terça-feira, 31 de janeiro de 2012

CONTRATO ADMINISTRATIVO - EMPREITADA DE OBRAS PÚBLICAS - PREÇO - INTEGRAÇÃO DO CONTRATO - MODIFICAÇÃO DO CONTRATO

Processo nº 464/2010  STA     -   2010-07-07

I - Não é omisso quanto à forma de pagamento dos preços de trabalhos de bombagem de água um contrato de empreitada de obras públicas em que se prevê um determinado preço por hora, proposto pelo empreiteiro, sem indicação da potência das bombas a utilizar, pois não é inviável aplicar este único critério para determinar os pagamentos que há que efectuar com essa bombagem.
II - Nestas condições, a adopção de outro critério para calcular os pagamentos referidos, em vez do indicado no contrato, traduzir-se-ia na sua modificação e não na sua integração.
III - Não se provando que a potência média ponderada das bombas efectivamente instaladas na bombagem fosse inferior à potência média das bombas que o empreiteiro teve em conta ao calcular o custo a hora de bombagem que indicou na sua proposta, não há suporte para concluir que o preço não seja adequado à prestação das Autoras, isto é, que o «equilíbrio das prestações» que se refere no art. 237.º do Código Civil não tenha sido alcançado com os pagamentos nos termos que resultam do contrato.



 Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
 1 – B..., S.A. e C..., S.A. recorrem para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de ... que julgou improcedente a acção sobre contrato administrativo de empreitada de obras públicas que o consórcio que as Recorrentes formaram propôs contra o Estado e o Gabinete de Saneamento Básico da ....
Por acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo que consta de fls. 504-513 verso, foi confirmada a absolvição do Réu Estado da instância e a legitimidade passiva do INSTITUTO DA ÁGUA – INAG, enquanto sucessor do Gabinete de Saneamento Básico da ....
As Recorrentes apresentaram alegações com as seguintes conclusões:
A EXISTÊNCIA DE OMISSÃO CONTRATUAL
A – O critério de medição das unidades de bombeamento, para aplicação do respectivo preço unitário, não está suficientemente definido nas peças concursais, nem no contrato de empreitada celebrado entre as partes, pois nestes apenas se refere como "unidade" a hora de bombagem, sem se referir a potência padrão dessa hora de bombagem, isto é, a potência horária que corresponde ao preço unitário acordado, de 299$00.
B – Não é indiferente que determinada bombagem se faça durante uma hora com uma potência de 1 cv ou durante uma hora com a potência de 100 cv, pois na segunda hipótese a mesma hora de bombagem permitirá realizar 100 vezes mais trabalho – e consumirá 100 vezes mais energia – do que na primeira. Sendo diferente tanto o resultado alcançado como o custo dessa hora de trabalho para o empreiteiro, seria destituído de lógica, de racionalidade e de equidade que se abstraísse, na medição dos trabalhos de bombagem, da potência de funcionamento de cada bomba, para apenas considerar o respectivo tempo de funcionamento – mesmo que multiplicado pelo número de bombas utilizadas em simultâneo – como forma de cálculo do preço que o empreiteiro tem a receber por esse trabalho.
C – As peças concursais (cfr. factos g) e k) da sentença), prevêem a necessidade de "conversão" da energia consumida em horas de bombagem - o que necessariamente terá que ser traduzido por uma expressão de CV x Hora - e mesmo a própria unidade de "(CV. h) ", pelo que a única coisa que ficou por indicar foi o valor concreto da potência padrão da hora de bombagem para se chegar à unidade de bombagem.
D – A mera indicação da altura manométrica de 15 m não tem a virtualidade de permitir o cálculo da potência aqui prevista para a hora de bombagem, conforme ficou demonstrado e expressamente consignado no facto tt) da sentença, pelo que tal indicação não possibilita que se chegue, mesmo por dedução, ao valor omitido, ao contrário do que pretende o Réu.
E – O próprio Réu e o seu projectista (G...) sempre admitiram que o estabelecimento de um valor de potência horária seria necessário para estabelecer a unidade de medição dos trabalhos bombagem, não bastando para tal a referência à unidade temporal - cfr. os factos x) e aa) da sentença, bem como o documento junto aos autos pelo consórcio Autor por requerimento de 3 de Maio de 2005 e nele referido sob a alínea c) - pelo que se esforçaram (tal como o Senhor Advogado, Dr. D..., que subscreveu o parecer junto pelo Réu) por ir "buscar" à relação de equipamentos apresentada em anexo pelo consórcio Autor a potência de referência que faltava nas peças concursais, e procurar interpretar o contrato de empreitada como incluindo no critério de medição da unidade de bombagem a potência desses equipamentos.
F – Para tanto, teve o Réu que alegar, e procurar demonstrar que de facto assim era, isto é, que o valor unitário do trabalho de bombagem dizia respeito a uma hora de trabalho de uma bomba com 11 cv de potência.
G – Foi essa tentativa que soçobrou em audiência de julgamento, tendo sido dado como não provado que o preço unitário apresentado pela ora Recorrente tenha tido por base os tais 11 CV de potência das bombas listadas em anexo - cfr. a resposta negativa ao quesito 13.
H – A tese que o Réu tão persistentemente se esforçou por fazer passar, além de contraditória com as anteriores tomadas de posição em que admite a justiça de uma compensação ao consórcio Autor (independentemente do seu valor concreto) labora, para mais, contra evidências que a tomariam de todo estranha, pois tal tese sempre deixaria por explicar a escolha da potência de 11 Cv, com preterição da consideração das bombas de 27 Cv também listadas pelo consórcio Autor, e, sobretudo, é contrária à constante aceitação por parte do Réu de pagar ao preço de 299$00, horas de bombagem a uma potência média de 4,8 Cv, isto é, menos de metade da potência a que o consórcio Autor se teria comprometido de acordo com tão irrealista tese.
I – Aliás, a potência padrão resultante de tal tese conduziria a valores unitários absolutamente irrisórios que o consórcio Autor nunca propôs nem poderia ter proposto, e com os quais o Réu nunca poderia razoavelmente contar, pelo que tal interpretação do contrato sempre violaria o art. 236º, in fine, do Código Civil, relativo à interpretação dos negócios jurídicos.
J – Também por isso carece de sentido a afirmação do Mmo. Juiz a quo (a fls. 855-856) de que afinal foi o consórcio Autor que ficou beneficiado, por ter obtido o pagamento de um preço que seria referido a 11 CV quando apenas aplicou 4,8 CV, recebendo, portanto, mais do dobro do que lhe era devido, sendo, aliás, tal afirmação frontalmente contraditória com a resposta negativa ao quesito 13º.
K – Também não procede a afirmação, constante da sentença recorrida, de que "o argumento de que o critério de medida consagrado no CE é irracional, por não tomar em devida conta a potência de cada bomba, é reversível, na medida em que poderia conduzir a uma situação de vantagem para o empreiteiro se a potência das bombas for a menor possível, caso em que o número de horas seria proporcionalmente aumentado." (cfr. fls. 855 dos autos), porquanto a "irracionalidade" não desaparece (nem se "reverte") só pelo facto de, em cada caso concreto, poder funcionar a favor do empreiteiro ou do dono da obra: pelo contrário, a irracionalidade subsiste precisamente porque, desprovido do valor da potência padrão, o critério de medição da unidade de bombagem conduz a soluções absolutamente injustas, desfasadas do real valor do trabalho prestado, economicamente desequilibradas e conducentes a um enriquecimento injustificado, beneficiando o dono da obra ou o empreiteiro (o que não é relevante no juízo abstracto sobre a suficiência do critério), consoante a potência concreta que tiver sido efectivamente utilizada em obra.
L – O sentido da expressão "devendo essa conversão ser feita de acordo com o equipamento dos concorrentes" deve ser entendido, no contexto da cláusula em que se insere, no sentido de estar referida não ao equipamento abstractamente indicado em lista anexa como passível de utilização, mas ao equipamento concreto que o concorrente adjudicatário efectivamente viesse a utilizar na execução da obra, conforme resulta, aliás, da referência à energia "consumida", isto é, a efectivamente consumida, a qual é observável a partir do equipamento concreto utilizado, "com o" qual deve ser feita a tal conversão para os valores (de potência) aplicáveis ao preço unitário apresentado.
M – Pelo que a operação de conversão consiste em partir do valor de potência registado (em termos médios) nesse equipamento efectivamente utilizado para chegar ao número de unidades horárias, de acordo com a potência padrão que baseou a fixação do preço unitário, podendo-se então multiplicar, de forma justa, esse número de horas pelo preço unitário fixado.
N – Esta a interpretação útil e correcta da referida expressão, e tornada, aliás, a única possível, depois de ter sido dado como não provado que o preço unitário apresentado foi fixado com base na potência das bombas constantes da lista anexa apresentada pelo consórcio.
O – A isso não obsta o facto de a listagem anexa de equipamento por parte dos concorrentes ser obrigatória ou fazer parte do contrato, porquanto essas circunstâncias não permitem afirmar que a finalidade dessa declaração é outra que não seja a de demonstrar as capacidades técnicas de cada concorrente, muito menos permitem afirmar que a sua finalidade é a de complementar o critério do preço dos trabalhos.
P – A confirmá-lo está o facto de os equipamentos listados não serem de uso obrigatório em obra, tendo-se aliás verificado, no caso concreto, a utilização de equipamentos completamente diferentes pelo consórcio Autor com o integral acordo do Réu.
Q – De tudo se conclui pela existência de uma omissão contratual - com prejuízo para o consórcio Autor - e pela necessidade de a integrar.
R – A douta sentença recorrida labora em equívoco quando chama à colação os institutos da alteração das circunstâncias ou da revisão de preços, e ao afirmar que "eventuais alterações às estipulações contratuais devem ser ditadas por razões de interesse público" (cfr. fls. 854 dos autos), ou ao indagar, na página anterior, sobre se "é juridicamente possível alterar o critério estabelecido (bem ou mal) no CE", precisamente porque o que o consórcio Autor sempre afirmou foi que não estava contratualmente definido - que faltava - o critério (o valor padrão da potência horária), não que o critério existente devesse ser alterado - sendo certo que até o Réu concordou com a necessidade de se acrescentar esse critério, ainda que afirmasse que ele estava previsto noutro local, afirmação essa que, conforme se constatou, veio a ser julgada não demonstrada no processo.
A INTEGRAÇÃO DA OMISSÃO
S – Existem nos autos elementos de facto que nos permitem saber qual teria sido a vontade das partes quanto ao critério em falta (potência da bomba-tipo, ou potência padrão) se o tivessem previsto e exarado no contrato, de forma a integrar a omissão contratual nos termos do art. 239º do Código Civil, a saber, os factos resultantes da correspondência com propostas, pareceres técnicos e actas de reunião referidos nos factos w), z), aa) e dd) da sentença, bem como a p. 3 da acta da segunda reunião da Comissão de Conciliação, junta pelo consórcio Autor mediante requerimento de 3 de Maio de 2005.
T – A circunstância de algumas dessas propostas por parte do Réu terem ficado dependentes de ratificação superior em nada obstam à sua utilização para cumprimento do art. 239º do Código Civil, porquanto o que se pretende não é saber o que é o que as partes (e portanto também o dono da obra por si só) acordaram efectivamente, pois já se viu que, quanto a esse aspecto, não acordaram nada, donde a omissão, mas sim o que é que elas teriam acordado caso tivessem previsto o critério inicialmente ("a vontade que as partes teriam tido", conforme prescreve o art. 239º do Código Civil).
U – E os factos - as trocas de correspondência, pareceres e negociações havidas a posteriori - demonstram que certamente as partes teriam acordado num valor da potência padrão (ou da bomba-tipo) que não sairia do intervalo entre os 1,6 kW e os 1,8 kW.
V – Para fixar um valor concreto dentro deste intervalo haverá que recorrer aos "ditames da boa fé", conforme igualmente manda o art. 239º do Código Civil, ditames esses dos quais nunca poderia afastar-se, para este efeito, a vontade presumível das partes.
W – Consta dos autos um documento - cfr. o orçamento anexo à carta 269/DO, de 07-02-1992 (Capítulo VI, Art.º 2º), bem como o respectivo ofício de adjudicação proveniente do dono da obra, juntos ao processo por requerimento de 3 de Maio de 2005, e referidos, em conjunto, sob a alínea b) do referido requerimento – do qual resulta um facto que tem a virtualidade de fazer luz acerca do que neste caso é concretamente ditado pela boa fé, e do qual o Tribunal poderá socorrer-se para este efeito, nos termos do art. 264º, n.º 2, segunda parte do CPC (por se tratar de um facto instrumental), ou, sem conceder, mesmo nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 264º do CPC, para o caso de se entender que se trata de um facto essencial, aqui se manifestando desde já, para essa eventualidade, a intenção de aproveitamento do referido facto.
X – E o facto é que o mesmo dono da obra (ora Réu) adjudicou ao mesmo empreiteiro (consórcio ora Autor) no âmbito da mesmíssima empreitada em causa nos autos, trabalhos a mais que incluíram trabalhos de esgoto de águas (com bombagem) pelo valor unitário de 187$00 por kWh.
Y – Esse valor, efectivamente aceite pelo dono da obra e acordado entre as partes em 1992, para a precisa obra em causa, e portanto em condições em tudo equivalentes às da proposta e adjudicação inicial da empreitada (mais equivalentes não poderiam ser) corresponde precisamente ao valor da bomba tipo aqui defendido pelo consórcio (1,6 KW).
Z – Este facto permite, até a montante do recurso aos ditames da boa fé, saber qual teria sido a concreta vontade das partes caso o elemento omisso tivesse sido previsto, pois trata de um acordo real entre as mesmas partes para um caso em tudo idêntico, e até pertencente à mesma obra, para mais calculado como "reportado à origem da empreitada", conforme se explica no ponto 3 da carta à qual está anexo o referido orçamento,
AA – Fazendo uso da vontade presumível das partes e também dos ditames da boa fé não poderá haver qualquer dúvida na aplicação deste valor (1,6 kW), que as próprias partes no presente processo aceitaram, entre si, ser o equitativo e justo num trabalho igual ao que agora está em causa, e aliás, executado no âmbito da mesma empreitada pelo que também não poderá deixar de ser considerado o equitativo e justo na solução do presente processo.
BB – Só esse critério permitiria o respeito pelo princípio do equilíbrio contratual, necessariamente conformador dos contratos de empreitadas de obras públicas, como é o caso do presente.
CC – Ainda que assim não se entendesse, sempre deveria ser integrada a lacuna com recurso à potência padrão de 1,8 kW expressamente referido nas propostas do Réu e do seu projectista, e correspondente à máxima cedência a que o consórcio Autor se mostrou disposto em termos de negociação extra judicial sob a égide do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes.
DD – Mesmo que não se considerasse que dos autos resultam - quer na factualidade constante da sentença, quer na factualidade resultante dos documentos juntos pelas partes - factos suficientes para se proceder à integração da omissão contratual, de qualquer forma sempre haveria que reconhecer-se a existência da lacuna, e o prejuízo dela resultante no caso em apreço para o consórcio Autor, condenando-se o Réu a pagar ao consórcio Autor a quantia que viesse a ser liquidada posteriormente, de acordo com o critério (valor da potência padrão) que venha a resultar demonstrado nessa liquidação, nos termos do art. 661º, n.º 2 do CPC.
QUESTÃO SUBSIDIÁRIA DA INTERPRETAÇÃO DO CONTRATO:
SOLUÇÃO DO CASO DUVIDOSO COM RECURSO AO PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL
EE – Mesmo que não se considerasse existir uma omissão contratual no caso em apreço, mas apenas um problema de interpretação, sempre seria de entender estarmos perante um caso duvidoso, o qual deveria ser resolvido de acordo com o princípio do maior equilíbrio das prestações - art. 237º do Código Civil - o qual conduz igualmente à aplicação de uma potência padrão de 1,6 kW.
FF – A sentença recorrida violou os artigos 236º e 239º do Código Civil, ou, subsidiariamente, o art. 237º do Código Civil.
Nestes termos, deverá a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que condene o Réu a pagar ao consórcio Autor a quantia, calculada de acordo com a potência padrão de 1,6 kW, de 380.525.418$80 (correspondente em euros a 1.898.052,79 €), acrescida dos juros à taxa comercial que se venceram desde as datas das facturas referidas no facto jj) da sentença, e que na data da propositura da acção se computavam em 174.156.567$00 (correspondente em euros a 868.689,29 €).
O INSTITUTO DA ÁGUA contra-alegou, concluindo da seguinte forma:
I – O critério que as AA. devem aplicar na medição das bombagens é o que consta do art. IR Capitulo III do Mapa de Medições ou de Trabalhos e que é única e exclusivamente aplicável inicialmente pelos concorrentes para determinarem e calcularem, com base nos respectivos parâmetros, o preço unitário/hora das bombagens a apresentar nas respectivas propostas.
II – A bombagem é apenas medida por hora real de funcionamento do equipamento e o seu cômputo monetário obtém-se pela respectiva multiplicação pelo preço unitário, calculado nos termos do número que antecede,
III – O caderno de encargos não padece de qualquer omissão ou lacuna que careça de integração e aplicação analógica.
IV – As AA. nunca formularam, dentro dos prazos legais, reclamações no sentido de existência de erro ou omissão do projecto e do caderno de encargos, pelo que esse direito, pelo decurso dos correspondentes prazos, caducou.
V – A circunstância de as AA. terem indicado um preço unitário para a hora de bombagem significa que entenderam o respectivo conceito, parâmetros e modo de cálculo e demonstra a inexistência de erro ou omissão.
VI – Sendo a empreitada por série de preços, o empreiteiro obriga-se a executar pelo respectivo preço unitário contratual todos os trabalhos de cada espécie.
VII – Porque a empreitada de obras públicas é um contrato típico, formal e com obrigatória redução a escrito, são nulas todas as cláusulas e estipulações que inobservem a referida forma legal.
VIII – A pretensão das AA. não tem acolhimento contratual, já que nele se não encontra prevista.
IX – As AA. foram beneficiadas com o preço unitário aprovado de Esc.: 299$DO/h, porquanto, a altura manométrica média real (8,5 m) é inferior em cerca de metade da contratualmente prevista (15m) e a potência média ponderada das bombas pelas mesmas efectivamente aplicadas em obra (3,5 kw _ 4,8 c.v.) é inferior em menos de metade à por si inicialmente proposta (8kw T 11 c.v.).
XII – A utilização do critério indevidamente pretendido pelas AA. aumentaria significativamente o cômputo da medição das bombagens, face ao real número de horas do seu funcionamento, donde seriam pagas horas em que os equipamentos não funcionariam.
XIII – Não existiu qualquer alteração das circunstâncias.
XIV – As facturas apresentadas pelas AA., foram-no, face ao exposto, indevidamente emitidas, pelo que, do respectivo montante, não é o Réu devedor, devendo manter-se a sua absolvição.
Nestes termos e nos demais de Direito ao caso aplicáveis e com o douto suprimento de V. Exas., Meritíssimos Juízes Conselheiros, deve julgar-se improcedente o recurso pelas AA. interposto da douta sentença de absolvição de fls. 838 a 857 a qual deve, na íntegra, ser mantida e confirmada assim se fazendo JUSTIÇA,
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
11.1 - De facto:
a) Após concurso público realizado na Direcção Geral do Saneamento Básico foi adjudicado ao Consórcio, ora A., a Empreitada de "Saneamento da ... - Remodelação e Ampliação do Sistema Base - Interceptor Laje - Sassoeiros - Guia" e devidamente outorgado, em 20 de Maio de 1986, o contrato n.º 225 para execução da dita empreitada.
b) A obra foi objecto de consignação em 20.06.86.
c) De harmonia com a cláusula primeira do Contrato, o Consórcio adjudicatário obrigou-se a executar a Empreitada de acordo com a sua Proposta de 26 de Dezembro de 1985 e a cumprir as prescrições do Caderno de Encargos e demais peças do processo patente a concurso.
d) O artigo 9.5. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos estabelece:
"1. Constitui encargo do Empreiteiro salvo estipulação em contrário deste Caderno de Encargos, o fornecimento e utilização das máquinas, aparelhos, utensílios, ferramentas, andaimes e tudo o mais indispensável à boa execução dos trabalhos."
"2. O equipamento a que se refere a cláusula 9.5.1. deve satisfazer, quer quanto ao seu funcionamento, ao estabelecido nas leis e regulamentos de segurança aplicáveis."
e) O artigo 14.1 e 2 das Cláusulas Especiais - Jurídicas do Caderno de Encargos estipula o seguinte:
"1. A Empreitada é realizada por medição, isto é, por série de preços, de acordo com o preceituado na alínea b) da cláusula 2.2.1.."
"2. O Empreiteiro obriga-se a executar, pelos preços apresentados na sua proposta, todos os trabalhos constantes do projecto, competindo-lhe ainda efectuar, sem direito a quaisquer indemnizações, os trabalhos subsidiários que forem consequentes daqueles ou necessários para a sua perfeita execução."
f) No Caderno de Encargos - Condições Técnicas Especiais - Implantação de Tubagens no âmbito da valas a céu aberto, estipula-se na cláusula 1.2., o seguinte: "Sempre que os trabalhos não possam ser conduzidos por forma a assegurar o livre escoamento das águas que porventura existam, terá de proceder-se ao escoamento da água de bombagem devendo o empreiteiro dispor de equipamento adequado."
g) Na cláusula 1.3., no mesmo âmbito, refere-se:
"O esgoto da água deverá ser medido por hora de bombagem, devendo o empreiteiro, de acordo com o seu equipamento, fazer a conversão da energia consumida para horas de funcionamento."
"As horas de funcionamento dos grupos deverão ser controladas pela fiscalização e assentes no livro da obra",
h) O art.º 12.1. do Programa do Concurso dispõe que a Proposta deverá ser instruída com os seguintes documentos:
"(...) Declaração do concorrente na qual conste o equipamento e pessoa que dispõe para execução da obra."
i) Nos termos do Anexo VI do Caderno de Encargos – Condições Especiais – Túneis, cláusula 1.4.3.:
"O Empreiteiro deverá drenar as águas infiltradas, por gravidade ou por bombagem, em quantidade suficiente para obter condições satisfatórias de trabalho."
"Se as ocorrências de caudais forem substanciais o Empreiteiro poderá selar a entrada de água no túnel a fim de reduzir a quantidade a ser bombada e drenada."
j) O ponto 3.5., relativo às regras de medição", das Cláusulas Gerais estabelece:
"3.5.1. Os critérios a seguir na medição de trabalhos quando a ela houver lugar, serão estabelecidos no projecto, neste Caderno de Encargos ou no Contrato.
3.5.2. Se os documentos referidos na cláusula 3.5.1. não fixarem os critérios de medição a adoptar, observar-se-ão para o efeito, pela seguinte ordem de prioridades:
- as normas oficiais de medição que porventura estejam em vigor;
- as normas definidas pelo Laboratório de Engenharia Civil se existirem;
- os critérios geralmente utilizados ou, na falte deles, os que forem acordados entre o Dono da Obra e o Empreiteiro;"
k) No Mapa de Trabalhos do Concurso, na parte correspondente aos troços em túnel, especificamente no art.º 1.º do Capitulo III - Diversos, consta o seguinte na coluna correspondente a "designações" (dos preços unitários): "Bombagem para drenagem provisória incluindo todos os encargos com manutenção e instalação do equipamento, canalizações e acessórios e todas as operações considerando uma altura manométrica média de 15 m, medido por hora de funcionamento dos grupos através de conversão da energia consumida (CV.h), devendo esta conversão ser feita com o equipamento dos concorrentes"
l) No Mapa de Medições e Orçamento, que contém o Mapa de Trabalhos do Concurso apenas existe, quanto ao item referido (bombagem para drenagem) a menção da quantidade total de 17.500 h.
m) O artigo e respectivo preço unitário apresentados em 26 de Dezembro de 1985 pelo Consórcio para a bombagem de água foi formulado da seguinte forma: Artigo-Bombagem de água (etc.) Unid. P.V.
H 299$00
n) Conforme previsto na alínea h) do art.º 1.2.1. do Programa de Concurso, o Consórcio apresentou declaração relativa ao equipamento e pessoal que dispunha para a execução da obra.
o) No n.º 3 dessa declaração expressamente se refere que: "a lista de equipamento anexa é resultado de estudos provisórios ficando sujeita, naturalmente, aos ajustamentos resultantes da marcha dos trabalhos. Esse equipamento poderá ser reforçado, se necessário."
p) Essa lista menciona especificamente 8 electro bombas Flygt 2125, cada uma das quais tendo a potência de 11 cv.
q) Na "Relação de Equipamento" anexa ao Plano de Trabalhos apresentado pelo Consórcio, em 25 de Julho de 1986, encontram-se mencionadas 5 electro bombas Flygt 2151, cada uma das quais tendo a potência de 27 cv.
r) Na obra foi utilizado um grande número de bombas, variável no tempo, cujas potências oscilam entre cerca de 2kw (±2,7 cv) e 20 kw (±27cv).
s) A potência média ponderada das bombas efectivamente instaladas nos túneis foi de 3,5 kw (± 4,8cv), tendo sido utilizadas bombas cuja potência varia entre cerca de 2 kw (±2,7cv) e 20 kw (±27 cv).
t) Os equipamentos utilizados, incluindo as bombas, antes de colocados na obra, foram sancionados pela Fiscalização, tendo em conta os volumes de água a ser bombados.
u) Desde o início das operações de bombagem o empreiteiro facturou, por imposição do Dono da Obra, os trabalhos de bombagem de água na base do somatório das horas de funcionamento de cada uma das bombas utilizadas, independentemente da sua potência, a funcionar isoladamente ou em simultâneo.
v) Por carta datada de 20.01.88, cujo teor se dá aqui por reproduzido (cfr. fls. 81, 82 e 84, 84), o Consórcio E...-C..., ora A., informou o Gabinete Coordenador do Projecto de Saneamento da ... (GCSCE), inter alia, do seguinte: "Bombagens em geral"
"Por existirem diversificações de opinião na interpretação da forma de medição de bombagens de água, e no seguimento de conversações já havidas com V. Ex.as, vimos pela presente dar conhecimento da nossa interpretação sobre este assunto." "Da leitura do Caderno de Encargos desta Empreitada, nomeadamente, no capítulo das Cláusulas Técnicas Especiais, Art.º 1.3., deduz-se o seguinte:
A medição do número de horas de bombagem corresponde ao número real de horas de funcionamento do equipamento multiplicado pela potência do mesmo, convertida em cv.. Para melhor esclarecimento da nossa interpretação sobre o assunto apresentamos um exemplo concreto.
Equipamento utilizado – bomba Flygt com 2,8 kw de potência. Número real de horas de funcionamento do equipamento - 3 horas. Conversão da potência do equipamento em cv.. 2,8 kw - 1,36 x 2,8 = 3,81 cv. Medição do número de horas de bombagem 3 horas x 3,81 = 11,43cv.h. "Bombagens nos túneis"
Como é do conhecimento de V. Ex.as a ocorrência permanente de água nos túneis 1 e 2 já em execução obriga-nos a ter em permanência nas frentes de trabalho três bombas. Uma na frente de cada túnel e uma outra na fossa existente na plataforma exterior." "Dado que na lista de quantidade e preços unitários do Caderno de Encargos desta empreitada não está prevista esta situação, vimos pela presente submeter à apreciação de V. Ex.as o preço horário de estadia dessas mesmas bombas. ( )„
w) Por meio de carta datada de 14.11.88, cujo teor se dá aqui por reproduzido (cfr. fls. 83), dirigida ao GCSCE, a E...-C... informa do seguinte: "Na sequência da nossa carta ref.ª OS/7-DO/88 de 88/10/20 e de posteriores conversas, somos a submeter a V. o valor de 249$00/Kwh, para bombagem de águas incluindo instalação de equipamento, canalizações e acessórios."
x) Em 12.04.88, foi exarado sobre a carta referida em v), o seguinte despacho:
"Não considero esclarecida a questão da avaliação dos custos de bombagem porque a interpretação do caderno de encargos não conduz a qualquer situação racional."
"Assim e para que valha o critério de justiça, desejo que me seja proposto um procedimento que traduza os verdadeiros custos: – justificação do equipamento utilizado; – custo por hora e por c.v. instalado."
y) Em 18.12.1989, o Consórcio apresentou um memorando, sob a epígrafe "Bombagem de água em túneis. Actualização da facturação." (cfr. fls. 86 a 87), cujo teor se dá por reproduzido, no qual se afirmava, inter alia, que:
"O volume de horas provisoriamente facturado ao Gabinete apenas cobre 16.865,70 h.
Há que repor em dia esta situação, que tanto mais impacto tem quanto nos vemos forçados a considerável reforço de bombas, canalizações e redes, em paralelo com uma drástica quebra na produção devido aos caudais com que nos defrontamos. Daí que seja necessário facturar o diferencial resultante."
z) Por meio de carta data de 22.11.90, cujo teor se dá aqui por reproduzido (cfr. fls. 88 a 92), dirigida à Fiscalização da obra, F..., Lda., o Consórcio/Empreiteiro da obra afirma o seguinte:
"Durante a elaboração da última reavaliação da Empreitada, foi necessário retomar este tema, cujo processamento está pendente de 1988 (vide nossas cartas .../DO/88 de 20.01.88 e .../88 de 14.11.88)." "Tivemos então oportunidade de expor ao Gabinete, Fiscalização e Projectista o modo e critério de avaliação que desde sempre defendemos, relativamente à medição das bombagens de água, a saber:
Medição do número de horas de bombagem – corresponde ao número real de horas de funcionamento do equipamento, multiplicado pela potência do mesmo."
"Na prática, esta medição será contabilizada do seguinte modo:
Horas de bombagem = (horas registadas e visadas em Partes Diárias x 3,5kwh /1,2 kwh
Em que,
3, 5 kwh = potência média ponderada das bombas instaladas nos túneis 1,2 kwh = potência da bomba tipo, para altura manométrica de 15 m (proposta inicial, a solicitação do Caderno de Encargos)."
"Depois de longos debates, chegou-se a uma solução de consenso, que ficou tacitamente aprovada pelos presentes, baseada no critério anteriormente exposto, mas implicando um aumento da potência tipo de 1,2 kwh para 1,6 kwh."
aa) Por meio de carta datada de 17.05.91, dirigida ao GCSCE, cujo teor se dá aqui por reproduzido (cfr. fls. 79), o projectista da obra, G... Limitada, informou, inter alia, do seguinte: "A justiça ou não da reclamação do adjudicatário E.../C... sobre o critério de medição só poderá ser devidamente apreciado, depois de um cálculo da potência média usada na bombagem durante a vigência da mesma." "Assim se esse valor for igual ou inferior a 2,5 c.v. não vemos qualquer direito à referida reclamação. Se for superior, é de toda a justiça rever o preço, proporcionalmente ao aumento verificado."
bb) Por meio de carta, datada de 16.07.1991, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 83), a F... informa o Consórcio E.../C... de que:
"Em referência ao assunto de Bombagem em Túnel objecto da carta de V. Ex. as Ref. 1905/DO, de 90.11.22, pela presente comunicamos que, após reuniões havidas na sede do Gabinete Coordenador, o mesmo se encontra em reapreciação."
cc) Por meio do ofício n.º 620, de 29.10.91, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 84), o GSBCE informa o Consórcio do seguinte:
1) Na sequência da pretensão desse Consórcio, sobre a alteração dos critérios de medição das bombagens de água, decorrente das obras de construção dos túneis, foi colocada a este Gabinete a necessidade de avaliar da justeza ou não de tal pretensão."
2) Pelas razões que são do vosso conhecimento, e das quais se salientam a necessidade de aprovação de Reprogramação dos trabalhos e as dificuldades financeiras deste Gabinete, não foi considerado oportuno até ao início do ano de 1991, retomar e colocar superiormente o assunto em causa."
3) Entretanto, nos finais de 1990 e princípio de 1991, procederam V. Ex.as à emissão de facturas relativas à pretensão mencionada em 1), com base no vosso critério de medição que ainda não está superiormente aprovado.
Em consequência, até aprovação de qualquer critério diferente do constante do Mapa dos Trabalhos patente a concurso, as facturas são, segundo o nosso ponto de vista, consideradas indevidamente emitidas."
4) Neste momento, perspectivam-se condições financeiras que nos permitem o mais rapidamente possível, retomar a apreciação deste assunto, reiniciado aliás, já no passado mês de Maio.
Tal acção envolve obviamente não só este Gabinete mas também o Projectista e a Fiscalização da empreitada, dado tratar-se da análise de um critério, que no fundo altera o estipulado nas Cláusulas do Caderno de Encargos patente a Concurso."
dd) Por meio de carta datada de 08.11.91, dirigida pelo Consórcio ao GSBCE, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 96-97), afirma-se, inter alia, que "O Gabinete, em reunião de obra e com a presença da Fiscalização e Projectista propôs uma alteração ao novo critério, entretanto apresentado pelo Empreiteiro, que representava uma redução de 20 a 25% daquele." "(...) aceitamos a referida alteração e, em consequência emitimos as respectivas facturas."
ee) No parecer emitido a 15.11.91 pela F... e dirigido ao GCSCE, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 174 a 178), afirma-se, inter alia, que "...não há qualquer razão para aumentos de preço, já que os parâmetros que influenciaram a fixação do preço unitário da bombagem são superiores aos reais verificados."
ff) Na Comunicação de 27.11.91 dirigida pela G... ao GSBCE, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 179 a 180), afirma-se, inter alia, que "...não vemos qualquer justificação para a pretensão do empreiteiro."
gg) Na informação n.º …./1991/GSBCE, de 09.12.91, elaborada pela Assessoria Jurídica do GSBCE, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 186 a 199), afirma-se, inter alia, que "a pretensão da E... não pode proceder porquanto:
"a) O critério que pretende aplicar na medição das bombagens é o que consta do art.º1º do Capítulo III do Mapa de Medições ou de trabalhos e que é única e exclusivamente aplicável pelos concorrentes para determinarem e calcularem com base nos respectivos parâmetros o peço unitário/hora das bombagens a apresentar nas respectivas propostas. (...)"
b) A utilização do critério indevidamente pretendido pela E... triplicaria o cômputo da medição das bombagens, face ao real número do seu funcionamento donde seriam pagas horas em que o equipamento não funcionaria."
hh) A informação referida em hh) mereceu despacho de concordância da Comissão Directiva do GSBCE, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 186 a 199).
ii) Por meio de carta, de 29.05.92, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 98), dirigida pelo Consórcio Empreiteiro ao GSCE, afirma-se, inter alia: "Perante o silêncio de mais de seis meses, consideramos que, de acordo com a legislação em vigor, o Gabinete aprovou o critério por si próprio proposto para avaliação dos trabalhos de bombagem, pelo que são devidas as facturas já emitidas."
jj) O Consórcio Empreiteiro emitiu facturas, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 100 a 117), que relaciona com os diferenciais de horas de bombagem referentes ao período que intercede entre o ano de 88 e Julho de 1993, cujos números e montantes são os seguintes:
factura n.º ... – 32.548.781 $00;
factura n.º... – 53.674.439$00;
factura n.º ... - 112.084.273$00
factura n.... - 7.011.565$00;
factura n.º ...1 - 6.380.680$00
factura n.º... - 32.073.917$00
factura n.º ... - 3.869.072$50
factura n.º ... - 132.882.763$00
kk) Na sequência da carta da E... n.º 1.011, datada de 29.05.92 e da factura n.º ..., foi elaborada a informação n.º .../1992/GSBCE, de 27.07.92 (cfr. doc. de fls. 201 a 209), cujo teor se dá por integralmente reproduzido, nos termos da qual se promove "o indeferimento da pretensão do empreiteiro".
II) O despacho de concordância do Secretário de Estado do Ambiente e Recursos Naturais, de 14.08.92, foi exarado na informação referida em kk),
(cfr. doc. de fls. 201, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
mm) Por meio do ofício n.º ..., de 19.08.92, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 99), subscrito pela Vogal da Comissão Directiva e dirigida ao Consórcio Empreiteiro, informa-se de que, "(...) de acordo com os pareceres elaborados pela Fiscalização e Projectistas do Interceptor Laje – Guia, não é reconhecida a existência de qualquer diferencial a facturar para além do que está liquidado, dado que os trabalhos se desenvolveram dentro dos parâmetros previstos no Mapa de Trabalhos patente a concurso, não podendo este Gabinete aceitar novos critérios de medição que vão alterar as Cláusulas Especiais do Caderno de Encargos."
nn) Por meio de requerimento datado de 16.11.92, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 118 a 125), o Consórcio Empreiteiro solicitou ao Ministro do Ambiente e Recursos Naturais que "se digne: a determinar o pagamento das facturas referidas no ponto 6, aliás de há muito já vencidas e com as despesas de IVA já também de há muito efectuadas pela requerente;
reconhecer que o critério de medição das unidades que devem ser pagas pelo preço da bombagem em túnel está omisso no Caderno de Encargos e na Proposta, devendo tal omissão ser integrada segundo critérios de razoabilidade, isto é, com base no critério de medição assente numa bomba tipo de potência não superior a 1,6 kw."
oo) Na sequência de tal requerimento, o Consórcio Empreiteiro fez juntar ao processo parecer jurídico para fundamentar a sua pretensão, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 126 a 135).
pp) Por meio do ofício n.º ...0 de 02.12.1993, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 136 e 137), a Ministra do Ambiente e Recursos Naturais informou o Consórcio Empreiteiro de que "não assiste razão ao Consórcio E...-C... na pretensão em referência, já que:
"a) O contrato de empreitada outorgado entre o Consórcio e o dono da obra previu expressamente como critério de medição das unidades de bombagem em túnel o valor hora, obtido pela conversão da energia despendida de harmonia com o equipamento utilizado pelo empreiteiro, para horas de funcionamento;"
"b) Não existe, portanto, lacuna que caiba integrar, pelo que se impõe dar cumprimento ao contrato firmado entre as partes, nos termos contratualmente assentes;"
"c) não se verificou acordo das partes contraentes para estabelecimento de critério diferente daquele que fora fixado no caderno de encargos."
qq) A presente acção deu entrada em tribunal em 08.02.95, tendo sido solicitada a tentativa de conciliação extra judicial em 26.05.94.
rr) No clausulado do caderno de encargos consta o seguinte: "bombagem para drenagem provisória, incluindo todos os encargos de manutenção e instalação de equipamento, canalizações e todos os acessórios e todas as operações, considerando uma altura manométrica de 15 m, medido por horas de funcionamento dos grupos através da energia consumida (cv.h) devendo esta conversão ser feita de acordo com o equipamento dos concorrentes;
ss) No Caderno de Encargos não consta a bomba-tipo;
tt) Não estando definido o caudal, a referência à altura manométrica de 15 m é insuficiente para definir a bomba tipo, isto é, para definir a potência desta;
uu) Houve mais do que uma bomba em funcionamento simultâneo e com potências diferentes;
vv) O critério de cálculo referido no artigo 1º do Capítulo III do Mapa de Trabalhos do caderno de Encargos era apenas para ser inicialmente considerado pelos concorrentes ao concurso, como meio de cálculo e suporte-base para apresentação, pelos mesmos, nas respectivas propostas, do preço unitário por hora de drenagem por bombagem;
ww) As bombagens efectuadas foram pagas ao empreiteiro adjudicatário pelo produto da multiplicação do número de horas reais de funcionamento das bombas pelo respectivo preço unitário aprovado e fornecido pelo empreiteiro na respectiva proposta, nos termos referidos na alínea anterior;
xx) No critério de medição proposto nas facturas, o número de horas é multiplicado pelo coeficiente 2,19, o que provoca o aumento proporcional dos valores a pagar;
yy) A média ponderada da altura manométrica existente nas várias frentes de trabalho era de 8,5m;
zz) O preço unitário de Esc. 299$00 das bombagens traduz o custo e o lucro que as AA propuseram para cada hora de bombagem, com inclusão de todos os encargos com manutenção e instalação do equipamento, canalizações e acessórios e todas as correspondentes operações;
3 – Está em causa no presente recurso jurisdicional decidir, no âmbito da Empreitada de "Saneamento da ... – Remodelação e Ampliação do Sistema Base-Interceptor Laje-Sassoeiros-Guia", adjudicada ao consórcio Autor, como deve ser efectuado o pagamento da operação de bombagem de água efectuada durante a execução dos trabalhos e necessária para a conclusão destes.
Na sentença recorrida, a acção foi julgada improcedente por se ter entendido, em suma, que não pode ser alterado o critério estabelecido no Caderno de Encargos para calcular o preço a pagar, porque
– se está perante uma empreitada por série de preços, em que a remuneração do empreiteiro se obtém através da aplicação dos preços estabelecidos contratualmente por cada espécie de trabalho às quantidades dos mesmos efectivamente executadas;
– o que foi contratado só pode ser alterado «por mútuo consenso dos contraentes» (art. 406º do CC), só podendo alterações contratuais justificarem-se por razões de interesse público ou por alterações das circunstâncias (nos termos do art. 437.º do CC) ou por força maior;
– no caso em apreço não se está perante uma situação em que haja alteração das circunstâncias, designadamente por não terem ocorrido factos imprevisíveis que não sejam conjecturáveis segundo um padrão de diligência normal;
– a tese das Autoras de que o critério de medida no Caderno de Encargos, segundo as horas de funcionamento, é irracional, por não ter em contra a potência da cada bomba, é reversível, pois podia conduzir a uma situação de vantagem para o empreiteiro se a potência das bombas fosse a menor possível, sendo mesmo isso que aconteceu;
– não há base para aplicação do mecanismo da revisão de preços;
– a maior quantidade de horas de bombagem em relação às inicialmente estimadas consubstanciaria execução de trabalhos a mais, que deveriam ser pagos aos preços unitários previstos para os trabalhos da mesma espécie, o que as Autoras não alegam não ter ocorrido.
4 – Está-se perante uma empreitada por série de preços em que «a remuneração do empreiteiro resulta da aplicação dos preços unitários previstos no contrato para cada espécie de trabalho a realizar às quantidades desses trabalhos realmente executadas» (art. 14.º do DL n.º 48871, de 19-2-1969, aplicável por força do disposto no art. 236.º do DL n.º 235/86, de 18 de Agosto).
No presente recurso jurisdicional, as Autoras defendem, em primeiro lugar, que existe uma omissão contratual quanto ao critério de medição das unidades de bombeamento, por não estar suficientemente definido nas peças concursais, nem no contrato de empreitada celebrado entre as partes, pois nestes apenas se refere como unidade a hora de bombagem, sem se referir a potência padrão dessa hora de bombagem, isto é, a potência horária que corresponde ao preço unitário acordado, de 299$00.
É certo que no contrato não é definida a potência das bombas que iriam ser utilizadas e o Tribunal Colectivo não considerou provado que aquele preço tivesse sido calculado com base o equipamento que as Autoras listaram na sua proposta (resposta negativa ao quesito 13.º, a fls. 657 e 832).
No entanto, como se refere na alínea zz) da matéria de facto fixada na sentença recorrida (resposta ao quesito 11), aquele preço de 299$00 por hora de bombagem traduz o custo e o lucro que as Autoras propuseram para cada hora de bombagem, com inclusão de todos os encargos com manutenção e instalação do equipamento, canalizações e todas as correspondentes operações.
Por isso, é de concluir, à face da matéria de facto fixada, que as Autoras, ao calcularem o preço de 299$00 por hora de bombagem, tiveram em conta a potência das bombas que tencionavam utilizar, sejam as que listaram na sua proposta sejam quaisquer outras, pois sem a considerarem, não poderiam calcular o custo horário subjacente a tal preço, que se provou ter sido considerado.
Assim, estando assente que as Autoras, ao proporem tal preço, tiveram em conta todos os encargos atinentes ao funcionamento das bombas e não sendo idêntico o custo horário de funcionamento de bombas de potências diferentes, a determinação daquele preço necessariamente teve em conta os custos de funcionamento das bombas que as Autoras tencionavam utilizar, fossem elas ou não as que foram indicadas na lista de equipamento anexa à declaração relativa ao equipamento que as Autoras dispunham para a execução da obra, prevista na alínea h) do artigo 1.2.1. do Programa do Concurso (a resposta negativa ao quesito 13 significa que não se provou que o preço referido tivesse sido calculado com base no equipamento listado na proposta, mas não tem o alcance de dar como provado o contrário, isto é, que não o tenha sido).
De qualquer forma, o certo é que no contrato se prevê a forma de cálculo dos pagamentos relativos à bombagem referida, com base nas horas de funcionamento das bombas, independentemente da sua potência, e não é inviável aplicar este único critério para determinar os pagamentos que há que efectuar com essa bombagem.
Podendo esse critério ser aplicado e tendo sido ele o acordado, não se pode concluir que se esteja perante uma omissão do contrato, que seja necessário integrar.
Não há, assim, necessidade de integração do contrato.
5 – Sendo assim, a adopção de outro critério para calcular os pagamentos referidos, em vez do indicado no contrato, traduzir-se-ia na sua modificação e não na sua integração.
A modificação de contratos, fora de casos especialmente previstos, apenas pode correr com o acordo de ambas as partes, como resulta do teor expresso do art. 406.º, n.º 1, do Código Civil. ( Como sucede, nomeadamente, nos casos de alteração anormal das circunstâncias, previstos no art. 437.º do Código Civil, e, para modificação pelo contraente público, nos casos previstos nos arts. 180.º, alínea a), do CPA e 302.º, alínea c) do Código dos Contratos Públicos)
Ora, no caso em apreço, não se deu como provado que tenha havido acordo por parte do contraente público em considerar outro critério de cálculo dos pagamentos relativos à bombagem referida que não fosse com base no preço de 299$00 por hora de funcionamento, que foi interpretado pelas partes como reportando-se a cada uma das bombas utilizadas.
Pelo contrário, provou-se que «desde o início das operações de bombagem o empreiteiro facturou, por imposição do Dono da Obra, os trabalhos de bombagem de água na base do somatório das horas de funcionamento de cada uma das bombas utilizadas, independentemente da sua potência, a funcionar isoladamente ou em simultâneo» [alínea u) da matéria de facto fixada], o que revela que o contraente público entendeu que o critério referido para determinar os pagamentos em causa era o que constava do contrato e que não deu a sua aceitação a modificação do contrato, neste ponto.
Por isso, tem de se concluir que não há suporte contratual para que os pagamentos sejam efectuados em termos diferentes dos que foram realizados.
6 - As Autoras, subsidiariamente, defendem que se está perante uma questão de duvidosa solução, que deve ser resolvida de acordo com o princípio do maior equilíbrio das prestações (art. 237.º do Código Civil).
Segundo as Autoras, a aplicação deste princípio conduz à aplicação de uma potência padrão de 1,6 kW.
O art. 237.º do Código Civil estabelece que «em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações».
No caso em apreço, não se está perante uma situação de dúvida sobre o alcance das declarações que integram o contrato, pois o que deste resulta é que o pagamento se faça com base apenas nas horas de funcionamento das bombas, independentemente da sua potência.
Aliás. é por reconhecerem que é esse o critério previsto no contrato e por entenderem que é um critério inadequado que as Autoras defendem que o contrato deve ser «integrado», aplicando um critério distinto.
Por isso, não se pode entender que se está perante uma situação de dúvida sobre o alcance das declarações negociais que viabilize a aplicação do regime do art. 237.º do Código Civil.
De qualquer forma, não se provou que a potência média ponderada das bombas efectivamente instaladas nos túneis [3,5 kw, segundo se refere na alínea s) da matéria de facto fixada] fosse superior à potência média das bombas que as Autoras tiveram em conta ao calcular o referido custo horário que indicaram na sua proposta.
Por isso, à face da matéria de facto fixada, não há suporte para concluir que o preço não seja adequado à prestação das Autoras, isto é, que não tenha sido alcançado o «equilíbrio das prestações» que se refere naquele art. 237.º e, designadamente, que tenha ocorrido um desequilíbrio desfavorável às Autoras.
Termos em que acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelas Autoras.
 Lisboa, 7 de Julho de 2010
 Jorge Manuel Lopes de Sousa (relator)
Alberto Augusto Andrade de Oliveira
Fernanda Martins Xavier e Nunes

Sem comentários:

Enviar um comentário