sexta-feira, 1 de agosto de 2014

LEGITIMIDADE ACTIVA - CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL



Proc. 01212/12    STA   14  Fev  2013 

Não tem legitimidade activa para arguir vícios próprios do acto de adjudicação de uma empreitada de obras públicas, o concorrente cuja proposta foi excluída e que não impugna essa exclusão.
Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

O MUNICÍPIO DE ALBERGARIA-A-VELHA, recorre para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150.º do CPTA, do acórdão do TCA Norte, de 23 de Agosto de 2012, que concedeu provimento ao recurso interposto por A……. S.A., revogou a sentença do TAF de Aveiro e julgou procedente a acção administrativa especial, com a consequente anulação do concurso público n.º 2653/2011, para adjudicação de um Contrato de Empreitada de Obra Pública denominado «Arrelvamento do Estádio Municipal da Branca».

Por decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro foi julgada improcedente a acção de contencioso pré-contratual instaurada por A……. S.A., contra o Município de Albergaria-a-Velha, indicando como contra-interessada a sociedade B……, Lda., visando o procedimento de concurso público n° 2653/2011 para adjudicação de Contrato de Empreitada de Obra Pública de «Arrelvamento do Estádio Municipal da Branca» cujo anúncio foi publicado no Diário da República, II Série, de 01/06/2011, pedindo a sua anulação.

Desta decisão foi interposto recurso para o TCA Norte, que concedeu provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e julgando procedente a acção.
Deste aresto, é interposto recurso de revista excepcional nos termos do artº 150º do CPTA.

No recurso que vem de ser referido, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:

a) Tendo a proposta da concorrente, A……, sido excluida do concurso ainda na fase da admissibilidade das propostas, por ter violado a norma da alínea f), n° 1 do art.6° do Programa do Concurso, uma vez que não juntou, com os diversos documentos, os testes e certificados da qualidade da relva sintética, como de resto confessa expressamente, a mesma deveria ter impugnado tal exclusão e não a eventual violação de normas concernentes à fase da avaliação e classificação das propostas e da adjudicação da empreitada, permitindo, desta forma, que a referida exclusão da sua proposta se firmasse na ordem jurídica como caso decidido ou caso resolvido.

b) Confessou a A…… nas suas alegações na 1ª instância que: "De salientar que o que aqui está em causa, não é a ilegalidade da exclusão da proposta da A., mas sim, o facto de se estar a dar seguimento a um concurso público que enferma de vícios, irregularidades, deficiências, erros… ".

c) Só que a A…… não é a defensora da legalidade do concurso, nem tem procuração dos outros concorrentes para zelar pelos seus interesses!

d) Por outro lado, a eventual violação das normas referidas no aresto recorrido, não tem a virtualidade de fundamentar a anulação do concurso.

e) Com efeito, a eventual violação das normas do art. 139°, nº 3 e al. n), n° 1 do art. 132°, ambos do CCP, já transcritas não assumem relevância invalidante pois em nada alteram a exclusão da proposta da A……, que por isso se mantém na ordem jurídica.

f) Efetivamente, as questões atinentes ao modo como foram fixados os factores de classificação das propostas e respectivo modelo de avaliação, invocadas pela recorrida A……, e aceites pelo aresto recorrido, em nada bulem com a decisão de exclusão da proposta, proposta esta que não chegou a ser apreciada, valorada ou classificada.

g) Por isso, os interesses que as normas em causa, que no entender do acórdão recorrido não foram observadas, não se mostram, no caso, desatendidas.

Pelo exposto, e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve dar-se provimento ao presente recurso de revista excecional e revogar-se o acórdão recorrido, assim se fazendo JUSTIÇA!
A Recorrida contra-alegou, concluindo, assim:

1. A ora Recorrida concorreu ao concurso público nº 2653/2011, publicado na II Série do Diário da República, no dia 1 de Junho de 2011, para adjudicação de um Contrato de Empreitada de Obras Públicas denominado "Arrelvamento do Estádio Municipal da Branca".

2. De facto, a Recorrida foi excluída pelo júri do concurso público na fase da admissibilidade das propostas, por violação da alínea f) do nº 1 do art. 6º do respectivo Programa de Procedimento, ou seja, por não ter instruído a sua proposta com os documentos relativos aos testes e certificados dos materiais a incorporar na empreitada.

3. A Recorrida admite que foi correctamente excluída do concurso em causa, pelo que não tinha razão de ser vir impugnar o fundamento da sua exclusão. E parece que foi isso que a Recorrente ainda não entendeu, ou não quer entender ...

4. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou totalmente improcedente a acção administrativa especial do contencioso pré-contratual que a ora Recorrida intentou contra a ora Recorrente e a Contra-Interessada.

5. Não se conformando com a douta sentença, a Recorrida interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte, onde imputou erros de julgamento à sentença da 1ª instância, relativamente à interpretação e aplicação que fez dos arts. 139º nº 3 e 132º nº 1 al. n), do CCP.

6. O que estava em causa era que tinha sido adoptado o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa, que foi densificado por factores e ponderações. O factor preço com ponderação de 50% e o factor qualidade técnica também com ponderação de 50%.

7. Para o que ora nos importa, quanto ao factor qualidade técnica e a cada um dos seus subfactores, não foi explicitada a respectiva escala de pontuação, através de uma expressão matemática ou em função de um conjunto ordenado de diferentes atributos susceptíveis de serem propostos e que permitissem a atribuição das pontuações parciais, ficando tais pontuações e suas consequentes ponderações, entregues a uma discricionariedade mais ampla do que aquela que o legislador do CCP quis conceder.

8. Não foi cumprido o que impõe a alínea n) do nº 1 do art. 132º do CCP, relativamente ao conteúdo do Programa do Concurso, nem foi cumprido o art. 139º. Nº 1 e 3 do CCP, no que toca ao modelo de avaliação das propostas, atento o critério de adjudicação adoptado.

9. Tal como é sabido, à contratação pública, enquanto procedimento administrativo, é aplicável a generalidade dos princípios da actividade administrativa, nomeadamente, o princípio da legalidade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da imparcialidade e o princípio da boa-fé.

10. No entanto, destacam-se três princípios que são especialmente aplicáveis à matéria da contratação pública, os quais enformaram as soluções jurídicas criadas pelo legislador do CCP e aos quais se deve fazer apelo aquando da interpretação das suas normas, encontrando-se previstos logo no art. 1º nº 4 do CCP.

11. São eles o princípio da transparência, promovido pela regra da desmaterialização total e obrigatória dos procedimentos pré-contratuais; o princípio da igualdade que opera, particularmente, ao nível da participação dos interessados nos procedimentos e o princípio da concorrência potenciado pela utilização de mecanismos mais rigorosos, como por exemplo, o modelo de avaliação das propostas.

12. Contudo, o Tribunal Central Administrativo Norte, conseguiu alcançar o que a ora Recorrida pretendia com tal pleito, acabando por revogar a sentença proferida pelo TAF de Aveiro e anular o concurso público em causa.

13. A Recorrente não percebeu que o que aqui está em causa é o facto de que todo o concurso, todo ele, está contaminado pela violação dos princípios estruturantes já referidos, na medida em que não cumpriu as imposições derivadas dos arts. 132º, nº1, al. n) e 139°, nº 1 e 3 do CCP., relativamente ao factor qualidade técnica e seus subfactores.

14. Houve uma actuação ilícita e culposa por parte dos membros do júri do concurso público lançado peça Recorrente, a que várias empresas se candidataram, entre as quais a ora Recorrida.

15. A conduta ilícita e culposa atribuída àqueles, consubstancia-se no facto do júri do concurso não ter ponderado, classificado a lista de testes e certificados a apresentar pelos concorrentes. Traduz-se, ainda, no facto de não terem procedido à notificação da adjudicação nos termos previstos e conformes estabelecidos no CCP, embora esta questão tenha sido "esquecida" pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro ...

16. Conclui-se, portanto, que houve preceitos legais que não foram cumpridos, pondo em causa a continuidade dos concorrentes ...

Nestes termos e nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser rejeitado, por não cumprir os requisitos do recurso de revista previstos no art. 150º do CPTA.

Destarte, caso V. Exas. admitam o mesmo, deverá ser mantido o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte nos mesmos termos em que julga procedente a acção administrativa especial e anula o concurso público em causa. Assim decidindo farão Vossas Excelências a verdadeira e costumada JUSTIÇA!

Por acórdão deste STA, de fls. 399 e segs., foi a revista admitida, em apreciação preliminar sumária, nos termos dos n.ºs 1 e 5 do artigo 150.º do CPTA, por aquela Formação ter entendido que “a questão colocada consiste em saber se o candidato excluído de um concurso em virtude de a sua proposta não satisfazer as exigências do Programa do Concurso pode impugnar o acto final e conseguir a sua invalidação com fundamento em ilegalidade das normas relativas ao critério de adjudicação ainda que sem impugnar os fundamentos pelos quais foi excluído.
Sobre esta questão o Acórdão recorrido disse:
“ … este tribunal aprecia os erros de julgamento de direito invocados em sede de conclusões de recurso entre os quais não figura, porque não apreciada na sentença do TAF, a questão da falta de interesse em agir da recorrente”.
Isto é, o Acórdão recorrido considerou que a questão de saber se a A. podia obter a invalidação do acto com o fundamento que usou era uma questão de interesse em agir que não estava suscitada nem decidida pelas instâncias e por isso estava fora do objecto da apelação.
Esta é, portanto, uma questão que se suscita, distinta da acabada de enunciar, embora em relação ela.
Como se vê o tratamento processual dado nas instancias à pretensão e seus fundamentos e a natureza da questão da impugnação da adjudicação por concorrente cuja proposta fora excluída, mas que usa como fundamento exclusivo da impugnação a invalidade de normas do concurso, podem repetir-se noutros procedimentos concursais e a certeza sobre esta matéria apresenta grande importância para a Administração e para os concorrentes em concursos públicos, pelo que a respectiva solução se reveste de fundamental relevância jurídica e justifica a intervenção do Supremo”.
O M.P. notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º, 1 e 147º do CPTA nada disse.
Sem vistos vem o processo à conferência para julgamento do recurso.

2. Fundamentação
2.1. Matéria de facto
A matéria de facto fixada na decisão é a seguinte:
1. No Diário da República, II série, nº 106, de 1 de junho de 2011, foi publicado o anúncio de abertura do concurso público para empreitada de obra pública designada de "Arrelvamento do Estádio Municipal da Branca" (junto sob Doc. n° 1 com a Petição Inicial, a fls. 19 dos autos).
2. Aquele Concurso Público teve o Programa de Concurso (PC) (junto sob Doc. n° 2 com a Petição Inicial, a fls. 24 ss. dos autos) e o Caderno de Encargos (CE) e respetivos Anexos, constantes do Processo Administrativo, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido.

3. É o seguinte o disposto no artigo 6° do Programa de Procedimento:
Artigo 6.° - Documentos que constituem a proposta
1 - Além dos documentos referidos no n.º 1 do artigo 57.º (ver anexo I do CCP), bem corno no n.º 4 e no n.º 5 do artigo 60.°, ambos do Código dos Contratos Públicos, a proposta deve ser instruída com os seguintes documentos:
a) Nota justificativa do preço proposto;
b) Lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstos no projecto de execução. com o ordenamento dos mapas resumo de quantidades de trabalho;
c) Programa de trabalhos, incluindo plano de trabalhos, plano de mão-de-obra e plano de equipamento;
d) Plano de pagamentos e cronograma financeiro;
e) Memória justificativa e descritiva.
f) Testes e certificados
√ Teste de avaliação das características mecânicas e físico químicas da fibra que demonstre a resistência da mesma em condições de envelhecimento artificial, incluindo a exposição desta aos raios UV e à condensação.
√ Teste de resistência mecânica da fibra à abrasão, que comprove a resistência sem fibrilação/ fragmentação da mesma, quando sujeita à abrasão mecânica com a frequência de >30.000 ciclos no teste LlSPORT, efectuado em Laboratório acreditado pelo FIFA QUALITY PROGRAM.
√ Teste laboratorial que comprove e indique o índice de aumento térmico pontual da pele do utilizador quando este estabelece contacto com a superfície da relva artificial. Este teste deve ser efectuado por Laboratório de Bio mecânica acreditado pelo FIFA QUALlTY PROGRAM.
√ Teste que comprove que o teor de metais pesados do sistema, relva e enchimento em borracha cumpre o exigido na norma DIN 18035-7: 2002.
√ Teste de resistência do filamento que determine a sua resistência quando submetido à flexão forçada e sistemática, reproduzindo o rolamento de bola e carga das chuteiras.
√ Carta FIFA endereçada ao fabricante que comprove a credenciação FIFA PREFERRED PRODUCER.
√ Certificado Basic emitido pela EPEA, que comprove que a relva do fabricante e o fabricante da mesma cumprem os requisitos em matéria de sustentabilidade e eco eficiência.
√ Ficha técnica em língua da proveniência da fabricante acompanhada de tradução oficial em Português.
√ Certificado de conformidade emitido pelo fabricante da relva e do enchimento da borracha, a acompanhar a montagem da relva, que prove que a relva a instalar cumpre o intervalo de parâmetros definidos nas condições técnicas especiais requeridas neste processo.
√ Teste laboratorial que apresente foto microscópica da secção dos filamentos da fibra, sua estrutura e espessura devidamente acompanhado da tabela de aferição.
√ Declaração do concorrente onde se descreve e se junta catálogo do equipamento de instalação e seus certificados de propriedade.
√ Declaração do concorrente em que se compromete mandar executar os ensaios de campo a suas expensas, que comprovem a performance FIFA atingida pelo campo instalado, devendo este teste ser efectuado por um dos laboratórios licenciados pela FIFA para o efeito.
√ Manual descritivo dos procedimentos de manutenção em documento emitido pelo fabricante do sistema e que esteja de acordo com as exigências preconizadas pela FIFA para o efeito.
√ Certificado de garantia da relva artificial e seu descritivo e ressalvas, sua validade, devidamente assinado por representante legal da empresa produtora da relva.
√ Ensaios Lisport teste de desgaste e resistência da relva, apresentada pelo concorrente/fabricante da relva, comprovadamente elaborados por um Laboratório Credenciado pela FIFA no âmbito do seu FIFA QUALITY PROGRAM, ultima edição.

2 - O programa de trabalhos previsto na alínea c) do número anterior é constituído, no mínimo, pelos seguintes elementos:
a) Diagrama de barras mostrando o desenvolvimento dos trabalhos de execução da empreitada e dos rendimentos médios adoptados para a execução dos diferentes tipos de trabalhos;
b) Plano de mão-de-obra para a execução dos trabalhos da empreitada - Mapa de afectação das diferentes cargas de mão-de-obra distribuídas, quer em quantidade, quer em tempo previsto de permanência na obra;
c) Plano de equipamento para a execução dos trabalhos da empreitada - Mapa de equipamento representando os diversos tipos de equipamento, quer em quantidade, quer em tempo de afectação à obra.

3 - A elaboração da proposta obedece ao disposto nos nºs 4 e 5 do artigo 57º e do artigo 58.º do Código dos Contratos Públicos, bem como do n.º 2 do artigo 9.° do Decreto-lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro.

4. É o seguinte o disposto no artigo 10º do Programa de Procedimento:
Artigo 10.º - Critério de adjudicação

1 - A adjudicação obedece ao critério da proposta economicamente mais vantajosa, o qual é densificado de acordo com seguintes factores e ponderações:
a) Preço: 50%;
b) Qualidade técnica: 50%.

2 - O factor previsto na alínea b} do número anterior integra ainda os seguintes subfactores e ponderações:
b.1) Plano de Trabalhos, (Programa de trabalhos, plano de Mão-de-obra e plano de Equipamento: 25,0%;

b.2) Memória descritiva e justificativa do modo de execução da obra: 25,0%;

b.3) Teste : 50%.

3 - Os factores e subfactores elementares referidos nos números anteriores são avaliados de acordo com a metodologia descrita no regulamento de avaliação das propostas, o qual estabelece o suporte orgânico e o enquadramento processual e metodológico para a análise e avaliação das propostas e constitui o Anexo I ao presente Programa do Concurso.

5. É o seguinte o teor do Anexo I ao Programa do Concurso (junto sob Doc. 2 com a Petição Inicial, a fls 31 ss. Dos autos):
Anexo I
(A que se refere o Artigo 10.º)

Avaliação das Propostas

Factores a considerar percentagem relativa
Preço (P): 50%
Qualidade técníca (QT): 50%

A avaliação do factor "preço" (P) resulta da regressão linear do valor da proposta (VP) sobre o valor base (VB), considerando-se o intervalo entre o valor base e o limite do preço anormalmente baixo (60% do valor base).
Sendo a fórmula da regressão linear:
Y= a + b × x

Onde: X0=VB x 50% e Y0=1

X1=VB e Y1 =0

Temos:

A avaliação do factor "Qualidade Técnica" (QT) é feita através da ponderação dos seguintes critérios:

a) Plano de trabalhos (PT): 25%
b) Memória Descritiva (MD): 25%
c) Teste e certificados (TC): 50%

A "Classificação Final" (CF) será calculada de acordo com a seguinte fórmula:

CF = P × 50% + [0.25xPT + 0.25xMD +0.50xTC} x 50%

6. Em 02-06-2011 a Autora dirigiu ao Presidente da Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha o requerimento que apelidou de «reclamação» (que junta sob Doc. n° 3 com a Petição Inicial, a fls. 35 ss. dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido), na qual concluiu da seguinte forma:

III - CONCLUSÃO:

Os actos perpetrados pelo promotor padecem do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos e por desrespeito do princípio da justiça quanto criou obstáculos incontornáveis aos concorrentes em poderem apresentar as suas propostas sem estar manietado e subjugados a um único fornecedor

O dono de obra está vinculado às regras substanciais e de procedimento estabelecidas na lei e igualmente às regras de admissão dos concorrentes.

O dono da obra está obrigado a realizar o procedimento de acordo com a aplicação de critérios legalmente definidos

A haver uma correcta aplicação da lei e do regulamentado no programa de Concurso, dando provimento aos princípios constitucionais da igualdade, da estabilidade, da transparência e da imparcialidade, os concorrentes deveriam poder apresentar a sua proposta em face das qualidades intrínsecas de performance desportiva que os seus produtos possuem e não se verem retirados do procedimento devido à obrigatoriedade de uma panóplia de documentos redundantes, tendo em conta que o organismo máximo que regula esta actividade (FIFA) não os impõe desta forma. E todo o procedimento tem como actividade principal o fornecimento e aplicação de relva sintética sendo inclusive obrigatório que a instalação seja testada, aprovada e referenciada no sítio oficial desta instituição.

De igual forma os critérios de avaliação pecam por uma valorização cujo critério, ao não ter um cariz matemático, os concorrentes ficam ao sabor da subjectividade do júri.

Mais, o concorrente corre sérios riscos de não ver a sua obra recepcionada, se não atingir os parâmetros FIFA e obter a publicação da mesma no sitio da instituição citada, quando um dos parâmetros têm a ver com a permeabilidade, sendo a mesma da responsabilidade do dono de obra, pois não vai haver alterações à base existente !!!
O promotor não fundamenta a razão para tal desidrato, sendo certo que os elementos de facto apresentados por este, estão em oposição com as conclusões de direito.

Nos termos do art.º 125°, no seu nº 2 do CPA, sob a epígrafe "Requisitos da fundamentação", constata-se que:

... "Equivale à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto."

A exigência da fundamentação significa que o acto administrativo deve apresentar-se formalmente como uma disposição conclusiva lógica de premissas correctamente desenvolvidas e permitir através da exposição sucinta dos factos e das normas jurídicas em que se funda, que os seus destinatários possam fazer a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pelo seu autor - Cfr. neste sentido os Acs. STA de 04.JUL.96 e de 05. DEZ. 96, in Recs. n.ºs 38 283 e 33 857, respectivamente.
A exigência de fundamentação é, pois, uma regra que se impõe na prolação de actos administrativos, em ordem à transmissão por parte do seu autor ao seu destinatário das razões subjacentes à sua prática.

Do mesmo modo, ainda, sumariou-se no Ac. deste TCAN, de 03.NOV.05, in Rec. N° 00111/04, que “Ocorre violação do princípio constitucional da imparcialidade, gerador de vício autónomo de violação de lei, sempre que sejam levados a cabo procedimentos que contenham o risco de consubstanciarem actuações parciais, independentemente da demonstração efectiva de ter ocorrido uma actuação destinada a favorecer algum dos interessados em concurso, com prejuízo de outros.”

Assim, a inobservância de formalismo que lese os valores essenciais do concurso pode conduzir à exclusão de uma proposta, o que pressupõe a ofensa de normas a que o Júri do concurso está vinculado (cfr. Esteves de Oliveira, "Direito Administrativo", 1998, p, 460; Ac. STA de 20.11.86, in Ac. Dout. nº 303, p. 364 e seguintes; Ac. STA (Pleno) de 17 de Janeiro de 2001, Rec. n° 44249, in "Antologia de Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo", Ano IV, n° 2, p. 11 e seguintes; Margarida Olazabal Cabral, "O Concurso Público nos Contratos Administrativos", Almedina, 1997, p. 180 e seguintes.

7. O Júri do Concurso apreciou aquela «reclamação» nos termos vertidos na Informação de 07-06-2011 (junta sob Doc. n° 4 com a Petição Inicial, a fls. 46 dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido) ali deliberando, por unanimidade, não lhe dar provimento.
8. Foram apresentadas cinco (5) propostas àquele concurso, entre as quais a proposta da Autora, cujo valor era de € 230.876,40 (cfr. Doc. n° 5 junto com a Petição Inicial, a fls. 48 dos autos).
9. No Relatório Preliminar elaborado em 12-07-2011 (junto sob Doc. n° 6 junto com a Petição Inicial, a fls. 49 ss. dos autos), O Júri do Procedimento propôs a exclusão de três (3) pospostas, entre as quais a proposta da Autora, esta com o seguinte fundamento: «por não cumprir o estipulado na alínea f), do art. 6° do Programa de Procedimento, conforme "mapa de análise de documentos que constituem as propostas que se anexa».
10. Notificada, a Autora pronunciou-se, em sede de audiência prévia, (através do requerimento que junta sob Doc. n° 3 com a Petição Inicial, a fls. 35 ss. dos autos, cujo teor integral se dá aqui por reproduzido) alegando, em suma, que considerava terem sido violados os princípios da proporcionalidade, da imparcialidade e da prossecução do interesse público, solicitando que o procedimento fosse anulado.
11. O Júri do Procedimento elaborou então em 20-07-2011 o Relatório Final (junto sob Doc. n° 8 junto com a Petição Inicial, a fls. 67 ss. dos autos) no qual não deu provimento à exposição apresentada pela Autora, e manteve o teor do Relatório Preliminar, e propôs a adjudicação da empreitada ao concorrente classificado em primeiro lugar, a B……, LDA., pelo valor de € 256.174,90.
12. Na sua reunião de 03-08-2011 a Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha aprovou aquele Relatório Final e adjudicou a empreitada nos termos propostos (cfr. Doc. nº 8 junto com a Petição Inicial, a fls. 67 ss. dos autos) tendo o respetivo contrato (junto a fls. 109 dos autos do Processo Cautelar n° 459/11.0BEVIS-A apenso] sido celebrado em 07-10-2011.

E, em sede de motivação o Tribunal consignou que "A matéria de facto dada como assente nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados teve por base os documentos aí referidos juntos aos autos e constantes do Processo Administrativo apenso."

2.2. Matéria de Direito
2.2.1. Objecto do recurso
Como decorre do acórdão deste STA que admitiu o recurso de revista a questão a decidir é a de saber se “o candidato excluído de um concurso em virtude da sua proposta não satisfazer as exigências do Programa do Concurso pode impugnar o acto final e conseguir a sua invalidação com fundamento em ilegalidade das normas relativas ao critério de adjudicação ainda que sem impugnar ols fundamentos pelos quais foi excluído”.
O TAF de Aveiro entendeu a proposta da autora (ora recorrente) fora “correctamente excluída por não ter sido acompanhada de todos os documentos a que aludia a alínea f) do n.º 1 do art. 6º do Programa do Concurso. Não merecendo também, pois, censura, a atuação do Júri que a não admitiu e a subsequente deliberação de 3-8-91 da Câmara Municipal de Albergaria a Velha.”

Perante esta constatação a sentença disse ainda o seguinte:
“ (…)
Não assumindo relevância invalidante, no caso, as demais invocações feitas pela autora, já que em nada alteram a exclusão da sua proposta, que se mantém. Na verdade, as questões atinentes ao modo como foi fixados os factores de classificação das propostas e respectivo modelo de avaliação, invocadas pela autora, em nada bulem com a decisão de exclusão da proposta da autora, a qual como se viu, foi validamente proferida, e que assim não chegou a ser apreciada, valorada ou classificada
(…) ” – cfr., sentença do TAF de Aveiro de fls. 242 dos autos.

No TCA Norte o recurso foi julgado por aceitação integral de um outro acórdão proferido “no âmbito do processo n.º 460/???? Onde, através de acórdão proferido em 13/7/2012, foi decidido nos termos que nos limitaremos a transcrever, por razões óbvias de celeridade e economia processuais:”

Nesse acórdão do TCA Norte limitou-se o “objecto material do recurso” “à apreciação do erro de julgamento de direito relativo à interpretação e aplicação dos artigos 139º,n.º 3 e 132º, n.º 1, al. n) do CCP”. Nada disse sobre a decisão da 1ª instância que considerou sem relevância invalidante os vícios atinentes ao modo como foram fixados os critérios de avaliação e classificação das propostas.

Daí que a questão essencial a decidir – como de resto foi sublinhado no acórdão que admitiu o recurso de revista – seja a de saber se, efectivamente, o candidato excluído pode impugnar o acto de adjudicação, com fundamento em vícios que não se projectam sobre o acto de exclusão.

2.2.2. Análise das questões – objecto do recurso
Como já referimos o acórdão do TCA Norte decidiu por remissão e transcrição de um outro acórdão desse Tribunal, relativamente a questão similar.
Ora, esse acórdão do TCA Norte foi revogado por acórdão deste STA de 6 do corrente mês de Fevereiro, proferido no recurso 952/12/12 com a seguinte argumentação:
“(…)
Do que vem dito decorre que não tendo um concorrente impugnado a exclusão da sua proposta de um procedimento concursal, esta decisão firmou-se na ordem jurídica como caso resolvido ou decidido, carecendo de legitimidade para atacar o acto final do mesmo procedimento, no caso a adjudicção de um contrato de empreitada de obras públicas. A falta de legitimidade do autor não permite o prosseguimento do processo (art. 89º, 1, al. d) do CPTA.
(…)”

No referido processo as partes eram as mesmas e as alegações da recorrente são idênticas.

Concordamos inteiramente com o decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo no citado acórdão de 6-2-3013 – recurso 952/12/12.

A ora recorrida quando recorreu para o TCA Norte referiu expressamente nas suas alegações:

De salientar que o que aqui está em causa não é a ilegalidade da exclusão da proposta da autora …” – como sublinha a ora recorrente na conclusão b).

De resto a recorrida (nas contra – alegações para este STA) referiu expressamente:
A Recorrida admite que foi correctamente excluída do concurso em causa, pelo que não tinha razão de ser vir impugnar o fundamento da sua exclusão.” – Conclusão 3.

A sentença – como vimos - considerou as partes legítimas e entendeu que a falta de impugnação do acto de exclusão tornava inoperantes quaisquer vícios do acto de adjudicação.

Contudo, a nosso ver, a questão é efectivamente de legitimidade e não de inoperância dos vícios do acto. Ou seja, as razões que levaram a sentença a considerar inoperantes ou irrelevantes os vícios do acto de adjudicação para a posição do interessado validamente excluído de um concurso, são questões sobre a legitimidade processual activa.

Vejamos então.

A legitimidade processual activa afere-se em função da alegação de um interesse directo e pessoal lesado pelo acto impugnado (art. 56º, 1 do CPTA). Ou seja, o interessado deve alegar um prejuízo resultante do acto concretamente impugnado.
Este Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 25-1-2006, proferido no recurso 01127/05 entendeu que:
“(…)
Carece de legitimidade para impugnar um acto que aprovou um pedido de licenciamento de eliminação de uma janela de um edifício, o titular de um prédio vizinho que não invoca qualquer prejuízo derivado de tal eliminação
(…)”.
A razão deste entendimento – invocada no acórdão – é a de que deve considerar-se interessado quem espera e pode obter da anulação do acto um benefício. - cfr. FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo volume IV, página 170.

No caso destes autos, a ora recorrida (autora na acção) tinha, sem dúvida legitimidade para impugnar a exclusão da sua proposta, na medida em que a anulação dessa exclusão o colocava no concurso. Com efeito, a concorrente era titular do interesse legítimo de permanecer no concurso, e, portanto, a lesão desse alegado interesse conferia-lhe legitimidade activa. Mas, em boa verdade, tendo sido excluída, a sua legitimidade limitava-se à defesa do interesse em permanecer no concurso.

Com efeito, a partir do momento em que a autora está excluída (validamente excluída, como, de resto, reconhece) tal implica a falta de interesse directo e pessoal susceptível de ser lesado pela prática do acto de adjudicação da proposta a um dos candidatos admitidos. O candidato excluído num concurso – depois de esta estar firme na ordem jurídica por força do caso decidido - não espera nem pode obter da anulação do acto de adjudicação a um dos candidatos admitidos, qualquer benefício, não tendo assim legitimidade para impugnar esse acto.

Assim, o entendimento da sentença recorrida está certo, embora a questão não seja de inoperância dos alegados vícios, mas de ilegitimidade activa da autora para impugnar o acto de adjudicação.

Deve, então, conceder-se provimento ao recurso, revogar-se o acórdão do TCA Norte e, consequentemente, considerar-se que a autora (candidata excluída num concurso) não tinha legitimidade activa para impugnar o acto de adjudicação às concorrentes admitidas, pois não retiraria da eventual anulação qualquer benefício.

3. Decisão

Face ao exposto, os Juízes da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo acordam em conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e por ilegitimidade da autora absolver o requerido da instância.

Custas pela recorrida.

Lisboa, 14 de Fevereiro de 2013. – António Bento São Pedro (relator) – António Políbio Ferreira Henriques – Américo Joaquim Pires Esteves

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