sexta-feira, 25 de julho de 2014

CONTRATAÇÃO PÚBLICA - CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL - ART. 100.º CPTA - NULIDADE DECISÃO - ERRO JULGAMENTO FACTO - RETIFICAÇÕES PROPOSTAS - ART. 249.º CC - PRAZO VALIDADE PROPOSTA OMISSÕES PROPOSTA - ESCLARECIMENTOS PEDIDOS PELO JÚRI DO CONCURSO - ART. 72.º CCP - EXCLUSÃO PROPOSTA - ART. 70.º CCP – CONCORRÊNCIA



Proc. Nº 02363/12.6BELSB (PORTO)    TCAN    6   Dez   2013  

I. Tem-se como admissível que a entidade adjudicante proceda à correção ou consideração oficiosa de propostas de concorrentes admitindo a sanação de correções de pormenor ou a retificação de erros manifestos, de cálculo, de escrita ou outros constantes da proposta, nos termos do art. 249.º do CC, sem exigir para o efeito, quer o consentimento prévio, quer o assentimento posterior por parte dos respetivos concorrentes.
II. Se a proposta tem um «lapsus calami» ostensivo e se é absolutamente seguro o que, na vez do que aí se escreveu, se pretendera escrever, deve o júri aceitar a retificação da proposta à luz do princípio geral de direito acolhido no referido art. 249.º do Código Civil, abstendo-se de propor a exclusão dela, sem que isso viole os princípios da estabilidade das propostas ou da concorrência.
III. O legislador vem fixando um prazo limitado de validade ou de obrigação de manutenção das propostas de molde a que os concorrentes não fiquem “eternamente” presos a um procedimento e a uma proposta que foi elaborada num determinado contexto circunstancial, extraindo-se do art. 65.º do CCP a regra geral nesta matéria.
IV. Esse prazo deve constar do programa do procedimento ou do convite para a apresentação de propostas mas só prevalece sobre o prazo legalmente previsto no citado normativo se a entidade adjudicante entender fixar dum prazo de validade em tempo superior aquele prazo supletivo, na certeza de que caso contrário valerá este prazo.
V. Da ausência de expressa referência na proposta da concorrente da menção de que a validade da sua proposta era superior 90 dias tal como definido no Programa não se pode concluir automaticamente que a respetiva proposta não aceitasse ou quisesse contrariar tal normativo contratual, ou que a mesma proposta tivesse um prazo de validade inferior, mormente, o prazo supletivo previsto no referido art. 65.º do CCP.
VI. A ideia basilar ínsita no n.º 2 do art. 72.º do CCP é a de que os esclarecimentos são algo que se destina a aclarar, explicitar, clarificar algum elemento da proposta que está ou parece estar enunciado de modo pouco claro, ou de não ser apreensível, ou unívoco o sentido duma expressão, dum aspeto ou elemento da proposta, na certeza de que para a atendibilidade do esclarecimento que se prenda com a interpretação de elemento/aspeto da proposta importa que o mesmo tenha nesta ainda uma normal, uma razoável correspondência verbal sob pena de se poder por em causa a concorrência e igualdade dos concorrentes.
VII. Tem-se como inadmissíveis esclarecimentos prestados pelos concorrentes que contrariem elementos constantes de documentos das propostas, que alterem ou completem estas nas respetivas caraterísticas/atributos ou que se destinem ou visem suprir omissões da proposta a que faltasse algum dos atributos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e que seriam conducentes à sua exclusão [arts. 70.º, n.ºs 1 e 2 e 72.º, n.º 2 ambos do CCP].
VIII. Não será possível admitir a formulação de pedido de esclarecimento quanto a proposta apresente graves defeitos que a tornem insuscetível de avaliação quanto a um determinado atributo da mesma já que tal se traduziria num esgotar da previsão da al. c) do n.º 2 do art. 70.º do CCP, sendo que o mesmo já não ocorrerá quando se trate de caso de mera dificuldade de leitura do atributo que esteja em causa.
IX. Um pedido de esclarecimento ou um esclarecimento feitos em termos ilegais devem ter-se os mesmos por não escritos, não podendo conduzir à exclusão da proposta com tal fundamento já que aquela carece de ser aferida de “per si” tendo por referência a observância do programa de concurso, do caderno de encargos e das demais regras legais que disciplinem o concreto procedimento concorrencial.
X. Face ao que decorre da al. a) do n.º 2 do art. 70.º do CCP serão excluídas as propostas que “não apresentem algum dos atributos” exigidos já que, mercê de tal falta, as mesmas são insuscetíveis de serem alvo duma avaliação completa à luz do modelo de avaliação definido pelo programa do procedimento, na certeza de que a definição do que seja um atributo importa ser encontrada do cotejo do que se mostra disciplinado nos arts. 56.º, n.º 2, 75.º, n.º 1 e 102.º, n.º 1 do CCP.
XI. Para que resulte preenchida a previsão da al. f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP importa que se mostre demonstrado que a proposta permita detetar qualquer incompatibilidade com o bloco de legalidade em vigor [seja de fonte legal ou regulamentar] a ponto da entidade adjudicante poder formular de imediato um juízo de exclusão da proposta sob pena pactuar com a ilegalidade e infringir os princípios da legalidade e da prossecução do interesse público [cfr. arts. 266.º, n.º 2 da CRP, 03.º e 04.º do CPA].
XII. Os valores dos preços finais insertos na recomendação da «ACT» de 12.04.2012 são valores meramente indicativos, recomendados, não constituindo ou gozando dum qualquer valor impositivo obrigatório e absoluto como valor mínimo que importe ser estritamente observado sob pena de ilegalidade.
XIII. O preço indicado numa proposta por cada concorrente é fruto da análise e ponderação daquilo que é a sua vontade de ganhar o procedimento face à concorrência, considerando o objeto/custos do procedimento concorrencial a que se apresenta e daquilo que é o conhecimento da sua estrutura de custos [varáveis e fixos/impostos legal e contratualmente] e da margem de lucro com que opera/funciona.    

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
“P... - EMPRESA DE SEGURANÇA, SA”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 20.05.2013, que julgou totalmente improcedente a ação administrativa de impugnação urgente [contencioso pré-contratual] que a mesma havia deduzido, nos termos dos arts. 100.º e segs. do CPTA, contra “INSTITUTO PORTUGUÊS DE ONCOLOGIA DO PORTO FRANCISCO GENTIL, EPE” [doravante «IPO…»] e a contrainteressada “S... - SEGURANÇA, SA”, ambas devidamente identificadas nos autos, não declarando a nulidade ou anulando a decisão do CA do ente demandado, datada de 22.08.2012, que no âmbito do procedimento de ajuste direto n.º 5437/2011 determinou a adjudicação do mesmo à proposta apresentada pela referida contrainteressada, nem condenando o R. a praticar o ato de exclusão da proposta daquela contrainteressada, a abster-se de celebrar o contrato com a mesma ou a declarar sua nulidade ou anulá-lo, e a praticar o ato de adjudicação à proposta da A..
Formulou a A., enquanto recorrente, nas respetivas alegações [cfr. fls. 811 e segs. - paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário] as seguintes conclusões que se reproduzem:

A) O douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não considerou provado que o contrainteressado tivesse de remunerar a ANCP «por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP».
B) O alegado no artigo 218.º da petição inicial, no artigo 191.º da contestação da Contrainteressada e a não impugnação do referido artigo da petição inicial na contestação do IPOP determinam que a sentença recorrida deveria ter dado como provado que o contrainteressado tinha de remunerar a ANCP por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP (nos termos e para os efeitos do artigo 490.º, n.º 2, do CPC).
C) A não impugnação pelo Réu e pelo Contrainteressado da genuinidade e validade do documento referido no artigo 218.º da petição inicial determina que a sentença recorrida deveria ter dado como provado que o contrainteressado tinha de remunerar a ANCP por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP.
D) Finalmente, prova adicional sobre o facto alegado apenas poderia ser apresentada pela Contrainteressada, por dizer respeito a um contrato celebrado entre ela e a ANCP, pelo que não pode ser imputado à Autora o ónus de prova do mesmo.
E) Em face do exposto, resulta evidente que o douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto deveria dar como provado que o fornecedor terá de remunerar a ANCP por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP.
Por outro lado, e quanto ao recurso sobre a matéria de direito:
F) A sentença recorrida, ao entender que os documentos eivados de erros, que conjuntamente não podem ser considerados meros lapsos de escrita, apresentados pela contrainteressada consubstanciam a apresentação de uma proposta ao concreto procedimento faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado.
G) A sentença do douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ao entender que a omissão de apresentação de prazo de validade da proposta, apesar de as peças do procedimento o exigirem, não determina a sua exclusão, faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado.
H) A sentença recorrida, ao entender que a omissão da Proposta da S... quanto à forma de execução das funções específicas dos postos de vigilância, informação cuja apresentação era exigida pelas peças do procedimento, não determina a sua exclusão, faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, e 146.º, n.º 2, al. d), aplicável ex vi artigo 122.º, n.º 2, todos do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado.
I) A sentença do douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ao entender que a omissão da Proposta da S... quanto à forma de execução das funções específicas dos postos de vigilância, informação cuja apresentação era exigida pelas peças do procedimento, não determina a sua exclusão, faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, e 146.º, n.º 2, al. d), aplicável ex vi artigo 122.º, n.º 2, todos do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado.
J) A sentença recorrida, ao sustentar que os concorrentes apenas se encontravam obrigados a entregar o Plano de Saúde e Segurança do Trabalho em caso de adjudicação é nula por não especificar os fundamentos que justificam a decisão [artigo 668.º, n.º 1, al. b), do CPC].
K) A sentença recorrida, ao entender que a omissão da Proposta da S... quanto à Política de Segurança e Saúde no Trabalho, política essa cuja apresentação era exigida pelas peças do procedimento, não determina a sua exclusão, faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, e 146.º, n.º 2, al. d), aplicável ex vi artigo 122.º, n.º 2, todos do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado.
L) A sentença do douto Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, ao entender que a não consideração no preço proposto de todos os custos decorrentes do cumprimento das prestações contratuais (e, portanto, a apresentação de um preço abaixo de custo) não determina a exclusão da proposta apresentada, faz errada aplicação do artigo 70.º, n.º 2, als. f) e g) do CCP. A correta interpretação e aplicação do referido preceito impunham a exclusão da proposta apresentada pelo Contrainteressado …”.
Pugna pela revogação daquela decisão judicial e total procedência da ação.
Apenas R./contrainteressada, enquanto recorrida, apresentou contra-alegações [cfr. fls. 875 e segs.], nas quais conclui nos termos seguintes:
...
Do recurso sobre a matéria de facto
a. Cabia à Autora o ónus da prova do facto por si alegado no artigo 218.º da petição inicial (cf. art. 342.º, n.º 1, do Código Civil).
b. Trata-se de facto que só poderia ser provado por documento escrito.
c. Não tendo a Autora feito prova por documento escrito do alegado no artigo 218.º da p.i., não poderia o mesmo considerar-se provado.
d. É inaplicável no processo administrativo a disposição do art. 490.º, n.º 2, do CPC (cf. art. 83.º, n.º 4, do CPTA).
e. Se a Autora pretendia que a contrainteressada fosse notificada para juntar aos presentes autos o acordo-quadro celebrado com a ANCP, poderia tê-lo requerido ao tribunal, ao abrigo do disposto no art. 528.º, n.º 1, do CPC. Não o tendo feito, sibi imputet.
f. O acordo quadro celebrado entre a contrainteressada e a ANCP é de conteúdo idêntico ao acordo quadro celebrado com as restantes adjudicatárias daquele concurso, entre as quais se inclui a aqui Autora. Pelo que a Autora sempre poderia ter junto o seu acordo-quadro, só não o fazendo porque não quis.
g. Seja como for, o alegado pela Autora no artigo 218.º da sua p.i. é irrelevante para a decisão.
h. Termos porque, e sem necessidade de mais considerações, improcedem as conclusões A) a E) das alegações da Recorrente.
Do recurso sobre a matéria de direito
Da alegada violação do artigo 3.º do PP
i. Como resulta de forma evidente da proposta da S..., a referência ao «Ajuste Direto n.º 5473/2011» e a referência a «politécnico» constituem erros manifestos de escrita nos termos do art. 249.º do Código Civil.
j. Quer a nossa doutrina quer os nossos tribunais admitem a possibilidade de retificação (por iniciativa dos concorrentes ou da entidade adjudicante) de erros de escrita ou de cálculo constantes das propostas apresentadas pelos concorrentes nos termos do disposto no art. 249.º do Código Civil (cfr. Rodrigo Esteves de Oliveira «Os Princípios Gerais da Contratação Pública», in «Estudos de Contratação Pública - I», p. 83-84, e Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 24-06-2010, proferido no processo 06338/10, de 12-02-2009, proferido no processo 04057/08, e de 29-04-2010, proferido no processo n.º 05862/10, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 24-05-2007, proferido no processo 02187/05.7BEPRT, e Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 30-09-2009, proferido no processo 0703/09 e de 07-03-2002, proferido no processo n.º 048413).
k. A referência a «empresa» constante da proposta da S... é adequada para designar a entidade adjudicante no presente procedimento porquanto o IPOP é uma entidade pública empresarial (cf. DL 93/2005, de 7 de junho) e as entidades públicas empresariais são empresas públicas (cf. art. 3.º, n.º 2 e capítulo III do DL 558/99, de 17 de dezembro).
l. A proposta da S... tem uma componente económica, que integra a proposta de preço, e uma componente técnica, que integra os restantes documentos da proposta, aos quais a Autora se refere no artigo 45.º das suas alegações de recurso.
m. Conclusão que se retira da análise do respetivo conteúdo e ainda do facto de os documentos que integram a componente técnica da proposta integrarem um único ficheiro em formato «pdf» designado por «componente técnica» (cf. formulário da proposta constante da plataforma eletrónica - fls. 1 do documento n.º 6 junto pela Autora com a sua p.i.).
n. A S... dispõe dos recursos humanos necessários à prestação dos serviços (cfr. proposta, designadamente, a pág. 2 do documento «Estrutura Organizacional», no qual declara que dispõe de 1400 colaboradores).
o. Na sua proposta, a S... obriga-se, de forma clara, inequívoca e completa, a prestar os serviços de segurança e vigência objeto do procedimento em apreço. Quando a S... afirma que «após análise das necessidades do cliente, far-se-á o recrutamento dirigido ao perfil necessário» tal significa apenas que, do conjunto dos recursos humanos de que a S... dispõe, e tendo em conta o perfil de cada trabalhador, será escolhida a pessoa em concreto para cada posto de trabalho.
p. Não tem razão a Autora quando afirma que a douta sentença recorrida «é nula por não se pronunciar sobre questão que deveria apreciar - os documentos apresentados pela contrainteressada não consubstanciam a apresentação de uma proposta ao concreto procedimento - nos termos e para os efeitos do artigo 668.º, n.º 1, do CPC».
q. A douta sentença recorrida pronuncia-se sobre a questão, concretamente nas páginas 24 a 26.
r. Termos porque, e sem necessidade de mais considerações, improcede a conclusão F) das alegações da Recorrente.
Da alegada violação do artigo 3.7. do PP
s. Os concorrentes não tinham que indicar o prazo de validade das suas propostas, porque tal prazo de validade foi fixado pelo PP ao qual os concorrentes estão vinculados.
t. O prazo de validade não constitui um aspeto da execução do contrato.
u. A proposta só pode ser excluída por falta de atributos ou por apresentação de atributos ou de termos e condições em violação do caderno de encargos (cf. art. 70.º, n.º 2, al. a), b) e c) do CCP).
v. Pelo que a falta de indicação na proposta da S... do prazo de validade nunca poderia conduzir à exclusão da mesma porquanto não constitui um atributo nem um termo ou condição.
w. Termos porque, sem necessidade de mais considerações, improcede a conclusão G) das alegações da Recorrente.
Da alegada violação do artigo 3.4. do PP e dos artigos 3.12, 3.13 e 4. do Caderno de Encargos
x. As funções específicas dos postos estão descritas em termos fixos no número 3.12 do C.E., constituindo um verdadeiro termo ou condição.
y. Este termo ou condição não está em falta na proposta da S..., como sustenta a Autora.
z. A S... obrigou-se, na sua proposta, ao cumprimento de todos os termos ou condições exigidos pelo C.E., e, portanto, ao cumprimento da norma do número 3.12 do C.E. (cf. Declaração de Aceitação do Conteúdo do Caderno de Encargos).
aa. Ao responder ao pedido de esclarecimentos efetuado pelo Júri do Concurso, a S... limitou-se a reproduzir a norma do número 3.12 do C.E., a qual já havia declarado na sua proposta que se obrigava a cumprir.
bb. Pelo que é forçoso concluir que os esclarecimentos prestados pela S... não alteraram o conteúdo da sua proposta.
cc. Quanto às placas sinalizadoras e à política de segurança e saúde no trabalho em vigor na empresa, são aspetos da execução do contrato que o C.E. não estabelece em termos fixos, nem por reporte a limites qualitativos ou quantitativos de mínimos ou máximos.
dd. Ou seja, são aspetos que o C.E. não regula, ou, por outras palavras, não faz relativamente aos mesmos quaisquer exigências acerca do concreto modo do seu cumprimento.
ee. Pelo que, ao obrigar-se a cumprir o clausulado do C.E., obrigação plasmada na sua Declaração de Aceitação do Caderno de Encargos, a S... obrigou-se a cumprir o número 3.13 do C.E., ou seja, a colocar placas sinalizadoras com a quantidade, o conteúdo e nos locais que vierem a ser definidos pelo IPOP.
ff. Não é, pois, a proposta da S... omissa quanto a este aspeto.
gg. Não sendo exigível que a mesma contivesse qualquer outro elemento - nomeadamente, o número de placas - porque não solicitado pelo C.E. e porque poderia não corresponder ao pretendido pelo IPOP a quem cabe exclusivamente a decisão futura sobre este aspeto da execução do contrato.
hh. Ao responder ao pedido de esclarecimentos efetuado pelo júri do concurso, a S... limitou-se a reproduzir a norma do número 3.13. do C.E., a qual já havia declarado cumprir na sua proposta.
ii. A disposição do número 4. do C.E. estabelece apenas a obrigatoriedade de a entidade adjudicatária entregar no IPOP um exemplar da política de segurança e saúde no trabalho em vigor na empresa.
jj. Pelo que, ao obrigar-se a cumprir o clausulado do C.E., obrigação plasmada na sua Declaração de Aceitação do Caderno de Encargos, a S... obrigou-se a entregar ao IPOP, caso venha a ser a adjudicatária, a política de segurança e saúde no trabalho em vigor na sua empresa.
kk. Não sendo, pois, a proposta omissa quanto a este aspeto.
ll. Ao entregar, em sede de esclarecimentos, o seu Manual de Gestão da Segurança e Saúde do Trabalho em vigor na sua empresa, a S... não alterou a sua proposta.
mm. O Manual de Gestão da Segurança e Saúde do Trabalho que foi junto com os esclarecimentos prestados já era aquele que a S... aplicava à data da entrega da sua proposta no procedimento em apreço.
nn. Pelo que a sua junção não altera o conteúdo da proposta (cfr., neste sentido, Rodrigo Esteves de Oliveira, «Os Princípios Gerais da Contratação Pública», in Estudos de Contratação Pública - I, p. 80 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 1 de junho de 2011, proferido no processo n.º 07643/11).
oo. Ainda que se considerasse que falta na proposta da S... algum termo ou condição (no que não se concede), sempre a S... poderia vir a explicitar, em sede de esclarecimentos, esse termo ou condição.
pp. Ainda que se entendesse que a proposta da S... não indicou termos ou condições exigidos no C.E. e que os esclarecimentos prestados são ilegais - no que não se concede - a mesma não poderia ser excluída (cf., neste sentido, o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-08-2011, proferido no processo 07691/11).
qq. Termos porque, sem necessidade de mais considerações, improcedem as conclusões H), I) e K) das alegações da Recorrente.
rr. A douta sentença recorrida decidiu que não tinha sido violado o art. 4.º do C.E. explicando que, de acordo com esta norma (que reproduziu), a entrega da política de segurança e saúde no trabalho só é obrigatória em caso de adjudicação do serviço.
ss. Assim, a decisão está fundamentada não se verificando a nulidade apontada pela Autora.
tt. Termos porque, sem necessidade de mais considerações, improcede a conclusão J) das alegações da Recorrente.
Da alegada violação do artigo 3.4. do PP e do artigo 3.8 do Caderno de Encargos
uu. A S... obrigou-se, na sua proposta, ao cumprimento de todos os termos ou condições exigidos pelo C.E., e, portanto, ao cumprimento da norma do número 3.8 do C.E. (cf. Declaração de Aceitação do Conteúdo do Caderno de Encargos).
vv. Ainda que se considerasse que a proposta da S... não continha algum termo ou condição exigido pela norma do número 3.8 do C.E. (no que não se concede), isso não conduziria à exclusão da sua proposta por tal situação não se subsumir à disposição do art. 70.º, n.º 2, al. b), do CCP (cfr., neste sentido, o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12-08-2011, proferido no processo 07691/11).
Da alegada violação das alíneas f) e g), do n.º 2, do art. 70.º, do CCP
ww. O preço constante da Recomendação da Autoridade para as Condições do Trabalho (doravante ACT) não inclui apenas custos cuja obrigatoriedade resulta da lei e cujo valor está fixado na lei.
xx. O preço mínimo recomendado baseia-se em «cálculos» efetuados pela própria ACT relativos ao valor dos custos em que as empresas de segurança incorrem para prestar serviços de vigilância humana.
yy. Se é certo que as empresas, para a prestação de tais serviços, incorrem em custos cujo valor é pré-determinado e imposto por lei [componente A - salários, férias, subsídios de férias e Natal, trabalho noturno, trabalho em feriados, taxa social única e subsídio de alimentação], não menos certo é que incorrem também em custos cujo valor é muito variável e não é imposto por lei [componente B determinada por acordo entre os parceiros sociais - absentismo remunerado, crédito de formação, seguros (acidentes de trabalho e de responsabilidade civil), fardamento e outros materiais de serviço, custos com SST, provisões de férias e subsídios (ano de entrada), recrutamento, formação e estágio, coordenação e controlo operacional].
zz. É patente que estes dois tipos de custos não têm a mesma natureza.
aaa. E é também patente que a ACT não pode nem deve emitir recomendações que extravasem as suas competências e constituam intromissão nos critérios de gestão e na capacidade negocial e organizativa das empresas.
bbb. A lei e os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho estabelecem quais são os encargos obrigatórios (salários, subsídios de férias e Natal, trabalho noturno, trabalho em feriados, taxa social única e subsídio de alimentação) e qual o valor destes (no caso das remunerações mínimas obrigatórias e subsídio de alimentação devidos aos trabalhadores impostas pelas Convenções Coletivas de Trabalho aplicáveis ao setor) ou a sua forma de cálculo (no caso dos subsídios de férias e Natal, trabalho noturno, trabalho em feriados, taxa social única).
ccc. No que concerne aos demais custos considerados na Recomendação da ACT, os mesmos são variáveis, o seu valor não está fixado na lei, e a determinação do montante dos mesmos depende de inúmeros fatores ligados à capacidade de gestão, capacidade comercial e capacidade negocial dos concorrentes.
ddd. Nesta Recomendação vêm, pois, contemplados custos que não são impostos por lei nem por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (ou, pelo menos, cujo respetivo valor não está fixado na lei nem nos instrumentos).
eee. Custos esses que, consequentemente, não se pode considerar que os concorrentes terão efetivamente que suportar.
fff. Mesmo no que concerne aos custos estabelecidos na lei, sempre se dirá que as empresas concorrentes poderão beneficiar de certos incentivos sociais ou de recorrer a certos métodos estabelecidos na lei que podem determinar uma redução dos seus encargos com o pessoal.
ggg. Da Recomendação da Autoridade para as Condições de Trabalho, decorre ainda uma imposição quanto ao modo como as empresas devem imputar os custos suportados com a prestação dos serviços, inculcando a ideia da existência de uma obrigatoriedade de todos os custos identificados serem repercutidos da mesma maneira em todos os contratos.
hhh. O que representa uma ingerência intolerável na liberdade de organização e gestão das empresas.
iii. Sendo certo que a lei não impõe que a imputação de custos seja feita obrigatoriamente pela forma divulgada na Recomendação da Autoridade para as Condições de Trabalho.
jjj. Uma proposta só poderá ser excluída se tiver sido demonstrado que o concorrente não cumpre as obrigações impostas por lei ou por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho [cf. art. 70.º, n.º 2, al. f), do CCP].
kkk. Só se puder concluir que a proposta não cumpre os custos legais, é que poderá ser objeto de exclusão.
lll. No que concerne a custos não impostos por lei, a fixação de valores reveste-se de uma tripla ilegalidade:
i. Porque se traduz na fixação do preço de venda do serviço de segurança privada e, como tal, viola a disposição do artigo 9.º do Regime Jurídico da Concorrência aprovado pela Lei n.º 19/2012, de 8 de maio;
ii. Porque estabelece uma presunção, absolutamente desprovida de fundamento, de que a oferta de preço inferior ao fixado implica a violação da lei, designadamente da legislação laboral, fiscal e da segurança social;
iii. Porque interfere de forma inadmissível na liberdade de iniciativa económica privada, na sua vertente de liberdade de organização, gestão e atividade da empresa, porque inculca a obrigatoriedade de imputação de determinado tipo de custos no preço a propor em cada concurso, restringindo de forma intolerável a liberdade da empresa de organizar a sua contabilidade da forma que melhor lhe aprouver para uma gestão eficaz e, como tal, viola o direito fundamental à iniciativa económica privada previsto no artigo 61.º da Constituição.
mmm. A Autora ataca a proposta da S... porque esta concorrente, devido a uma melhor e eficaz estratégia comercial e de gestão, apresenta, de forma legal e legítima, um preço mais baixo.
nnn. A Autora gera a confusão entre custos que são impostos por lei e custos que não o são e que dependem única e exclusivamente da capacidade negocial das concorrentes.
ooo. Procurando equiparar uns e outros como se fossem a mesma coisa quando na realidade não o são.
ppp. Avançando com um alegado preço mínimo para a prestação dos serviços que, no seu entender, se imporia a todos os concorrentes.
qqq. O qual inclui componentes que não são impostos por lei (ou por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho).
rrr. E que como tal não se impõem aos concorrentes.
sss. Não sendo, afinal, o preço avançado pela Autora vinculativo para ninguém.
ttt. A verdade é que a Autora não alegou nem demonstrou um único facto do qual resulte que da proposta apresentada pela S... possa resultar a violação das suas obrigações legais.
uuu. Não existe a obrigatoriedade de imputar os custos indicados pela Autora (entre os quais a alegada remuneração a pagar à ANCP) da forma por ela pretendida.
vvv. Num Acórdão recente, o Tribunal Central Administrativo Sul entendeu que preço proposto pode simplesmente espelhar a estratégia comercial do proponente sem que com isso haja violação da legislação em vigor.
www. E que, em última análise, o único preço mínimo legalmente estabelecido seria aquele que, nos termos do disposto no art. 71.º, n.º 1 do CCP, levaria a considerar que uma proposta é de preço anormalmente baixo (cf. o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 07-02-2013, processo n.º 09611/13).
xxx. Os preços unitários propostos pela S... situam-se bastante acima do valor a partir do qual um preço é considerado anormalmente baixo para efeitos do presente procedimento, correspondendo em todos os casos (à exceção do PHNd) aos preços unitários base.
yyy. Não existe, pois, fundamento legal para excluir a proposta da S... ao abrigo do disposto no art. 70.º, n.º 2, al. f) e g), do CCP.
zzz. Termos porque, e sem necessidade de mais considerações, improcede a conclusão L) das alegações da Recorrente …”.
A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal notificada nos termos e para efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer/pronúncia quanto ao recurso jurisdicional interposto no sentido da sua improcedência [cfr. fls. 945/947 v.], parecer esse que objeto de contraditório não mereceu qualquer resposta [cfr. fls. 944 e segs.].
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir das questões colocadas pela aqui recorrente sendo certo que se pese embora, por um lado, o objeto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 05.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC/2013 [na redação introduzida pela Lei n.º 41/013, de 26.06 - cfr. arts. 05.º e 07.º, n.º 1 daquele diploma] [anteriores arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do CPC - na redação decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.
E as questões suscitadas pela recorrente de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão judicial recorrida ao julgar totalmente improcedente a pretensão deduzida pela A., nos termos e pelos fundamentos dela constantes, incorreu, por um lado, em nulidade [art. 668.º, n.º 1, al. b) do CPC - atual art. 615.º, n.º 1, al. b) do CPC/2013] e, por outro lado, em erro de julgamento de facto [incorretamente fixada a matéria de facto apurada tendo por referência a alegação não impugnada no art. 218.º da «P.I.» e referido no art. 191.º da contestação da contrainteressada] e de direito por desrespeito, nomeadamente, ao disposto nos arts. 70.º, n.º 2, e 146.º, n.º 2, al. d), aplicável “ex vi” art. 122.º, n.º 2, todos do CCP [cfr. alegações e conclusões supra reproduzidas].
3. FUNDAMENTOS
3.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA
O TAF do Porto em apreciação da pretensão deduzida pela A., aqui recorrente, concluiu no sentido da inverificação das ilegalidades assacadas ao ato de adjudicação em referência [infração ao disposto no art. 03.º do «PC»; no art. 03.7.º do «PC»; no art. 03.4.º conjugado com os arts. 03.8.º, 03.12.º e 03.13.º e 04.1.º todos do mesmo «PC»; no art. 70.º, n.º 2, als. f) e g) do CCP; das regras da concorrência], termos em que improcedeu na totalidade a pretensão deduzida na presente ação.
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3.2. DA TESE DA RECORRENTE
Argumenta a A. que tal decisão judicial, para além de padecer de nulidade, fez errado julgamento de facto [incorretamente fixada a matéria de facto apurada tendo por referência a alegação não impugnada no art. 218.º da «P.I.» e referido no art. 191.º da contestação da contrainteressada] e de direito já que o ato impugnado padece das ilegalidades que lhe haviam sido assacadas pelo que ao assim não haver concluído aquele TAF violou, nomeadamente, o disposto nos arts. 70.º, n.º 2, e 146.º, n.º 2, al. d), aplicável “ex vi” art. 122.º, n.º 2, todos do CCP.
ð
3.3. DO OBJETO DA INSTÂNCIA DE RECURSO
3.3.1. DA NULIDADE DE DECISÃO
Invoca a recorrente no quadro da síntese conclusiva que produziu e com a qual delimitou o objeto de recurso que a decisão judicial ora objeto de impugnação padece de nulidade já que não especificou os fundamentos que justificam a decisão no segmento em que considerou que os concorrentes apenas estavam obrigados a entregar o Plano de Saúde e Segurança do Trabalho em caso de adjudicação [infração ao art. 668.º, n.º 1, al. b) do CPC].
I. Apreciemos sendo que o faremos à luz do regime processual civil vigente à data da emissão da decisão judicial recorrida e da dedução do recurso jurisdicional face ao necessário e devido respeito quanto à validade e eficácia dos atos praticados no quadro da lei antiga e ao assegurar da sua utilidade [cfr. art. 12.º do CC], bem como ao disposto nos arts. 05.º e 07.º, n.º 1 da Lei n.º 41/013.
II. Estipula-se no art. 668.º do CPC, sob a epígrafe de “causas de nulidade da sentença” e na parte que ora releva, que é “… nula a sentença quando: … b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão ...”.
III. As situações de nulidade da decisão encontram-se legalmente tipificadas no art. 668.º, n.º 1 do CPC, cuja enumeração é taxativa, comportando causas de nulidade de dois tipos [de caráter formal - art. 668.º, n.º 1, al. a) CPC - e várias causas respeitantes ao conteúdo da decisão - art. 668.º, n.º 1, als. b) a e) CPC], sendo que a qualificação como nulidade de decisão de ilegalidades integradoras de erro de julgamento não impede o Tribunal “ad quem” de proceder à qualificação jurídica correta e apreciar, nessa base, os fundamentos do recurso.
IV. Caraterizando em que se traduz a nulidade da decisão por infração ao disposto na al. b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC em questão temos que a mesma só ocorre quando do teor da decisão judicial sindicada em sede de recurso não constem com o mínimo de suficiência e de explicitação os fundamentos de facto e de direito que a justificam.
V. A este respeito, a doutrina [J. Alberto dos Reis in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pág. 140; J. Rodrigues Bastos in: “Notas ao Código de Processo Civil”, 3.ª edição, vol. III, pág. 193; Anselmo de Castro in: "Direito Processual Civil Declaratório", Tomo III, pág. 141; Antunes Varela, M. Bezerra e Sampaio e Nora in: "Manual de Processo Civil", 2.ª edição, pág. 687] e a jurisprudência [cfr., entre outros, Acs. STA de 24.10.2000 (Pleno) - Proc. n.º 037128, de 26.03.2003 - Proc. n.º 047441, de 10.09.2009 - Proc. n.º 0940/08, de 14.04.2010 - Proc. n.º 0442/09, de 26.01.2011 - Proc. n.º 0595/10, de 07.11.2012 - Proc. n.º 01109/12, de 09.01.2013 - Proc. n.º 01076/12, de 06.03.2013 - Proc. n.º 0828/12 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Acs. deste TCAN de 24.04.2008 - Proc. n.º 00507/06.6BEBRG, de 08.05.2008 - Proc. n.º 00222/03-Coimbra, de 02.04.2009 - Proc. n.º 01993/08.5BEPRT, de 18.06.2009 - Proc. n.º 01411/08.9BEBRG-A, de 11.03.2010 - Proc. n.º 00228/08.5BEBRG, de 02.03.2012 - Proc. n.º 2459/07.6BEPRT, de 08.02.2013 - Proc. n.º 02104/11.5BEBRG in: «www.dgsi.pt/jtcn»], têm feito notar que não deve confundir-se a eventual sumariedade ou erro da fundamentação de facto e de direito com a sua falta absoluta, pois, só a esta última se reporta a alínea em questão.
VI. Afirmou J. Alberto dos Reis que uma ”… decisão sem fundamentos equivale a uma conclusão sem premissas; é uma peça sem base. (…) As partes precisam de ser elucidadas a respeito dos motivos da decisão. Sobretudo a parte vencida tem o direito de saber por que razão lhe foi desfavorável a sentença; e tem mesmo necessidade de o saber, quando a sentença admita recurso, para poder impugnar fundamento ou fundamentos perante o Tribunal superior. Este carece também de conhecer as razões determinantes da decisão, para as poder apreciar no julgamento do recurso ...” [in: ob. cit., vol. V, pág. 139].
VII. Esta nulidade só existirá, por conseguinte, quando a decisão omita por completo a operação de julgamento da matéria de facto essencial para a apreciação da questão/pretensão analisada e decidida.
VIII. Munidos dos antecedentes considerandos de enquadramento quanto ao conceito de nulidade de decisão judicial e, em particular, da nulidade em questão temos que, no caso, efetivamente o vício/defeito apontado à mesma decisão não configura o preenchimento da previsão em crise já que não nos deparamos em concreto com uma omissão/ausência total do julgamento de facto/direito.
IX. A decisão judicial sindicada não enferma de falta absoluta da consideração do julgamento de facto e de direito quanto ao aludido fundamento porquanto da mesma consta a motivação jurídica em que se estriba o juízo ali firmado, na certeza que o preenchimento deste fundamento de nulidade não se basta com uma insuficiente, obscura ou mesmo errada fundamentação visto que, nestes casos, esse erro, insuficiência ou obscuridade se traduzem num erro de julgamento que determina a sua revogação ou alteração e não num vício que importe a sua nulidade.
X. De harmonia com tudo o atrás exposto, improcede a arguição da nulidade assacada à decisão judicial em crise.
ð
3.3.2. DO ERRO NO JULGAMENTO FACTO
Invoca a A./recorrente, enquanto primeiro fundamento material de recurso, que a decisão judicial sob apreciação terá efetuado errado julgamento de facto ao não haver considerado como provado o que havia sido alegado no art. 2l8.º da petição inicial [«que o contrainteressado tinha de remunerar a ANCP por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP»], factualidade essa que não teria sido impugnada.
XI. Cumpre referir, desde logo, que não se divisa assistir mínima razão à A. quanto ao pretenso erro no julgamento de facto inserto na decisão judicial recorrida enquanto estribado no fundamento motivador daquele erro.
XII. O julgador deve proceder ao julgamento de facto selecionando da alegação feita pelas partes aquela realidade factual concreta tida por provada e necessária à apreciação da pretensão formulada à luz das várias e/ou possíveis soluções jurídicas da causa, não sendo de exigir a fixação ou a consideração de factualidade que se repute ou se afigure despicienda para e na economia do julgamento da causa, na certeza de que aquele juízo deve ser estribado e motivado à luz e com base nas provas produzidas nos autos pelas partes ou que oficiosamente haja sido determinada a sua junção.
XIII. Assim, vistos os autos, a prova documental nos mesmos requerida/produzida [inexistiu no caso qualquer junção aos autos por parte da A. do documento a que faz referência no art. 218.º da petição inicial, nem a mesma solicitou/requereu a notificação dos RR. ou de terceiro para procederem à sua junção] e, bem assim, o «PA» apenso; considerando o posicionamento tido pelos RR. nas suas contestações quanto à alegação da A. em causa do qual não se extrai, ao invés do sustentado pela mesma, de que aquela alegação, por não impugnada, se mostre ou se tenha de se considerar como aceite; e presente que o quadro normativo invocado [art. 490.º, n.º 2 do CPC] se tem como inaplicável ao processo “sub judice” porquanto, no caso, importa atentar ao e no regime específico decorrente do art. 83.º, n.º 4 do CPTA “ex vi” art. 102.º, n.º 1 do CPTA, do qual deriva a ausência do ónus de impugnação especificada no âmbito das ações administrativas especiais, mormente, nas impugnações de contencioso pré-contratual insertas nos arts. 100.º e segs. do mesmo Código; dúvidas não parecem existir de que inexiste o invocado erro de julgamento de facto, improcedendo, sem necessidade de outros considerandos, a argumentação/pretensão da recorrente enquanto inserta neste concreto fundamento de recurso.
XIV. Face ao acabado de decidir no quadro do invocado erro no julgamento de facto e do que, não sendo alvo de impugnação, se mostra fixado na decisão judicial recorrida temos, então, como assente a seguinte MATÉRIA DE FACTO:
I) Em reunião de 30.11.2011, o Conselho de Administração do “Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil, EPE”, deliberou o lançamento do ajuste direto n.º 5437/, ao abrigo do Acordo Quadro n.º AQ-VS-2010 da Agência Nacional de Compras Públicas - ANCP [cfr. ponto 1.3, do programa do procedimento, junto como doc. n.º 02, com a petição inicial].
II) O programa do procedimento do ajuste direto identificado em I) consta do documento n.º 02, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta nomeadamente o seguinte:




III) O caderno de encargos do ajuste direto identificado em I) consta do documento n.º 03, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta nomeadamente o seguinte:











IV) Em 21 de Maio de 2012, o «IPOP» convidou as seguintes empresas, selecionadas no âmbito do Lote 1, a apresentarem uma proposta em conformidade com o programa do procedimento e o caderno de encargos descritos em II) e III): - “S... - Segurança, SA”; - “P... - Companhia de Segurança Unipessoal, Lda.”; - “G... - Vigilância e Prevenção Electrónica, Lda.”; - “2... - Empresa de Segurança, SA”; - “C... Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância, SA”; - “P... - Empresa de Segurança, SA”; - “Se... - Serviços e Tecnologia de Segurança, SA” [cfr. docs. n.ºs 01 e 14 juntos com o requerimento inicial].
V) Previamente à apresentação das propostas foram formulados esclarecimentos ao júri do procedimento, os quais foram objeto de resposta, em 30.05.2012, nos termos constante do documento n.º 04, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
VI) Ao convite referido em IV) responderam as seguintes empresas: -“S... - Segurança, SA”; - “P... - Companhia de Segurança Unipessoal, Lda.”; - “G... - Vigilância e Prevenção Electrónica, Lda.”; - “2... - Empresa de Segurança, SA”; - “C... Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância, SA”; - “P... - Empresa de Segurança, SA”; - “Se... - Serviços e Tecnologia de Segurança, SA” [cfr. docs. n.ºs 05 e 14 juntos com o requerimento inicial].
VII) A proposta da contrainteressada, “S... …” consta do documento n.º 06, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por reproduzido, sendo o mapa de preços o seguinte:


VIII) A proposta da A., “P... …” consta do documento n.º 07, junto com a petição inicial cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
IX) Em 14.06.2012, através da plataforma eletrónica, o júri do procedimento formulou um pedido de esclarecimentos ao concorrente “S... …”, nos termos constantes do documento n.º 08 junto com a petição inicial cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
X) O concorrente “S... …” apresentou resposta ao referido pedido de esclarecimentos nos termos constantes do documento n.º 09, junto com a petição inicial cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
XI) Em 19.06.2012, o júri do procedimento elaborou o relatório preliminar de avaliação das propostas nos termos constantes do documento n.º 10, junto com a petição inicial cujo teor aqui se dá por reproduzido, no qual: consta o seguinte: tendo em conta que os preços indicados nas propostas apresentadas pela “P... - Companhia de Segurança Unipessoal, Lda.”, “G... - Vigilância e Prevenção Electrónica, Lda.”, “2... - Empresa de Segurança, SA”, “C... - Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância, SA”, e “Se... - Serviços e Tecnologia de Segurança, SA”, ultrapassavam o preço base definido no programa de procedimento, foram os referidos concorrentes excluídos; - admitiu os concorrentes “S... …” e “P... …”, dado que os preços base apresentados não ultrapassam os valores indicados no programa de procedimento; - classificou em primeiro lugar o concorrente “S... …” e em segundo lugar a “P... …”; - propôs a adjudicação ao concorrente “S... …” e determinou a notificação dos concorrentes para procederem ao exercício do seu direito de audiência prévia sobre a ordenação das propostas.
XII) Nessa sequência, a “P... …” apresentou pronúncia, nos termos constantes do documento n.º 11, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual começou por requerer ao júri que permitisse o acesso às propostas apresentadas por todos os concorrentes e, consequentemente, a realização de uma nova audiência prévia e, em qualquer caso, concluindo, a final, no sentido da exclusão da “S... …”, nos termos das alíneas l) e g) do n.º 2 do art. 70.º, do CCP.
XIII) Em 05.07.2012, o júri do procedimento elaborou o segundo relatório preliminar de avaliação das propostas nos termos constantes do documento n.º 12, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual analisou a pronúncia da ora A., tendo permitido o acesso a todas as propostas apresentadas e concedido novo prazo aos concorrentes para exercerem o direito de audiência prévia.
XIV) Nessa sequência a “P... …” apresentou pronúncia, nos termos constantes do documento junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual concluiu no sentido da exclusão da “S... …”, nos termos das als. l) e g) do n.º 2 do art. 70.º, do CCP.
XV) Em 07.08.2012, o júri do procedimento elaborou o relatório final de avaliação das propostas nos termos constantes do documento n.º 14, junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual propôs a adjudicação da prestação de serviços ao primeiro classificado - “S..., Segurança, SA”.
XVI) Em 22.08.2012, o Conselho de Administração do «IPOP» deliberou autorizar a adjudicação à “S..., Segurança, SA”, bem como a respetiva despesa, por um período de dois anos [cfr. processo instrutor].
XVII) Em 12.04.2012, a Autoridade para as Condições do Trabalho emitiu a seguinte recomendação:

XVIII) Dá-se aqui por integralmente reproduzido o documento n.º 18, junto com a «P.I.» [fls. 453 e ss. dos autos].
XIX) Dá-se aqui por integralmente reproduzido o processo administrativo apresentado pela entidade demandada, em suporte informático e junto à providência cautelar sob o n.º 2275/12.3BEPRT.
ð
3.3.3. DO ERRO NO JULGAMENTO DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise das demais questões suscitadas e aferir da procedência ou improcedência da argumentação desenvolvida pela recorrente em sede do recurso jurisdicional “sub judice” que se nos mostra dirigido.
XV. Sustenta a A./recorrente nesta sede que a decisão judicial recorrida terá incorrido em erro julgamento porquanto se mostra lavrada com infração, nomeadamente, do que se disciplina nos arts. 70.º, n.º 2, 146.º, n.º 2, al. d) aplicável por força do disposto no art. 122.º, n.º 2 todos do CCP, já que o ato adjudicatório se mostra proferido em infração “artigo 3 do Programa … uma vez que a proposta da S... não responde ao convite do IPOP”, do “artigo 3.7 do Programa … na medida em que a S... não apresentou o prazo de validade da proposta”, dos “artigos 3.4 do Programa … e 3.12, do Caderno de Encargos, uma vez que a proposta da S... não apresenta as funções específicas dos postos de vigilância”, dos “artigos 3.4 do Programa … e 3.13, do Caderno de Encargos, uma vez que a proposta da S... não apresenta a quantidade de placas sinalizadoras”, dos “artigos 3.4 do Programa … e 4.1 e seguintes, do Caderno de Encargos, uma vez que a proposta da S... não apresenta a política de segurança e saúde no trabalho”, dos “artigos 3.4 do Programa … e 3.8, do Caderno de Encargos, uma vez que a proposta da S... não apresenta resposta às exigências em matéria de fardamento”, das “als. f) e g), do n.º 2, do artigo 70.º, do CCP, na medida em que a aceitação do preço proposto pela S... implicaria a violação de vinculações legais e regulamentares aplicáveis e evidencia a existência de fortes indícios de práticas suscetíveis de falsear as regras de concorrência …”.
Analisemos.
XVI. Insurge-se a recorrente quanto ao juízo de improcedência firmado na decisão judicial recorrida quanto ao fundamento de ilegalidade que se prendia com o facto da R./contrainteressada não haver apresentado proposta que tivesse respondido ao convite do “IPOP” já que face à sua estrutura e aos termos/expressões que emprega não se está nem em presença de meros lapsos de escrita nem de proposta para o procedimento em questão.
XVII. Considerou-se para o efeito no segmento da decisão judicial sob apreciação que efetivamente “… oferece razão à A. na apontada discrepância entre a identificação do procedimento de ajuste direto, constando da Declaração de Aceitação do Conteúdo do Caderno de Encargos e da proposta de preço a referência a ajuste direto n.º 5473/2011, ao invés de ajuste direto n.º 5437/2011 como devia. (…) Todavia, tal erro não legitima a consequência que dele se retira. Trata-se de um mero erro de escrita, isto é, escreveu-se coisa diversa do que se queria escrever, revelado no contexto de toda a demais documentação que compõe a proposta da «S...» e que não deixa qualquer dúvida quanto ao concreto procedimento de ajuste direto a que destina a sua proposta. Isto é, trata-se de um simples erro de escrita (v. art. 249.º do CC) na identificação do procedimento pré-contratual, que determina tão só a sua correção, não configurando erro que permita concluir que não foi dada resposta ao convite formulado pelo IPOP. (…) Também o facto do concorrente se referir eventualmente a «empresa» e não expressamente ao IPOP não representa irregularidade que aponte para o incumprimento de norma do PP, nomeadamente o seu art. 3.º como defende a A., não deixando margem para dúvidas que a «S...» apresentou proposta para a prestação de serviços certa, cujo procedimento prévio à adjudicação foi levado a cabo pelo IPOP. (…) E quanto à referência na «Memória Descritiva» da proposta da «S...» a que «Após análise das necessidades do cliente, far-se-á o recrutamento dirigido ao perfil necessário», importa que se faça uma análise de conjunto de todos os elementos apresentados a concurso antes de retirar qualquer conclusão sobre a capacidade de dar resposta à solicitação feita pelo IPOP, sendo precipitado concluir como conclui a A., isto é, que a «S...» não possui o pessoal necessário à realização do serviço. (…) Na verdade, bastará uma leitura atenta e conjugada dos elementos que integram a proposta e das peças do procedimento para que a afirmação feita careça de qualquer sentido. Isto porque a proposta de preço apresentada pela «S...» dá resposta às exigências do PP - cfr. fls. 82 e 121 e ss dos autos -, resultando da estrutura organizacional da «S...» - cfr. fls. 123 e ss dos autos - que a empresa dispõe de 1.400 colaboradores e de um conjunto de soluções que lhe permite adaptar os seus serviços às necessidades de segurança, de pessoas e bens, de cada situação em concreto. (…) Tal como defende a contrainteressada, parece-nos que a afirmação de que «Após análise das necessidades do cliente, far-se-á o recrutamento dirigido ao perfil necessário» apenas quer significar que, do conjunto de recursos humanos de que dispõe a empresa, serão escolhidos os elementos em concreto para dar resposta ao pretendido, caso venha a ser o adjudicatário, sendo certo que, tal possibilidade não viola qualquer regra estabelecida no PP ou no CE …”.
XVIII. Presente este juízo e vista a factualidade apurada não se afigura procedente a argumentação expendida pela recorrente como motivação da sua discordância quanto ao julgado sob apreciação, já que, desde logo, nos parece inequívoco que a existência de alguns lapsos de escrita no conteúdo da proposta da R./contrainteressada não a afetam a ponto de se poder concluir, como pretende a A., que não foi apresentada uma proposta ao procedimento por parte daquela R. e que, assim, haja sido infringido o art. 03.º do «PC».
XIX. Note-se que, tal como já foi decidido quer pelo STA nos seus acórdãos de 09.04.2003, de 16.06.2005 e de 20.06.2013 [respetivamente Procs. n.ºs 048396, 01204/03 e 0467/13 in: «www.dgsi.pt/jsta»], quer por este TCA, mormente no seu acórdão de 14.06.2007 [Proc. n.º 01657/05.1BEPRT in: «www.dgsi.pt/jtcn»], se tem como admissível que a entidade adjudicante proceda à correção ou consideração oficiosa de propostas de concorrentes admitindo a sanação de correções de pormenor ou a retificação de erros manifestos, de cálculo, de escrita ou outros constantes da proposta, nos termos do art. 249.º do CC, sem exigir para o efeito, quer o consentimento prévio, quer o assentimento posterior por parte dos respetivos concorrentes [na doutrina ver, entre outros, R. Esteves de Oliveira em “Os princípios gerais da contratação pública” in: “Estudos da Contratação Pública”, tomo I, pág. 83; pronunciando-se sobre a relevância do erro de facto na formação da vontade subjacente a uma proposta ver Paulo Otero em “Intangibilidade das Propostas em concurso Público”, in: “O Direito”, Ano 131º, I/II, pág. 91 e segs.].
XX. Concluiu-se, aliás, em termos de sumário no acórdão do STA de 20.06.2013 supra citado que se “… a proposta tem um «lapsus calami» ostensivo e se é absolutamente seguro o que, na vez do que aí se escreveu, se pretendera escrever, deve o júri aceitar a retificação da proposta à luz do princípio geral de direito acolhido no art. 249.º do Código Civil, abstendo-se de propor a exclusão dela. (…) Uma tal retificação limita-se a, suprimindo a anomalia derivada do erro, restituir a proposta à sua verdade original, pelo que não fere os princípios da estabilidade das propostas ou da concorrência …”, extraindo-se, ainda, da sua linha argumentativa que se trata “… de um erro ou lapso notório e evidente, pois a referida expressão, aposta a propósito de uma especificação técnica a que a proponente deveria aderir - sob pena de negar, «ipso facto», essa sua qualidade - carece de um qualquer significado declarativo. (…) Isto mostra que a menção … se apresentava como um erro de escrita revelado no próprio contexto da declaração e, inclusivamente, através das circunstâncias em que ela foi feita. Portanto, o mencionado «lapsus calami» era perfeitamente integrável na previsão do art. 249.º do Código Civil. (…) Ora, esta norma acolhe e exprime um princípio geral de direito, aplicável a todos os erros de cálculo ou de escrita juridicamente relevantes, o qual permite a retificação desses lapsos desde que sejam ostensivos, ou seja, conhecidos do declaratário - o que, aliás, surge na linha da solução prevista no art. 236.º, n.º 2, do Código Civil. (…) o júri conhecia, ou devia conhecer dadas as circunstâncias do caso, aquela vontade real (…); e, perante este estado de coisas, o júri não podia obstar a que a proponente exercesse o «direito à retificação» previsto no art. 249.º do Código Civil. Assim, e à luz deste preceito de aplicação universal, que incorpora uma regra de bom senso, o júri do concurso, perante aquele ostensivo erro de escrita, localizado na proposta da recorrente … devia ter admitido a respetiva correção, abstendo-se de propor a exclusão depois acolhida pelo ato. E este «modus faciendi» não era recusado pelas regras e princípios por que se regem os concursos do género. É que a singela retificação de um erro evidente - sabendo-se o que devia estar na vez da declaração errada - não contende com a estabilidade das propostas, nem afeta a concorrência, nem absurdamente envolve a dedução de uma qualquer proposta variante. Com efeito, corrigir um lapso é colocar «in situ» o que se sabe que lá estaria «ab initio», não fora o erro cometido. E, desde que o processo retificador se faça com plena segurança, o seu resultado nenhuma inovação traz - a não ser no que toca à supressão da anomalia; pois, e no fim de contas, limita-se a restituir o escrito, v.g., a proposta, à sua verdade original …”.
XXI. No caso vertente se é certo que a proposta da R./contrainteressada continha alguns erros/lapsos de escrita ou “incorreções” terminológicas [referências a ajuste direto n.º 5473/2011 ao invés de ajuste direto n.º 5437/2011; a utilização da expressão «politécnico» e «empresa» querendo reportar-se ao R. «IPOP» enquanto entidade adjudicante] temos que, ainda assim, não se descortina que os mesmos ponham em causa a proposta a ponto de se poder concluir, como pretende a A., que no caso não estaríamos perante proposta apresentada pela referida R. para este procedimento concorrencial.
XXII. É que lida na sua integralidade toda a proposta em questão, com todos os seus documentos e declarações; presente todo o contexto espácio-temporal e procedimental em que a mesma foi dirigida, produzida e se inseriu/insere; dúvidas não nos parecem poder existir quanto a estarmos em presença duma efetiva proposta dirigida ao procedimento concorrencial aberto pelo R. “IPOP” por parte da R./contrainteressada e isso não obstante todos os erros/lapsos/incorreções nela insertos, que melhor seria não existirem, mas que, ainda, assim, não contendem com a sua adequada leitura, inteligibilidade e perceção e que não põem minimamente em causa a manifestação duma vontade expressa de concorrer daquela R. e de o fazer para aquele concreto procedimento.
XXIII. Todos os erros/lapsos/incorreções de escrita havidos são notórios e evidentes, que se revelam no e do próprio contexto da proposta/declaração e, inclusivamente, através das circunstâncias espácio-temporais e procedimentais em que ela foi feita/produzida, integrando-se perfeitamente na previsão do art. 249.º do CC.
XXIV. Tal dispositivo acolhe e exprime, como vimos, um princípio geral de direito e mostra-se aplicável a todos os erros de escrita juridicamente relevantes, permitindo a retificação mesmo oficiosa pelo júri/entidade adjudicante desses lapsos desde que sejam ostensivos, ou seja, conhecidos do declaratário.
XXV. Perante o quadro factual em presença temos para nós que a situação jurídica em discussão integra-se no referido quadro normativo, na certeza de que lida também na globalidade a proposta e todos os documentos/declarações dela integrantes não se vislumbra que aquela concorrente, aqui recorrida, não haja apresentado proposta contendo ambas as componentes previstas no programa do procedimento [técnica e económica], não sendo pelo facto de na proposta da concorrente não constar uma arrumação formal e terminológica com apelo à exata e estrita terminologia empregue no programa que se possa automaticamente concluir pelo incumprimento do ponto 03.º do programa, mormente, do seu n.º 4, já que duma adequada e atenta leitura da proposta, seus documentos/declarações anexos [de referir que o nome aposto/dado ao documento digital apresentado é “componente_tecnica”], que se impõe ser feita pelo júri/entidade adjudicante na análise e avaliação das propostas, tal cumprimento revela-se ter manifestamente ocorrido.
XXVI. De referir ainda que, igualmente, não se afigura acertada a “leitura”/”interpretação” expendida pela recorrente a propósito do extrato inserto no documento da proposta da R./contrainteressada em ponto denominado “plano de segurança” [não “memória descritiva” como é referido pela recorrente - “5. Após análise das necessidades do cliente far-se-á o recrutamento dirigido ao perfil necessário”] já que tal afirmação, desde logo, não poderá ser lida e vista de forma desgarrada e descontextualizada, impondo-se a sua interpretação no quadro global e integral da proposta e do que em tudo mais nela se afirma/declara, incluindo até no próprio documento em questão quando, mormente, logo no seu início e no capítulo sob o título de “estrutura organizacional” se refere que a “… S... - SEGURANÇA, com 1.400 colaboradores, dispõe de um conjunto de soluções que lhe permite adaptar os seus serviços às necessidades de segurança, de pessoas e bens, de cada situação em concreto …”.
XXVII. É que a frase invocada pela recorrente de per si já não teria que ter o sentido que necessariamente aquela lhe atribuiu, ou seja, de que a empresa concorrente não teria ou disporia ainda de efetivos, de pessoal, exigidos para prestar o serviço objeto do procedimento em questão, porquanto poderia querer significar que aquela concorrente iria, após análise das necessidades da entidade adjudicante e dentro do seu pessoal/efetivo, proceder em concreto à seleção daquele que melhor assegurasse ou desempenhasse o serviço tendo em consideração as especificas e particulares exigências feitas por aquela entidade.
XXVIII. Mas para além disso a leitura feita pela recorrente revela-se, como vimos pelo simples e pequeno extrato acima reproduzido, descontextualizada e desgarrada, não tendo a mínima consistência nas conclusões e implicações que extrai.
XXIX. Nessa medida, presente a proposta apresentada pela R./contrainteressada e uma vez lida/interpretada a mesma devida e adequadamente, tal como aliás foi feito pelo júri e pela entidade adjudicante se necessário suprindo oficiosamente erros/lapsos/incorreções existentes, não se afigura poder legitimamente concluir, ao invés do sustentado pela A./recorrente, que a R./contrainteressada não haja apresentado efetivamente uma proposta no quadro do procedimento concorrencial em questão e que com a mesma não haja cumprido aquilo que eram as exigências definidas pelo concreto programa do procedimento nos estritos termos que foram definidos pelo R./“IPOP” enquanto entidade adjudicante, termos em que inexistia qualquer fundamento para a exclusão da proposta, não ocorrendo nesse contexto, também, qualquer erro de julgamento por parte da decisão judicial sindicada por alegada infração ao disposto nos arts. 70.º do CCP e 03.º [mormente, seu n.º 4] do Programa do Procedimento, sendo que certo que uma alegada nulidade por omissão de pronúncia da mesma decisão neste segmento nem sequer foi levada ao quadro conclusivo das alegações de recurso, assim, limitando o poder de conhecimento deste Tribunal nesta sede, na certeza de que se trata de questão, diga-se, que sempre improcederia dada a inexistência de tal vício.
XXX. Sustenta, por outro lado, a recorrente que ocorreu erro de julgamento dada a infração do disposto no art. 3.7 do Programa em conjugação com os arts. 70.º, n.º 2 e 146.º, n.º 2 do CCP já que a proposta da concorrente aqui também recorrida não continha prazo de validade da proposta, o que deveria ter conduzido à exclusão da proposta.
XXXI. Considerou-se naquilo que constitui a essência do juízo firmado pela decisão judicial recorrida na análise deste fundamento de ilegalidade que “… no caso presente, ainda que a proposta da contrainteressada não contenha expressamente qual o prazo de validade (que sempre seria superior a 90 dias, dada a imposição fixada no PP), o que é certo é que tal elemento em falta não configura um atributo da proposta que determine uma única decisão possível por parte da entidade adjudicante, isto é, a exclusão da proposta. Na verdade, o prazo de validade da proposta reporta-se ao período em que o proponente é obrigado a manter os termos da sua proposta, findo o qual, ficará liberto das obrigações nela assumidas, tratando-se de elemento que não se reporta a nenhum aspeto da execução do contrato, sendo certo que, por isso, a proposta apresentada pela “S...” não derroga quaisquer parâmetros base fixados no caderno de encargos nem sequer apresenta quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência, pelo que, não se afigura desacertada a decisão da entidade adjudicante de não excluir a proposta da “S...”, como quer a A.. Acresce que, a par do princípio da concorrência expresso no artigo 1.º, n.º 4, do CCP como princípio da contratação pública, importa atender a um outro princípio igualmente relevante - o princípio da proporcionalidade - que tem especial incidência na definição do universo de concorrentes admitidos a participar no procedimento bem assim como na condução do procedimento, exigindo que as decisões das entidades adjudicantes, nomeadamente, perante irregularidades detetadas, não ponham em causa a valia da proposta no seu todo, o que sucederia em caso de decisão de exclusão, decisão que apenas deverá ser tomada perante irregularidade insuscetíveis de correção, o que não parece ocorrer em caso de omissão da menção do prazo de validade da proposta …”.
XXXII. Refira-se, desde já, que não se mostra desacertado este juízo, não sendo minimamente procedente a argumentação desenvolvida a este propósito pela recorrente.
XXXIII. Motivando nosso entendimento importa convocar o quadro normativo pertinente para a apreciação da questão em discussão, sendo que se extrai, desde logo, do art. 56.º do CCP que a “… proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo …” (n.º 1) e que para “… efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou caraterística da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos …” (n.º 2).
XXXIV. Resulta do n.º 1 do art. 57.º do mesmo Código que a “… proposta é constituída pelos seguintes documentos: a) Declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do anexo I ao presente Código, do qual faz parte integrante; b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar; c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule; d) Documentos que contenham os esclarecimentos justificativos da apresentação de um preço anormalmente baixo, quando esse preço resulte, direta ou indiretamente, das peças do procedimento …”.
XXXV. Prevê-se no art. 65.º, sob a epígrafe de “prazo da obrigação de manutenção das propostas”, que sem “… prejuízo da possibilidade de fixação de um prazo superior no programa do procedimento ou no convite, os concorrentes são obrigados a manter as respetivas propostas pelo prazo de 66 dias contados da data do termo do prazo fixado para a apresentação das propostas …”.
XXXVI. Deriva, por seu turno, do art. 70.º do CCP, sob a epígrafe de “análise da proposta” e no que para os autos importa, que as “… propostas são analisadas em todos os seus atributos, representados pelos fatores e subfactores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições …” (n.º 1) e que são “… excluídas as propostas cuja análise revele: a) Que não apresentam algum dos atributos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 57.º; b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49.º; c) A impossibilidade de avaliação das mesmas em virtude da forma de apresentação de algum dos respetivos atributos; d) Que o preço contratual seria superior ao preço base; e) Um preço total anormalmente baixo, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados ou não tenham sido considerados nos termos do disposto no artigo seguinte; f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis; g) A existência de fortes indícios de atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras de concorrência …” (n.º 2).
XXXVII. Em sede do mesmo diploma deriva, por último, do seu art. 146.º que após “… a análise das propostas, a utilização de um leilão eletrónico e a aplicação do critério de adjudicação constante do programa do concurso, o júri elabora fundamentadamente um relatório preliminar, no qual deve propor a ordenação das mesmas …” (n.º 1), sendo que no “… relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: … d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 57.º …” (n.º 2).
XXXVIII. Cotejado o quadro normativo antecedente e presente a definição de “proposta” decorrente do n.º 1 do art. 56.º do CCP sustentam M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira que a mesma “… não se trata de uma declaração unitária, mas de um complexo de declarações heterogéneas respondendo às diversas solicitações ou exigências postas pela lei ou pela entidade adjudicante quanto aos aspetos e questões considerados procedimentalmente relevantes para aferir das vantagens que cada proposta lhe trará …”, pelo que a mesma corresponde a “… um processo documental em que, além da manifestação da pretensão («modelada») de celebrar o contrato objeto do procedimento e da aceitação do conteúdo do caderno de encargos, o concorrente há-de incluir, basicamente, os documentos - qualquer que seja a forma … - nos quais exprime os atributos e caraterísticas das prestações que se propõe realizar e(ou) receber …” [in: “Concursos e outros Procedimentos de Contratação Pública”, 2011, pág. 570].
XXXIX. E Paulo Otero afirma que “… as propostas apresentadas por particulares a concurso público têm o valor jurídico de verdadeiras propostas, apesar de dotadas de estatuto sui generis, encerrando, por consequência, uma declaração negocial de um concorrente privado em relação à Administração Pública. (…) …” [cfr. em loc. e ob. cit., pág. 92].
XL. O legislador vem fixando um prazo limitado de validade ou de obrigação de manutenção das propostas de molde a que os concorrentes não fiquem “eternamente” presos a um procedimento e a uma proposta que foi elaborada num determinado contexto circunstancial, extraindo-se do art. 65.º do CCP a regra geral nesta matéria.
XLI. Note-se esse prazo deve constar do programa do procedimento ou do convite para a apresentação de propostas mas só prevalece sobre o prazo legalmente previsto no citado normativo se a entidade adjudicante entender fixar dum prazo de validade em tempo superior aquele prazo supletivo, na certeza de que caso contrário valerá este prazo.
XLII. Ora na situação vertente para além da jurisprudência convocada [Ac. TCA Sul de 17.03.2011 - Proc. n.º 07196/11] não se revelar pertinente para o seu julgamento porquanto, no caso, não temos uma proposta apresentada que haja infringido o prazo fixado no programa do procedimento, situação que foi julgada no citado acórdão, ocorre que também a argumentação enunciada pela A. não será de atender.
XLIII. Na verdade, da ausência de expressa referência na proposta da concorrente aqui recorrida da menção de que a validade da sua proposta era superior 90 dias tal como definido no art. 3.7 do Programa não se pode concluir, como faz a recorrente, que a respetiva proposta não aceitasse ou quisesse contrariar tal normativo contratual, ou que a mesma proposta tivesse um prazo de validade inferior, mormente, o prazo supletivo previsto no referido art. 65.º do CCP.
XLIV. Neste contexto, não se estando perante uma omissão quanto a um atributo da proposta que determine uma única decisão possível por parte da entidade adjudicante que é a exclusão da proposta, nem se podendo concluir que a proposta, omitindo a referência expressa nos seus termos à observância do prazo de validade definido em termos contratuais, seja por isso logo e automaticamente contrária ao programa do procedimento ou ao definido no caderno de encargos, não se vislumbra onde ocorra o assacado erro de julgamento, na certeza ainda que uma tal ausência expressa do conteúdo da proposta mais não poderá significar que a inteira e plena aceitação daquilo que são as regras procedimentais definidas na matéria, quando é certo que quer o regime normativo procedimental quer o regime normativo legal nesta matéria se afirmam como comandos que se impõe aos concorrentes e que os mesmos necessariamente têm de aceitar como pressuposto/condição basilar para acederem e permanecerem no procedimento.
XLV. Improcede, pois, também este fundamento recursivo, dispensando-nos, por desnecessários, outros considerandos dada a inexistência no caso de qualquer infração do que se dispõe nos arts. 65.º, 70.º, n.º 2 e 146.º, n.º 2 do CCP e 3.7 do Programa.
XLVI. Argumenta ainda a A. que a decisão judicial recorrida incorreu em erro de julgamento, com infração ao que se mostra previsto nos arts. 70.º, n.º 2, 72.º, 146.º, n.º 2 do CPTA, 3.4 do Programa do Procedimento, 3.8, 3.12, 3.13, 4.1 e segs. do Caderno de Encargos, já que a proposta da R./contrainteressada deveria ter sido excluída visto não conter as funções específicas dos postos de vigilância, a quantidade de placas sinalizadoras, a política de segurança e saúde no trabalho e as exigências em matéria de fardamento.
XLVII. A decisão judicial sindicada desatendeu tais fundamentos de ilegalidade sustentando, para o efeito, que a proposta “… é omissa quanto a estes aspetos e só em resposta ao pedido de esclarecimento indicou especificamente as funções e competências dos profissionais de vigilância. O mesmo se passou com as funções específicas dos postos bem assim como relativamente à quantidade de placas sinalizadoras e à política de segurança e saúde no trabalho em vigor na empresa. (…) Na verdade, em 14/6/2012 o júri do concurso, formulou um pedido de esclarecimentos nos seguintes termos: «Analisada a proposta admitida ao concurso mencionado em epígrafe pelo concorrente S... Segurança, SA, vimos por este meio solicitar o seguinte conjunto de esclarecimentos relativos à componente técnica: 1. Forma de execução das funções específicas dos postos de vigilância, conforme previsto no ponto 3.12 do caderno de encargos. 2. Quantidade de placas sinalizadoras, conforme previsto no ponto 3.13 do caderno de encargos. 3. Política de segurança e saúde no trabalho conforme previsto no ponto 4.1 e seguintes do caderno de encargos». (…) Em resposta, a «S...» apresentou resposta a esse pedido de esclarecimentos (cfr. doc. 9 junto com a p.i.). (…) A questão está em saber se à luz do quadro jurídico aplicável tal pedido de esclarecimentos era permitido …” e após convocar o disposto nos arts. 70.º, n.º 2 e 72.º do CCP refere que “… resulta destes preceitos é que a proposta deve ser sempre a mesma, ou seja, deve manter-se inalterada, apesar dos esclarecimentos. A proposta inicial deve manter-se tal como foi apresentada a concurso, devendo os esclarecimentos ser limitados a tornar claro o que já se incluía, embora de forma ambígua, na proposta inicial. O esclarecimento que se traduza na reformulação ou complementação da proposta é ilícito. (…) Ora, no caso presente, no que tange às funções específicas dos postos bem assim como quanto às placas sinalizadoras, a resposta da «S...» limitou-se a reproduzir o que consta do ponto 3.12 do CE, pelo que não ocorreu aqui qualquer inovação que leve a concluir que a proposta foi alterada ou indevidamente complementada. (…) No que concerne à política de segurança e saúde no trabalho em vigor na empresa, a «S...», em sede de esclarecimentos entregou o seu manual de gestão de segurança e saúde no trabalho da empresa, sendo certo que, de acordo com o art. 4.º do CE («A entidade adjudicatária deverá entregar no IPO PORTO, um exemplar da política de segurança e saúde no trabalho em vigor na empresa, bem como o respetivo código de ética, no caso de ele existir») a referida entrega só se torna obrigatória em caso de adjudicação do serviço. (…) Por essa razão, tal elemento não se encontrava em falta na proposta apresentada pela «S...», pelo que, não se pode concluir como faz a A., no sentido de ter ocorrido uma completude inaceitável à luz do art. 72.º do CCP da proposta formulada pela contrainteressada. (…) O art. 3.8 da CE estabelece que «O fardamento a utilizar pelos graduados e vigilantes a exercer funções nas instalações do IPO-Porto, deve ser uniforme, e deve corresponder a uma imagem que dignifique o IPO-Porto e a entidade adjudicatária». (…) Estabelece ainda o referido art. que «A entidade adjudicatária deverá apresentar documento comprovativo da aprovação do fardamento por parte do Ministério da Administração Interna. Regras de utilização do fardamento - Geral: a) A farda atribuída aos graduados e vigilantes é de uso obrigatório sempre que o mesmo se encontre nas instalações do IPO-Porto no exercício das suas funções, e deverá apresentar-se cuidadosamente tratada a fim de que a imagem transmitida a todos os utilizadores das instalações do IPO-Porto, esteja em conformidade com a dignidade da função; b) A farda, deverá manter sempre bem visíveis os distintivos que identifiquem o vigilante e a entidade adjudicatária; c) O graduado e vigilante deverão apresentar-se cuidadosamente asseado e uniformizado (cabelo curto e tratado, barba feita, camisa e gravata limpa, no caso de vigilante do sexo masculino, cabelo preso, unhas devidamente aparadas e pintadas à cor natural, no caso de vigilante do sexo feminino, farda escovada sem nódoas e apertada, sapatos ou botas sempre de cor preta engraxadas e cartão de identificação para ambos); Regras de utilização do fardamento - Camisas: a) No outono/inverno os vigilantes deverão utilizar camisa de manga comprida. As mangas deverão estar sempre descidas e abotoadas, assim como o botão do colarinho devidamente apertado; b) Na primavera/verão os vigilantes deverão utilizar camisa de manga curta com o botão do colarinho devidamente apertado; c) Em ambos os casos, não é dispensável o uso da gravata. Regras de utilização do fardamento - Gravata. O uso da gravata é obrigatório e o nó deverá estar sempre bem ajustado ao colarinho da camisa, a qual deverá estar sempre em perfeitas condições de higiene, com o botão sempre apertado. Regras de utilização do fardamento - Calças. Sem qualquer especificação, deverão ter em consideração o comprimento das calças para o calçado. Regras de utilização do fardamento - Saia. Sem qualquer especificação própria, a altura deverá ser regulada pelo joelho. Regras de utilização do fardamento - Cinto. Deverá estar colocado para que a fivela, ou logótipo no caso de existir, fique centrado com os botões da camisa. Regras de utilização do fardamento - Polluver/Camisola: a) O Polluver deverá ser usado sempre com camisa de manga comprida; b) A camisola deverá ser usada sempre que as condições climatéricas o exijam. Regras de utilização do fardamento - Blusão/Impermeável: a) Peças de vestuário usadas sempre que as condições climatéricas o exijam; b) O blusão deverá estar sempre apertado mais ou menos até 2/3 da altura do peito; c) O impermeável deverá apresentar-se sempre fechado. Regras de utilização do fardamento - Casaco de Senhora. Exclusivo dos vigilantes do sexo feminino, constitui alternativa ao blusão. Deverá ser usado sempre apertado. Regras de utilização do fardamento - Boina. Dada a imagem institucional pretendida por parte do IPO-Porto, não são admitidos fardamentos que utilizem boina tipo fardamento militar. Regras de utilização do fardamento - Calçado: a) Os sapatos e as meias deverão merecer um cuidado especial. O brilho dos sapatos significa brio profissional do seu utilizador. Só é autorizada a utilização de meias de cor preta, cinzenta e azul-escuro; b) Os sapatos deverão ser fechados, de cor preta, sem atacadores; c) Não são admitidas botas tipo militar. Regras de utilização do fardamento - Guarda-Chuva/Guarda-Sol. Não é permitida a utilização de guarda-chuva e/ou guarda-sol». (…) Ora, definidos os termos concretos em que deve consistir o fardamento e obrigando-se a contrainteressada a dar cumprimento a todos os termos e condições do CE, é óbvio que se obrigou a respeitar tudo quanto vem estabelecido no CE, nomeadamente, o supra citado art. 3.8. (…) Aliás, a própria A., limita-se a referir na componente técnica da sua proposta exatamente o que consta do art. 3.8 do CE …”.
XLVIII. Cientes deste juízo cumpre, então, analisar da procedência das criticas que lhe são dirigidas pela A./recorrente, apreciação essa na e para a qual vale o quadro normativo atrás convocado, quadro esse ao qual importa aditar o que se estipula no art. 72.º do CCP, bem como os considerandos de enquadramento que importa tecer a este propósito.
XLIX. Assim, resulta do preceito acabado de citar que “… júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas …” (n.º 1) e que são os “… esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º …” (n.º 2), sendo que os “… esclarecimentos referidos no número anterior devem ser disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse facto …” (n.º 3).
L. Munidos que estamos do acervo normativo pertinente e, bem assim, dos considerandos de enquadramento tecidos a propósito da proposta, temos que um dos princípios gerais que importa considerar em matéria da contratação pública é o da intangibilidade da proposta [ou também denominado de princípio da indisponibilidade ou da imutabilidade da proposta], princípio esse que, tal como é afirmado por R. Esteves de Oliveira, sendo uma “… refração, também aqui, dos princípios da concorrência e da igualdade, é um princípio fundamental da contratação pública e significa que, com a entrega da proposta (e com o termo do prazo para a sua apresentação) o concorrente fica vinculado a ela e, consequentemente, já não a pode retirar nem alterar até que seja proferido o ato de adjudicação ou até que decorra o respetivo prazo de validade. As propostas apresentadas ao procedimento adjudicatório não devem, pois, após o decurso do prazo para a sua apresentação, considerar-se na disponibilidade dos concorrentes, de ninguém, aliás, tornando-se intangíveis, documental ou materialmente. Em suma, valem pelo seu conteúdo (e informação) inicial, pelo que nelas se contém, por mais nada. (…) Após o termo do prazo para a sua apresentação, a proposta, além de não poder ser retirada (efeito de indisponibilidade) - há portanto uma obrigação de manutenção das propostas (art. 65.º do CPP), que só termina com o decurso do prazo de 66 dias, salvo se outro maior estiver estabelecido no programa ou no convite -, não pode ser alterada, tornando-se intangível (efeito de congelamento ou petrificação) …” [em loc. e ob. cit. págs. 76/77].
LI. Tal princípio válido e vigente para todos os procedimentos concorrenciais, salvo normativo legal em contrário, para além de ser uma decorrência natural do princípio da concorrência e da igualdade entre os concorrentes e, bem assim, do princípio da imparcialidade, o mesmo emerge do que se dispõe no supra citado art. 72.º do CCP, tanto mais que, como vimos, pese embora o júri do procedimento possa pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que repute ou considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas temos, contudo, que os esclarecimentos que venham a ser prestados para que possam fazer parte integrante da proposta importa que os mesmos não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não podendo alterar ou completar os respetivos atributos, nem podem ter por fim suprir omissões que deveriam ter conduzido ou sido fundamento de exclusão da proposta.
LII. É sabido que a admissibilidade da formulação por parte do júri/entidade adjudicante de pedido de esclarecimentos sobre a proposta admitido, como vimos no art. 72.º do CCP, se posiciona em domínio potencialmente conflituante ou de risco com o citado princípio da intangibilidade da proposta, impondo-se, assim, uma leitura e aplicação do mesmo normativo compatível com os interesses em confronto de molde a que ao se assegurar e promover o princípio do favor do concurso ou do procedimento não se ponha em causa a imparcialidade, a concorrência e igualdade entre os concorrentes.
LIII. Nessa medida, as situações de atendibilidade do pedido de esclarecimentos e os limites que estes devem respeitar para se manterem nos contornos do instituto são matéria que importa caraterizar devidamente à luz do que decorre em especial do n.º 2 do art. 72.º do CCP.
LIV. Ora tais esclarecimentos, como afirma R. Esteves de Oliveira, devem ter “… uma mera função de explicação ou de aclaração de algo menos nítido ou menos claro, não podendo por isso servir para dizer coisa diferente do que estava expressamente assumido na proposta (…), nem para completar ou aperfeiçoar algum atributo seu, nem para integrar lacunas existentes nos atributos ou nos elementos da proposta (preço, prazo, produto, etc.) cuja omissão justificasse a sua exclusão. (...) não é admitido ao concorrente «mexer» ou alterar a proposta durante a pendência do procedimento, integrando, modificando, reduzindo ou aumentando a pretensão ou a oferta inicialmente apresentada, seja para a tornar conforme aos parâmetros vinculativos constantes das peças do procedimento, seja para a tornar mais competitiva sendo irrelevante que a alteração resulte da iniciativa dos interessados ou da iniciativa da entidade adjudicante (ou do respetivo júri) …” [in: loc. e ob. cit., pág. 78].
LV. A ideia basilar ínsita no n.º 2 do art. 72.º é, pois, a de que os esclarecimentos são algo que se destina a aclarar, explicitar, clarificar algum elemento da proposta que está ou parece estar enunciado de modo pouco claro, ou de não ser apreensível, ou unívoco o sentido duma expressão, dum aspeto ou elemento da proposta, na certeza de que para a atendibilidade do esclarecimento que se prenda com a interpretação de elemento/aspeto da proposta importa que o mesmo tenha nesta ainda uma normal, uma razoável correspondência verbal sob pena de se poder por em causa a concorrência e igualdade dos concorrentes.
LVI. Tem-se, assim, como inadmissíveis esclarecimentos prestados pelos concorrentes que contrariem elementos constantes de documentos das propostas, que alterem ou completem estas nas respetivas caraterísticas/atributos ou que se destinem ou visem suprir omissões da proposta a que faltasse algum dos atributos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e que seriam conducentes à sua exclusão [arts. 70.º, n.ºs 1 e 2 e 72.º, n.º 2 ambos do CCP].
LVII. Não será, além disso, possível admitir a formulação de pedido de esclarecimento quanto a proposta apresente graves defeitos que a tornem insuscetível de avaliação quanto a um determinado atributo da mesma já que tal se traduziria num esgotar da previsão da al. c) do n.º 2 do art. 70.º do CCP, sendo que o mesmo já não ocorrerá quando se trate de caso de mera dificuldade de leitura do atributo que esteja em causa [cfr. M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira in: ob. cit., pág. 602].
LVIII. Já se à proposta falte um termo ou condição exigido pelo programa de concurso/caderno de encargos afigura-se-nos possível tal falta ser objeto de pedido de esclarecimento de molde a que o concorrente possa explicitar que termo ou condição pretende formular porquanto, como sustentam M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira, além “… do dito termo ou condição não relevar para a avaliação da proposta, ela não é proibida pelo artigo 72.º/2 do CCP, pois não há aqui contradição com qualquer elemento constante dos documentos da proposta (pelo simples facto de, nesse aspeto, dela não constar), nem se trata de alterar, completar ou suprir a omissão ou a ininteligibilidade de um atributo …” [in: ob. cit., págs. 602/603].
LIX. Resulta do sumário e fundamentos do acórdão do STA de 11.04.2012 [Proc. n.º 01166/11 in: «www.dgsi.pt/jsta»] que o “pedido de esclarecimentos só é legítimo quando for indispensável à compreensão e/ou à análise dos documentos já apresentados ou à avaliação da candidatura, isto é, quando se destinar a tornar mais compreensível o que já se encontrava na candidatura e/ou aclarar ou fixar o sentido de algo que nela constava, ainda que de forma menos inteligível”, sendo que não podem “os esclarecimentos previstos na lei servir para alterar ou suprir omissões da candidatura, designadamente dos documentos que a acompanham, por maioria de razão ter-se-á de concluir que, depois de apresentadas, as mesmas não podem ser corrigidas ou completadas através da junção de documentos que a deveriam instruir e que a não acompanharam”.
LX. Frise-se, ainda, que um pedido de esclarecimento ou um esclarecimento feitos em termos ilegais devem ter-se os mesmos por não escritos, não podendo conduzir à exclusão da proposta com tal fundamento já que aquela carece de ser aferida de “per si” tendo por referência a observância do programa de concurso, do caderno de encargos e das demais regras legais que disciplinem o concreto procedimento concorrencial.
LXI. Temos, por outro lado, que face ao que decorre da al. a) do n.º 2 do art. 70.º do CCP serão compreensivelmente excluídas as propostas que “não apresentem algum dos atributos” exigidos já que, mercê de tal falta, as mesmas são insuscetíveis de serem alvo duma avaliação completa à luz do modelo de avaliação definido pelo programa do procedimento, na certeza de que a definição do que seja um atributo importa ser encontrada do cotejo do que se mostra disciplinado nos arts. 56.º, n.º 2, 75.º, n.º 1 e 102.º, n.º 1 do CCP.
LXII. Ora nas palavras de M. Esteves de Oliveira e de R. Esteves de Oliveira são “… atributos da proposta as prestações (com as suas caraterísticas e circunstâncias) aí oferecidas ou pedidas à entidade adjudicante em relação aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, logo, com correspondência necessária no ou nos fatores de adjudicação, e de acordo com as quais, em caso de adjudicação, o concorrente fica obrigado a contratar …” [in: ob., cit., pág. 929].
LXIII. Ocorre que uma coisa é falta dum atributo a uma proposta outra será a falta de uma especificação inserta no programa do procedimento, na certeza de que a falta dum termo ou condição a uma matéria em relação à qual a entidade adjudicante pretenda que o concorrente se vincule apesar de se tratar de aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência não conduzirá à necessária exclusão da proposta, salvo se as peças do procedimento assim o determinem, impondo-se ou a sua integração automática pela especificação que conste, como limite máximo ou mínimo, do caderno de encargos ou, então, por não se tratar de algo que tenha sido submetido à concorrência a omissão poder ser suprida através de pedido de esclarecimentos da proposta nos termos do art. 72.º, n.º 2 do CCP [cfr. M. Esteves de Oliveira e R. Esteves de Oliveira in: ob. cit., págs. 930/932].
LXIV. Revertendo ao caso sob apreciação temos para nós que também não se afiguram procedentes as críticas dirigidas pela recorrente ao julgado “sub judice”.
LXV. Desde logo e como já tivemos oportunidade de referir supra a proposta da R./contrainteressada não era e não é omissa quanto à “componente técnica” à luz do que era exigido pelo programa do procedimento e do caderno de encargos, sendo que uma “estruturação”/“arrumação” da proposta nos moldes em que foi feita pela referida R. não pode ser minimamente entendida como não havendo cumprido aquilo que era exigido pelas peças procedimentais quanto aos seus vários pontos e que se mostram em questão.
LXVI. Temos, por outro lado, que sendo o critério de adjudicação do procedimento concorrencial em referência, nos termos do art. 74.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CCP, o do “preço mais baixo” [traduzido pelo valor global da proposta que resulta do somatório do custo das posições a concurso - cfr. arts. 4.2 do Programa e 2.3. do Caderno de Encargos] então uma alegada ou pretensa falta/ausência de elementos que não fazem ou não integram tal critério não constituirá fundamento ou causa de exclusão da proposta à luz do que se disciplina no art. 70.º, n.º 2 do CCP, mormente, suas als. a), b) e c), na certeza de que das regras do procedimento também não se extrai aquela consequência em resultado duma falta de tais elementos dos termos da proposta e documentos/anexos.
LXVII. Os comandos procedimentais em crise e as condições/elementos deles decorrentes como impostos aos concorrentes não se configuram ou se integram, no caso vertente, como atributos da proposta entendidos enquanto aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos, pelas peças procedimentais, à concorrência e com correspondência necessária no fator de adjudicação definido e, assim, sujeitos à avaliação.
LXVIII. Atente-se, ainda, que mercê da natureza que revestem os elementos alegadamente em falta e integradores da “componente técnica” da proposta, componente essa que, frise-se, não estava nem está submetida à concorrência, se mostra, no nosso entendimento, como possível e legal o pedido de esclarecimento que foi formulado pelo júri do procedimento tanto mais que se trata de pedido destinado a aclarar, explicitar, clarificar aquele elemento da proposta o qual não estaria enunciado de modo claro ou suficientemente apreensível.
LXIX. Nessa medida, não relevando para a avaliação da proposta não se mostraria proibido pelo art. 72.º, n .º 2 do CCP o pedido de esclarecimento com o conteúdo atrás referido, inexistindo aqui qualquer contradição com qualquer elemento constante dos documentos da proposta, nem se trata de alterar, completar ou suprir a omissão ou a ininteligibilidade de um atributo.
LXX. Aquela “componente técnica” constava e consta da proposta apresentada pela R./contrainteressada [veja-se, mormente, o referido/descrito, por vezes, genericamente ao longo dos capítulos relativos à “memória descritiva da vigilância”, aos “fluxogramas de atuação”, aos “meios técnicos de apoio à vigilância”, aos “procedimentos da qualidade, sistema integrado de gestão da qualidade, ambiente e segurança” e aos “níveis de serviço” tudo em articulação com o anexo I junto com a proposta da referida concorrente - declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos], mas, todavia, a mesma carecia de explicitação à luz daquilo que era a estrutura definida pelo Caderno de Encargos o que, como vimos, veio a ser feito pela referida concorrente de modo igualmente legal porquanto, como se extrai da factualidade apurada, os esclarecimentos que foram prestados não contrariam minimamente os elementos constantes de documentos da proposta, nem se trata de alteração ou complemento das respetivas caraterísticas/atributos, nem ainda se destinaram a suprir omissões da proposta a que faltasse atributo submetido à concorrência [arts. 70.º, n.ºs 1 e 2 e 72.º, n.º 2 ambos do CCP].
LXXI. Cumpre ter presente ainda que no que diz respeito aos elementos da “componente técnica” relativos às “funções específicas dos postos” e às “placas sinalizadoras” a resposta da mesma concorrente reconduziu-se à simples ou mera reprodução daquilo que constava dos arts. 3.12 e 3.13 do Caderno de Encargos, artigos esses que aquela havia declarado, sob compromisso, aceitar, cumprir e executar integralmente nos termos do anexo I junto com a proposta enquanto declaração de aceitação do conteúdo daquela peça procedimental, não ocorreu aqui inovação que leve a concluir que a proposta foi alterada ou indevidamente complementada e para além de que quanto às “placas sinalizadoras” tratava-se de elemento a observar/executar apenas pela entidade adjudicatária.
LXXII. Idêntica conclusão se chega também quanto ao elemento relativo à “política de segurança e saúde no trabalho” [art. 4.1. do Caderno de Encargos], presente que a R./contrainteressada, em sede de resposta ao pedido de esclarecimento para além de reiterar muito do referido na sua proposta/documento sob “componente técnica” sob os títulos da “seleção e formação”, “procedimentos da qualidade, sistema integrado de gestão da qualidade, ambiente e segurança”, veio a entregar o seu manual de gestão de segurança e saúde no trabalho e na certeza de que, de harmonia com o previsto no art. 04.º do Caderno de Encargos, só havia obrigação de proceder àquela entrega uma vez operada a adjudicação à entidade vencedora do procedimento concorrencial.
LXXIII. O mesmo vale no nosso juízo quanto ao elemento da “componente técnica” relativo ao “fardamento” já que o descrito nessa matéria no documento referente àquela componente conjugado e em articulação com o que a concorrente havia declarado, sob compromisso, de aceitar, cumprir e executar integralmente o Caderno de Encargos nos termos do anexo I junto com a proposta [declaração de aceitação do conteúdo daquela peça procedimental], satisfazem as exigências nesta sede, na certeza de que o que foi declarado pela A./recorrente na sua proposta [cfr. ponto 8.º do seu documento relativo à “componente técnica”] mais não foi do que, no fundo, reproduzir o teor do art. 3.8 do Caderno de Encargos sem que haja, também, ela apresentado já com a sua proposta o documento comprovativo da aprovação do fardamento por parte do «MAI», obrigação essa que, note-se, também só existirá para aquele concorrente que venha a ser o adjudicatário.
LXXIV. Por fim, refira-se que do facto do pedido de esclarecimento ou do esclarecimento feito o terem sido de forma ilegal tal implica apenas que os mesmos se devem ter como não escritos, não podendo conduzir à exclusão da proposta com tal fundamento já que aquela carece de ser aferida de “per si” tendo por referência a observância do programa de concurso, do caderno de encargos e das demais regras legais que disciplinem o concreto procedimento concorrencial.
LXXV. Improcede, por conseguinte, o pretenso erro de julgamento por incorreta aplicação do que se mostra disposto nos arts. 70.º, n.º 2, 72.º e 146.º, n.º 2 do CPTA, 3.4 do Programa do Procedimento, 3.8, 3.12, 3.13 e 4.1 e segs. do Caderno de Encargos, não ocorrendo causa de exclusão da proposta da R./contrainteressada com tais fundamentos.
LXXVI. Sustenta, ainda, a A., aqui recorrente, que a decisão judicial alvo do presente recurso enferma de erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação no caso do que se dispõe no art. 70.º, n.º 2, als. f) e g) do CCP já que, no seu entendimento, a aceitação do preço proposto pela R./contrainteressada implicaria a violação de vinculações legais e regulamentares aplicáveis e evidenciaria a existência de fortes indícios de práticas suscetíveis de falsear as regras da concorrência.
LXXVII. Decidiu-se neste âmbito no acórdão do TAF sob apreciação que no “… que concerne aos preços o PP estabelece na cláusula 3.2 - Parâmetros Base o seguinte: «No âmbito do presente procedimento de aquisição são estabelecidos os seguintes preços unitários base: 1. PHNd - Preço hora/homem do serviço normal diurno em dia normal: 7,50 €. 2. PHNn - Preço hora/homem do serviço normal noturno em dia normal: 9,00 €. 3. PHNdf - Preço hora/homem do serviço normal diurno em dia feriado: 14,00 €. 4. PHNnf - Preço hora/homem do serviço normal noturno em dia feriado: 16,00 €. 5. PHEd - Preço hora1homem do serviço extra diurno em dia normal: 7,50 €. 6. PHEn - Preço hora/homem do serviço extra noturno em dia normal: 9,00 €. 7. PHEdf - Preço hora/homem do serviço extra diurno em dia feriado: 14,00 €. 8. PHEnf - Preço hora/homem do serviço extra noturno em dia feriado: 16,00 €. Nota 1: As propostas cujos preços unitários ultrapassem os valores indicados nestes parâmetros base serão excluídas. Nota 2: Horário diurno: das 6h00 às 21 h00; Nota 3: Horário noturno: das 21 h00 às 6h00; Nota 4: Dia normal: domingo a sábado com exceção de feriados». (…) E estabelece na cláusula 3.4 que a proposta deve ser elaborada tendo em conta quanto à Componente Económica o seguinte: «1. Preço unitários das seguintes configurações: a. PHNd - Preço hora/homem do serviço normal diurno em dia normal. b. PHNn - Preço hora/homem do serviço normal noturno em dia normal. c. PHNdf - Preço hora/homem do serviço normal diurno em dia feriado. d. PHNnf - Preço hora/homem do serviço normal noturno em dia feriado. e PHEd - Preço hora/homem do serviço extra diurno em dia normal. f. PHEn - Preço hora/homem do serviço extra noturno em dia normal. g. PHEdf - Preço hora/homem do serviço extra diurno em dia feriado. h. PHEnf - Preço hora/homem do serviço extra noturno em dia feriado. 2. Valor do contrato será determinado pela aplicação dos preços unitários (da alínea a à alínea d) ao quadro de posições previsto no caderno de encargos». (…) Tendo em conta o quadro de posições estabelecido no art. 3.1 do CE, a contrainteressada «S...» apresentou o mapa de preços constante do probatório (cfr. item 7). (…) Ainda que a A. tenha razão quando alega que tratando-se de um ajuste direto celebrado ao abrigo do acordo quadro com a ANCP, o fornecedor terá de remunerar a ANCP por um valor líquido correspondente a 1% sobre o total da faturação emitida, sem IVA, ao IPOP, o que alegadamente resulta do art. 26.º do CE do concurso limitado por prévia qualificação para a celebração desse acordo, alegação que a A. não comprovou, como devia, não se vislumbra em que parte das condições do procedimento em análise - ajuste direto n.º 5437/2011 - se encontra a obrigação de imputar tal custo nos preços apresentados na proposta de preço e que se mostram discriminados na respetiva proposta de preço de acordo com as peças do concurso, isto é, atendendo aos preços máximos indicados no PP e às posições enumeradas no CE. (…) Também quanto à obrigação de suportar vários outros custos, como sejam os resultantes da obrigação de todos os vigilantes terem de frequentar formação na Escola Portuguesa de Oncologia do Porto e os resultantes da necessidade de meios de apoio e equipamentos à execução de rondas bem como da realização proposta de 391 visitas anuais, não resulta do PP ou do CE que os proponentes tenham que, de forma discriminada, indicar tais custos que devam acrescer aos custos elencados na proposta de preço apresentada. (…) Nesta medida, com a decisão de adjudicar a prestação de serviços ao contrainteressado «S...», não se mostra provada a violação de quaisquer normas e regulamentos aplicáveis ou ainda a prática de atos que distorçam as regras da concorrência, não oferecendo razão à A. na invocada violação das alíneas f) e g) do n.º 2 do art. 70.º do CCP …”.
LXXVIII. Tal como já anteriormente havíamos transcrito extrai-se do n.º 2 do art. 70.º do CCP, no que releva, que são “… excluídas as propostas cuja análise revele: … f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis; g) A existência de fortes indícios de atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras de concorrência …”.
LXXIX. Prevê-se ainda no art. 47.º do mesmo Código que quando “… o contrato a celebrar implique o pagamento de um preço, o preço base é o preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o seu objeto, correspondendo ao mais baixo dos seguintes valores: a) O valor fixado no caderno de encargos como parâmetro base do preço contratual; b) O valor máximo do contrato a celebrar permitido pela escolha do procedimento, quando este for adotado nos termos do disposto nos artigos 19.º, 20.º ou 21.º; c) O valor máximo até ao qual o órgão competente, por lei ou por delegação, pode autorizar a despesa inerente ao contrato a celebrar …” (n.º 1), sendo que quando “… o caderno de encargos fixar apenas preços base unitários, considera-se que o valor referido na alínea a) do n.º 1 corresponde à multiplicação daqueles pelas respetivas quantidades previstas no caderno de encargos …” (n.º 5).
LXXX. Temos, assim, que o preço base será o preço máximo que a entidade adjudicante aceita pagar pela execução das prestações objeto do contrato, constituindo, nessa medida, fator condicionador das propostas a admitir porquanto serão imediatamente excluídas as propostas que ultrapassem aquele “preço base”, o que, aliás, constava do próprio Programa do Procedimento [cfr. art. 3.4] e conduziu à exclusão de propostas de várias concorrentes [cfr. n.º XI) da matéria de facto apurada], sendo que tal exclusão opera independentemente da ultrapassagem do “preço base” ser ou não considerável [cfr. al. d) do n.º 2 do art. 70.º do CCP].
LXXXI. Para que resulte preenchida a previsão da al. f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP importa que se mostre demonstrado que a proposta permita detetar qualquer incompatibilidade com o bloco de legalidade em vigor [seja de fonte legal ou regulamentar] a ponto da entidade adjudicante poder formular de imediato um juízo de exclusão da proposta sob pena pactuar com a ilegalidade e infringir os princípios da legalidade e da prossecução do interesse público [cfr. arts. 266.º, n.º 2 da CRP, 03.º e 04.º do CPA].
LXXXII. Reconduzindo-nos à análise do fundamento de recurso ora em questão temos que o Programa do Procedimento não contém norma que obrigasse os concorrentes a demonstrarem a formação do preço que propuseram e que através daquela demonstração com a indicação de vários elementos deles constituintes fosse automática e inequivocamente possível apreender a observância ou não do preço proposto daquilo que são os encargos diretos obrigatórios decorrentes do quadro normativo vigente.
LXXXIII. Temos, contudo, que por força do disposto na al. f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP se mostra assegurado que não será válida uma proposta apresentada em procedimento concorrencial que contenha condição ou proposição que conduza a que o contrato que venha a ser celebrado em decorrência da sua aceitação implique a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares. Tal proposta nos termos do citado preceito terá de ser excluída.
LXXXIV. Para a verificação da ilegalidade em questão importa, assim, que haja sido demonstrado, como referimos supra, que a proposta em questão pelos seus termos e demais circunstâncias apuradas se revele como incompatível com o bloco de legalidade em vigor.
LXXXV. Ora no caso vertente, presente a factualidade alegada e a provada, não se vislumbra que tal haja sido feito.
LXXXVI. Desde logo, importa ter presente que os valores dos preços finais insertos na recomendação da «ACT» documentada nos autos e referida sob o n.º XVII) dos factos apurados são valores meramente indicativos, recomendados, não constituindo ou gozando dum qualquer valor impositivo obrigatório e absoluto como valor mínimo que importe ser estritamente observado sob pena de ilegalidade.
LXXXVII. Temos, por outro lado, que os valores recomendados, de referência, nela apostos foram produto dum cálculo no qual foram incluídos os vários custos/encargos obrigatórios que derivam de imposições legais diversas, mas desse cálculo não fazem parte unicamente tais custos porquanto para o mesmo contribuíram todos os outros custos variáveis imanentes ao funcionamento, operacionalidade e rentabilidade duma empresa do setor da prestação de serviços de segurança privada.
LXXXVIII. Nessa medida, a proporção com que uns custos e outros contribuem para o resultado obtido na operação de estudo e cálculo a que a «ACT» chegou é ou poder ser muito diverso, tal como muito diverso será, necessariamente, a estrutura de custos fixos e variáveis que cada empresa possui e terá de suportar no desempenho da sua atividade, pelo que não se descortina ou encontra consistência/razoabilidade na argumentação/tese sustentada pela A. para concluir pela ilegalidade do ato impugnado à luz da al f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP com apelo nas operações de cálculo que realizou tão só por reporte aos dados de referência insertos na Recomendação da «ACT» de 12.04.2012, conferindo-lhe quer um carater absoluto quer uma força jurídica e de normatividade que não possui.
LXXXIX. Não poderá assentar-se um juízo de ilegalidade duma determinada proposta no quadro de procedimento concorrencial e proceder à sua integração na referida alínea do n.º 2 do citado normativo do CCP com apelo tão-só a uma alegada infração duma determinada Recomendação da «ACT», mormente, daquela que está em presença, tanto para mais que o preço indicado numa proposta por cada concorrente é fruto da análise e ponderação daquilo que é a sua vontade de ganhar o procedimento face à concorrência, considerando o objeto/custos do procedimento concorrencial a que se apresenta e daquilo que é o conhecimento da sua estrutura de custos [varáveis e fixos/impostos legal e contratualmente] e da margem de lucro com que opera/funciona.
XC. Inexiste prova e demonstração factual nos autos que o preço constante da proposta da R./contrainteressada implique ou acarrete um qualquer incumprimento por parte da mesma daquilo que são as suas obrigações e vinculações legais/contratuais quer face a entidades públicas ou privadas, quer face aos seus trabalhadores.
XCI. Note-se que, no caso vertente, o valor que separou as duas propostas em confronto no procedimento e que foram apresentadas pelas partes em litígio ascendeu apenas a 3.524,00 €, diferença essa que derivou unicamente do valor diverso que aquela R. indicou ao preço unitário base relativo ao «PHNd - Preço hora/homem do serviço normal diurno em dia normal», no caso 7,45 €, quando a A. indicou o valor de 7,50 € que era igual ao preço unitário base que figurava no art. 3.2 do Programa do Procedimento.
XCII. Em tudo o mais as propostas em confronto são rigorosamente iguais e correspondem exata e rigorosamente aos valores insertos para os vários preços unitários base do parâmetro referidos naquele artigo do Programa, não se vislumbrando, em que medida, uma tão reduzida diferença em que se cifrou a divergência dos valores das propostas permita validamente fundar um juízo de claro, necessário e inequívoco incumprimento por parte da R./contrainteressada daquilo que são as suas obrigações/vinculações legais em sede de custos, mormente, daqueles que vêm referidos pela A. nos autos e que o mesmo também não ocorra com a própria proposta da A. quanto a ter também ela que dar cumprimento/observância aos mesmos custos/encargos obrigatórios considerando aquilo que foi o preço da sua proposta que, repita-se, não foi muito diferente daquele que a R. apresentou.
XCIII. Frise-se que para além dos custos fixos/impostos legal, administrativa e contratualmente, uma empresa defronta-se com uma gama muito variada de custos variáveis que não estão fixados ou taxados de forma alguma e em que entram fatores que se prendem com capacidades de organização e de gestão detidas ou não, com capacidades comerciais e de negociação, pelo que não poderemos deixar de ter em consideração esta realidade no juízo concreto que importa fazer quando haja de se aferir se a situação em questão preenche ou não a previsão da al. f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP.
XCIV. Neste juízo se é certo que, por um lado, não poderemos esquecer que importa assegurar o respeito estrito da legalidade, daquilo que são as obrigações e vinculações impostas sem margem de manobra para as empresas e que se apresentam a estas como custos fixos, bem como daquilo que sejam os valores duma sã e transparente concorrência, temos, por outro lado, que não poderemos esquecer aquilo que constitui uma realidade evidente e notória que se prende com a diversidade de custos e de estrutura destes que cada empresa possui, a margem de lucro com que cada empresa opera no mercado concorrencial, com aquilo que é e são as decorrências da liberdade de empresa, da liberdade de organização e de gestão duma empresa.
XCV. De notar, frisando o que supra se referiu quanto ao valor da referida recomendação da «ACT» de 12.04.2012, que lidos os seus próprios termos e pressupostos em que assenta, aquela recomendação parte de dados/parâmetros que não se reportam apenas a custos/encargos obrigatórios/fixos decorrentes da lei visto ter levado em consideração toda uma gama de variáveis muito diversas e em que se terá partido de valores ou médias ponderadas do setor, pelo que o seu resultado/produto só pode ser lido com possuindo um cariz meramente indicativo, referencial, sem que detenha ou possa ser considerado de molde automático enquanto comando impositivo absoluto que haja de ser observado de forma estritamente vinculada, sob pena daquela recomendação se traduzir ou se poder vir a traduzir numa ingerência ilegítima na aludida liberdade de empresa, da sua gestão e organização e mesmo da própria concorrência que visa assegurar.
XCVI. Uma proposta só poderá ser alvo de exclusão no quadro da al. f) do n.º 2 do art. 70.º do CCP se resultar demonstrado que a mesma não permite ao concorrente dar cumprimento às suas obrigações impostas por lei, por regulamento/instrumento de regulamentação coletiva.
XCVII. Os autos não permitem pelo que neles foi alegado e provado assim concluir, deles não derivando a demonstração de que a R./contrainteressada haja incumprido ou potencialmente ocorra, mercê da proposta apresentada, um risco de incumprimento daquilo que são as estritas vinculações e obrigações legais.
XCVIII. A apresentação daquele preço unitário por parte da referida R. decorre ou teve de decorrer, assim, de aferição e avaliação global que a mesma fez do que constituem os seus concretos e efetivos custos, na consideração das opções organizativas, de gestão meios humanos e recursos de que dispõe, razão pela qual aquele preço proposto pode meramente espelhar uma estratégia comercial da proponente sem que com isso esteja a necessariamente violar a legislação em vigor.
XCIX. De igual modo se nos afigura minimamente improcedente o erro de julgamento invocado pela A. quanto a pretensa infração à al. g) do n.º 2 do art. 70.º do CCP.
C. Com efeito, nos termos do que se dispunha no n.º 1 do art. 04.º da Lei n.º 18/03, de 11.06 [aplicável face ao regime transitório e à vigência definidos pelos arts. 100.º e 101.º da novo regime da concorrência inserto na Lei n.º 19/2012, de 08.05] são “… proibidos os acordos entre empresas, as decisões de associações de empresas e as práticas concertadas entre empresas, qualquer que seja a forma que revistam, que tenham por objeto ou como efeito impedir, falsear ou restringir de forma sensível a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente os que se traduzam em: a) Fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa; b) Fixar, de forma direta ou indireta, outras condições de transação efetuadas no mesmo ou em diferentes estádios do processo económico; c) Limitar ou controlar a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico ou os investimentos; d) Repartir os mercados ou as fontes de abastecimento; e) Aplicar, de forma sistemática ou ocasional, condições discriminatórias de preço ou outras relativamente a prestações equivalentes; f) Recusar, direta ou indiretamente, a compra ou venda de bens e a prestação de serviços; g) Subordinar a celebração de contratos à aceitação de obrigações suplementares que, pela sua natureza ou segundo os usos comerciais, não tenham ligação com o objeto desses contratos …”.
CI. Presente o quadro factual que resultou apurado nos autos não se vislumbra que haja sido demonstrada a existência de quaisquer atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras da concorrência, não se vislumbrando ter ocorrido um qualquer conluio entre concorrentes, ou entre aquela concorrente e terceiros que visasse cercear tais regras.
CII. Não integra esta alínea a invocação de que o preço unitário base proposto é inferior ao definido no Programa do Procedimento e que o mesmo não cobriria aquilo que são vinculações legais/administrativas obrigatórias assim violando também as regras de concorrência porquanto tal consequência revela-se conclusiva na alegação na certeza de que o preceito exigirá uma alegação e prova de realidade muito diversa que não logrou ser demonstrada nos autos.
CIII. Assim, face ao exposto não se mostrando verificados os fundamentos de ilegalidade imputados ao ato adjudicatório impugnado, inexiste como tal, no juízo de improcedência firmado pelo tribunal “a quo” quanto à pretensão da A., qualquer erro de julgamento por infração ao quadro normativo [legal/procedimental] convocado como violado pela recorrente, o que importa concluir com as legais consequências.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar total provimento ao recurso jurisdicional deduzido pela A. e, consequentemente, com a fundamentação antecedente manter a decisão judicial recorrida com todas as legais consequências.
Custas nesta instância a cargo da A., aqui recorrente, sendo que na mesma a taxa de justiça, não revelando os autos especial complexidade, se atenderá ao valor resultante da secção B) da tabela I anexa ao Regulamento Custas Processuais (doravante RCP) [cfr. arts. 446.º, 447.º, 447.º-A, 447.º-D, do CPC - atuais arts. 527.º, 529.º, 530.º, 531.º e 533.º do CPC/2013 -, 04.º “a contrario”, 07.º, n.º 2, 12.º, n.º 2, 25.º e 26.º todos do referido Regulamento - tendo em consideração o disposto no art. 08.º da Lei n.º 07/12 e alterações introduzidas ao RCP -, e 189.º do CPTA].
Valor para efeitos tributários: 30.000,01 € [cfr. fls. 50 dos autos e art. 12.º, n.º 2 do RCP].
Notifique-se. D.N..
Restituam-se, oportunamente, os suportes informáticos que, eventualmente, hajam sido gentilmente disponibilizados.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator [cfr. art. 131.º, n.º 5 do CPC/2013 “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA].
Porto, 6 de dezembro de 2013
Ass.: Carlos Carvalho
Ass.: Ana Paula Portela
Ass: Fernanda Brandão

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