível com a utilização do help-desk da ANACOM», pois «dessa esquematização [do funcionamento do serviço] não resulta que não seja o helpdesk/PUC da ANACOM a atuar como entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores», como se fosse prática corrente ou, sequer, admissível, os concorrentes preverem na sua proposta as actividades a executar, os objectivos a alcançar e os resultados a entregar por parte da sua Entidade Adjudicante (!).
u) Mais: ainda que «da análise dos slides das alíneas BB) a FF) [da matéria de facto dada como provada] [i.e., dos slides 51, 52 e 55] não result[asse] [entendimento] contrário» à pré-compreensão que formou em relação ao sentido da declaração de vontade da A... — o que, como se demonstrou, não sucede —, a verdade é que a análise da matéria de facto desprezada pelo Tribunal a quo denuncia, à saciedade, o erro crasso em que incorreu a sentença recorrida.
v) Efectivamente, no slide 86 da proposta adjudicada e em obediência ao Caderno de Encargos do Concurso, a Contra-interessada compromete-se a cumprir determinados níveis de qualidade de serviço para o «funcionamento do service desk», o que, como se intui, só se coaduna com uma interpretação da proposta adjudicada contrária à professada pela sentença recorrida: só quem se obrigue a prestar os serviços de help-desk de primeira linha pode, logicamente, vincular-se ao cumprimento de determinados níveis de serviço, pois está em causa uma obrigação de cumprimento de níveis de qualidade desse serviço, traduzida em x atendimentos por hora/dia/etc.
w) Também por isso, a única conclusão que se pode rigorosamente extrair do conjunto de declarações de vontade ínsitas na proposta adjudicada é que a proposta por ela apresentada não é expressa, nem inequívoca, a respeito da inclusão dos serviços de help-desk no objecto das prestações que a A... se obriga a executar em caso de adjudicação, encontrando-se, ao invés, sobejamente demonstrada a existência de uma dúvida sobre o teor dessas declarações de vontade.
x) Em terceiro lugar, verifica-se que a sentença recorrida, não obstante conclua que «não se verificam quaisquer ambiguidades no conteúdo da proposta da contra-interessada a respeito do termo ou condição respeitante à assunção do serviço de helpdesk de primeira linha» e que «resulta da proposta, de forma expressa e inequívoca, que seria utilizado o helpdesk da ANACOM», refere, ato contínuo, que tais conclusões são extraídas «sem prejuízo de poder estar previsto na proposta a realização das restantes componentes do serviço, designadamente as mencionadas no slide 55», slide este em que, repete-se, a proposta adjudicada descreve as «actividades principais» e os «resultados e entregáveis» referentes à componente de help-desk que integra o modelo operacional do SIC proposto pelo adjudicatário.
y) Isto porque, se a sentença recorrida concebe que o adjudicatário previu na sua proposta (portanto, na proposta adjudicada) a execução das actividades que integram a componente de help-desk do SIC — as quais se encontram exaustivamente elencadas no referido slide 55 da proposta — é evidente que a sentença se auto-contradiz quando, simultaneamente, refere que da «esquematização [vertida nesse slide 55] não resulta que não seja o Helpdesk/PUC da ANACOM a actuar como entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores» — trata-se de duas afirmações logicamente inconciliáveis no mesmo iter cognoscitivo.
z) E fica demonstrado à saciedade que a sentença recorrida incorre em flagrante oposição entre os fundamentos e a decisão quando conclui que a proposta adjudicada «violou a disposição do Caderno de Encargos que determina que o prestador de serviços assegura o helpdesk de primeira linha na comunicação de incidências», ao mesmo tempo que reconhece que essa proposta contempla a execução das actividades que integram a componente de help-desk.
aa) Desmontada a (errónea) conclusão de facto que constituiu o alicerce único da sentença recorrida — quer em razão da errada decisão sobre a matéria de facto, quer em virtude do erro de interpretação das declarações de vontade vertidas na proposta adjudicada, quer ainda por força da oposição entre os fundamentos e a decisão — é inevitável a ruína do "edifício" conceptual que conduz ao juízo anulatório do acto de adjudicação impugnado.
bb) É tão-somente porque, no entendimento (erróneo) da sentença recorrida, a vontade declarada na proposta adjudicada no sentido da não assunção pela A... da gestão/execução do serviço de help-desk de primeira linha seria «expressa e inequívoca» e destituída de «quaisquer ambiguidades» que, em consequência, se justifica a conclusão extraída pelo Tribunal a quo no sentido de que a proposta adjudicada «violou a disposição do Caderno de Encargos que determina que o prestador de serviços assegura o helpdesk de primeira Unha» — razão pela qual o ato de adjudicação seria violador da norma da alínea b) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP, que determinava a respectiva exclusão.
cc) Isto porque a hipótese típica abarcada na previsão normativa da alínea b) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP corresponde à detecção, pela Entidade Adjudicante, de uma violação certa e manifesta do Caderno de Encargos; bem ao contrário, o âmbito de aplicação daquela disposição legal não abarca as hipóteses de violação possível ou, até mesmo, de violável provável — mas, em qualquer caso, duvidosa — das normas ou especificações do Caderno de Encargos.
dd) As hipóteses típicas de dúvida sobre o conteúdo exacto da declaração de vontade do concorrente — pelo menos sempre que estejam em causa termos ou condições da proposta referentes a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência (como ocorre no caso dos autos) aos quais é inaplicável a norma da alínea c) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP — integram a previsão normativa do artigo 72.° do CCP e prestam-se ao exercício do poder-dever de solicitação de esclarecimentos sobre o conteúdo da proposta a cargo da Entidade Adjudicante.
ee) Tanto mais quanto é certo que, como a sentença recorrida sufragou (e o ora Recorrente não impugna), esse regime jurídico denuncia uma maior flexibilidade na fixação dos critérios de admissibilidade legal dos esclarecimentos sobre o teor de um «termo ou condição» referente a um aspecto de execução do contrato não submetido à concorrência, quando comparado com o regime previsto para a legitimidade de um esclarecimento que recaia sobre um «atributo», i.e., sobre um aspecto de execução do contrato submetido à concorrência (cfr. n.° 2 do artigo 72.° do CCP, e alíneas b) e c) do n.° l do artigo 57.° do CCP, para a distinção entre «atributos» e «termos e condições»): enquanto as operações que «contrariem», «altere[m]», «complete[m]» ou «visem suprir omissões» estão proibidas sempre que o esclarecimento incida sobre um «atributo» da proposta (cfr. segunda parte do n.° 2 do artigo 72.° do CCP), já no caso de um «termo ou condição» (referente, portanto, a um aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência) o esclarecimento só é legalmente inadmissível caso encerre uma contradição com qualquer elemento da proposta (cfr. primeira parte do n.° 2 do artigo 72.° do CCP).
ff) Na verdade, a sentença recorrida só concluiu que o acto de adjudicação impugnado viola o n.° 2 do artigo 72.° do CCP e o princípio da intangibilidade das propostas porque, assentando na (errónea) conclusão de facto atrás referida, o Tribunal a quo entende que os esclarecimentos prestados pela Contra-interessada na pronúncia apresentada em audiência prévia do primeiro relatório preliminar «ao referir que o concorrente assegura o serviço de helpdesk, ultrapass[m] o âmbito dos esclarecimentos admissíveis no art. 72.°/2 do CCP, na medida em que contraria[m] o referido nos documentos da proposta».
gg) Sucede que se, contrariamente ao que (em erro) concluiu a sentença recorrida, (i) a expressão «help-desk/PUC da ANACOM» não é unívoca, mas antes se presta, pelo menos, a dois significados possíveis, a saber help-desk pertencente ao ICP-ANACOM e help-desk a cargo do ICP-ANACOM e (ii) outros trechos da proposta adjudicada são apenas compatíveis com a assunção pela A... da obrigação de execução/gestão do componente de lielp-desk, o esclarecimento prestado pela Contra-interessada não contraria as declarações de vontade constantes da sua proposta: o adjudicatário não contraria a expressão «help-desk da ANACOM», limitando-se a confirmar um dos dois possíveis significados que podem ser conferidos a esta expressão, a saber, help-desk pertencente ao ICP-
hh) Por último, é só porque a sentença recorrida assenta no erróneo pressuposto de que as declarações de vontade iniciais da A... continham uma violação «expressa e inequívoca» do Caderno de Encargos e que os esclarecimentos prestados pela Contra-interessada vieram "emendar a mão" contrariando, assim, o teor da proposta apresentada, que pode, logicamente, concluir que «a admissibilidade das modificações introduzidas pelos esclarecimentos prestados permitiria à contra-interessada beneficiar da circunstância de não ter procedido à substituição da sua proposta, adequando-a ao exigido no CE, antes do termo do prazo de apresentação (...) e de, por via do critério de desempate previsto no PC, ser-lhe adjudicada, como veio a ser, a prestação dos serviços em concurso», o que privilegiaria a posição da Contra-interessada face à Autora, aqui Recorrida, que tinha também apresentado uma primeira proposta, depois retirada e substituída por outra após a prestação de esclarecimentos pelo Júri do Concurso.
ii) É verdade que as propostas apresentadas pela Recorrida e pela Contra-interessada apresentam o mesmo preço e que a adjudicação foi decidida em função do critério de desempate, mas dessas asserções não resulta qualquer suposta identidade de posições entre a proposta da Contra-interessada, que veio a ser adjudicada, e uma primeira proposta que chegou a ser carregada pela ambisig na plataforma eletrónica que suportou a tramitação do Concurso, mas que foi retirada e substituída por outra antes do termo do prazo de apresentação das propostas.
jj) Se a A... não retirou nem substitui a sua proposta inicialmente carregada foi justamente porque, não obstante a formulação do pedido de esclarecimentos durante a fase de apresentação de propostas, concebeu a sua proposta no pressuposto de que os serviços do help-desk incluíam o objecto do contrato a celebrar na sequência do Concurso — ou seja, no pressuposto de que o help-desk pertencente à ANACOM ficaria a cargo do adjudicatário —, parametrizando designadamente o preço proposto de modo a contemplar a remuneração devida pela execução (pelo adjudicatário) dos referidos serviços de help-desk.
kk) Em suma: falece todo e qualquer fundamento ao juízo formulado pela sentença recorrida no sentido de, ainda que implicitamente, assacar ao acto impugnado os vícios de violação do disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP, da norma do n.° 2 do artigo 72.° do CCP e do princípio da intangibilidade das propostas, e dos princípios da igualdade, da imparcialidade e da concorrência.
ll) Face a todas as conclusões atrás expostas, verifica-se que é, antes, a sentença recorrida que incorre em erro sobre os pressupostos de direito, violando o dispositivo legal contido na alínea b) do n.° 2 do artigo 70.° do CCP, por nele subsumir uma hipótese que não quadra no respectivo âmbito de aplicação, bem como a norma do n.° 2 do artigo 72.° do CCP, por, inversamente, nela não integrar o esclarecimento prestado pela Contra-interessada, o qual reúne todos os requisitos para ser tido como a interpretação autêntica das declarações de vontade vertidas na proposta adjudicada.
Termos em que: O presente recurso jurisdicional deve ser admitido por Vossas Excelências e, a final, julgado procedente, e, em consequência, deve ser revogada a recorrida sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa e mantido o acto de adjudicação vertido na deliberação do Conselho de Administração do ICP-Anacom de 21 de Julho de 2011.

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A Recorrida AMBISING – Ambiente e Sistemas de Informação Geográfica, SA contra-alegou, concluindo como segue:

1. A sentença recorrida não incorre em qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, nem deixou de conhecer qualquer questão que lhe cumprisse apreciar, não padecendo, em consequência, de nulidade.
2. A sentença recorrida decidiu, e bem, que da análise interpretativa da proposta da contra-interessada A... não resulta qualquer dúvida ou ambiguidade.
3. Na página na p. 51 da proposta da contra-interessada é referido "O help desk/PUC, da ANACOM (sublinhado nosso), actua como a entidade (sublinhado nosso) que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores" e na p. 52 que "O modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente de help desk da ANACOM (sublinhado nosso) como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by.".
4. Na página 54 a proposta da A... Portugal S.A. podemos encontrar no local onde se identificam os "Métodos e Ferramentas" associados à gestão do serviço uma referência a "Ferramentas do Cliente e da A...".
5. As "ferramentas do cliente" só podem ter algum sentido se a responsabilidade da gestão for atribuída ao ICP-ANACOM, e não à contra-interessada, como impõe o caderno de encargos.
6. A p. 61 não deixa margem para dúvidas, ao enunciar de forma bem explícita um leque de actividades da componente de helpdesk que são asseguradas e executadas pelo cliente, neste caso a ANACOM, designadamente, a recepção de pedidos no remedy e a abertura de pedido evolutiva, no Suporte ao Cliente, a recepção de pedidos no remedy na Manutenção Correctiva, ou a recepção de pedido, orçamentação e aprovação na Manutenção Evolutiva.
7. Na p. 70 ao descrever os riscos associados às várias fases da execução do contrato, a contra-interessada refere-se expressamente a recursos da ANACOM e a elementos da ANACOM, que sabendo-se que o caderno de encargos fazia impender sobre o co-contratante a execução da totalidade das prestações, sem alocação de quaisquer recursos da entidade adjudicante, é mais uma demonstração de que na proposta se pressupõe que o helpdesk fica a cargo da ANACOM.
8. Estas declarações contidas na proposta são, assim, claras e inequívocas, no sentido da exclusão do objecto da prestação contida na proposta do serviço de helpdesk, como decidiu, e bem, a sentença recorrida.
9. Os trechos da proposta da contra-interessada de onde a recorrente procura, artificiosamente, retirar declarações de sinal oposto, para concluir o contrário, nada de explícito contêm sobre a matéria.
10. E, quando lidos com honestidade intelectual e boa fé, não têm a virtualidade de pôr em causa o que tão clara e inequivocamente é afirmado nos pontos assinalados.
11. Ao contrário do que sustenta a contra-interessada, ora recorrente, não está em causa uma omissão, no conteúdo da proposta, de termos e condições não submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos, mas uma previsão na mesma em contradição expressa com tais cláusulas, que é expressamente cominada com a exclusão pelo art. 70°, n°2, ai. b) do CCP.
12. O declaratário normal, para efeitos de aplicação do art. 236° do CC na interpretação da proposta não é o homem rnédio que utiliza call centers das empresas de telecomunicações de que é cliente, mas a entidade adjudicante média, com competências legais na área, conhecedora em pormenor do objecto do contrato e dotada de quadros técnicos e jurídicos especialistas na matéria.
13. Sendo que, por recurso ao critério previsto no art. 236° do CC, a única interpretação possível da proposta da contra-interessada recorrente é a contida na decisão sob recurso.
14. Andou, assim, bem, a sentença recorrida ao decidir que a proposta não continha qualquer ambiguidade, negando ao requerimento apresentado pela contra-interessada em sede de audiência prévia, o carácter de esclarecimento, integrado na proposta, por a tanto obstar claramente o disposto no art. 72°, n°2 do CCP.
15. Esse requerimento da contra-interessada o que visava era alterar o conteúdo da proposta em sede de audiência prévia, passando a incluir na mesma uma parte da prestação do serviço que havia excluído de forma expressa na proposta originariamente apresentada.
16. E isso não é, naturalmente, admissível, já que viola o princípio da intangibilidade das propostas, refracção dos princípios da igualdade e da imparcialidade, mas também do princípio da concorrência, como decidiu, e bem, a sentença recorrida.

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Com dispensa de vistos substituídos pelas competentes cópias entregues aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência - art°s. 36° n° 2 CPTA e 707° n° 2 CPC, ex vi art° 140° CPTA.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

A. Por deliberação de 11 de Novembro de 2010 do CA da Entidade Demandada, foi determinada a abertura do concurso público para Implementação e Gestão de Sistema de Informação Centralizado (fls. 3 do processo administrativo);
B. Foram publicados, a 23.11.2010, no DR e a 24.11.2010, no JOUE, oa anúncios do concurso (fls. 231 e 235 do processo administrativo);
C. No anúncio de fls. 235 consta que termo final do prazo para apresentação das propostas seria no dia 13.01.2011, às 16 horas;
D. A Autora apresentou uma primeira proposta, que veio a retirar, tendo apresentado a proposta final, a 27.12.2010 (acordo e fls. 309 do processo administrativo);
E. A contra-interessada A... apresentou a sua proposta a 20.12.2010 (fls. 309 do processo administrativo);
F. Na cláusula 6a/1, da parte l do Caderno de Encargos, respeitante às obrigações principais do prestador de serviços, prevê-se o seguinte: « Sem prejuízo de outras obrigações previstas na legislação aplicável, no presente caderno de encargos ou nas cláusulas contratuais, da celebração do contrato decorre para o prestador de serviços a obrigação de prestação dos serviços de concepção, desenvolvimento, implementação, gestão, acessibilidade, disponibilidade e manutenção do Sistema de Informação Centralizado (SIC), providenciando a sua acessibilidade, disponibilidade e manutenção permanentes (...)»;
G. Na cláusula 7a da parte l do Caderno de Encargos, respeitante às fases da prestação dos serviços, prevê-se, no ponto 2, fase 2 - Gestão Operacional do SIC, alínea a), ponto 2.b, o seguinte: «Actualização, gestão e manutenção da informação e apoio/suporte a utilizadores - o prestador de serviços será responsável pela execução das actividades subjacentes à boa exploração do SIC, em termos que permitam a qualquer utilizador deste e de acordo com as pretensões de cada um, conforme previstas na parte II (Especificações Técnicas) deste Caderno de Encargos, fazer o melhor uso do mesmo, assegurando os necessários serviços para esse efeito.»
H. No ponto 3 da parte II do Caderno de Encargos, respeitante aos objectivos dos serviços a contratar, refere-se que «(...) o icp anacom, ao contratar um prestador de serviços, estabelece que o mesmo é responsável por " a) auto-instalar-se, recrutar as competências necessárias e instruir o modelo de organização, gestão, planeamento e controlo adequados às orientações reflectidas neste documento»;
I. Ao pedido de esclarecimentos formulado pela contra-interessada - Quem assegura o helpdesk de primeira linha na comunicação de incidências pelas entidades municipais e demais operadores? - a Entidade Demandada respondeu, a 23.12.2010 - O prestador de serviços (fls. 290 do processo administrativo);
J. A 01.02.2011 foi elaborado, pelo Júri do Concurso, o Relatório Preliminar de Análise e Avaliação de Propostas de fls. 1904-1908 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e do qual consta, designadamente, O seguinte: «(...) A proposta da concorrente A... Portugal, no Capítulo II, ponto 2, fase II, ponto 2.1 Modelo de gestão operacional do SIC, menciona que "o helpdesk /PUC da ANACOM (...), actua como a entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores". No mesmo ponto, é mencionado, ainda, que "o modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente de help-desk da ANACOM (sublinhado nosso) como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by”.
No entanto, decorre da cláusula 6a, da parte l do caderno de encargos, respeitante às obrigações principais do prestador de serviços, a obrigação, entre outras, da prestação de serviços de gestão (...) do Sistema de Informação Centralizado (SIC).
Por sua vez, a cláusula 7a da parte l do caderno de encargos, respeitante às fases da prestação dos serviços, no ponto 2, fase 2 - Gestão Operacional do SIC, alínea a), ponto 2.b, refere-se, entre outros serviços a prestar, à actividade de apoio/suporte a utilizadores (...), devendo o prestador de serviços ser responsável pelas actividades subjacentes à boa exploração do SIC, assegurando os necessários serviços para esse efeito
Ainda o ponto 3 da parte II do caderno de encargos, respeitante aos objectivos dos serviços a contratar, refere que o ICP ANACOM, ao contratar um prestador de serviços, estabelece que o mesmo é responsável por" a) auto-instalar-se, recrutar as competências necessárias e instruir o modelo de organização, gestão, planeamento e controlo adequados às orientações reflectidas neste documento (leia-se caderno de encargos).
Também no ponto 7 da parte II do caderno de encargos, respeitante aos níveis de serviço e penalizações, foram definidos os SLA's referentes ao funcionamento do serviço desk do prestador de serviços e respectivos indicadores, assim como as penalidades a aplicar pela sua não concretização. (..)
Assim, considera-se que o concorrente, ao mencionar na sua proposta que o ICP - ANACOM assegurará o serviço de helpdesk, sendo aquele o ponto único de contacto (PUC), realizando as tarefas a ele associado, tais como a centralização da gestão de pedidos realizados pelos utilizadores, transferindo este serviço inerente à prestação dos serviços para o ICP - ANACOM, viola claramente um aspecto da execução do contrato a celebrar não submetido à concorrência, na medida em que este serviço, tal como os demais, são externalizados para a entidade que implementa e opera o SIC. (...)»;
K. A contra-interessada, em sede de audiência prévia, apresentou à Entidade Demandada a pronúncia de fls. 1913-1925 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e da qual se destaca O seguinte: «(...) Assim, partamos do slide 50, no qual nos é dado verificar que no modelo de gestão são identificados os três níveis de intervenção, que são: estratégico, gestão/táctico e operacional. Naturalmente não colocamos sequer a hipótese de o Júri não ter considerado que estes slides não faziam parte integrante do texto da Proposta, coisa que a acontecer configuraria uma violação grave inadmissível dos deveres de competência para o exercício daquela função. Ao avançarmos para o slide seguinte (51), no qual descrevemos o Modelo de serviço que propomos e as respectivas componentes incluídas no âmbito do serviço, tudo quanto supra se afirmou ressalta ainda mais claro, quer em termos de escrita, quer de grafismo. Infra apresentamos o slide em questão para melhor visualização do que nos estamos a referir. (...) De facto, todo o seu conteúdo é demonstrativo de que o concorrente se propõe assegurar o serviço de helpdesk. Não é certamente por descrevemos que “o helpdesk/PUC, da Anacom, actua como entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores” que estamos a afirmar que transferimos este serviço para a Anacom. Como mais adiante explicamos, perante terceiros, a saber, os utilizadores externos do sistema, a "entidade" que vai estar a receber as chamadas, os pedidos de esclarecimentos, os relatórios de anomalias, etc dos utilizadores do sistema, vulgo um serviço de helpdesk, é a ANACOM apesar de ser a adjudicatária que vai prestar o serviço inerente a esse helpdesk e que está ora a ser externalizado. Tomamos, por isso, a liberdade de solicitar ao júri que proceda uma vez mais à análise do referido slide, a fim de constatar se dele resulta ou não claramente (designadamente do conteúdo do círculo vermelho do lado esquerdo) que nesta proposta a Requerente se propõe assegurar o serviço de helpdesk, colocando-se na posição, pelo menos de consciência, de tentar esboçar uma fundamentação para uma improvável conclusão que seja desfavorável à A.... É que dentro do círculo encontram-se as duas componentes do serviço a manter ou seja, já em fase de gestão e manutenção por oposição à sua implementação que tem outras fases) e que são o service management e o servíce delivery, E neste serviço descrevem-se as componentes do mesmo, a saber helpdesk, o netlan service, a manutenção correctiva, evolutiva, preventiva, apoio ao utilizador, sendo que o helpdesk centraliza pedidos relacionados com todas essas componentes do serviço. (...) Neste slide 52 afirmamos que 'O modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente do help-desk da ANACOM como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by" Ora, o que ali se explica é muito simples: que após a implementação (roll out) do SiC é assegurado pela Requerente um modelo conforme "descrito' visualmente. Faz tudo parte do serviço de helpdesk/PUC da ANACOM que vai ser assegurado pelo adjudicatário, e que irá recepcionar os pedidos dos utilizadores. Os pedidos dos utilizadores entram através de uma das formas de comunicação previstas - telefone, email, fax ou via internet (exemplo registo directo numa ferramenta) - que chega ao helpdesk e que é tratado em qualquer dos módulos descritos, seja um tema de suporte ao cliente ou de manutenção ou de gestão de servidores que suportam a plataforma. De modo idêntico, o slide seguinte (53) ao representar graficamente os serviços da responsabilidade da A... (que estão a amarelo) inclui aí o serviço de helpdesk/PUC. A partir do slide 54 e até ao slide 60 descrevemos todas as actividades que integram todas as componentes do Serviço, sendo que nenhuma delas foi colocada em questão pelo Exmo. Juri, à excepção da do helpdesk que vêm descritas no slide 55, como podemos ver infra. (...) De facto, no slide 55, no seu quadrado a vermelho do lado esquerdo, poderá o Exmo. Júri, de forma inequívoca, concluir que o helpdesk, tal como as restantes componentes do serviço (slides 54 a 60) faz parte do âmbito dos serviços a prestar pela A... caso nenhum dos anteriores slides lhe permitisse ainda tal conclusão. E será que o júri não leu o lado direito do mesmo slide onde a Requerente escreve como objectivo dessa componente precisamente: "funcionar como ponto único de contacto entre todos os utilizadores e o Serviço; Dar resposta a consultas provenientes dos utilizadores" (sublinhado nosso)? Será possível ao júri, após a sua análise, manter a posição de que a proposta da Requerente viola as cláusulas 6a e 7a do Caderno de Encargos em relação ao serviço de helpdesk ? Será que o júri ficará ainda com dúvidas de que a Requerente demonstrou claramente considerar ser ela própria a responsável pelo serviço de helpdesk/PUC ? Estamos em crer que, de uma observação que obedeça às regras da boa fé, tal não será de modo algum possível ! Porém, se hesitações ainda persistirem, podem as mesmas ser eliminadas com a leitura dos slides n°s 86 e 87, que mais não são do que a descrição dos níveis de serviço que a Requerente se propõe manter, de acordo com o exigido no Caderno de Encargos. (...) A justificação para este modelo proposto pela Requerente é para ela e estamos certos de que também para o júri, após análise imparcial da presente pronúncia - demasiado evidente e assenta nas seguintes razões:
O relacionamento directo dos utilizadores do SIC com o Sistema deve processar-se através do "ICP-Anacom" (através dos serviços do adjudicatário), uma vez que é a entidade a quem o legislador conferiu a competência para a concepção, a gestão e a manutenção, acessibilidade e disponibilidade do SIC (nº 1 do artº 25º do Decreto-Lei nº 123/2009). Ou seja, independentemente da entidade que esteja a jusante a prestar o serviço de helpdesk, a verdade é que o utilizador tem de relacionar-se com a entidade a quem reconhece que a lei atribuiu tal competência. Ora, esta realidade não esteve presente na análise que o júri efectuou à proposta da Requerente, pois se tivesse estado, ele teria tido ocasião de compreender a posição nela expressa, que é a única que faz sentido com o que o júri afirma no Relatório Preliminar e que se transcreve: "este serviço, tal como os demais, são externalizados para a entidade que implementa e opera o SIC", pressupondo, claro, a prévia recepção por quem de direito e no local adequado.
Se, por absurdo, a Requerente houvesse dito que o helpdesk/PUC era o da A..., poderia estar a referir-se a um dos inúmeros helpdesks que possui, quer offshore quer partilhado com outras empresas.
Se por absurdo, ainda, e permitam-nos o exemplo, a Requerente houvesse dito isso, fazendo um paralelismo com o helpdesk, seria a mesma coisa que dizer que as telefonistas da A... (que são subcontratadas da empresas ABCD e ABCD2) eram afinal "telefonistas da ABC e da ABC2", coisa que sabemos constituiria algo de verdadeiramente incompreensível para qualquer stakeholder da A.... (...)»;
L. A 17 de Fevereiro de 2011 foi elaborado, pelo Júri do Concurso, o Relatório Final de fls. 1927-1928 do processo administrativo, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual foi proposta a exclusão da proposta apresentada pela contra-interessada e ordenada em 1° lugar a proposta apresentada pela Autora;
M. Em anexo ao Relatório Final mencionado na alínea anterior consta a Análise do Júri à pronúncia apresentada pela empresa A... Portugal - Serviços de Consultoria e Informática, cujo teor se dá por reproduzido e do qual se destaca o seguinte: «(...) Para além do mencionado, a Requerente na sua proposta não refere em lado algum explicitamente que a mesma assume em pleno a execução dos serviços inerentes de helpdesk, mas sim, ao contrário, o que é referido na proposta, repita-se, é que é o helpdesk/PUC da ANACOM que "actua como a entidade (sublinhado nosso) que centraliza a gestão dos pedidos de apoio dos utilizadores" (vide pág. 51 da proposta), sendo este o Ponto Único de Contacto (PUC) - (vide pág. 52 da proposta). Do acima exposto, nas páginas 52 e 53 da proposta da Requerente, o júri conclui que se depreende que é da responsabilidade do ICP-ANACOM o funcionamento do helpdesk/PUC. A Requerente alega, ainda, que na pág. 53 inclui o helpdesk/PU sob a sua responsabilidade. Da proposta apresentada nada permite ao júri deduzir tal conclusão da Requerente porque:
a. Tal não é expressamente mencionado;
b. A pág. 53 menciona ser um modelo conceptual - em relação ao qual o júri nada tem a opor, logo mantendo-se sem alteração o postulado nas páginas supra mencionadas;
c. A pág. 53 indica explicitamente que é "ILUSTRATIVO", logo não se pode depreender por esta via que a assunção de responsabilidade pelos serviços tenha mudado relativamente aos slides anteriores.
d. Não se pode concluir que o logo da Requerente, que se sobrepõe, pressupõe, com carácter absoluto, que essa é uma realidade que pretende exemplificar a sua gestão directa do helpdesk/PUC.
Decorre do anterior que a Requerente dá ao mencionado na pág. 53 uma interpretação com a qual o júri não concorda de todo.
Efectivamente, em nenhum ponto da proposta vem a Requerente afirmar, como o faz agora em sede de pronúncia ao relatório preliminar, que os serviços inerentes ao helpdesk/PUC da ANACOM são por si assegurados.
O júri reitera que a Requerente não referiu isso na proposta apresentada pelo que tal comentário adicional, ora apresentado, não pode, nem poderá, ser considerado.
Ainda considerando o acima mencionado, na pág. 54, aparece referido em Métodos e Ferramentas associadas à Gestão do Serviço, "Ferramentas do Cliente...", estas, de acordo com o objecto do concurso, só fazem sentido existirem se a responsabilidade da gestão for da responsabilidade do ICP-ANACOM.
Mais adiante, na pág. 61, são apresentados, a título ilustrativo, alguns exemplos que configuram competências/servicos do cliente (veja-se as legendas associadas). Esta situação reforça a interpretação de que, a localização do helpdesk/PUC ANACOM, estaria efectivamente alocada directamente a esta entidade.
Ainda nas alegações relativas ao mencionado na pág. 55, mais uma vez a Requerente refere que é por demais evidente que o helpdesk/PUC é de sua responsabilidade pelo quadrado a vermelho do lado esquerdo...". O júri não considerou aquando da sua análise inicial, nem considera agora, que "o quadrado a vermelho" reflicta tal evidência! O que a Requerente afirma é completamente insuficiente para efeitos e em sede de análise, - a contradição entre o que a Requerente ora afirma e o que está plasmado na proposta continua a existir vinda das páginas anteriores. (...)»;
N. A proposta constante do Relatório Final foi agendada para apreciação do CA da Entidade Demandada para a reunião daquele órgão de 3 de Março de 2011;
O. Da acta da reunião de 3 de Março de 2011 consta que «o assunto foi discutido e adiada a decisão para próxima reunião» (cfr. fls. 1981 Processo administrativo);
P. A 17 de Março foi determinada, pelo vogal do CA da Entidade Demandada, Prof. Eduardo Cardadeiro, a realização de um procedimento de consulta à Sérvulo Correia e Associados, Sociedade de Advogados RL, tendo a adjudicação da proposta apresentada sido determinada por despacho de 25 de Março de 2011 (fls. 139-144 dos autos);
Q. Em reunião de 12 de Maio de 2011 do CA da Entidade Demandada foi decido não aprovar o Relatório Final e as respectivas propostas de exclusão da proposta apresentada pela contra-interessada e adjudicação da prestação de serviços à Autora, tendo sido ainda determinada a elaboração de novo relatório preliminar por parte do Júri (cfr. fls. 2183-2184 do processo administrativo);
R. A Deliberação mencionada na alínea anterior remeteu para a fundamentação constante do parecer jurídico de fls. 2185-2236 do processo administrativo, anexo à mesma e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
S. O Júri do procedimento, em reunião de 18.05.2011, deliberou no sentido de terem cessado as suas funções com a aprovação do Relatório Final (cfr. processo administrativo);
T. A 23.05.2011 o CA da Entidade Demandada nomeou um novo Júri para o procedimento (cfr. fls. 2242-2251 do processo administrativo);
U. A 29 de Junho de 2011 foi aprovado, pelo novo Júri nomeado, o Relatório Preliminar de Análise e Avaliação das propostas de fls. 2257-2263, cujo teor se dá por reproduzido e do qual consta como ordenada em 1° lugar a proposta apresentada pela contra-interessada A...;
V. No Relatório Preliminar mencionado na alínea anterior foram formuladas as seguintes conclusões: «(...) 1° As explicações apresentadas em sede de audiência prévia dos interessados pela A... PORTUGAL (...) relativamente à sua responsabilidade por assegurar o helpdesk são consideradas esclarecimentos admissíveis da proposta que esta concorrente apresentou em 20.12.2010 e afastam o fundamento que levou a propor a respectiva exclusão, como decorre do parecer jurídico acolhido pela Deliberação do Conselho de Administração de 12.05.2011;
2° Aquele esclarecimento integra-se, pois, na proposta apresentada pela concorrente;
3° Importa, por isso, dar cumprimento ao disposto no n° 3 do art. 70° do CCP, inserindo na plataforma electrónica a pronúncia da A... (...), bem como o parecer nos termos do qual se considera que essa pronúncia encerra um esclarecimento legalmente admissível da respectiva proposta e a Deliberação do Conselho de Administração que o acolheu (...);-
4° Não sendo proposta a exclusão da A... (...) é necessário proceder a uma nova ordenação das propostas para efeitos de adjudicação, à luz do critério constante da alínea a) do n° 15 do Programa do Concurso (A adjudicação será feita segundo o critério do mais baixo preço), bem como do critério de desempate estabelecido na alínea b) do mesmo n° 15 (Em caso de empate, será vencedora a proposta recepcionada mais cedo pelo ICP-ANACOM).
5° Tanto a proposta da A... (...) como a proposta da AMBISIG (...) têm o valor de 2 000 000,006; A proposta da SOLUCIONES GLOBALES (...) tem o valor de 2 239 184,20€; a proposta da INDRA (...) tem o valor de 3 457 755,00€.
6° A proposta da A... (...) foi apresentada em 20.12.2010; a proposta da AMBISIG (...) foi apresentada em 27.12.2010.
7° Nestes termos, a ordenação das concorrentes é a seguinte:
1º lugar _ concorrente n° 1 - A... (...);
2° lugar - Concorrente n° 2 - AMBISIG (...)
W. Dá-se por reproduzido o teor do parecer jurídico anexo ao Relatório mencionado na alínea anterior, transcrevendo-se as respectivas conclusões: “(..)
1° O nº 1 do art. 72° do CCP habilita legalmente o Júri do procedimento ao exercício de um poder discricionário enquadrado na sua margem de livre decisão, que assume a modalidade de discricionariedade de decisão, i.é, agir, solicitando esclarecimentos, ou não agir;
2° A solicitação de esclarecimentos sobre as propostas deve ser entendida como um verdadeiro poder funcional ou poder-dever, ou seja, um poder de solicitar esclarecimentos sobre o conteúdo das suas propostas, funcionalizado à prossecução daquela que é a melhor optimização in casu das exigências impostas por dois princípios conflituantes - o da concorrência em sentido próprio, como melhor meio para a maximização potencial da concretização do interesse público e o da igualdade e não discriminação entre operadores económicos, que gera como corolário o valor da inalterabilidade das propostas;
3° A sua dimensão de dever de prossecução dos fins visados pelo legislador com a atribuição de uma margem de livre decisão à administração aniquila qualquer veleidade de equacionar este como um espaço de livre escolha extra-jurídica insusceptível de fiscalização judicial, mas, por outro lado, a sua vertente de poder administrativo (discricionário) implica a delimitação de um espaço de responsabilidade própria da Administração, em termos tais que a substituição da avaliação casuística feita pelo decisor administrativo por uma (re)avaliação feita por uma entidade externa é ilegítima e ajurídica;
4° A margem de livre decisão administrativa está, assim, sujeita a condicionantes, não a determinantes, jurídicas, entre as quais assumem especial destaque os designados limites internos ou imanentes da margem de livre decisão: as exigências decorrentes dos restantes princípios orientadores da actividade administrativa, i.é, os princípios da prossecução do interesse público, da protecção das posições jurídicas subjectivas dos particulares, da justiça, da igualdade, da imparcialidade, da proporcionalidade e da boa-fé;
5° Porém, o controlo da opção do decisor administrativo no âmbito da sua margem de livre decisão limita-se à anulação de uma decisão manifestamente desrazoável, enquanto fundamentada num erro manifesto de apreciação, recorrendo, para o efeito, a uma avaliação negativa das três vertentes do princípio da proporcionalidade em sentido amplo, em ordem a confirmar se a decisão foi manifestamente desadequada, desnecessária ou desproporcional; -
6° Aliás, a hipótese da presente consulta corresponde a uma situação de redução a zero da margem de livre decisão, pois a ponderação e harmonização dos princípios da concorrência em sentido próprio e da igualdade, com vista à maximização optimizada dos objectivos contraditórios da prossecução do interesse público e da protecção das posições jurídicas subjectivas dos operadores económicos, quando devidamente equacionadas à luz das circunstâncias do caso e dos princípios gerais da actividade administrativa - maxime dos vectores da proporcionalidade e da imparcialidade (na dimensão objectiva) - apontavam ao júri do concurso um único caminho: a solicitação de esclarecimentos ao concorrente A... sobre o conteúdo da sua declaração de vontade referente à inclusão, ou não, dos serviços de helpdesk entre as obrigações cuja execução assume com a apresentação da sua proposta;
7° A opção contrária seguida pelo Júri do Concurso - de não solicitação de esclarecimentos ao concorrente e de exclusão liminar da sua proposta - pode assim, no nosso entendimento, ser colocada em crise, pois incorre em manifesto erro de apreciação das circunstâncias do caso e violação ostensiva dos princípios da concorrência, da prossecução do interesse público, da proporcionalidade e da imparcialidade na sua dimensão objectiva de ónus de ponderação de todos os interesses públicos e privados implicados no presente caso;
8° O concorrente A... fez uso da sua prerrogativa de pronúncia em sede de audiência prévia para vir, no fundo, prestar esclarecimentos ao ICP-ANACOM sobre o conteúdo da sua declaração de vontade, pelo que fez operar a sanação dos efeitos dos vícios invalidantes atrás apontados, colocando o júri do concurso na situação em que se encontraria caso tivesse exercido adequada e proporcionalmente o seu poder dever e solicitado esclarecimentos à A... sobre o teor da sua proposta;
9° Na previsão normativa do n° 2 do art. 72° do CCP, o legislador pré-determinou o leque das hipóteses em que o esclarecimento deve passar a fazer parte integrante da proposta (inicialmente) apresentada, sendo tido como o sentido real da vontade (inadequadamente) declarada pelo concorrente num primeiro momento do processo pré-contratual, cabendo ao decisor administrativo, como aplicador da lei, conformar-se como essa estatuição legal, analisando e avaliando a proposta à luz desse esclarecimento;
10° Teleologicamente orientado pelos princípios da concorrência em sentido próprio e da inalterabilidade das propostas, o legislador distingue os tipos de esclarecimentos inadmissíveis em função do critério do (seu) objecto, i.é, consagra distintos regimes jurídicos consoante o esclarecimento incide sobre um atributo da proposta ou é referente a um termo ou condição não submetido à concorrência pelo caderno de encargos;
11° Centrando-nos no regime que importa à hipótese da presente consulta, importa reter que, caso o esclarecimento recaia sobre um termo ou condição da proposta referente a um aspecto da execução do contrato não submetido à concorrência pelo caderno de encargos, o esclarecimento só é legalmente inadmissível caso encerre uma contradição explícita com qualquer elemento contido na proposta (cfr. primeira parte do n° 2 do art. 72° do CCP);
12° Ora, as explicações apresentadas pela A... no esclarecimento espontaneamente apresentado em sede de audiência prévia não contrariam qualquer um dos segmentos da proposta, não podendo dela extrair-se qualquer elemento inovatório, mas antes uma mera confirmação de uma das possíveis interpretações da menção "serviço de helpdesk da ANACOM" e, em geral, da delimitação feita pelo concorrente dos serviços que se compromete executar;
13° Por isso, os esclarecimentos prestados pela A... fazem parte integrante da proposta (inicialmente) apresentada nos termos impostos pela norma do n° 2 do art. 72° do CCP, estando a consulente legalmente obrigada a considerar esta clarificação como o sentido real da vontade (inadequadamente) declarada pelo concorrente num primeiro momento do processo pré-contratual e como interpretação autêntica da menção "serviços de helpdesk da ANACOM" juridicamente relevante em sede de análise e avaliação da proposta;
14° Uma eventual decisão de exclusão da proposta da A... com fundamento na alegada violação dos limites do objecto contratual que foi lançado à concorrência, rectius a não inclusão do serviço de helpdesk entre as obrigações assumidas, seria anulável com fundamento em vício de violação de lei, traduzido, designadamente no desrespeito pela vínculação legal que emana do n° 2 do art. 72° do Código.»;
X. A 13 de Julho de 2011 foi elaborado o Relatório Final de fls. 2570 do processo administrativo, cujo teor, bem como dos respectivos anexos, se dá por integralmente reproduzido, no qual foi mantida a ordenação das propostas constante do Relatório Preliminar;
Y. A 21 de Julho de 2011 o CA da Entidade Demandada deliberou aprovar o Relatório Final e adjudicar a prestação dos serviços à contra-interessada;
Z. Dá-se por reproduzido o teor da proposta apresentada pela contra-interessada A... (fls. 311-657 do processo administrativo);
AA. A proposta da concorrente A... portugal, no Capítulo II, ponto 2, fase II, ponto 2.1 Modelo de gestão operacional do SIC, menciona que " o helpdesk /PUC da ANACOM (...), actua como a entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores". No mesmo ponto, é mencionado, ainda, que "o modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente de help-desk da ANACOM como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by" (o Sublinhado é nosso - págs. 51 e 52 da proposta - fls. 372-373 do processo administrativo);
BB. É o seguinte o teor do slide 51 da proposta apresentada pela contra-interessada:


(omissis)


DO DIREITO


No Recurso interposto pela A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA vem suscitada a nulidade de sentença por omissão e pronúncia e contradição entre os fundamentos e a decisão por decorrência da falta e incorrecta fixação das questões a dilucidar em sede de sentença, ex vi artº 94º nº 1 CPTA.
Todavia, tal não se verifica porque o disposto no artº 94º nº 1 CPTA tem por objecto o relatório da sentença e a matéria das nulidades substanciais de sentença estatuídas no artº 668º nº 1 als. b) e c) CPC respeitam ao conteúdo da decisão.
Pelo exposto improcedem as questões suscitadas nas conclusões sob os itens 1 a 10 do presente recurso.

***

Os recursos em causa, da A... Portugal – Serviços de Consultoria e Informação, SA e ICP-ANACOM – Autoridade Nacional das Comunicações, reportam-se ao concurso público aberto para aquisição de um conjunto integrado de serviços em matéria de comunicações electrónicas, nomeadamente de implementação e gestão operacional do Sistema de Informação Centralizado (SIC) criado pelo DL 123/2009 de 21.05, rectificado pela Declaração de Rectificação nº 43/09 de 22.06 e com as alterações introduzidas pelo DL 258/09 de 26.09.

*
Resulta da fundamentação de direito da sentença recorrida que o Tribunal a quo teve por adquirido com apoio na “matéria dos autos, que a proposta apresentada pela adjudicatária [A...] ao prever a utilização da help-desk da ANACOM violou a disposição do Caderno de Encargos que determina que o prestador de serviços assegura o help-desk de primeira linha na comunicação de incidências pelas entidades municipais e demais operadores (alínea I dos factos assentes)”, conforme segmento retirado do segundo parágrafo de fls. 226 dos autos.

Em síntese, a situação trazida a recurso apresenta nos seguintes traços principais:

Numa primeira formulação - 1º relatório preliminar de 01.02.2011, transcrito em J) do probatório e 1º relatório final de 17.02.2011, não aprovado pela entidade adjudicante ICP-ANACOM, alíneas L) e M) do probatório - o Júri concursal propôs a exclusão da proposta apresentada pela A... com fundamento na violação expressa de um aspecto contratual não submetido à concorrência, concretamente, por a sua proposta não incluir a execução dos serviços de help-desk tal como exigido no Caderno de Encargos, circunstância subsumível numa das causas de exclusão de propostas que o CCP concentra nos artºs. 70º nº 2, 132º nº 4 e 146º nº 2 CCP, a saber, apresentação de quaisquer termos ou condições que violem aspectos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência – artº 70º nº 2 b), 2ª parte, CCP.
Ouvida em audiência prévia na sequência da notificação deste 1º relatório preliminar a A... pronunciou-se refutando a interpretação sustentada de que os termos constantes da proposta por si apresentada excluíssem a execução de serviços de help-desk, pronúncia levada ao probatório na alínea K).
Numa segunda formulação, na sequência da não aprovação do citado 1º relatório final de 17.02.2011 e uma vez constituído outro Júri no domínio do presente procedimento adjudicatório – 2º relatório preliminar de 29.06.2011, alíneas U) e V) do probatório e 2º relatório final de 13.07.2011 aprovado pela entidade adjudicante ICP-ANACOM por deliberação de 21.07.2011, alíneas X) e Y) do probatório – o Júri concursal admitiu a pronúncia da A... em sede de audiência prévia (artº 147º CCP), considerando-a na qualidade de esclarecimentos da proposta apresentada, nos termos e para os efeitos do artº 72º nº 2 CCP e concluiu que tais esclarecimentos “afastam o fundamento que levou a propor a respectiva exclusão”, alínea V) do probatório.
Por último, em sede dos citados 1º e 2ºs. relatórios preliminar e final, procedeu a nova ordenação e aplicando o critério de desempate do artº 15º b) do Programa de Concurso fundado na proposta recepcionada mais cedo, o Júri ordenou em 1º lugar e propôs a adjudicação da proposta da concorrente A..., matéria aprovada pela entidade adjudicante ICP-ANACOM por deliberação de 21.07.2011, alíneas X) e Y) do probatório.
É este acto de 21.07.2011 que o Tribunal a quo anulou, condenando ainda o ICP-ANACOM a excluir a proposta apresentada pela A... e adjudicar a proposta apresentada pela Ambising.

Feito o esquema da controvérsia trazida a recurso por ambos os Recorrentes, cumpre decidir.

***
A questão central trazida a recurso funda-se na alegação de violação primária de direito substantivo por erro de julgamento em matéria de interpretação quer do normativo do CCP quanto a esclarecimentos sobre as propostas, quer do clausulado constante da proposta apresentada pela ora Recorrente A..., erro de julgamento expresso nos seguintes segmentos:
(i) “não se verificam quaisquer ambiguidades no conteúdo da proposta da contra-interessada [A...] … pois que resulta da proposta, de forma expressa e inequívoca, que seria utilizado o help-desk da ANACOM, ainda que se admita que apenas para centralizar a gestão dos pedidos dos utilizadores … Assim não se mostra verificado o primeiro dos pressupostos respeitantes à admissibilidade de esclarecimentos sobre o conteúdo da proposta – a existência de ambiguidades.”
(ii) “a pronúncia da alínea K) dos factos, ao referir que a concorrente assegura o serviço de help-desk, ultrapassa o âmbito dos esclarecimentos admissíveis no artº 72º/2 do CCP, na medida em que contraria o referido nos documentos da proposta.”
(iii) “o acto impugnado [21.07.2011], ao acolher o mencionado pela contra-interessada na pronúncia da alínea K), enquanto esclarecimento prestado no âmbito do artº 72º/2 do CCP, violou a referida disposição legal, pois que admitiu uma modificação de um termo ou condição da proposta para além do que é admitido pelo instituto previsto nessa norma, corolário do princípio da intangibilidade das propostas”.

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Importa deixar assente que nenhum dos recursos interpostos suscita qualquer questão que envolva alegação de impropriedade do critério técnico expresso pela entidade administrativa na fundamentação do acto de adjudicação (21.07.2011) por remissão para os fundamentos constantes do 2º relatório final do júri.
O que significa que não faz parte do objecto dos recursos e, consequentemente, não cabe decidir sobre a vertente técnica dos motivos expressos na fundamentação do acto de adjudicação de 21.07.2011 na parte em que tanto os 2ºs. relatórios preliminar e final de 29.06.2011 e 13.07.2011 (alíneas U), V) e X) do probatório) se reportam e apreciam criticamente os 1ºs. relatórios preliminar e final de 01.02.2011 e 17.02.2011 (alíneas J), L) e M) do probatório).
Efectivamente, na medida em que os tribunais administrativos não são peritos em matérias técnicas, caso o objecto dos recursos implicasse saber se o clausulado da proposta apresentada pela concorrente A... violava os termos e condições do clausulado do Caderno de Encargos no que toca à gestão operacional do Sistema de Informação Centralizado (SIC) na parte assinalada no 1º relatório preliminar de 01.02.2011 transcrito na alínea J) do probatório, tal implicaria carrear para os autos os competentes meios de prova pericial em ordem a, num primeiro momento valorar e qualificar a situação real decorrente do clausulado da proposta do ponto de vista dos critérios técnicos e, num segundo momento, com base em critérios jurídicos administrativos apreciar a conduta administrativa expressa no acto de adjudicação, concluindo no sentido da violação, ou não, dos termos e condições do Caderno de Encargos e consequente subsunção, ou não, da situação trazida a juízo no regime estatuído do artº 70º CCP.
Pese embora o clausulado do Caderno de Encargos evidencia uma formulação estreitamente ligada ao domínio técnico das comunicações electrónicas cujo regime jurídico de construção de infra-estruturas e instalação de redes reside no acima citado DL 123/2009, todavia a controvérsia trazida a juízo tal como as Partes a conformam nos respectivas peças processuais não sai do domínio da interpretação jurídica da vontade declarada na proposta concorrencial, ou seja, fazendo apelo ao regime constante dos artºs. 236º a 239º C. Civil.

E, senão, vejamos.
*
O 1º relatório preliminar de 01.02.2011 analisa a proposta da A... no tocante ao Capítulo II, ponto 2, fase II, ponto 2.1 Modelo de gestão operacional do SIC, em que, transcrevendo, “o helpdesk/PUC da ANACOM (..) actua como a entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores” e que, transcrevendo, “o modelo de funcionamento de serviço proposto assenta na utilização da componente helpdesk da ANACOM como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by” - alínea J) do probatório e fls. 1905 do PA em anexo..
Segue o 1º relatório preliminar de 01.02.201, agora analisando as cláusulas do Caderno de Encargos, transcrevendo, “No entanto, decorre da cláusula 6a, da parte l do caderno de encargos, respeitante às obrigações principais do prestador de serviços, a obrigação, entre outras, da prestação de serviços de gestão (...) do Sistema de Informação Centralizado (SIC).
Por sua vez, a cláusula 7a da parte l do caderno de encargos, respeitante às fases da prestação dos serviços, no ponto 2, fase 2 - Gestão Operacional do SIC, alínea a), ponto 2.b, refere-se, entre outros serviços a prestar, à actividade de apoio/suporte a utilizadores (...), devendo o prestador de serviços ser responsável pelas actividades subjacentes à boa exploração do SIC, assegurando os necessários serviços para esse efeito
Ainda o ponto 3 da parte II do caderno de encargos, respeitante aos objectivos dos serviços a contratar, refere que o ICP ANACOM, ao contratar um prestador de serviços, estabelece que o mesmo é responsável por" a) auto-instalar-se, recrutar as competências necessárias e instruir o modelo de organização, gestão, planeamento e controlo adequados às orientações reflectidas neste documento (leia-se caderno de encargos).
Também no ponto 7 da parte II do caderno de encargos, respeitante aos níveis de serviço e penalizações, foram definidos os SLA's referentes ao funcionamento do serviço desk do prestador de serviços e respectivos indicadores, assim como as penalidades a aplicar pela sua não concretização. (..) - alínea J) do probatório e fls. 1905/1906 do PA em anexo..
Conclui o 1º relatório preliminar de 01.02.2011 no sentido de, transcrevendo, “Assim, considera-se que o concorrente, ao mencionar na sua proposta que o ICP - ANACOM assegurará o serviço de helpdesk, sendo aquele o ponto único de contacto (PUC), realizando as tarefas a ele associado, tais como a centralização da gestão de pedidos realizados pelos utilizadores, transferindo este serviço inerente à prestação dos serviços para o ICP - ANACOM, viola claramente um aspecto da execução do contrato a celebrar não submetido à concorrência, na medida em que este serviço, tal como os demais, são externalizados para a entidade que implementa e opera o SIC.” - alínea J) do probatório e fls. 1905 do PA em anexo.
Das considerações expostas conclui pela verificação do fundamento de exclusão constantes dos artºs. 146º nº 2 o) e 70º nº 2 b) CCP no que respeita à proposta apresentada pela A....
É absolutamente claro que a motivação exposta neste 1º relatório preliminar integra razões de natureza técnica insusceptíveis de ser separadas do fio condutor do raciocínio, o que significa que o 1º relatório preliminar expressa um juízo de inadequação técnica sobre a da proposta objecto de análise com fundamento em que do seu clausulado decorre que o concorrente não assegura os serviços de helpdesk em contrário do clausulado do Caderno de Encargos.

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Ouvido o concorrente A... no domínio da audiência prévia prescrita no artº 147º CCP, este pronunciou-se esgrimindo com o clausulado da sua proposta e nos diversos slides que identifica e que, do seu ponto de vista confluem no sentido de que a sua proposta assegura os citados serviços de help-desk cumprindo, assim, o clausulado do Caderno de Encargos nesta matéria - vd. alínea K do probatório e fls. 1913/1925 do PA em anexo.

Continuamos, pois, no domínio de análise estritamente técnico.

Em sede de 1º relatório final de 17.02.2011 o Júri analisou a resposta do concorrente em audiência prévia nos termos que seguem, transcrevendo, “Efectivamente, em nenhum ponto da proposta vem a Requerente afirmar, como o faz agora em sede de pronúncia ao relatório preliminar, que os serviços inerentes ao help-desk/PUC da ANACOM são por si assegurados.
O júri reitera que a Requerente não referiu isso na proposta apresentada pelo que tal comentário adicional, ora apresentado, não pode, nem poderá, ser considerado.”
E mais adiante, transcrevendo, “O que a Requerente afirma é completamente insuficiente para efeitos e em sede de análise, - a contradição entre o que a Requerente ora afirma e o que está plasmado na proposta continua a existir vinda das páginas anteriores.” – alínea M) do probatório e fls. 1949/1950 do PA em anexo.

Aqui, no 1º relatório final, o Júri ampliou o âmbito temático da análise.

Efectivamente, na apreciação da pronúncia da A... ao abrigo do artº 147º CCP, no 1º relatório final ao critério de análise estritamente técnico o Júri veio aduzir um critério assente na interpretação meramente textual, ou seja, um critério jurídico no sentido da insuficiência de clareza do conteúdo da proposta em matéria da inclusão da componente de help-desk nos serviços que se propõe prestar, exigida pelo Caderno de Encargos.
Neste ponto e salvo o devido respeito, a pronúncia do Júri mostra-se contraditória nos seus termos porque não é sustentável colocar no mesmo plano de análise estas duas conclusões: que a proposta contraria um aspecto técnico do Caderno de Encargos em matéria de termos e condições, porque a evidência técnica é no sentido de não assegurar os serviços de help-desk, antes remetendo para o help-desk da ANACOM e, simultaneamente, considerar que relativamente a essa mesma matéria não declarou expressamente que os assumia.
Se da análise técnica das diversas cláusulas e slides da proposta apresentada apenas resultava a conclusão tecnicamente fundada de que a A... não assumia a execução dos os serviços de help-desk, a eventual declaração expressa no sentido oposto obviamente que iria resultar numa proposta viciada por contraditoriedade dos seus termos.
Dito de outro modo, o significado expresso pelo texto de tal declaração estaria em colisão com o sentido técnico resultante das cláusulas e slides da proposta, anulando-se mutuamente.
O que significa que das duas uma: (i) ou do ponto de vista técnico não é sustentável que a proposta da A... exclui a execução dos tais serviços de help-desk – e nesse caso não é preciso fazer qualquer declaração sobre aquilo que tecnicamente é claro (salvo para os leigos, como é evidente, mas estes não contam para a matéria de análise das propostas) – (ii) ou a par do concreto conteúdo técnico da citada proposta, o Júri do concurso – que não é leigo nas matérias que analisa, sob pena de negar a competência de exercício da sua função procedimental – entende que subsiste uma falta de clareza porque os dados técnicos não são decisivos para arredar a margem de dúvida relativa a um dado aspecto da proposta.
Nesta segunda hipótese, instalada a dúvida, cumpre ao Júri, ponderado o âmbito de expansão de princípios potencialmente conflituantes – o princípio da concorrência, da igualdade e da transparência versus princípio do favor do procedimento na vertente dos concorrentes e das propostas -, pender a favor do regime de poderes oficiosos instrutórios estatuído no artº 72º nºs 1 e 2 CCP, solicitar de forma fundamentada e especificada os esclarecimentos tidos por necessários sobre o conteúdo da proposta em função do clausulado do caderno de encargos.
Como nos diz a doutrina “(..) a ideia essencial deste preceito é, portanto, a de que os esclarecimentos são isso mesmo, algo (uma informação, uma explicação, etc.) destinada a aclarar, a tornar claro, congruente ou inequívoco, um elemento que na proposta estava (ou parecia estar) apresentado ou formulado de modo pouco claro ou menos apreensível, não percebendo o júri (ou não percebendo ele seguramente) o que aqui se queria dizer.
Ou então - embora a hipótese já apresente outros contornos -, no caso de as expressões da proposta poderem ser entendidas em mais de um sentido.
O esclarecimento há-de assim ter por escopo a melhor compreensão de um qualquer aspecto ou elemento da proposta. (..)” (1)

*
E passamos, então aos 2ºs. relatórios, preliminar e final, elaborados já pelo novo Júri do concurso, em que abandonou o argumento da contrariedade técnica da proposta da A... face aos serviços de help-desk discriminados no Caderno de Encargos a título de termos ou condições e centrou-se exclusivamente no critério fundado na insuficiência de clareza da proposta da A..., ou seja, retomando o segmento já posto em relevo no 1º relatório preliminar mas em que se concluía pela sua contrariedade técnica com o clausulado do Caderno de Encargos.
Transcrevendo, “o help-desk /PUC da ANACOM (...), actua como a entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores" - "o modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente de help-desk da ANACOM (sublinhado nosso) como ponto único de contacto - PUC, cujo objectivo é o de recepcionar, registar, catalogar e informar sobre todos os pedidos relacionados com o âmbito do serviço. Será também o PUC o contacto para intervenções em stand-by”.
Nesta fase o Júri convolou procedimentalmente a pronúncia da A... no domínio do artº 147º CCP para o domínio dos esclarecimentos sobre a proposta prestados a impulso do Júri, ou seja, no domínio do artº 72º nºs. 1 e 2 CCP - como foi o caso só que num momento procedimental que acabou por ser anulado por via da retoma do procedimento e reexercício dos poderes de análise e avaliação do Júri -, e admitidos por satisfatórios.
Em sede de sentença tais esclarecimentos foram julgados inatendíveis por disposição legal expressa na medida em que contrariam o referido nos documentos da proposta no sentido de que “o help-desk da ANACOM actua como entidade que centraliza a gestão dos pedidos realizados pelos utilizadores” e “o modelo de funcionamento do serviço proposto assenta na utilização da componente help-desk da ANACOM”, segmentos da sentença sob recurso a fls.223 - 224 dos autos.
Todavia, não se acompanha esta fundamentação pelas razões aduzidas supra no tocante ao objecto dos recursos interpostos e que também relevam em sede de 1ª Instância por decorrência da causa de pedir plasmada na petição inicial, na medida em que a Autora e ora Recorrida Ambising - Ambiente e Sistemas de Informação Geográfica, SA não suscita a impropriedade do critério técnico expresso na fundamentação do acto impugnado, o que significa que dos autos não resulta, por força do adequado meio probatório pericial, que a proposta da A... no Capítulo II, ponto 2, fase II, ponto 2.1 Modelo de gestão do SIC contraria tecnicamente as cláusulas 6ª, parte 1, cláusula 7ª parte 1 e pontos 3 e 7 da parte II, todos do Caderno de Encargos, conforme consta do 1º relatório preliminar de 01.02.2011, levado à alínea J) do probatório.
Assim sendo, carece de fundamentação de facto a conclusão jurídica no sentido de que os esclarecimentos prestados pela A... e admitidos por convolação procedimental da pronúncia emitida ao abrigo do artº 147º CCP, contrariam aspectos da proposta apresentada por este concorrente em matéria de termos ou condições, o que significa que a anulação da deliberação de 21.07.2011 pela qual a ICP-ANACOM aprovou o relatório final do Júri datado de 13.07.2011 não se pode manter.


***

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em, julgar procedentes os recursos e revogar a sentença proferida.

Custas a cargo da Recorrida.

Lisboa, 05.JUL.2012

(Cristina dos Santos) ……………………………………………………………………..

(António Vasconcelos) …………………………………………………………………..

(Paulo Carvalho) ………………………………………………………………………...


1- Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina/2011, págs. 601/602

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